domingo, 11 de novembro de 2018

Opinião do dia: Fernando Gabeira

• Há saída para a esquerda brasileira?

Claro que há. O governo que começará no Brasil irá liberar muita energia de oposição. Imediatamente após a vitória de Trump, a sociedade americana e os democratas passaram a se mobilizar. A esquerda do partido Democrata ganhou espaço na Câmara com as eleições desta semana. Com isso, quero dizer que a direita será superada, pois haverá alternância no poder. A única dificuldade que vejo na esquerda brasileira, que não há entre parte dos democratas americanos, são essas denúncias de corrupção que aqui não foram objeto de crítica interna. Agora, acho que novas configurações podem surgir. Até o PT pode se transformar. Não está proibido. O caminho está aberto, pois não sabemos que êxitos Bolsonaro obterá. Também acredito que os movimentos sociais, que reúnem lutas de minorias, mulheres, índios e negros, precisam fazer uma crítica sobre sua associação ao PT. Alguns foram cooptados, o que criou uma certa hostilidade que talvez não seja exatamente contra suas causas, mas contra o partido.
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Fernando Gabeira é jornalista. Entrevista à revista Istoé, desta semana

Merval Pereira: O PSDB no divã

- O Globo

Secretário-geral do PSDB identifica gênese dos problemas do partido na delação da Odebrecht e no caso Joesley

Há duas semanas, os líderes do PSDB têm em mãos um diagnóstico sobre o que provocou sua derrota, e o que fazer para dar a volta por cima depois da eleição geral deste ano que provocou uma ruptura do sistema político-partidário como nós o conhecemos há 25 anos pelo menos.

A análise foi feita pelo secretário-geral do partido, Marcus Pestana, ele mesmo derrotado nas urnas, e entregue aos presidentes do partido, Geraldo Alckmin, e do Instituto Teotônio Vilela, Tasso Jereissati, a Fernando Henrique Cardoso e ao candidato derrotado ao governo de Minas, senador Antonio Anastasia. “Primeiro, temos que colar os cacos e curar as feridas de nossa maior derrota, depois de um espetacular desempenho em 2016”, diz ele, que identifica a gênese dos problemas do PSDB em 2017 e 2018, a partir da primeira delação da Odebrecht e em seguida o caso do empresário Joesley Batista e seus desdobramentos.

Antes disso, Bolsonaro ficava entre 6 e 8% nas intenções de votos, lembra Pestana. Para ele, será inevitável um processo de reestruturação partidária, pois nenhuma democracia funciona com 30 partidos no Congresso. Esse, para Marcus Pestana, é mais um impulso para a reaglutinação partidária, pois “muitos estão esquecendo de que, nas eleições municipais de 2020, as coligações proporcionais estão proibidas”.

No caso específico do PSDB, diz seu secretário-geral, há que testar se é possível uma convivência das diversas correntes e personalidades. “Fusão, novos partidos, são assuntos para o segundo semestre de 2019, já com a nova direção eleita. Fomos protagonistas das eleições presidenciais desde 1994, com um expressivo resultado em 2014”, lembra, “mas quem achou que o modelo clássico de fazer política e campanhas funcionaria, se frustrou”. Pestana vê na eleição de Bolsonaro e de diversos outsiders, como governadores (MG, RJ, SC, AM, RR), “o fim do ciclo histórico da redemocratização e da Nova República”.

Ascânio Seleme: Saber perder

- O Globo

Ao longo da campanha que acabou por elegê-lo presidente da República, Jair Bolsonaro deu sinais de que não sabe ganhar. Mesmo liderando todas as pesquisas por larga margem, denunciou diversas vezes que havia tentativas de fraudes eleitorais e atacou sem cessar a mais eficiente urna eletrônica em uso em todo o mundo. E esses ataques seguiram até a véspera do segundo turno. Difícil dizer como vai reagir quando perder alguém que não sabe ganhar.

