“Em Bruxelas, para onde me transferi, em
virtude de uma ordem de expulsão imposta pelo sr.Guizot, tive ocasião de
prosseguir nos meus estudos de economia política, Iniciados em Paris.
O resultado geral a que cheguei e que, uma
vez obtido, serviu de fio condutor aos meus estudos, pode resumir-se assim: na
produção social da sua vida, os homens contraem determinadas relações
necessárias e independentes da sua vontade, relações de produção que
correspondem a uma determinada fase de desenvolvimento das suas forças
produtivas materiais.
O conjunto dessas relações de produção
forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se levanta a
superestrutura jurídica e política e à qual correspondem determinadas formas de
consciência social.
O modo de produção da vida material
condiciona o processo da vida social, política e espiritual em geral.
Não é a consciência do homem que determina
o seu ser, mas, pelo contrário, o seu ser social é que determina a sua
consciência.
Ao chegar a uma determinada fase de
desenvolvimento, as forças produtivas materiais da sociedade se chocam com as
relações de produção existentes, ou, o que não é senão a sua expressão
jurídica, com as relações de propriedade dentro das quais se desenvolveram até
ali.
De formas de desenvolvimento das forças
produtivas, estas relações se convertem em obstáculos a elas. E se abre, assim,
uma época de revolução social.
Ao mudar a base econômica, revoluciona-se,
mais ou menos rapidamente, toda a imensa superestrutura erigida sobre ela.
Quando se estudam essas revoluções, é
preciso distinguir sempre entre as mudanças materiais ocorridas nas condições
econômicas de produção e que podem ser apreciadas com a exatidão própria das
ciências naturais, e as formas jurídicas, políticas, religiosas, artísticas ou
filosóficas, numa palavra, as formas ideológicas em que os homens adquirem
consciência desse conflito e lutam para resolvê-lo.
E do mesmo modo que não podemos julgar um
indivíduo pelo que ele pensa de si mesmo, não podemos tampouco julgar estas
épocas de revolução pela sua consciência, mas, pelo contrário, é necessário
explicar esta consciência pelas contradições da vida material, pelo conflito
existente entre as forças produtivas sociais e as relações de produção.
Nenhuma formação social desaparece antes
que se desenvolvam todas as forças produtivas que ela contém, e jamais aparecem
relações de pr6dução novas e mais altas antes de amadurecerem no seio da própria
sociedade antiga as condições materiais para a sua existência.
Por isso, a humanidade se propõe sempre
apenas os objetivos que pode alcançar, pois, bem vistas as coisas, vemos
sempre, que esses objetivos só brotam quando já existem ou, pelo menos, estão
em gestação as condições materiais para a rua realização.
A grandes traços podemos designar como
outras tantas épocas de progresso, na formação econômica da sociedade, o modo
de produção asiático, o antigo, o feudal e o moderno burguês. As relações burguesas
de produção são a última forma antagônica do processo social de produção,
antagônica, não no sentido de um antagonismo individual, mas de um antagonismo
que provém das condições sociais de vida dos indivíduos.
As forças produtivas, porém, que se desenvolvem
no selo da sociedade burguesa criam, ao mesmo tempo, as condições materiais
para a solução desse antagonismo.
Com esta formação social se encerra,
portanto, a pré-história da sociedade humana.”
*Uma Contribuição para a
Crítica da Economia Política (Prefácio, 1859)