sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Fernando Gabeira* - O Brasil não é uma ilha

-  O Estado de S.Paulo

Exceto se reduzirmos o País aos limites mentais de Bolsonaro e seus mais retrógrados apoiadores

Política externa não é um tema popular. Mas nas circunstâncias do mundo de hoje erros ou acertos nesse campo vão repercutir no cotidiano das pessoas comuns. É preciso acionar os sinais de alerta para uma configuração negativa no horizonte. Nela nos poderemos isolar, simultaneamente, da Europa e dos Estados Unidos.

No front europeu, são inúmeras as advertências de que o acordo comercial com o Mercosul subiu no telhado por causa da política ambiental do governo Bolsonaro. A recusa começa por Parlamentos nacionais, estende-se ao Parlamento Europeu e já aparece no discurso oficial da França. Angela Merkel tem sofrido forte pressão, embora reconheça, como estadista, a importância do acordo e a necessidade de salvá-lo dos desatinos bolsonaristas.

Nos EUA, além da China, o Brasil foi o único país a ocupar a agenda do debate na campanha presidencial: Joe Biden anunciou a possibilidade de reunir investimentos de US$ 20 bilhões para preservar a Amazônia e ameaçou com sérias consequências econômicas caso não se altere a política do governo brasileiro na região.

Além das divergências no campo ambiental, Biden discorda claramente da visão de Bolsonaro sobre a tortura no regime militar. Ele veio pessoalmente entregar a Dilma Rousseff documentos do governo americano que confirmam e até mesmo ampliam o conhecimento sobre a repressão no período. São textos de diplomatas americanos, baseados também na ampla equipe de informantes nacionais, militares incluídos.

Merval Pereira - Dinheiro sujo

- O Globo

O Supremo Tribunal Federal (STF) esteve envolvido nos últimos dias em situações extremas, desde a soltura de um traficante condenado a 25 anos por tráfico internacional de drogas, até a suspensão de um senador da República que escondia dinheiro não apenas na cueca, mas também nas nádegas.  

O presidente Bolsonaro, que alardeava que em seu governo não havia corrupção, teve que abrir mão de seu vice-lider Chico Rodrigues, com quem dizia ter “quase uma relação estável”.  

O presidente do STF, ministro Luis Fux, teve ontem ratificada sua decisão de suspender o habeas corpus que seu colega Marco Aurélio Mello dera ao traficante André do Rap, em prisão preventiva. O que para Marco Aurélio desmoralizou o Supremo, para Fux a cassação salvou o tribunal da desmoralização.  

Mesmo os que se incomodaram com a possibilidade de o presidente do Supremo cassar decisão de um colega, admitiram que a medida foi acertada devido à urgência do caso e à periculosidade do condenado.  

Nos dois casos o Legislativo está envolvido. No habeas corpus, o ministro Marco Aurélio obedeceu à letra fria da lei, sem levar em conta outros critérios para apenas constatar que a prisão não fora reafirmada após 90 dias, como manda o artigo 316 introduzido no Código de Processo Penal (CPP) pelo Congresso através do pacote anticrime.  

Ao final do julgamento, ficou definido que a soltura dos presos depois de 90 dias sem revisão da prisão preventiva não é automática, como interpretou Marco Aurélio. O juiz de primeira instância que decretou a prisão terá que ser consultado sobre se as razões da prisão continuam válidas. Com isso, mantém-se a sentido benéfico da lei, que é o de impedir que presos sem acusação formal ou sem julgamento apodreçam nas prisões. Mas impede-se que criminosos do colarinho branco e grandes traficantes se beneficiem do artigo para fugir, como aconteceu com André do Rap.

Míriam Leitão - A corrupção sempre presente

- O Globo

O escândalo enojante, em todos os sentidos da palavra, do ex-vice-líder do governo, senador Chico Rodrigues, é a mais recente prova de como Jair Bolsonaro usou abusivamente a bandeira do combate à corrupção, vendendo-se diferente do que sempre foi. Não precisava mais nada no governo, mesmo assim houve essa última excrescência. Bastava a abundância de dinheiro sem origem ou sem explicação clara que circula nas mãos ou nas contas de Bolsonaro, seus filhos, sua mulher e suas ex-mulheres. No fim do dia, o ministro Luís Roberto Barroso determinou o afastamento do senador do mandato por 90 dias, decisão ainda sujeita à aprovação pelo Senado.

