sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Opinião do dia - José Serra: patrimonialista

"Se o PT estivesse na oposição e o governo oferecesse de graça patrimônio público a agentes privados, denunciar-se-ia o “neoliberalismo selvagem”. Como estava no governo, praticou-o. Se o modelo estivesse funcionando, isso poderia ficar na rubrica dos debates e disputas políticas. Mas não funciona.

E há, sobretudo, o estilo patrimonialista de governar, que compreende o uso do setor público como se fosse propriedade do partido, de seus aliados e de algumas corporações. É a privatização viciosa que atrapalha a virtuosa. Por último, a publicidade massiva e a espetacularização permanente – e esta sim competente – das realizações não-cumpridas fecham o círculo: ilude o próprio governo, amolece o trabalho e dificulta as soluções. "

José Serra, ex-prefeito e ex-governador de S. Paulo. Artigo ‘O sofá e a sala’. O Estado de S. Paulo, 13/10/2011.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Falta de fiscalização causa mais uma tragédia no Rio
Em agosto, mortes no parque e no bonde
Aeroportos privatizados terão meta para a Copa
Gisele Bündchen fica no ar
Berlusconi, de novo, enfrenta a desconfiança

FOLHA DE S. PAULO
Governo reduz previsão do PIB
Explosão em restaurante no centro do Rio mata 3 e fere 17
Alemanha deve crescer menos do que o previsto
Patriota diz que EUA admitem lacuna na acusação contra Irã

O ESTADO DE S. PAULO
Economia desacelera além do previsto, mostra índice do BC
MP pede que Tribunal de Contas afaste conselheiro
Mantega teme contágio
Procurador pede a deportação de Battisti

VALOR ECONÔMICO
Japão contesta na OMC alta do IPI sobre carros
Sindicatos já buscam o aviso prévio retroativo
China ganha apoio contra o Brasil nos EUA
Bilhões em módulos de plataformas
Mercado vê Copom gradualista e já projeta Selic de um dígito em 2012

CORREIO BRAZILIENSE
GDF suspende uso de arma de choque em blitz do Detran
Haja paciência até a caixa postal ficar em dia
Fifa abre o país a quem comprar bilhete da Copa

ESTADO DE MINAS
Obstáculos para obras da Copa
Paralisação nos Correios é encerrada e segue o transtorno nos bancos

ZERO HORA (RS)
O metrô mais próximo
Decisão tardia: Morte faz Samu mudar socorro

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Correios retomam o trabalho com mutirão
Interpol no caso do lixo hospitalar

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www.politicademocratica.com.br/editoriais.html

Battisti: MP pede anulação de visto

Procuradores alegam que decisão foi ilegal e querem deportar italiano

BRASÍLIA. O Ministério Público Federal entrou com ação na Justiça Federal, em Brasília, pedindo a anulação do visto de permanência concedido ao ex-ativista italiano Cesare Battisti. Os procuradores querem que ele seja deportado para outro país. Para o Ministério Público, o visto foi concedido de forma ilegal, violando o Estatuto do Estrangeiro. A lei proíbe a concessão de permanência a estrangeiro condenado em outro país por crime passível de extradição. Battisti foi condenado na Itália pela participação em quatro homicídios na década de 1970.

Segundo o procurador da República Hélio Heringer, autor da ação civil pública, o STF concluiu que os delitos cometidos pelo italiano têm natureza comum, e não política. São, portanto, passíveis de extradição, segundo a Constituição brasileira. O tribunal decidiu também que caberia ao chefe do Poder Executivo decidir entregar ou não o estrangeiro. No ano passado, o então presidente Lula recusou-se a extraditar Battisti.

O procurador argumentou que a decisão de Lula não muda os crimes. "Tal competência é exclusiva do STF e foi exercida para declarar os crimes praticados como sujeitos à extradição. Sendo os crimes dolosos e sujeitos à extradição segundo a lei brasileira, não há que ser concedido visto de estrangeiro a Cesare Battisti", escreveu.

Segundo o procurador, extraditar Battisti não seria punição, pois ele não seria entregue à Itália, para não contrariar a decisão de Lula. No entanto, seria possível entregá-lo a outro país onde ele morou, como França e México. O caso será julgado pela 20ª Vara Federal, em Brasília.

Battisti foi condenado à prisão perpétua em seu país e estava foragido no Brasil. Em junho, o STF manteve a decisão de Lula que, ao fim de 2010, negou o pedido de extradição feito pelo governo da Itália. O Conselho Nacional de Imigração já concedeu visto de permanência a Battisti para que ele possa viver e trabalhar no Brasil por tempo indeterminado.

FONTE: O GLOBO

Governo reduz previsão do PIB

Novas projeções apresentadas pelo Banco Central reforçam avaliações internas do governo de que o país pode crescer neste ano menos de 3,5%, taxa apresentada pelo Ministério da Fazenda como piso nesta semana. A atividade econômica recuou 0,53% em agosto em relação a julho, segundo indicador calculado pelo BC para prever a evolução do PIB

Recuo da economia leva governo a rever projeção para o PIB

Novos números divulgados pelo Banco Central sugerem que crescimento poderá ficar abaixo de 3,5% neste ano

Governo acha que desaceleração abre caminho para Copom ter "mais ousadia" ao reduzir taxa de juros

Natuza Nery e Maeli Prado

BRASÍLIA - Novas projeções apresentadas pelo Banco Central reforçaram avaliações internas do governo de que o crescimento da economia brasileira neste ano poderá ficar abaixo de 3,5%, taxa apresentada como piso pelo Ministério da Fazenda nesta semana.

A atividade econômica recuou 0,53% em agosto, de acordo com o IBC-Br, indicador calculado pelo BC para prever a evolução do PIB (Produto Interno Bruto), que representa a soma dos bens e serviços produzidos no país.

Os números do BC coincidem com as avaliações que a equipe econômica tem feito, segundo a Folha apurou, mas contrariam o discurso oficial do governo e o desejo manifestado pela própria presidente Dilma Rousseff, que em setembro disse buscar uma expansão de 4% do PIB.

No início da semana, o secretário-executivo da Fazenda, Nelson Barbosa, afirmou durante audiência no Congresso que o país poderá crescer de 3,5% a 4% neste ano. Os números do BC sugerem que ele foi otimista demais.

Integrantes do governo disseram ontem que o esfriamento da economia abre espaço para "mais ousadia" na próxima reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) do BC, que se reunirá na semana que vem e deve promover um novo corte da taxa básica de juros da economia.

O BC começou em agosto a reduzir os juros de forma agressiva, com o objetivo de evitar que a economia brasileira sofra muito com os efeitos da crise externa e cresça num ritmo muito lento. A instituição promete promover novos cortes até o fim do ano.

A maioria dos analistas do mercado aposta num corte de pelo menos 0,5 ponto porcentual na semana que vem. A taxa básica de juros fixada pelo BC está em 12% hoje.

Nas palavras de um importante interlocutor da presidente Dilma Rousseff, os novos números mostram que o BC estava certo ao decidir baixar os juros em agosto, apesar dos riscos que isso cria para o controle da inflação.

Os números do BC aumentaram o pessimismo no mercado financeiro também. Alguns economistas preveem que o PIB poderá ter crescimento zero neste trimestre ou até mesmo sofrer contração.

"O número em si não muda a leitura que o mundo dos negócios faz do Brasil", afirmou o economista-chefe do Bradesco, Octavio de Barros. "Mas ele reforça a tese de que estamos crescendo um pouco abaixo do potencial."

Os números do BC confirmam também outros sinais de desaceleração da economia, como a queda na produção industrial e nas vendas do varejo, disse o economista Aurélio Bicalho, do Itaú Unibanco, que recentemente reviu de 3,6% para 3,2% a projeção para o PIB em 2011.

O cenário é desfavorável para a indústria principalmente por causa do aumento das importações e de exportações fracas em setores como calçados e vestuário.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Economia desacelera além do previsto, mostra índice do BC

A economia brasileira recuou em agosto o pode estar desacelerando mais que o previsto. É o que aponta o Índice de Atividade Econômica do Banco Central, que caiu 0,53% em agosto ante julho. A média do acumulado entre junho e agosto é negativa em 0,19%. Economistas reduziram a previsão de crescimento em 2011 para pouco acima de 3%, reforçando o cenário de desaquecimento traçado pelo BC como justificativa para cortar juros. No acumulado em 12 meses a economia está crescendo 4% - nível considerado pelo BC abaixo da capacidade do País de se expandir sem pressionar os preços. Mas há duvida no mercado se esse freio bastará para derrubar a inflação

Economia recua mais que o previsto

Índice do BC que funciona como prévia do PIB cai 0,53% em agosto e sinaliza que resultado do ano deve ficar abaixo do projetado

Fabio Graner

BRASÍLIA - A economia brasileira recuou em agosto e pode estar desacelerando mais que o previsto. É isso que aponta o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), indicador que funciona como um termômetro mensal da economia.