A primeira derrota do presidente eleito aconteceu antes mesmo de ele assumir seu novo cargo. E se deu porque ele resolveu se intrometer no assunto ao pedir ao Senado que não aprovasse o reajuste do Judiciário que vai causar impacto anual de R$ 4 bilhões nas contas públicas. Bolsonaro foi provocado por um repórter, poderia ter ficado calado, mas não só respondeu como fez a recomendação. Agiu corretamente, apesar de ao final ter perdido a votação, pois terá de lidar com o resultado do aumento salarial dos juízes no ano que vem. Não se omitiu, ponto para ele.

Mas o fato é que ele perdeu a primeira votação antes mesmo de inaugurar seu governo. E, pior, perdeu com dez votos de senadores que oficialmente o apoiam e vão fazer parte de sua base parlamentar a partir de 2019. Antes da votação do reajuste, o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, defendia fazer uma “prensa” no Congresso para aprovar sua agenda, e um dos filhos do presidente chegou a falar em “tratorar” o Legislativo. Bobagem, deputados e senadores não temem a fúria de presidentes, querem seus favores, e podem até fazer trocas. Mas grito não resolve.

Elio Gaspari: Os livreiros querem tungar os leitores

- O Globo

Está na Casa Civil da Presidência um pleito das guildas de comerciantes e editoras proibindo a concessão de descontos superiores a 10% durante o primeiro ano de venda de um livro. Se bobear, Temer sacramenta essa tunga no bolso dos leitores. A origem do pleito é uma majestosa demonstração do atraso de empresários e do oportunismo de suas corporações. Ela deriva do que seria uma crise do mercado de livros, exemplificada nas dificuldades financeiras que afogam as duas maiores redes do país, a Cultura e a Saraiva. Uma está em recuperação judicial, devendo em torno de R$ 150 milhões a bancos e fornecedores. A outra já fechou vinte lojas e sua dívida estaria em R$ 400 milhões.

Não há crise no mercado de livros. Como no de parafusos, o setor passou pelas dificuldades de todos os empresários. Neste ano o mundo dos livros cresceu 5,7% e seu faturamento aumentou em 9,3%. Também não existe crise de livrarias, pois há redes que vão muito bem, obrigado. A Cultura e a Saraiva enroscaram-se nas próprias gestões. Quem lhes manteve o crédito devia saber o que fazia. Se Temer quiser ajuda-las, pode liderar uma vaquinha. Quando as grandes redes de livrarias estavam comendo as pequenas, louvava-se a destruição criadora do capitalismo. Havia até editoras que imprimiam seus livros na China. Agora, cavalgam um falso problema e foram ao escurinho de Brasília para recorrer à capacidade destruidora do corporativismo. Grandes livreiros quebram e a conta vai para a freguesia, instituindo-se um tabelamento de preços.

O mercado de livros, como o de jornais, passa pelo choque da era digital. Primeiro surgiu a Amazon, revolucionando o setor com seu sistema de vendas. Depois veio o ebook, que compete com os volumes impressos. Assim é a vida, o automóvel quebrou as fábricas de carruagens, o CD matou o disco de vinil e a internet matou o CD. Como em Pindorama canta o sabiá, no século XIX, quando os Estados Unidos e a Europa expandiam suas ferrovias, os plutocratas lutavam para preservar a escravidão.

Em 1994, todos os donos de redes de livrarias e de grandes editoras brasileiras tinham mais patrimônio que Jeff Bezos, um papeleiro de 30 anos que pensava em criar um varejão eletrônico. Ele começou a Amazon com menos de 200 mil dólares, vendendo só livros. Metade do capital foi-lhe emprestado pelos pais e Bezos avisou que as chances de perderem tudo era de 70%. Hoje a Amazon está encostando no trilhão de dólares em valor de mercado. Esse gigante surgiu dando descontos. As guildas dos livreiros nacionais querem socializar um falso problema suprimindo-os.