O senador foi removido da vice-liderança pelo governo, mas isso não apaga o fato de que foi líder, tinha com o presidente da República uma relação definida por Bolsonaro como “quase uma união estável”, emprega no seu gabinete Leo Índio, o notório primo dos filhos do presidente. O distanciamento que Bolsonaro tenta agora ter em relação ao senador foi o mesmo movimento que ele executou contra o advogado Frederick Wassef, o mesmo que tenta manter de Fabrício Queiroz, que, por sua vez, tinha ligação com Adriano da Nóbrega, chefe miliciano.

Bernardo Mello Franco - A poupança do senador

- O Globo

Na quarta-feira, o presidente Jair Bolsonaro disse que daria uma “voadora no pescoço” de quem praticasse corrupção. No mesmo dia, a Polícia Federal flagrou um dos vice-líderes de seu governo com dinheiro escondido entre as nádegas.

A PF apreendeu R$ 33 mil na cueca do senador Chico Rodrigues. Segundo os agentes, parte do butim estava ocultada “em regiões íntimas”. A filmagem da operação registrou cenas escatológicas. Para nos poupar delas, o ministro Luís Roberto Barroso mandou trancar o vídeo num cofre.

O senador do DEM é suspeito de desviar verbas federais enviadas a Roraima combater a pandemia. Os investigadores afirmam que ele ajudou a fraudar a compra de testes da Covid. O Estado tem 15 municípios, mas só a capital conta com leitos de UTI.

Luiz Carlos Azedo - O traficante e o senador

- Correio Braziliense

O julgamento do habeas corpus de André do Rap foi o assunto político da semana, mas acabou ofuscado pelo flagrante no senador Chico Rodrigues (DEM-RR), com R$ 37 mil na cueca

O Supremo Tribunal Federal(STF), por 9 a 1, confirmou a decisão do presidente da Corte, ministro Luiz Fux, que cassou a liminar que soltou o traficante André de Oliveira Macedo, o André do Rap, da lavra do ministro Marco Aurélio Mello. Um dos chefões do Primeiro Comando da Capital (PCC), o traficante fugiu para o exterior. A decisão era pedra cantada, assim como o bate-boca no final do julgamento entre os dois ministros. Novo decano, Marco Aurélio sustentou sua posição, embora tenha negado um habeas corpus de um comparsa do fugitivo, cujo advogado alegou as mesmas razões acolhidas no caso de André do Rap, para pedir sua libertação.

Apesar do resultado dilatado, a sessão de ontem foi tensa. Todos ressaltaram a necessidade de o presidente da Corte respeitar as liminares dos ministros, e trataram o caso de André do Rap como excepcionalidade. O ministro Ricardo Lewandowski chegou a criticar Fux por ter sustado uma de suas liminares, durante um plantão, quando era vice-presidente do Supremo. Houve críticas dos ministros à proposta de mudanças no sistema de distribuição de processos por ato administrativo feita por Fux.

O ministro Gilmar Mendes destacou as falhas no caso de André do Rap, uma vez que a liminar concedida por Marco Aurélio foi dada após o advogado do traficante ter peticionado pela segunda vez; antes, havia retirado outro pedido de habeas corpus, que fora distribuído para a ministra Rosa Weber. Também criticou a omissão do juiz de primeira instância, que deveria ter se pronunciado no prazo de 90 dias, e o Ministério Público Federal (MPF), que somente recorreu da decisão no sábado passado, o que também facilitou a fuga do traficante, que não foi devidamente monitorado pela polícia.

Eliane Cantanhêde* - Dói na alma

- O Estado de S.Paulo

A nova obsessão do Bolsonaro 4.ª versão é a ‘sua’ vacina contra a ‘dele’, Doria

Em seu quarto personagem desde a eleição e a posse, há menos de dois anos, o presidente Jair Bolsonaro vai se metamorfoseando de acordo com as circunstâncias e conveniências políticas, mas de uma coisa ele não abre mão: dobrar a aposta a toda semana, a toda hora, na sua versão da “gripezinha”. São 152 mil mortos, mais de 5,1 milhões de contaminados e o discurso do presidente do Brasil é o mesmo, inacreditavelmente, irritantemente, negacionista.