O índice recuou 0,53% em agosto em relação a julho. Levando-se em conta também o resultado de junho e julho, a média acumulada nos três meses é negativa em 0,19%.

O resultado dá mais força para o cenário de desaquecimento da economia traçado pelo BC como justificativa para a redução da taxa básica de juros. No resultado acumulado em 12 meses, a economia está crescendo 4% - nível considerado pelo BC abaixo da capacidade de o País crescer sem pressionar a inflação.

Na visão do BC, seria necessário cuidar para que a economia não entrasse numa rota de estagnação, em um quadro de deterioração do ambiente externo.

Com os dados divulgados ontem pelo BC, boa parte dos analistas começou a refazer as projeções do Produto Interno Bruto (PIB) em 2011. Para o desempenho do terceiro trimestre, cujo resultado oficial o IBGE só divulgará em dezembro, a maior parte dos analistas trabalha com cenário de estabilidade ou queda no PIB. Mesmo assim, há grande dúvida sobre se o movimento de desaceleração será suficiente para derrubar a inflação.

Em entrevista ao serviço AE Broadcast ao Vivo, da Agência Estado, o economista-chefe do banco ABC Brasil, Luiz Otávio de Souza Leal, prevê um resultado próximo de zero para o PIB no terceiro trimestre e uma alta de 3,3% no ano. Mas não descarta a possibilidade de o indicador ficar mais próximo de 3%.

Quanto à desaceleração econômica e sua influência sobre a inflação, Souza Leal apontou que há muitas dúvidas se o setor industrial - que representa em torno de 30% do PIB - vai ser capaz de puxar rapidamente para baixo o setor de serviços, que responde por cerca de 60% do PIB.

"Não há dúvida se há desaceleração. A questão é: essa desaceleração é suficiente para trazer a inflação para a meta?"

Produção e consumo. O economista do BES Investimento Flavio Serrano considera que é um engano tratar como tendência de estagnação os resultados do IBC-Br. "Uma desaceleração no terceiro trimestre já estava contratada, não quer dizer que a economia viverá uma estagnação", disse Serrano, argumentando que a indústria tem tido um desempenho mais fraco, enquanto o consumo das famílias, mesmo com alguma acomodação, ainda segue forte.

O economista destaca que o mercado de trabalho não dá sinais de perda de dinamismo. "Ainda não estão equilibradas a oferta e a demanda, o que gera um risco de a inflação não cair tanto daqui para frente e se elevar mais rapidamente no segundo semestre de 2012, forçando nova alta dos juros."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Na TV, PSDB defende gestão FHC e explora a 'volta' da inflação - Olhe o vídeo

Ex-presidente afirma que principais reformas no país foram feitas pelo partido e cita real e controle de gastos

Aécio ocupa quase 2 dos 10 minutos da inserção para falar sobre gestões estaduais; coube a Serra criticar governo federal

SÃO PAULO - O PSDB usou seu programa nacional de TV ontem para defender o legado do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e criticar a "volta" da inflação e a corrupção na máquina pública.

A peça, com duração de dez minutos, também foi usada para apaziguar os ânimos no partido, exibindo, ainda que em papéis diferentes, o ex-governador José Serra e o senador Aécio Neves, que disputam espaço dentro sigla.

FHC foi o primeiro político a aparecer no programa. Ele usou o espaço para defender ações de seu governo.

Disse que os tucanos controlaram a inflação -"o maior mal para os trabalhadores"-, citou a Lei de Responsabilidade Fiscal e a concepção de programas sociais que, afirmou, deram origem ao Bolsa Família.

No capítulo seguinte, o partido apresentou Serra como porta-voz das críticas ao governo federal, nas mãos do PT há nove anos.

O ex-governador, que no mês passado reclamou de não ter aparecido no programa de TV do PSDB em São Paulo, afirmou que o plano de combate ao crack "ficou na promessa" e que a a corrupção está ameaçando o "progresso social" do país.

"Não se trata de fazer a crítica pela crítica. É que fiscalizar, apontar o que está errado, ajuda a melhorar", justificou, ao encerrar.

O capítulo propositivo do programa ficou com o senador Aécio Neves, que defendeu a "gestão eficiente" para enfrentar a corrupção, e apresentou projetos de governadores tucanos.

Diferente dos demais, Aécio apareceu em close, com aparência mais despojada - paletó aberto e sem gravata. O senador mineiro, que já se colocou como possível nome na disputa presidencial de 2014, ocupou quase 2 dos 10 minutos do programa -pouco mais que Serra.

Os líderes do partido no Senado e na Câmara, Álvaro Dias (PR) e Duarte Nogueira (SP), e o presidente nacional da sigla, Sérgio Guerra (PE) também apareceram.

O PSDB exibiu imagem de seus oito governadores, mas nenhum falou no programa.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Fifa abre o país a quem comprar bilhete da Copa

Pilha de documentos exigidos de estrangeiros que vêm fazer turismo no Brasil não será cobrada de quem comprar ingresso da Fifa para ver jogos do Mundial de 2014. A brecha está na Lei da Copa em discussão no Congresso. Países como EUA e Alemanha não admitiram esse tipo de ingerência.

Compre seu bilhete e entre no Brasil

Lei Geral prevê a dispensa do visto aos estrangeiros que adquirirem ingressos para os jogos de futebol. Polícia Federal teme que flexibilização estimule a vinda de criminosos

Josie Jeronimo

Comprovante de renda, de residência, de emprego fixo, declaração escolar e extratos bancários. A pilha de documentos exigidos atualmente para que estrangeiros possam fazer turismo no Brasil deve ser reduzida a um simples ingresso para algum dos jogos da Copa do Mundo de 2014. A brecha consta na Lei Geral da Copa, em análise no Congresso. O texto do projeto estabelece o afrouxamento nas rotinas de concessão de vistos a estrangeiros vindos de países que atualmente só deixam os brasileiros partirem de seus aeroportos mediante um pente-fino financeiro e criminal em suas vidas.

Depois da Copa do Mundo da África do Sul, em 2010, o Brasil será o segundo país a suspender suas regras vigentes de seleção de imigrantes temporários para se adequar às exigências da Federação Internacional de Futebol (Fifa). A Lei Geral da Copa diz que "considera-se documentação suficiente para obtenção do visto de entrada ou para o ingresso no território nacional o passaporte válido" em conjunto "com qualquer instrumento que demonstre a sua vinculação com os eventos", resumido no capítulo três da lei como "ingressos ou confirmação de aquisição".

A Alemanha, na Copa de 2006, divulgou regras de emissão de vistos e o país fez questão de ressaltar que, apesar de estar "aberto" ao evento, não mudaria normas para facilitar a entrada de turistas e sugeriu aos torcedores que tirassem o visto antes de comprar o ingresso: "O Ministério das Relações Exteriores recomenda a todos os fãs de futebol que necessitam de visto a encaminhar os documentos o mais cedo possível". Na época, o governo germânico ainda acrescentou que os ingressos não seriam sinônimo de comprovação de boa-fé do viajante. "A apresentação de bilhete para um jogo de Copa do Mundo ou uma prova de que esse tipo de bilhete foi comprado será vista apenas como uma forma de fundamentar o propósito da viagem, mas em si não concede o direito a um visto", orientou o governo alemão. Nas Copas de 2002, na Coreia do Sul/Japão, e de 1994, nos Estados Unidos, também não houve abertura irrestrita de fronteiras.

Na África do Sul, entretanto, para resolver o encalhe de ingressos, as autoridades liberaram a entrada de estrangeiros com bilhetes e deixaram até mesmo de cobrar a taxa de visto, que custava cerca de US$ 60 no ano passado. Quando perceberam que o afrouxamento temporário das regras estimulou o aumento da procura por viagens ao continente africano, as autoridades lançaram mão de tratamento diferenciado na concessão de vistos.

Pedofilia

Enquanto o Congresso se prepara para analisar a Lei Geral da Copa, a Polícia Federal se preocupa com os problemas que a abertura dos aeroportos e das fronteiras aos turistas-torcedores pode trazer ao Brasil. A inteligência brasileira analisa a possibilidade de o evento atrair criminosos dos mais variados tipos, especialmente os ligados à rede internacional de pedofilia e conta com a ajuda da Interpol para ampliar alertas de "difusão vermelha" com o objetivo de barrar viajantes alvo de mandado de prisão.

De acordo com a Secretaria Extraordinária de Grandes Eventos, do Ministério da Justiça, coordenada por José Ricardo Botelho, se a Lei Geral da Copa for aprovada como está, os agentes de segurança pública terão que fazer o pente-fino durante o desembarque dos turistas nos aeroportos. A secretaria estuda a criação de um banco de dados integrado, com informações da Interpol, das polícias dos estados que sediarão a Copa e da Polícia Federal para municiar consulados, embaixadas e agentes envolvidos na análise de imigração temporária.