Míriam Leitão: A vitória da diversidade

- O Globo

Pode-se atrasar o futuro, mas não se pode impedir que ele aconteça. O recado das urnas americanas vale para outros países: este é o século da diversidade

O que houve de mais importante na eleição americana foi a vitória da diversidade. Em um governo hostil às diferenças, dirigido por um presidente intolerante com os imigrantes, o voto trouxe para a cena política pessoas de origens, religiões, orientação sexual, idades diferentes entre si. O recado que ficou é que o futuro inevitável é o do alargamento da representação política porque todas as vozes querem ser ouvidas e é isso que fortalece a democracia.

A nova maioria democrata na Câmara dos Deputados será fundamental para a continuidade da investigação sobre os subterrâneos da eleição do presidente Donald Trump e a nunca devidamente explicada participação russa na campanha na internet. É importante também por fortalecer os pesos e contrapesos da democracia, diante de um presidente que é capaz de afrontar a primeira emenda da Constituição, a da liberdade de imprensa, como fez com o jornalista Jim Acosta que cobria a Casa Branca. Depois de ouvir as acusações do presidente, teve sua credencial cassada. Curioso como a atitude de Trump lembra a do coronel Hugo Chávez. Ele também acusava alguns jornalistas e jornais de serem “inimigos do povo”, quando não gostava do que lia ou das perguntas que ouvia. As mentes autoritárias se parecem, independentemente da ideologia que afirmam ter. Os autoritários em qualquer país acusam seus críticos de serem contra o país e o povo. A diferença está na força das instituições que se contrapõem a eles. Infelizmente a Venezuela nunca teve uma democracia sólida e ela foi sendo demolida paulatinamente por Chávez e Maduro.

Vera Magalhães: A 'prensa' da realidade

- O Estado de S.Paulo

Equipe de transição do presidente eleito precisa se ater às articulações com o atual Congresso

A transição de governo está se encarregando de dar a Jair Bolsonaro e sua equipe, todos inexperientes em gestão pública, um choque de realidade. A semana em que Paulo Guedes ameaçou dar uma “prensa” no Congresso termina com a velha política, governos de outros países, as corporações e o mesmo parlamento mostrando os dentes de volta e deixando claro que existe um fosso entre retórica de campanha e os desafios de governar um País tão complexo quanto o Brasil.

O maior baque veio da vergonhosa aprovação do reajuste de 16,38% dos salários dos ministros do STF, que com seu efeito cascata vai ajudar a ampliar o rombo das contas públicas não só da União, mas de Estados igualmente encalacrados. Mais: a porteira arrombada graças ao conluio silencioso orquestrado por Dias Toffoli e Eunício Oliveira em sua saideira vexaminosa deve assanhar deputados e senadores a darem um upgrade nos próprios contracheques antes que muitos deles saiam do Congresso pela porta dos fundos que lhes foi aberta pelo eleitor.

O que a votação-molecagem mostra sobre o futuro governo? Que a arrogância de Guedes e companhia em achar que será na base da soberba que se aprovarão medidas intrincadas como as reformas precisa ser deixada no Centro Cultural Banco do Brasil antes que provoque estragos maiores na largada do futuro governo.

O governo de transição se mostrou nas duas primeiras semanas ainda desarticulado politicamente. Onyx Lorenzoni parece desfrutar do gostinho de ter sido uma ovelha desgarrada e escapado, nessa condição, da derrota acachapante do Centrão, com seu partido, o DEM, no barco.

Eliane Cantanhêde: Battisti, um troféu

- O Estado de S.Paulo

Com a troca de poder, do PT para Bolsonaro, muda a situação do italiano Cesare Battisti

Depois de uma profusão de manifestações equivocadas e até chocantes na política externa, e de começar a levar o troco, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, já tem uma carta na manga para virar o jogo: a extradição do terrorista Cesare Battisti. A ideia agrada a Itália e, por extensão, a toda a Europa. E é mais uma estocada no PT e na esquerda brasileira, com apoio do eleitorado conservador de Bolsonaro.