Eu estava no velório do jornalista Alberto Coura, na quarta-feira, quando Bolsonaro insistiu que a pandemia é “superestimada”. Como assim? O que mais é preciso, no Brasil e no mundo, para o presidente admitir para sua gente que o coronavírus é grave, gravíssimo, uma tragédia na história da humanidade? Ele sabe exatamente o que se passa, mas não admite por estratégia, por cálculo político. Aliás, como fez e faz seu ídolo e mentor Donald Trump nos EUA.

Alon Feuerwerker - Um adversário de cada vez

- Revista Veja

O centro erra ao combater ao mesmo tempo a esquerda e a direita

O movimento do presidente Jair Bolsonaro no sentido de uma composição com o chamado Centrão parlamentar tem algo, sim, de moderação. Mas já foi bem diagnosticado como uma guinada para a preservação do poder. Ele soube detectar de onde vêm as maiores ameaças: daqueles que o ajudaram na eleição, mas a contragosto.

A flexão tática bolsonarista ao dito centro trouxe um efeito colateral interessante, um fenômeno ainda por medir e observar. Um “novo centro” que, paradoxalmente, radicaliza pela direita. Uma reação de parte do bolsonarismo puro e deixado para trás, agora já um quase ex-­bolsonarismo, e que tem tudo para se agrupar em torno do ex-ministro Sergio Moro.

Aliás, como era previsível, e foi previsto, ele desponta firme para se viabilizar no arco-íris do autodeclarado centrismo.

Dora Kramer - Sabor do vento

- Revista Veja

A impressão é a de que Jair Bolsonaro não só ficará pelo tempo regulamentar como poderá repetir a dose e permanecer oito anos na chefia da nação

No primeiro ano de governo, a impressão mais ou menos generalizada era a de que Jair Bolsonaro não se aguentaria no cargo porque o país simplesmente não aguentaria quatro anos “disso daí”: um presidente hostil, criador de casos, defensor de causas retrógradas, refratário aos preceitos mínimos da civilidade e, sobretudo, desprovido de preparo adequado para o exercício da função.

Pois bem. Quase dois anos e uma pandemia depois, a impressão mais ou menos generalizada é a de que Jair Bolsonaro não só ficará pelo tempo regulamentar como poderá repetir a dose e permanecer oito anos na chefia da nação. Esta passou a ser a previsão corrente desde que o presidente resolveu dar uma de pessoa “normal”, adaptando-se às circunstâncias da política tradicional (para o bem e para o mal). Colheu bons frutos nas pesquisas de avaliação e pôde, com isso, perceber quanto o assistencialismo é bom de voto.

José de Souza Martins* - Terrivelmente o quê?

- Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

A geopolítica do confuso regime bolsonarista vem transformando evangélicos de governo em partido político imaginário para absolver-se de erros e enganos

Volta e meia o presidente da República menciona que vai nomear alguém terrivelmente evangélico para uma eventual vaga no Supremo Tribunal Federal. Por que não alguém indiscutivelmente jurista, capaz, justo, de formação jurídica acima de qualquer suspeita? Por que tem que ser alguém com um qualificativo que o identifica como sectário de uma crença, que é o que significa o terrivelmente? O do modo terrível, aterrorizante, medonho? Já não basta o medonho das incertezas que estamos vivendo?

O reiterado anúncio de um juiz “terrivelmente evangélico” não tem a seriedade que se tem o direito de esperar e exigir de um presidente da República. Às vezes parece gozação, outras vezes parece coisa de quem ouviu cantar o galo, mas não sabe onde. No mais das vezes é claramente fala de alguém brandindo a língua flamejante para ameaçar o povo brasileiro e as instituições. Mais do que o improvável reconhecimento de cidadania a que os evangélicos têm direito.