O especialista em direito internacional Carlos Pellegrino afirma que usar o ingresso como condição para a entrada no país é "temerário", mas acrescenta que o Brasil já possui experiência na deportação de estrangeiros caso a polícia identifique problemas. "Do ponto de vista do controle jurídico-político, acho problemático adotarmos essa flexibilização. Atrelar a entrada no país à compra do bilhete de ingresso é um pouco temerário."

Governo e Fifa discutem regras

Integrantes do governo federal, da Fifa e do Comitê de Organizador Local (COL) se reuniram na tarde de ontem para discutir pontos polêmicos do projeto da Lei Geral da Copa. A reunião foi a primeira após o encontro em Bruxelas realizado no último dia 4 entre a presidente Dilma Rousseff e o secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke. No encontro, realizado a portas fechadas no Ministério do Esporte, a pauta foi direcionada para pontos específicos do projeto de lei, como o credenciamento e os direitos de transmissão. Após a reunião, que durou seis horas, ninguém deu declarações à imprensa. Em nota, o Ministério do Esporte disse apenas que o debate serviu para "aprofundar o diálogo entre as partes envolvidas e o Congresso , que examina o projeto de Lei Geral da Copa". Entre os participantes, estavam o secretário nacional de Futebol e Direitos do Torcedor da pasta, Alcino Rocha; o chefe de Direito Comercial da Divisão de Assuntos Jurídicos da Fifa, Jörg Vollmüller; o advogado da Fifa Julian Chediak; e o representante do COL Álvaro Jorge. (Erich Decat)

Outros Mundiais

2010 – África do Sul

Após verificar o encalhe de boa parte da carga de ingressos colocada à venda, em abril de 2010, a dois meses do início do Mundial, a África do Sul abriu as portas para os turistas e chegou a isentar da taxa de visto, de cerca de US$ 60. Na prática, segundo a Fifa, houve aumento na procura por bilhetes.

2006 – Alemanha

O Ministério das Relações Exteriores da Alemanha divulgou documento informando que os ingressos seriam apenas um documento a mais para o pedido de visto de turismo e que o país não modificaria suas regras em função dos jogos de futebol.

2002 – Coreia do Sul e Japão

Para entrar na Coreia do Sul, os brasileiros não precisavam de visto em viagens de até 30 dias. O Japão, porém, manteve a exigência de vistos para a entrada no país, mas redobrou o efetivo de funcionários envolvidos no atendimento aos turistas.

1998 – França

O país europeu não flexibilizou a concessão de vistos para os países cuja autorização era exigida. No entanto, os brasileiros já eram dispensados da exigência, bastando apenas apresentar passaporte válido.

1994 – Estados Unidos

Os brasileiros tiveram que tirar visto para acompanhar os jogos do Mundial. No mês que antecedeu a Copa, o consulado americano em São Paulo registrou aumento de 19% no número de pedidos de visto em relação ao mesmo período em 1993. Preocupados com a entrada de estrangeiros, o Serviço de Imigração dos EUA reforçou a fiscalização para evitar que os torcedores se transformassem em imigrantes ilegais depois dos jogos.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Politizar para avançar :: Roberto Freire

Já há algum tempo que setores de classe média buscam mobilizar o conjunto da população contra a corrupção, desde o movimento do “cansei”, no segundo mandato do governo Lula, sem, no entanto, conseguir sensibilizar o grosso da população para essa bandeira, mesmo que saibamos que quem mais perde com os desvios de recursos são os setores mais pobres da população que enfrentam um déficit na melhoria da qualidade de vida, como se pode observar pela falta de saneamento, precária educação pública, falta de assistência médica adequada e segurança.

Depois da conquista da Lei da Ficha Limpa, fruto de um amplo e difuso movimento da classe média sustentado e alimentado pelas redes sociais, aprovado pelo Congresso por meio de uma votação que mobilizou a cidadania, setores sociais ampliaram e cristalizaram sua reivindicações, no mesmo momento em que buscavam apoio para as mesmas.

Claro que é auspicioso jovens se conectando e participando das discussões dos problemas do país como vemos agora. Mas é fundamental que se compreenda que nos sistemas democráticos, mais cedo ou mais tarde, todas as questões que dizem respeito à cidadania terão que encontrar o caminho institucional da representação política, intermediada pelos partidos.

Essa marcha contra a corrupção, que se dá em seu sentido genérico, sem definir concretamente contra que instância ou órgão do governo se realiza, a continuar como está, tem grande chance de não alcançar seu objetivo se não for politizada.

Movimentos apolíticos podem ter um certo charme, sobretudo em sociedades, como a nossa, cujos parlamentos gozam de pouca confiança de seus cidadãos. Mas, como aconteceu com o projeto da Ficha Limpa, sua resolução necessariamente terá que passar pelo parlamento, como passou a imensa mobilização pelas diretas já para a eleição de presidente da República. Que mesmo derrotado pela maioria que ainda detinha a ditadura em seu estertor, não impediu a vitória da oposição com a eleição de Tancredo-Sarney, que pôs fim ao ciclo militar, imposto em 1964.

O fim da corrupção no país não será apenas fruto de um movimento popular, por mais amplo e denso que seja, mas também função de uma profunda mudança em nossa cultura política, começando pelo fim da impunidade aos que se apropriam do dinheiro público. Pelo fortalecimento dos órgãos de fiscalização, abertos ao escrutínio da sociedade civil, e pela punição exemplar - com perda de direitos políticos, no caso de pessoa física, e impossibilidade de participação de concorrência pública em projetos governamentais e financiamento de bancos estatais, no caso de pessoa jurídica.

A corrupção política está de tal modo entranhada no corpo social - desde o mais humilde servidor público até o mais destacado ministro das altas esferas - que para enfrentá-la precisamos unir esforços dos atores políticos e da sociedade nas manifestações de rua, que viabilizem a criação de comissões parlamentares de inquérito e a aprovação de uma legislação eficaz.

Enquanto não entendermos o papel do parlamento nessa luta, ficaremos presos ao ato, deixando de enfrentar o fato da maneira correta.

Roberto Freire, deputado federal (SP) e presidente do PPS

FONTE: BRASIL ECONÔMICO

Que herege era aquele Gramsci liberal*:: Massimo D’Alema**

Quando enfrentamos a grande crise do movimento comunista e a exigência de uma corajosa transformação, Gramsci foi um forte ponto de apoio: sua pesquisa original nos ajudou nos momentos mais difíceis e mais dramáticos de nossa luta. Ele nos permitiu ostentar no socialismo europeu o melhor patrimônio do maior Partido Comunista do ocidente, fez com que fôssemos recebidos como companheiros que, embora vindos de uma história difícil e dramática, tinham algo a trazer à casa comum: algo de original e de útil.

A nosso ver, Gramsci foi um grande pensador comunista herético, numa época em que qualquer desvio da ortodoxia soviética custava um preço dramático. Creio que a heresia de Gramsci no movimento comunista seja algo de muito mais radical no tocante à diversidade de avaliação e julgamento do curso que o movimento comunista assumiu a partir da década de 1930. Uma diversidade que, sob certos aspectos, coloca Gramsci numa dimensão própria, distinta tanto da experiência leninista quanto da experiência social-democrata, em aberta polêmica a respeito de alguns pontos que, no curso deste século, se tornarão comuns à cultura de uma e de outra. Em particular o conceito da função do Estado. Certamente não seria correto transportar a uma época anterior as escolhas e estratégias que a esquerda italiana realizou muitos anos mais tarde. Mas hoje podemos dizer que em Gramsci estavam os instrumentos para que algumas mudanças e certas rupturas pudessem acontecer até algum tempo antes. Tínhamos em casa um tesouro de pensamento, de idéias, de antecipações, que podia ajudar-nos a escolher e, se tivéssemos mais coragem, poderíamos ter escolhido antes.

A peculiaridade do Gramsci está naquilo que Mario Telo define como seu paradoxo. Um paradoxo dramaticamente vinculado mesmo a sua condição humana, àquela condição de isolamento do movimento coletivo e da luta política, durante o seu confinamento no cárcere de Turi. Sozinho em sua cela – enquanto, no inicio da década de 30, a Europa era dominada pelo advento dos grandes totalitarismos e por uma crise, vivida pelo movimento comunista como o anúncio do fim do capitalismo – Gramsci entende não apenas que essa interpretação da crise estava equivocada, mas também que estava surgindo uma nova sociedade e uma nova hegemonia – a do fordismo e do americanismo – E o destino da Europa teria sido o de entrar na esfera hegemônica da nova forma, expansiva, de capitalismo.