A tese tem o apoio do governo de Michel Temer, professor de Direito Constitucional. Além dele, os ministérios da Justiça e da Relações Exteriores já acenaram com o apoio à extradição de Battisti, não por questões de legalidade e diplomacia.

Há um problema: a decisão depende do Supremo e pode demorar, porque não tem consenso no plenário, quando os 11 ministros parecem enfim falar a mesma língua, na defesa da democracia, das instituições e do próprio Supremo.

No governo Lula, tanto o Itamaraty quanto o Ministério da Justiça, via Comitê Nacional para Refugiados (Conare), recomendaram a extradição de Battisti, condenado à prisão perpétua no seu país por quatro assassinatos quando integrava um movimento terrorista e refugiado no Brasil desde 2004.

O então ministro da Justiça, Tarso Genro, do PT, mexeu mundos e fundos, mudou a posição do Conare, desconsiderou a do Itamaraty, convenceu Lula e manteve Battisti no Brasil, como “preso político”, não um assassino julgado pela Justiça italiana.

Rolf Kuntz: Bolsonaro, Trump e o lulismo com sinal trocado

- O Estado de S. Paulo

A barbaridade com sinal invertido pode ser tão grave quanto a estupidez oposta

Os maiores acertos do presidente eleito, até agora, foram as decisões de recuo. Ele acertou, por exemplo, ao abandonar a chocante e vergonhosa ideia de juntar os Ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura. Também escapou de uma grossa bobagem ao desistir de subordinar a Controladoria-Geral da União ao novo Ministério da Justiça. Mostrou disposição para atender ao bom senso, pelo menos de vez em quando, e isso vale alguns pontos em sua coluna de créditos.

Mas precisará de um desvio maior se quiser escapar da mais perigosa armadilha. O maior risco para o novo governo, e principalmente para o Brasil, ainda é a tentação de criar uma versão tropical do trumpismo, num esforço grotesco, e certamente muito custoso, para exorcizar o lulismo. Essa tentação tem sido especialmente visível nas manifestações sobre política externa. O futuro presidente, Jair Bolsonaro, parece ter percebido o erro de alguns lances, mas os motivos de preocupação permanecem.

Ele já admitiu, embora sem compromisso, reexaminar a ideia de transferir para Jerusalém a embaixada em Israel. O quase recuo ocorreu depois da reação de governos favoráveis aos palestinos. No protesto mais duro, autoridades do Egito suspenderam a visita de uma missão comercial brasileira. Se houve surpresa para o eleito e sua equipe, só pode ter sido porque o assunto nunca foi discutido, pelo menos com um mínimo de seriedade e de competência. O futuro presidente parece desassistido em matéria diplomática ou, pior, aconselhado por alguém capaz de enormes cretinices. 

Para ficar apenas no mais prosaico: países muçulmanos estão entre os maiores importadores de aves e de outros produtos da agropecuária brasileira.

Ninguém da equipe sabia disso?

José Roberto Mendonça de Barros: Um cenário para 2019

- O Estado de S. Paulo

Sem reformas, as expectativas favoráveis que se firmaram após a eleição podem se esvaziar

A eleição de Bolsonaro reflete um desejo de renovação, uma inflexão à direita, inclusive na área de valores, uma rejeição do petismo e da corrupção como método do exercício do poder e, para muitos, mas não para todos, uma visão mais liberal da economia.

Pode ser uma mudança e tanto.

Muitas coisas devem acontecer para que isso ocorra. Em particular, uma condição necessária (mas, não suficiente) é a volta de um crescimento sustentável.

Daí, porque, a indagação: pode isso acontecer?

A resposta que me parece adequada é que ainda existem muitas coisas a serem construídas para que o sucesso se verifique.

De positivo, várias condições favoráveis foram sendo criadas no governo que está terminando.