Bruno Boghossian – Os valores do baixo clero

- Folha de S. Paulo

Presidente levou representantes da planície da política para o Palácio do Planalto

O presidente não gostou da repercussão da batida policial que encontrou dinheiro na cueca do senador Chico Rodrigues (DEM). “Não tenho nada a ver com isso”, reclamou. O que se sabe do caso até agora não sugere uma conexão entre os desvios e o Palácio do Planalto, mas o protagonista do escândalo simboliza bem as relações políticas de Jair Bolsonaro.

Agora notório, Rodrigues foi um deputado típico do baixo clero por cinco mandatos. Nunca liderou a bancada de um partido e só presidiu uma única vez uma comissão da Câmara. Foi na planície que ele conheceu Bolsonaro, um político que habitou esse território por três décadas.

Num vídeo que voltou a circular depois da operação, o hoje presidente chama Rodrigues de “velho colega de Câmara” e brinca que a relação de 20 anos entre os dois era “quase uma união estável”. Não foi surpresa, portanto, quando o parlamentar inexpressivo se tornou vice-líder do governo no Senado, nos primeiros meses de mandato de Bolsonaro.

Hélio Schwartsman - Bolsonaro e a corrupção

- Folha de S. Paulo

Há uma semana, ele declarou que não havia corrupção em seu governo

Os deuses sabem ser irônicos. Poucas horas depois de Jair Bolsonaro ter afirmado que daria uma voadora no pescoço de quem praticasse corrupção em sua gestão, a Polícia Federal flagrou o senador Chico Rodrigues (DEM-RR), vice-líder do governo, com cerca de R$ 100 mil em sua residência, dos quais R$ 30 mil se encontravam em sua cueca, algumas notas "entre as nádegas", como fizeram questão de publicar, por pudicícia, alguns veículos.

A operação policial que apanhou o repleto senador é parte de uma investigação sobre desvio de verbas destinadas ao combate à Covid-19. Uma semana antes dessa pilhéria divina, o presidente declarara que não havia corrupção em seu governo e que por isso ele acabara com a Lava Jato.

Embora Bolsonaro tenha no passado dito que tinha "quase uma união estável" com Rodrigues, esse não é o caso controverso mais próximo do presidente. 

Ruy Castro* - Todos os fãs de Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

Se você gosta dele e acha que a corrupção acabou, veja se se enquadra em alguma categoria

Iludem-se os que acreditam que Jair Bolsonaro só tem adeptos entre a meia dúzia que vai vê-lo quando ele sai do Alvorada para, digamos, trabalhar. Bolsonaro tem seguidores em muitas categorias. Eis algumas.

Pecuaristas, madeireiros, garimpeiros, grileiros e incendiários infiltrados na Amazônia, no Pantanal, na mata atlântica, nos manguezais, restingas, dunas, terras indígenas e quaisquer santuários que possam ser destruídos e enriquecer amigos. Ex-cupinchas da Velha Política, sempre prontos a ser comprados. 

Profissionais das bancadas do boi, da bala e da Bíblia. Assessores de gabinete dispostos a ceder 80% de seus salários pagos com dinheiro público, lavá-los e depositá-los nas contas de seus familiares. Formadores de quadrilha, praticantes de peculato e operadores de esquemas, investigados, denunciados ou réus em ações judiciais. Juízes complacentes e advogados corruptos. Lobistas diversos, íntimos dos 01, 02 e 03.

Maria Cristina Fernandes - ‘União estável’ com senador tem fim abrupto

- Valor Econômico

Senador empregou parente dos filhos de Bolsonaro e controlava distrito sanitário especial indígena

O ex-vice-líder do governo Bolsonaro no Senado, Chico Rodrigues (DEM-RR), flagrado com dinheiro grotescamente escondido e afastado do cargo pelo STF, foi o responsável pela indicação de Vitor Pacarat para o Distrito Sanitário Especial Indígena Leste, em Roraima, vinculado ao Ministério da Saúde. Lá, por meio de empresas de aliados, Rodrigues passou a fornecer equipamentos superfaturados. 

A proximidade com o governo lhe valeu presença na viagem do presidente a Israel, em 2019, e na visita do secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, a Roraima. Em vídeo, ainda na campanha, Bolsonaro diz ter com Rodrigues “quase uma união estável”, que ainda garantiu a um primo dos filhos do presidente, Leonardo Rodrigues, um emprego no gabinete do senador.