Em contraposição com todo o movimento comunista, não apenas nas suas correntes mais ortodoxas e estalinistas, mas também nas suas versões mais abertas, Gramsci lê a crise como o prelúdio de uma grande e extraordinária transformação em escala mundial.Ele está convicto de que a racionalização americana representará o horizonte de referência para o desenvolvimento histórico da Itália e da Europa. Isso tornou-se um ponto central da reflexão sobre a atualidade de Gramsci porque é um aspecto rico de sugestões, mesmo do ponto de vista humano, porque descreve o mundo moral de Gramsci e sua extraordinária capacidade de olhar além do seu tempo. Graças a essas suas qualidades, Gramsci consegue transmitir ainda hoje uma grande emoção.

Na análise de Gramsci, existe uma modernidade, uma capacidade de diálogo com nosso tempo que parecem verdadeiramente extraordinárias. O cosmopolitismo econômico, a grande transformação capitalista em escala mundial são vistas por Gramsci como o verdadeiro teatro – muito além do Estado nacional – no qual o movimento operário deve travar a “guerra de posições” e suas lutas pela hegemonia. Ao analisar a “grande transformação capitalistica”, Gramsci coloca-se ao lado da modernidade. Encara-a como um novo campo de possibilidades.

Hoje, um dos grandes problemas da esquerda é exatamente este: certa resistência diante da nova “grande transformação”. Vejamos o caso das concepções estatizantes e corporativas, tanto em nosso país como em outros grandes países europeus, em contraposição com a idéia liberal do Estado ligada à inovação. Gramsci não faz parte daquela esquerda impregnada de espírito conservador, em confronto com os que consideram a expansão das funções estatais como uma garantia de igualdade. (visão própria do comunismo e da democracia social, em formas políticas profundamente diversas, mas, do ponto de vista cultural, substancialmente semelhantes), ele se coloca numa perspectiva diferente.

Em Americanismo e Fordismo existem páginas de extraordinário interesse. A americanização – diz ele – exige um determinado ambiente, uma determinada estrutura social e um determinado tipo de Estado. O Estado é o Estado liberal, “não apenas no sentido do liberalismo aduaneiro e da efetiva liberdade política, mas no sentido mais fundamental da livre iniciativa e do individualismo econômico, que, com meios próprios, como sociedade civil”, pelo mesmo desenvolvimento histórico, chega ao regime da concentração industrial e do monopólio“. O desaparecimento do tipo semifeudal do rentista é, na Itália, uma das condições da revolução industrial, não uma conseqüência. Há – em Americanismo e Fordismo – um capítulo que considero sugestivo até por sua impressionante contemporaneidade, intitulado Ações, Obrigações e Títulos do Estado. Aqui Gramsci coloca o seguinte problema: ”Quando a poupança depende mais da garantia pública do que dos riscos do mercado, transforma-se em parasitismo e comprime o lucro industrial e o trabalho.” E é um comunista da década de 30 que escreve tais coisas!.

Gramsci encara o problema da penetração do Estado nas atividades industriais, destacando as vantagens disso – o Estado pode investir nos setores mais arriscados, com utilidades prorrogadas, portanto mais inovativas -, mas ao mesmo tempo, afirma que esse processo não está absolutamente isento de perigos, porque determina o agravamento dos regimes aduaneiros e das tendências autárquicas, que se opõem à globalização e induzem ao dumping, ao resgate das grandes empresas sob ameaça ou em perigo de falência – fenômenos todos que Gramsci condena. Referindo-se depois, a gusa de exemplo, a algumas características da Itália, Gramsci afirma: “Uma outra fonte de parasitismo absoluto sempre foi a administração do Estado e ainda hoje acontece que homens relativamente jovens, com ótima saúde, no pleno vigor das forças físicas e intelectuais, depois de 25 anos a serviço do Estado, não se dedicam mais à mesma atividade produtiva, mas vegetam com aposentadorias mais ou menos satisfatórias.” Essa forma de assistencialismo é considerada por Gramsci como um fato corruptivo. Do comunismo ele retirava o senso do processo histórico e do interesse coletivo, mas, por outro lado, estava ligado a uma cultura liberal e até liberalista, que exalta o indivíduo e sua função: o famoso “otimismo da vontade”, que encarava o profissionalismo, o trabalho, a capacidade de competir como valores positivos, como a moda de um progresso social. Nem estatismo, portanto, nem igualitarismo nivelador e parasitário.

Nós vivemos a época da crise do modelo fordista que Gramsci analisou no seu nascedouro, no momento em que assentava as bases de uma nova hegemonia. Ao mesmo tempo, vivemos numa época em que o processo de unificação do mundo parece caminhar também sobre a onda de uma nova grande revolução industrial técnica, científica, com um ritmo e uma força desconhecida no tempo de Gramsci. A globalização da economia dos mercados, da produção, a livre circulação dos capitais com os efeitos confusos que produz: a crise dos Estados nacionais e o prelúdio da tentativa de encontrar uma resposta para essa crise pelo surgimento de instituições regionais, supranacionais. Uma das mais importantes é a União Monetária Européia: a Europa unida com seus instrumentos.

Estamos imersos nessa fase histórica e diante de nós – antes de tudo, diante da esquerda – se coloca uma grande pergunta cultural: devemos ler também essa passagem histórica com as lentes de Gramsci? Se pensarmos essa grande mudança em termos dogmáticos, surge diante de nós uma situação sem saída: o fim do fordismo é o fim geral do socialismo, seja na forma do movimento comunista, seja na forma do Welfare e do reformismo nacional. É o advento de um pensamento único, de um liberalismo absoluto, alheio a qualquer ordenamento político. Essa visão é sustentada não apenas pelos profetas da nova direita, mas também, no campo da esquerda, existem aqueles segundo os quais o fim do fordismo assinala inexoravelmente o declínio da esquerda, de suas idéias, de seus valores e, conseqüentemente, não restaria outra opção senão a de resistir à transformação, tornando-se assim uma força conservadora, estacionária, destinada com o tempo a ceder diante das razões prepotentes da inovação e da modernidade.

Mas se, ao invés, lermos a “grande transformação” à maneira de Gramsci, com os instrumentos conceituais que ele nos deixou, veremos esta fase de mudanças como uma fase cujo desfecho está ligado à ação das forças históricas em campo. A palavra-chave é “cultura”. Em vez de defender de maneira rígida as velhas formas de proteção social ligadas ao Welfare State nacional, uma esquerda moderna deve pôr em discussão o problema de um Welfare, que tenha no centro a cultura, a formação, a educação permanente dos indivíduos: condições para que o processo inovativo não empurre as pessoas para as margens, mas ofereça-lhes a possibilidade de viver melhor e de realizar plenamente a própria personalidade. Creio que Gramsci nos ajuda a ler, usando essa chave interpretativa, as transformações do mundo de hoje e podemos entender por que nesse momento ele não é apenas uma glória nacional, mas um pensador sempre mais presente no processo de revisão da esquerda em escala mundial.

* Este artigo é um resumo, feito para o jornal “II Sole-24 Ore”, de um discurso pronunciado recentemente em Cagliari por Massimo D’Alema , secretário-geral do Partido Democrático de Esquerda (PDS)
** Massimo D’Alema, ex- secretário-geral do Partido Democrático de Esquerda (PDS), ex-Primeiro Ministro e atualmente vice-chefe de governo e Ministro das Relações Exteriores da Itália.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO, 30/8/1997

Clara Nunes - Minha festa (Nelson Cavaquinho)

Nenhum país é uma ilha :: Fernando Gabeira

Nenhum homem é uma ilha, dizia o poeta inglês John Donne, no século 17. No auge da globalização, é razoável afirmar que nenhum país e uma ilha.

Quando as coisas apertam o mundo, o Brasil tende a se ilhar, mentalmente. O Brasil é uma ilha de prosperidade, dizia o general Geisel. Tsunami econômico aqui não passa de marolinha, afirmava o presidente Lula.

O jornalista americano Michael Lewis acaba de concluir um livro - Boomerang, Viagens ao Novo Terceiro Mundo - sobre a Europa. Ele percorreu quatro países: Islândia, Irlanda, Grécia e Alemanha. Seu objetivo era extrair lições para os EUA. E concluiu que os americanos deveriam inquietar-se com a crise europeia, pois podem ser os próximos da fila.

Barack Obama e Dilma Rousseff têm feito constantes advertências aos líderes europeus. Alguns já reclamam por terem sido condenados a ouvir conselhos. É compreensível que os dois presidentes se inquietem com a crise europeia e a demora em achar saídas. Mas ambos, em níveis diferentes, têm de olhar a própria retaguarda.

A exemplo de Islândia, Grécia e Espanha, os EUA enfrentam manifestações de rua. Elas têm um objetivo vago, mas miram o sistema financeiro e suas relações com o governo.

No Brasil o tema é a corrupção, mas o núcleo de descontentes pode ampliar seu alcance em caso de crise econômica. E não só porque a corrupção se torna mais insuportável num quadro de crise. Outro fator potencial de protesto é o modo irracional de gastar o dinheiro público. Olhando por esse ângulo, o Brasil comporta-se como um novo-rico, alheio à tempestade que se aproxima.

Os fatos da semana fortalecem essa visão. A Câmara dos Deputados gastou R$ 13,9 milhões com telefone nos últimos oito meses. Se houvesse interesse, com a ajuda da tecnologia esses gastos poderiam ser reduzidos à metade. Os custos do Congresso aumentam, assim como aumenta a resistência a considerar a tese de que, sem perder a eficácia, eles poderiam ser reduzidos à metade. A Câmara tem uma televisão com equipamentos e equipe completa. A pouco mais de 300 metros dali, o Senado tem também uma televisão com equipamentos e equipe completa. Com bons editores, uma só televisão divulgaria todo o trabalho do Congresso e ainda sobraria tempo.

José Sarney declarou em entrevista que os privilégios parlamentares são um tributo à democracia. Os suecos, apesar de sua riqueza, considerariam um insulto à democracia. Basta examinar o tratamento que dão a seus parlamentares, que precisam lavar sua roupa e limpar, após usarem, a cozinha coletiva de seu prédio.

Na área do governo, os fatos também revelam indiferença pelos gastos inúteis. Essa tendência pode rastreada pelas manchetes dos jornais. O Ministério da Pesca surge como um generoso pagador da bolsa-defeso. Não há indícios de que conterá seus excessos. O da Saúde aparece gastando parte de sua verba com vale-transporte e até pista de skate. Enquanto isso ocorre, R$ 1,8 milhão enviado à reserva dos índios guaranis-caiuás parece ter sumido no caminho, pois os postos, segundo o Ministério Público, estão em estado de miséria. Já a reforma do Palácio do Planalto custou 43% acima do preço estimado inicialmente. Apesar de notas técnicas condenando os gastos, R$ 112 milhões foram pagos.

Tudo isso vem à tona na fase pós-escândalo dos Ministérios dos Transportes e do Turismo, áreas em que as cifras do dispêndio eram muito maiores. A visão corrente na base do governo é de que tudo é secundário e chega a ser comovente se importar com tais gastos, diante da complexidade do processo. O mantra é confiar no mercado interno, apoiar-se nele para continuar crescendo. No entanto, embora não seja alarmante, pesquisa da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) diz que, entre os emergentes, o Brasil sofreu uma das mais fortes desaceleração do crescimento.

A presidente Dilma deve anunciar, dizem os jornais, um novo plano de investimentos. Ela quer estimular a economia. Grande parte dos investimentos que o País fará nos próximo anos é destinada à Copa do Mundo e à Olimpíada. É preciso muita confiança para supor que esse caminho não apresente riscos na crise. Não se trata apenas de calcular o custo de alguns elefantes brancos. Eles continuarão representando gastos de manutenção muito tempo depois de usados nesses eventos internacionais.
Não se pode dizer que o governo ignore o problema de gestão dos recursos. Dilma atraiu para sua equipe o empresário Jorge Gerdau, que investiu na modernização dos governos. O do Rio de Janeiro deve a ele grande parte do êxito em superar o atraso constrangedor das administrações anteriores. A presença de Gerdau indica, pelo menos, a existência de plano de longo alcance. Mas falta uma força-tarefa para as emergências.

Toda eleição presidencial discute os gastos com viagens, que rondam os R$ 800 milhões. Num tempo de teleconferências, e-mails, Skype, gastos com viagens poderiam ser reduzidos. Mas não se vê uma campanha para diminuí-los, com resultados transparentes.

Ao pedágio da corrupção soma-se o espírito de novo-rico, inspirado pelo crescimento econômico. É muito peso para voar em tempos difíceis. Os dois fatores se entrelaçam e ganham nova dimensão quando o foco está na Copa e na Olimpíada. O primeiro grande acontecimento, o sorteio das chaves, no Rio de Janeiro, revelou a amplitude dessa tendência perigosa. Estado e cidade gastaram, juntos, R$ 30 milhões. O aluguel de uma cadeira custou R$ 204, soma suficiente para comprar cadeira nova.

A racionalidade nos gastos é um remédio muito simples para a complexidade da crise. Outras grandes medidas se pedem aos estadistas. A vantagem do remédio está sobre a mesa: é só ter a coragem política de adotá-lo. Na verdade, o grande obstáculo para racionalizar os gastos é político. Uma configuração estática de governo torna a política não mais uma solução, mas parte da crise.

Jornalista

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Efeitos da corrupção:: Merval Pereira

Estamos acompanhando renovados protestos contra a corrupção, desta vez alcançando 26 cidades brasileiras e 17 estados. Não importa se em algumas delas a presença tenha sido pequena, no total foram 30 mil cidadãos que saíram nas ruas de suas cidades para protestar, sendo que a grande maioria, não por acaso, foi registrada em Brasília, sede do governo federal e do Congresso, onde cerca de 20 mil pessoas saíram às ruas e se concentraram na Esplanada dos Ministérios.

Os símbolos foram padronizados, o que já indica um avanço na organização: fantasias de palhaços, vassouras e grandes pizzas.

As marchas podem servir de instrumento de pressão nos parlamentares, mas também estarão demonstrando à presidente Dilma Rousseff que ela teria apoio popular caso decidisse reassumir o que parecia ser uma prioridade de seu governo, a chamada "limpeza ética", relegada a plano secundário devido às pressões da base aliada, e, sobretudo do PMDB, PT e do ex-presidente Lula, que se sentiram atingidos pela reforma ministerial que vinha se processando em consequência das demissões pelas denúncias de corrupção.

Na verdade, o que esteve em jogo durante os primeiros meses do governo Dilma foi o desarranjo da base parlamentar que apoia o governo desde os tempos de Lula, mas que atuava em outras condições políticas.

A rigidez da presidente Dilma com os acusados pela mídia de corrupção, nos primeiros momentos de seu governo, estava a um só tempo ressaltando que o ex-presidente Lula era mais condescendente com os políticos corruptos desde que o apoiassem politicamente, como também que as regras que comandam as relações políticas no Congresso são ditadas pela conveniência, e não pelos projetos e programas partidários.

O fracasso das manifestações apontado pelos governistas é, ao contrário, o sintoma de seu sucesso. Primeiro por que ninguém se preocupa em desqualificar manifestações que são por si só desqualificadas.

Depois, o que faz com que as manifestações sejam pequenas numericamente é o fato de que elas nascem espontâneas pelas redes sociais, sem que haja instituições por trás delas que possam dar suporte logístico ou apoio oficial.

No entanto, há sinais de que muitas dessas organizações de cidadãos já estão montando estruturas que proporcionarão atos mais organizados daqui em diante. No Rio de Janeiro, por exemplo, já estão pensando em alugar um carro de som permanentemente.

A evolução das manifestações já parece evidente, se não no número de pessoas, na padronização do discurso e na escolha de temas.

O apoio à Lei da Ficha Limpa, ao poder de atuação e punição do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ao fim do voto secreto no Congresso mostra que os objetivos da "rua brasileira" estão bastante focados, identificando esses três temas com o tema central do combate à corrupção.

A pauta é relevante, e os dois primeiros assuntos serão decididos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nos próximos meses, o que dá um tempero político às decisões.

É previsível que o julgamento do mensalão, no primeiro semestre do ano que vem, um ano eleitoral, será um ingrediente a mais nessas mobilizações, se elas tiverem fôlego até lá, como tudo indica.

A Lei da Ficha Limpa, que chegou ao Congresso através de uma iniciativa popular e por isso foi aprovada, apesar da reação negativa inicial dos parlamentares, agora recebe o apoio renovado das ruas, o que deverá ser levado em conta pelos juízes do STF.

O Supremo, aliás, quando do primeiro julgamento da lei, decidiu que ela só valeria a partir da próxima eleição, e não na do ano passado, mas a maioria dos juízes já deixou antever em seus votos que a consideravam constitucional.

Agora, com novas pressões para considerar a lei inconstitucional, os juízes do Supremo terão a oportunidade de reafirmar seu entendimento ou alterá-lo, de acordo com novas interpretações, mas também à luz dos anseios da sociedade.

Já com relação ao Conselho Nacional de Justiça, é sintomático que parcela importante da sociedade associe a manutenção de seu poder de punição ao combate à corrupção.

É um sinal de que sua atuação tem sido percebida como eficaz no controle do corporativismo e da corrupção de maneira geral.

É evidente que quando se diz que nossa "Primavera" já aconteceu, com os comícios pelas Diretas já ou as passeatas que ajudaram a derrubar o então presidente Collor, está se falando de reivindicações que tinham um objetivo definido e, por trás, estruturas partidárias e sindicais capazes de mobilizar ativistas pelo país inteiro.

Dessa vez estamos falando de temas difusos, valores intangíveis, que mobilizam muito mais a classe média do que a população como um todo.

Enquanto que naqueles episódios tidos como exemplos de mobilização de massas por temas políticos, havia uma situação política e econômica instável que causava insegurança no cidadão, hoje a luta contra a corrupção se dá num ambiente diferente, com a economia estabilizada e o ambiente político democrático, apesar de degradado.