Em entrevista na manhã de ontem, à saída do Palácio do Alvorada, o presidente da República, Jair Bolsonaro, disse que a operação de busca e apreensão da Polícia Federal na casa do senador Chico Rodrigues (DEM-RR) é uma demonstração de que seu governo não tem corrupção. Na tentativa de se descolar do vice-líder do seu governo no Senado flagrado com dinheiro grotescamente escondido, o presidente disse que seu governo, na verdade “combate a corrupção”.

Coube ao senador, porém, a indicação, em 2019, de Vitor Pacarat como coordenador do Distrito Sanitário Especial Indígena Leste, em Roraima, um dos 34 DSEIs do país. Os distritos, responsáveis pelas comunidades indígenas, estão sob o chapéu do Ministério da Saúde. As etnias sob a supervisão do DSEI Leste tinham um outro candidato para o cargo e ocuparam as instalações do órgão em protesto.

Vinicius Torres Freire - A crise política da roubança na Covid

- Folha de S. Paulo

Cinco governadores estão ameaçados, mas corrupção é apenas parte do problema

A história repugnante do dinheiro sujo do senador Chico Rodrigues (DEM-RR) e o fato de essa criatura ser amiga de Jair Bolsonaro ofuscaram um outro fato. O político é acusado de desviar recursos para o combate à Covid, que teria destinado a empresas de parentes e agregados.

Acusações de roubança de dinheiro reservado para atenuar a epidemia ameaçam o mandato de pelo menos cinco governadores, três deles da “nova política”. A cúpula de pelo menos nove governos estaduais é investigada, além de dezenas de prefeituras. Além do problema do roubo, em si, essas crises político-policiais explicitam mais uma vez quão longe do fim está a ruína brasileira.

Wilson Witzel, do Rio de Janeiro, foi afastado, deve ser deposto e provavelmente preso. Foi surfista eleitoral do bolsonarismo e é do PSC, partido religioso agregado do governo.

O impeachment quase certo de Carlos Moisés, de Santa Catarina, deve ser votado na quarta-feira que vem. É do PSL que elegeu Bolsonaro, partido ora cortado ao meio feito uma laranja.

Flávia Oliveira - A urgência da fome

- O Globo

IBGE disparou o alerta quando contou 10,3 milhões com privação alimentar grave em 2017-2018

Por uma porção de conveniência política e um punhado de incompetência técnica, o governo de Jair Bolsonaro adiou para depois das eleições 2020 a decisão sobre a política social no pós-pandemia. Na prática, ficará para 2021, já que o segundo turno do pleito municipal está marcado para 29 de novembro. Assim, ignorou-se descaradamente a regra número um de quem se ocupa do combate à extrema pobreza: quem tem fome tem pressa. A frase eternizada pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, deu na cruzada brasileira pela erradicação da miséria; desaguou no Fome Zero, no primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva; emendou no Bolsa Família. Rendeu a saída do Brasil do Mapa da Fome da ONU, no início desta segunda década do século XXI, que chega ao fim com o recrudescimento da insegurança alimentar.

O aumento da vulnerabilidade social mundo afora, durante a pandemia da Covid-19, explica o Nobel da Paz concedido ao Programa Mundial de Alimentos, WFP da abreviação em inglês. A agência da ONU foi reconhecida pelas ações de combate à fome, por melhorar condições de paz em áreas de conflito e por atuar contra o uso da falta de alimentos como arma de guerra, informou o comitê norueguês do prêmio. Resumindo em hashtag: #comidaépaz. Segundo as Nações Unidas, o WFP é a maior organização humanitária do mundo; em 2019, assistiu 97 milhões de pessoas em 88 países. Foi festejada pela complexa logística que construiu para levar alimentos onde há fome na África, na Ásia e na América Latina. Opera com mais de cinco mil caminhões, uma centena de aviões, 30 navios.

Celso Ming - Hora de reconstruir

-  O Estado de S.Paulo

Cenário pós-pandemia exige um novo Bretton Woods, diz a diretora-geral do Fundo Monetário Internacional

Tempo de reconstrução. No pronunciamento desta quinta-feira, a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), a búlgara Kristalina Georgieva, pediu que a comunidade internacional encare os problemas da hora com o espírito da Conferência de Bretton Woods.

Esse foi o grande acordo costurado em 1946 nessa minúscula localidade do Estado de New Hampshire, nos Estados Unidos, em que 44 representantes dos principais países liderados pelos Estados Unidos definiram as bases econômicas da reconstrução.

Em 1944, a economia mundial estava prostrada em consequência de duas enormes devastações: a da Grande Depressão dos anos 1930 e a da 2.ª Grande Guerra, de 1939 a 1945.

Rogério L. Furquim Werneck* - Um pé em cada canoa

-  O Estado de S.Paulo / O Globo

Diante de tamanha incerteza sobre a gestão das contas públicas, não é surpreendente que o risco fiscal esteja em ascensão

Planalto pode até não ter percebido ainda, mas está, ou deveria estar, em desenfreada corrida contra o tempo. O ano legislativo está chegando ao fim. E, com os parlamentares mobilizados com as eleições municipais até pelo menos 15/11, sobrarão pouco mais de 30 dias para o governo extrair do Congresso uma saída razoável para o entalo fiscal em que se meteu.

Há um Orçamento a ser aprovado, mas nem mesmo foi instalada a comissão mista que deverá apreciá-lo. E, na proposta orçamentária submetida ao Congresso, faltam programas vultosos que o Planalto considera prioritários, como o que deverá substituir o Auxílio Emergencial, a ser extinto em 31/12, quando chegar ao fim o período de vigência do estado de calamidade decretado em decorrência da pandemia.

O governo não sabe ainda de onde virão os recursos que, sem violar o teto de gastos, financiarão o novo programa. A solução mais óbvia, proposta por um grupo de especialistas ligados ao Centro de Debates de Política Pública (CDPP), seria racionalizar programas sociais mal focados, como o abono salarial e o seguro-defeso, para liberar os recursos que se fazem necessários. Foi lamentável que tal solução tenha sido torpedeada de chofre pelo próprio Bolsonaro, que, mal assessorado, se apressou a declarar que não faria sentido tirar de pobres para dar a paupérrimos.

Claudia Safatle - Em busca de respostas

- Valor Econômico

Afinal, o que é, para quem é e quanto custa o Renda Brasil?

A área econômica do governo já reduziu as expectativas de aprovação de temas importantes no Congresso para este ano. Passadas as eleições municipais, considera que será possível se institucionalizar o Renda Brasil no Orçamento da União para 2021, que deve ser aprovado até o fim de dezembro. As demais reformas constitucionais, seja a tributária, seja a do pacto federativo, seja a administrativa, ficarão para depois da eleição dos integrantes das mesas diretoras da Câmara e do Senado, responsáveis pela gestão dos trabalhos legislativos, em 1º de fevereiro. Esses são assuntos complexos sobre os quais não há acordo para serem votados, segundo avaliação política de assessores da pasta da Economia.

O ano de 2021 terá uma “janela” de oportunidades para o aprofundamento dos debates e dos entendimentos políticos para se levar esses temas à votação no Congresso. Caso contrário, não haverá mais espaço na agenda do governo para tratar de assuntos polêmicos em 2022, ano da sucessão presidencial - para onde os olhos de Jair Bolsonaro miram desde já.

Na ótica desses assessores, não haverá grandes embates para a aprovação de um programa de renda básica que “todos estão de acordo”.

Jennifer Rubin* - Estados que indicam os problemas do Partido Republicano

-  The Washington Post / O Estado de S. Paulo

Na Geórgia e na Carolina do Sul, até disputa pelo Senado está apertada

Não me lembro quando os Estados de Geórgia e Carolina do Sul votaram em um presidente democrata. Na Carolina do Sul, a última vez foi em 1976. Na Geórgia, foi em 1992 com o sulista Bill Clinton. Donald Trump venceu a Geórgia por 5 pontos e a Carolina do Sul por 14 pontos, em 2016. Hoje, está 1,2 ponto atrás na Geórgia e lidera com apenas 7 pontos na Carolina do Sul.