Embora a economia esteja com viés de baixa, enquanto a inflação se mostra em alta consistente, não existe ainda um clima de desassossego mobilizador, mesmo que as greves salariais estejam acontecendo com mais frequência.

Essas reivindicações salariais já são sintomas de um desconforto futuro provocado pela inflação em alta, e a situação tende a piorar ano que vem devido ao aumento já acertado do salário mínimo de cerca de 14%.

Além de realimentar a inflação com o aumento do poder de compra de parcela ponderável da população, esse aumento real de 7% chamará a atenção dos vários sindicatos, que quererão também o mesmo tratamento.

Há informações de que os organizadores das marchas contra a corrupção estão pensando em montar uma Organização Não Governamental (ONG) para transformar todas essas bandeiras que estão sendo levadas pelas ruas das cidades brasileiras em uma discussão permanente.

É uma boa iniciativa, principalmente se desse fórum de discussão surgirem novos projetos de lei de iniciativa popular.

FONTE: O GLOBO

Algo de novo no ar:: Eliane Cantanhêde

Quem conhece bem Brasília sabe o quanto é difícil colocar 20 mil pessoas na Esplanada dos Ministérios em pleno feriado. Ainda mais se a grande maioria é de classe média e gosta de viajar.

Mas quem conhece bem Brasília também sabe que a capital não nega fogo nos grandes momentos e que deu apoio ou até mesmo deflagrou alguns dos principais movimentos políticos: o renascimento do movimento estudantil pós-1968, as Diretas-Já, de 1984, os caras-pintadas dos anos 1990.

E eis que 20 mil pessoas foram à Esplanada dos Ministérios e à praça dos Três Poderes no último 12 de outubro para protestar contra a corrupção e defender a constitucionalidade da Ficha Limpa, as prerrogativas do Conselho Nacional de Justiça e a instituição do voto aberto de deputados e senadores.

O movimento é quase espontâneo. Começou com anônimos indignados com a roubalheira de dinheiro público, foi alimentado pelas redes sociais e está virando o que está virando sem participação de partidos, de sindicatos e de entidades como, digamos, a nova UNE. As pessoas carregam vassouras, fantasiam-se de presidiários e usam batas pretas, máscaras e narizes de palhaços.
O conteúdo é sério, a forma é alegre. Quase um Carnaval pela ética e contra os corruptos.

Isso muda alguma coisa? Muda. Tira os cidadãos do marasmo, dissemina a indignação, constrange políticos e agentes públicos, cobra as instituições responsáveis pela impunidade e, principalmente, demonstra um novo estágio da democracia brasileira.

Em suma, as marchas contra a corrupção que ocorrem em Brasília e se reproduzem ainda incipientemente pelos Estados e suas capitais são, no mínimo, saudáveis.

Não são contra o governo, nem contra o Congresso, nem contra o Judiciário. Mas são um aviso. E, se bem não fizerem, mal não fazem

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Pedra no sapato:: Dora Kramer

Praticamente acertado internamente em torno da candidatura do ministro da Educação, Fernando Haddad, para a Prefeitura de São Paulo, o PT está às voltas com um problema visto como de difícil solução: construir uma saída que permita à senadora Marta Suplicy recuar da candidatura sem provocar um racha de repercussão negativa na campanha eleitoral de 2012.

No momento, não se vislumbra uma fórmula para superar o entrave sem danos. A oferta de um ministério para Marta - o da Educação, por exemplo, já ambicionado por ela - esbarra na resistência da presidente Dilma Rousseff em fazer esse tipo de transação.

Ir às prévias e derrotá-la tampouco é a saída considerada ideal. Primeiro, porque não há certeza absoluta de que a senadora perca; segundo, porque se ela mantiver a candidatura todos os outros pretendentes (Eduardo Suplicy, Jilmar Tato e Carlos Zarattini) também manterão, levando, na visão do partido, à explicitação de um racha que pode vir a ser prejudicial na campanha; terceiro, e mais importante, porque o PT não pode abrir mão da força política de Marta nas periferias.

A rejeição dela ocorre de maneira acentuada nas classes média e alta, o tipo de eleitorado que os petistas acreditam poder conquistar com um nome novo como o de Fernando Haddad.

Se ela desistir, acreditam, provavelmente só o senador Eduardo Suplicy manteria seu pleito e, como ele enfrenta muita resistência no partido, seria uma hipótese de derrota certa e indolor.

Mas, como dar a Marta a chance de recuar sem que ela precise passar pelo constrangimento de reconhecer que desiste porque a avaliação de seu partido é de que perde a eleição?

"Marta foi muito longe, tanto ao insistir na candidatura quanto nas críticas ao Haddad e ao próprio Lula", avalia um petista com assento no ministério. "Ela poderia dizer que abre mão, reconhecendo que é o melhor para o partido, mas, para isso, seria preciso uma boa dose de humildade."

O ministro não completa explicitamente o raciocínio e deixa em aberto a avaliação sobre a possibilidade de Marta Suplicy contrariar a própria personalidade.

E Lula, não pode pedir a ela que desista?

Difícil, pois o ex-presidente também teria de contrariar sua natureza de nunca explicitar pedidos, até para não se tornar devedor.

Toda obra. O PSD não é apenas um partido que abre uma janela de oportunidade para detentores de mandato interessados em mudar de legenda sem se arriscar a sofrer punições.

Criado a partir de acordos com todos os governadores (à exceção do paulista Geraldo Alckmin, já procurado com proposta de aliança), o PSD serve também para que os chefes de Executivos estaduais aperfeiçoem o manejo das maiorias nas Assembleias Legislativas.

Já os prefeitos, que aderiram em quantidade sem necessariamente se filiarem, têm no PSD uma opção caso haja mudanças que lhes desfavoreçam nos partidos de origem.

Mas a grande vantagem mesmo do PSD é ser uma espécie de tamanho único: serve em qualquer manequim.

Aos fatos. Noves fora os alvos diretos, ganham o quê, querem dizer o quê, pretendem chegar aonde mesmo os que celebram a baixa adesão aos protestos contra a corrupção?

Ao mesmo tempo, não contribuem para a eficácia dos movimentos análises que buscam "inflar" artificialmente os atos que não têm conseguido mobilizar a população na proporção da gravidade do problema.

Divisão de tarefas. O programa do PSDB exibido ontem à noite mostrou suas principais lideranças cada qual em um papel específico.

Fernando Henrique foi o porta-voz das realizações do partido, José Serra ficou com as críticas mais contundentes ao governo federal e Aécio Neves encarnou o arauto da boa gestão, apresentando as credenciais dos governos estaduais.

Enxuto, objetivo, organizado, o programa acabou sendo a antítese da prática atual do partido.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O mundo em vermelho e azul de Zizek e Jobs:: Maria Cristina Fernandes

Camisa de malha vermelha estampada por um Karl Marx gorducho e em cima do que no Youtube parece um banco de madeira, Slavoj Zizek usa microfone humano para reproduzir seu discurso numa praça arborizada em Wall Street.

"Não se apaixonem por vocês mesmos. É bom estar aqui, mas lembrem-se, os carnavais são baratos. O que importa é o dia seguinte, quando voltamos à vida normal. Não quero que se lembrem destes dias assim: "Meu Deus, como éramos jovens e foi lindo"".

Aos 62 anos, professor de universidades europeias e americanas, palestrante globetrotter e autor de 43 livros publicados em mais de 20 línguas, o esloveno Slavoj Zizek é um filósofo pop.

O alvo de Zizek e de sua plateia eram os bancos da vizinhança que, socorridos pelo fisco americano, não dividem a conta da crise em que a irresponsabilidade financeira jogou o país desde 2008.

Segundo o "The New York Times", o movimento que se espraia pelo país já tem uma cobertura noticiosa comparável à do surgimento de seu congênere de direita, o Tea Party, mas ainda perde para a morte de Steve Jobs, quatro dias antes do discurso de Zizek.

Nenhum fato da vida do fundador da Apple foi tão lembrado naqueles dias em que Jobs foi colocado no panteão de gênios da humanidade quanto o discurso que proferiu em 2005 na Universidade de Stanford. Sua plateia era de concluintes da universidade mais prestigiada do Vale do Silício, onde Jobs fez fama e fortuna.

Confrontados pelo Youtube, os discursos de Zizek e Jobs, seis anos mais novo que o filósofo esloveno, revelam mais do que mentalidades em conflito.

O fundador da Apple fez um discurso centrado em sua própria história de vida para dizer aos estudantes que só deviam acreditar neles mesmos. Recheado por histórias de sua adoção até as brigas societárias na Apple, o discurso é uma ode ao individualismo.

Na receita do que deveriam fazer para vencer na vida, seus estudantes foram presenteados com tiradas como: "Seu tempo é limitado, então não o gaste vivendo a vida de um outro alguém"; "Não deixe que o barulho da opinião dos outros cale sua própria voz interior"; "Tenha coragem de ouvir seu próprio coração e sua intuição".

A mensagem do gênio da era digital é coerente com os produtos que criou. Umberto Eco um dia disse que, com a Apple, a informática tinha deixado de ser instrumento para se transformar num meio de encantamento.

E o encanto aumenta a cada lançamento, ainda que a diferença de um produto para outro seja o acréscimo de um megapixel ou o decréscimo de milímetros na espessura. Cada pequeno detalhe é aplaudido como mais uma grande conquista de um mundo de ícones coloridos ao alcance de um toque.

Junto com o fetichismo, a era digital também possibilitou a convocação de manifestações como as que sacudiram o mundo árabe, passaram pela Europa e espraiam-se pelos Estados Unidos.

O filósofo midiático também é filho desta era digital, o que não lhe impede de fazer perguntas que incomodam, a começar de si mesmo, que, a cada frase de seu discurso em Wall Street, automaticamente puxava a camiseta para baixo.

Naquele domingo em que foi a atração do movimento nova-iorquino, Slavoj Zizek perguntou aos manifestantes por que a tecnologia havia rompido quase todas as fronteiras do possível enquanto na política quase tudo era considerado impossível, a começar do aumento do imposto dos ricos para melhorar a saúde pública.

A audiência do filósofo performático era muito diferente daquela de Stanford. Muitos dos estudantes ali presentes, de acordo com os relatos da imprensa, não conseguem emprego para pagar o crédito estudantil que lhes permitiu frequentar universidade.

Vítima da ditadura iugoslava de Tito, Zizek usou suas frases de efeito para dizer que o comunismo falhou, mas o problema dos bens comuns permanece: "Hoje os comunistas são os capitalistas mais eficientes e implacáveis. Na China de hoje, temos um capitalismo que é ainda mais dinâmico do que o vosso capitalismo americano. Mas ele não precisa de democracia. O que significa que, quando criticarem o capitalismo, não se deixem chantagear pelos que vos acusam de ser contra a democracia. O casamento entre a democracia e o capitalismo acabou".

O divórcio da era digital genialmente revolucionada por Jobs e a utopia de Zizek está resumida na história contada pelo filósofo esloveno na praça. Um alemão oriental foi exilado na Sibéria e combinou com seus amigos que ao receberem cartas suas observassem a cor da tinta. Se azul, contaria a verdade. Se vermelha, seria falsa. A primeira carta veio em azul: "Tudo é maravilhoso aqui, as lojas estão cheias de boa comida, os cinemas exibem bons filmes do ocidente, os apartamentos são grandes e luxuosos, a única coisa que não se consegue comprar é tinta vermelha".

Zizek contou essa história para dizer que, sem tinta vermelha, o mundo se mostrava incapaz de articular uma linguagem para expressar a ausência de liberdade e encontrar alternativas a um sistema em crise.

A era digital abre todas as possibilidades e nenhuma. Faz do individualismo a alma da globalização. É imaginativa, mas escreve em azul.

É pela internet que está sendo convocada para amanhã o que se imagina que venha a ser "a maior manifestação da história". Pretende mobilizar milhões em 79 países e dar seguimento à onda de mobilizações que começou nos países árabes, prosseguiu pela Europa e agora se espraia pelos Estados Unidos.

Já tem adeptos em 34 cidades brasileiras. Muitos deles participaram dos protestos de quarta-feira. No Brasil, a manifestação é ainda mais difusa do que no resto do mundo que pelo menos tem o desemprego crescente como amálgama.

Um dos grupos tupiniquins mais ativos é o Anonymous que, no 12 de outubro, declarou: "A corrupção é o principal motivo de as coisas estarem erradas". De seu banquinho nova-iorquino, Slovej usou mais uma de suas frases de efeito para mandar o recado: "O problema não é a corrupção ou a ganância, o problema é o sistema".

Maria Cristina Fernandes é editora de Política.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Paralisação dos bancos preocupa o governo

O ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, admitiu ontem que o governo está preocupado com o movimento de paralisação dos bancos.

"Estamos preocupados com a greve dos bancários", disse Carvalho, depois de participar de um fórum de debates no Interlegis, em Brasília, sobre o Plano Plurianual (PPA), que estabelece os investimentos do governo a longo prazo.

"É um tipo de greve que o governo participa parcialmente, através dos bancos estatais, mas estamos sabendo que se vislumbra uma saída para essa greve", afirmou.

Sobre a greve dos funcionários dos Correios, que interrompeu os serviços da estatal por quase um mês, Carvalho lamentou que o desfecho não tenha sido por meio de acordo e disse que agora "se trata de cumprir a determinação da Justiça".

"Nós fizemos todo esforço para fazer um acordo, foram várias as propostas apresentadas pela direção dos Correios em busca de uma saída honrosa", afirmou.

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) determinou na última terça-feira o fim da greve dos Correios, que durou 28 dias.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Fenaban e bancários tentam chegar a um acordo

Bancos apresentaram proposta de 8,4%, que foi rejeitada pelos dirigentes sindicais dos bancários; negociação continua hoje

Marcelo Rehder

A Federação Nacional dos Bancos (Fenaban) e o Comando Nacional dos Bancários vão se reunir na manhã de hoje em São Paulo. Os bancos apresentaram uma nova proposta de reajuste de 8,4%, que foi rejeitada pelos dirigentes sindicais. A audiência de negociação realizada ontem foi interrompida por volta das 20 horas, para que ambas as partes consultassem suas bases antes de prosseguir nas discussões.

Banqueiros e bancários tentam construir uma solução para o reajuste salarial da categoria capaz de pôr fim à greve no setor, que completa hoje 18 dias. Ontem, o movimento cresceu com a paralisação de 9.254 agências de bancos públicos e privados em todos os 26 Estados e no Distrito Federal, segundo a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), que coordena o Comando Nacional dos Bancários.

Impasse. O diálogo entre as duas partes havia chegado a um impasse depois que assembleias de bancários realizadas no Brasil todo recusaram a proposta de reajuste salarial de 8% feita pela Fenaban e deflagraram a greve no dia 27 do mês passado. A oferta dos bancos representava apenas 0,56% de aumento real dos salários, muito abaixo das pretensões da categoria.

Os bancários reivindicam reajuste de 12,8%, o que corresponde a um aumento real de 5%, mais a inflação acumulada no período de 12 meses terminado em agosto. Os trabalhadores querem ainda valorização do piso salarial da categoria e maior Participação nos Lucros e Resultados (PLR) dos bancos, além de mais contratações e fim das metas abusivas, entre outras reivindicações.

Apesar do impasse nas negociações, desde o início da greve, tanto o Comando Nacional dos Bancários quanto a Fenaban diziam que estavam abertos ao diálogo, mas nenhuma das duas partes tomava a iniciativa de chamar para a mesa de negociação.

Na quarta-feira, no entanto, os negociadores da Fenaban decidiram marcar reunião com os negociadores dos bancários. Para a Contraf, foi a mobilização da categoria que fez os representantes dos bancos reabrirem as negociações.

A greve da categoria, juntamente com a dos carteiros, irritou a presidente Dilma Rousseff, que resolveu jogar duro contra os grevistas. Por ordem do Planalto, repassada ao Ministério da Fazenda, as direções do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal cortaram o ponto dos seus grevistas. A mesma providência já havia sido adotada em relação aos funcionários da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), vinculada ao Ministério das Comunicações.

O fato levou a direção nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT) a procurar os ministros Gilberto Carvalho, da Secretaria-Geral da Presidência, e Guido Mantega, da Fazenda, e também a chefia de gabinete da presidente Dilma, para cobrar que os bancos públicos adotassem postura diferente da dos demais bancos filiados à Fenaban.

Somados, os bancos públicos têm peso enorme nas decisões da Fenaban, avaliou d o presidente da CUT, Artur Henrique. "Cobramos empenho do governo, que é acionista majoritário dessas instituições, para assumir uma nova abordagem nesse conflito trabalhista, que vem sendo marcado pela intransigência e autoritarismo dos bancos."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Com margem apertada, Berlusconi consegue voto de confiança no Parlamento

ROMA - A Câmara dos Deputados italiana aprovou por margem apertada o novo voto de confiança pedido pelo primeiro-ministro Silvio Berlusconi após o fracasso de sua tentativa de aprovar o orçamento. A votação desta sexta-feira terminou com 316 parlamentares a favor do Cavalieri e 301 contra, livrando o premier de uma possível renúncia após 17 anos de carreira política.

Embora apenas a maioria simples (baseada no número de presentes) fosse necessária, o resultado representa que, dos 630 deputados, Berlusconi obteve apoio da maioria absoluta por apenas um voto de diferença. Durante toda a manhã, especulou-se que o número de votos a favor seria suficiente, mas menor, o que poderia aumentar a instabilidade política italiana.