As disputas pelo Senado nos dois Estados também estão apertadas. É impressionante pensar que um democrata poderia ganhar na Geórgia e três democratas poderiam ser eleitos para o Senado em dois redutos republicanos. Isso é um problema assustador para Trump, visto que Joe Biden nem sequer precisa vencer nesses Estados para se tornar presidente, nem o Partido Democrata precisa de qualquer uma dessas três cadeiras para obter a maioria no Senado.

Humberto Saccomandi - O que pode mudar na economia com Biden?

- Valor Econômico

Democrata tem plano de US$ 2 trilhões em investimentos verdes

Se as pesquisas estiverem corretas, um grande “se”, o democrata Joe Biden será eleito em 3 de novembro presidente dos EUA. O que isso significa para a economia dos EUA e mundial? Há algumas certezas e muitas dúvidas ainda. A indefinição principal é com a continuidade, e em que medida, da guerra econômica com a China, que tem efeitos em cadeia por toda a economia global. O Brasil precisa atentar aos riscos e se preparar para oportunidades.

As pesquisas recentes indicam vantagem nacional expressiva do candidato democrata e uma vantagem mais apertada nos Estados decisivos, aqueles que definem a eleição presidencial nos EUA. Mas a dinâmica favorece Biden: a epidemia voltou a avançar, a economia perdeu força e a votação antecipada está muito alta. Há a possibilidade ainda de os democratas, que devem manter a maioria na Câmara, conquistarem a maioria no Senado. Isso seria vital para Biden aprovar suas propostas.

Uma vitória democrata por ampla margem parece ser o cenário mais favorável para os mercados, apesar de o setor financeiro ser tradicionalmente mais simpático aos republicanos. Isso porque a vitória democrata incontestável é provavelmente o único cenário possível em que não haveria judicialização da eleição, com meses de incerteza, e nem a paralisia do Congresso que marcou os últimos anos.

O que a mídia pensa – Opiniões / Editoriais

Acabou a corrupção? – Opinião | Folha de S. Paulo

Dinheiro encontrado na cueca de vice-líder ridiculariza bazófia de Bolsonaro

A Lava Jato acabou por falta de objeto, afirmou o presidente Jair Bolsonaro em termos mais coloquiais. O raciocínio por trás da parolagem era simplista como de hábito: seu governo teria extinguido a corrupção e, portanto, não caberia mais operação para esse propósito.

Como nas comédias, o tempo se encarregou de ridicularizar o canastrão. Nesta quarta (14), uma semana depois de declamado o fim dos desvios, o então vice-líder do Planalto no Senado, Chico Rodrigues (DEM-RR), foi pego pela Polícia Federal com dinheiro na cueca

.Quando deram com o achado, os investigadores cumpriam um mandado de busca e apreensão, ordenado pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, na residência do senador em Boa Vista. A intervenção ocorreu para dar curso a uma apuração sobre fraudes de verba federal para o combate à Covid-19.

Chico Rodrigues diz que provará a inocência, mas foi desligado da vice-liderança do governo —e afastado do Senado por decisão, decerto polêmica, de Barroso. Já os vídeos em que aparece dando mostras de sintonia com Bolsonaro despertam o interesse do público.

Música | Zeca Pagodinho / Beth Carvalho - Ainda é tempo pra ser feliz

 

Poesia | Ascenso Ferreira (1895 –1965) - Misticismo

Na paisagem da rua calma,

tu vinhas vindo… vinhas vindo…,

e teu vestido era tão lindo

que parecia que tu vinhas envolvida na tu’alma…

Alma encantada;

ama lavada

e como que posta ao sol para corar…

E que mãos misteriosas terão feito o teu vestido,

que até parece o de Maria Borralheira,

quando foi se casas…!

─ Certamente foi tecido

pelas mãos de uma estrela fiandeira,

com fios de luz, no tear do luar…

no tear do luar…

O teu vestido era tão que parece o de Maria Borralheira

quando foi se casar…

─ “Cor do mar com todos os peixinhos…!

─ Cor do céu com todas as estrelas…!

E vinhas vindo… vinhas vindo…

na paisagem da rua calma,

e o teu vestido era tão lindo

que parece que tu vinhas envolvida na tu’alma…