Apelo: 'Sou a única alternativa', disse premier ao pedir voto de confiança

Considera-se que Berlusconi está mais perto do que nunca de deixar o governo. Se acontecer, no entanto, a saída - por renúncia, impeachment ou fim do mandato - será menos surpreendente do que o tempo em que ele durou no poder, numa gestão sempre cercada de polêmicas.

Aos 75 anos, o premier é como o lutador de boxe que já tomou tantos golpes que bastaria apenas que alguém lhe encostasse um dedo para que fosse ao chão. O premier, porém, se mantém no poder, respaldado pela força de vontade, interesses políticos e pela verdadeira inércia política italiana.

Para surpresa de muitos, o Cavalieri continuou no poder apesar de uma longa lista de escândalos e derrotas políticas que há anos já teriam derrubado qualquer outro líder em outras partes do mundo.

Atualmente ele enfrenta quatro julgamentos separados, envolvendo denúncias de fraude e sexo com menores. Há o risco ainda de que tenha pela frente novas acusações por conta dos casos relacionados a suas festas particulares, que fizeram a alegria dos tabloides e tornaram mundialmente conhecido o termo Bunga Bunga.

Junto aos processos judiciais estão também a longa lista de derrotas políticas nos últimos meses e os recorrentes embates - em tempos de crise econômica - com o ministro da Economia, Giulio Tremonti.

- Ele é história, ele já era. Berlusconi pode ficar mais seis meses no governo, mas já acabou. O país já teve o bastante - disse, antes da votação desta sexta, Franco Pavoncello, cientista político da Universidade John Cabot, em Roma.

As gafes e declarações vulgares do premier viraram quase uma lenda, provocando constrangimento com vários líderes europeus. Sua gestão foi repreendida até pela Igreja Católica. Berlusconi garante, no entanto, que fica no poder até 2013 - mesmo com a oposição pressionando pela antecipação das eleições para 2012.

Temor da oposição ajuda a adiar queda

Na quarta-feira, o presidente Giorgio Napolitano divulgou um comunicado incomum pressionando o governo a mostrar que é capaz de tomar medidas firmes contra a crise. Mario Draghi, que está deixando o comando do Banco Central, engrossou o coro.

Mas o governo, consumido por disputas políticas internas e externas, adiou repetidamente tomar decisões mais abrangentes para reverter uma década de crescimento lento.

Por esses e outros motivos, analistas previam uma queda antes de 2013, porém ainda não nesta sexta-feira. Ex-embaixador da Itália em Moscou, Sergio Romano disse que a oposição temia o que poderia acontecer caso Berlusconi caísse nesta votação.

Para continuar no poder, o premier vem contando com a falta de uma alternativa para a ala dominante e altamente conservadora de eleitores italianos.

FONTE: O GLOBO

Mulheres da paz :: Marina Silva

Ainda reverbera o anúncio do Nobel da Paz deste ano para três mulheres. As ganhadoras, duas africanas e uma iemenita, são oriundas de países cuja cultura e códigos religiosos acentuam valores que atribuem às mulheres um papel social diminuto, baixo status e, em decorrência, cultivam a submissão delas aos homens.

Tawakkul Karman, jornalista iemenita, a primeira mulher árabe a ganhar o Nobel da Paz, preside a organização não governamental "Jornalistas sem Algemas". Da Libéria, Leymah Gbowee, assistente social e militante da paz, preside a organização não governamental "Rede África de Mulheres, Paz e Segurança"; e a economista Ellen Johnson Sirleaf é a atual presidente do país.

As três têm histórias de vida extraordinárias, cujo traço comum é a resistência pacífica a regimes políticos antidemocráticos e a superação de uma condição feminina de servidão em seus países.

Tawakkul Karman e Leymah Gbowee acrescentam a suas biografias uma capacidade notável de elaborar e desenvolver estratégias inovadoras e mais femininas de participar da política. Para se proteger, a iemenita foi acampar numa praça e defender suas causas, em situação de extrema exposição e fragilidade.

Com inteligência e coragem, Karman ganhou apoio de multidões, o que até agora impede que ela seja conduzida à prisão -onde já esteve muitas vezes- pelos partidários do governo de Ali Abdullah Saleh, ditador do Iêmen.

Por seu lado, Leymah Gbowee liderou um movimento de mulheres de todas as religiões, vestidas de branco em oração pela paz.

O gesto mais incisivo dessa atuação pacífica foi a suspensão da prática sexual até que as guerras cessassem. Com isso conseguiram ser parte na negociação política do país.

A presidente Ellen Johnson Sirleaf, inesperadamente, ganhou as eleições de 2005 contra George Weah, herói local, eleito em 1995 o melhor jogador de futebol do mundo. Tornou-se a primeira mulher chefe de Estado na Libéria, como no continente africano.

O contexto político das eleições era de saturação da sociedade com a corrupção e, contra todas as expectativas, a população apostou suas fichas na candidata, que em sua trajetória tem passagens profissionais pela ONU (Organização das Nações Unidas) e pelo Banco Mundial, mas também pelo cárcere político nos anos 80. Mas a prisão jamais inibiu a altura, a largura e a profundidade de seu compromisso com a paz e a liberdade.

Olhando a trajetória das três ganhadoras, podemos dizer que neste ano foi premiada a forma menos cartesiana de fazer política, que combina uma enorme capacidade de resistência com estratégias de envolvimento e constrangimento éticos. Uma forma menos destrutiva e mais possibilitadora do fazer político.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Retrato de uma cidade:: Carlos Drummond de Andrade

I

Tem nome de rio esta cidade
onde brincam os rios de esconder.
Cidade feita de montanha
em casamento indissolúvel
com o mar.

Aqui
amanhece como em qualquer parte do mundo
mas vibra o sentimento
de que as coisas se amaram durante a noite.

As coisas se amaram. E despertam
mais jovens, com apetite de viver
os jogos de luz na espuma,
o topázio do sol na folhagem,
a irisação da hora
na areia desdobrada até o limite do olhar.

Formas adolescentes ou maduras
recortam-se em escultura de água borrifada.
Um riso claro, que vem de antes da Grécia
(vem do instinto)
coroa a sarabanda a beira-mar.
Repara, repara neste corpo
que é flor no ato de florir
entre barraca e prancha de surf,
luxuosamente flor, gratuitamente flor
ofertada à vista de quem passa
no ato de ver e não colher.

II

Eis que um frenesi ganha este povo,
risca o asfalto da avenida, fere o ar.
O Rio toma forma de sambista.
É puro carnaval, loucura mansa,
a reboar no canto de mil bocas,
de dez mil, de trinta mil, de cem mil bocas,
no ritual de entrega a um deus amigo,
deus veloz que passa e deixa
rastro de música no espaço
para o resto do ano.

E não se esgota o impulso da cidade
na festa colorida. Outra festa se estende
por todo o corpo ardente dos subúrbios
até o mármore e o fumé
de sofisticados, burgueses edifícios:
uma paixão:
a bola
o drible
o chute
o gol
no estádio-templo que celebra
os nervosos ofícios anuais
do Campeonato.

Cristo, uma estátua? Uma presença,
do alto, não dos astros,
mas do Corcovado, bem mais perto
da humana contingência,
preside ao viver geral, sem muito esforço,
pois é lei carioca
(ou destino carioca, tanto faz)
misturar tristeza, amor e som,
trabalho, piada, loteria
na mesma concha do momento
que é preciso lamber até a última
gota de mel e nervos, plenamente.

A sensualidade esvoaçante
em caminhos de sombra e ao dia claro
de colinas e angras,
no ar tropical infunde a essência
de redondas volúpias repartidas.

Em torno de mulher
o sistema de gesto e de vozes
vai-se tecendo. E vai-se definindo
a alma do Rio: vê mulher em tudo.
Na curva dos jardins, no talhe esbelto
do coqueiro, na torre circular,
no perfil do morto e no fluir da água,
mulher mulher mulher mulher mulher.

III

Cada cidade tem sua linguagem
nas dobras da linguagem transparente.
Pula
do cofre da gíria uma riqueza,
do Rio apenas, de mais nenhum Brasil.
Diamantes-minuto, palavras
cintilam por toda parte, num relâmpago,
e se apagam. Morre na rua a ondulação
do signo irônico.
Já outros vêm saltando em profusão.
Este Rio...
Este fingir que nada é sério, nada, nada,
e no fundo guardar o religioso
terror, sacro fervor
que vai de Ogum e Iemanjá ao Menino Jesus de Praga,
e no altar barroco ou no terreiro
consagra a mesma vela acesa,
a mesma rosa branca, a mesma palma
à Divindade longe.

Este Rio peralta!
Rio dengoso, erótico, fraterno,
aberto ao mundo, laranja
de cinqüenta sabores diferentes
(alguns amargos, por que não?),
laranja toda em chama, sumarenta
de amor.

Repara, repara nas nuvens; vão desatando
bandeiras de púrpura e violeta
sobre os montes e o mar.
Anoitece no Rio. A noite é luz sonhando.