Coisas relevantes foram aprovadas no Legislativo e estão em pleno vigor, como a reforma trabalhista, o teto para gasto público, a Lei de Responsabilidade das Estatais, alterações na área de petróleo (que já resultaram em muitos projetos de investimento), reforma do ensino médio e outras.

Terminaremos o ano com uma inflação inferior ao teto da meta (4,5%), apesar dos vários choques de preços administrados que ocorreram ao longo do período, sugerindo uma forte ancoragem dos preços. Em consequência, a taxa Selic se mantém como a mais baixa de muitos anos, e assim deve continuar pelo menos até o fim do primeiro trimestre de 2019. Além disso, uma agenda do Banco Central e a criação de novas empresas financeiras de base tecnológica (fintechs) está elevando a competição no mercado de crédito. Finalmente, o setor externo apresenta uma extraordinária robustez, resultante de boas exportações, elevadas reservas e investimentos diretos estrangeiros.

Embora o acima descrito não seja pouca coisa, existem ainda formidáveis obstáculos decorrentes de uma deterioração persistente da situação fiscal e da manutenção dos investimentos em níveis muito baixos.

Não é preciso muito esforço para concordar que não teremos de volta o desenvolvimento sem um avanço considerável nessas duas áreas.

Luiz Carlos Azedo: O mundo de Bolsonaro

- Correio Braziliense

“Os efeitos das tarifas impostas por Trump às importações chinesas, assim como das restrições de acesso a tecnologias americanas, já desaceleram o comércio mundial, o que não é bom para o Brasil”

Na montagem de sua equipe, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, já deu pistas de como a banda vai tocar no seu governo em relação a alguns temas da agenda nacional. Por exemplo, ninguém pode dizer que se enganou em relação ao futuro ministro da Justiça, Sérgio Moro, cuja pasta combaterá o crime organizado e a corrupção. A mesma coisa pode-se dizer quanto ao superministro da Fazenda, Paulo Guedes, que o mercado conhece muito bem. Idem para a ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM-MS), indicada pelo agronegócio de exportação. O futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, também não engana ninguém: seu estilo e modo de operar no Congresso são conhecidos.

O que permanece uma incógnita é a relação do futuro governo com a política mundial. Os sinais de Bolsonaro eram no sentido de um alinhamento automático com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Deu várias declarações nessa direção, seja em relação aos acordos multilaterais, como o Mercosul e o de Paris, seja em questões mais específicas, como as relações comerciais com a China e a intenção de mudar a embaixada do Brasil em Israel de Tel Aviv para Jerusalém. Ocorre que essas declarações tiveram repercussão muito negativa, e as eleições norte-americanas de 6 de novembro mostraram que o vento mudou em relação a Trump. Com os democratas conquistando a maioria na Câmara, nada será como antes.

Nos bastidores da transição, com o roque do Ministério da Defesa para o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), as quatro estrelas do general Augusto Heleno passaram a brilhar mais do que todas as outras, inclusive as do vice-presidente, general Hamilton Mourão, que é mais “moderno”. Essa mudança tem impacto no posicionamento estratégico de governo sobre vários temas, um deles é a política externa. Desde a Guerra das Malvinas, quando os EUA deram apoio logístico aos ingleses e, inclusive, inviabilizaram a utilização de seus mísseis pelos argentinos, a velha Doutrina Monroe caducou.

Vigorava desde 2 de dezembro de 1823, quando o presidente James Monroe, no Congresso norte-americano, disse que o continente não deveria aceitar nenhuma intromissão europeia: “América para os americanos”, proclamou. De uma só vez, os EUA rechaçaram a criação de novas colônias no continente, a interferência de nações europeias em questões internas e a neutralidade norte-americana em conflitos envolvendo países europeus. Esses princípios funcionaram contra a Espanha e a antiga União Soviética, mas não contra o principal aliado dos EUA no Atlântico, a Inglaterra. A guerra das Malvinas aprofundou o chamado “pragmatismo responsável” dos chanceleres Azeredo da Silveira e Saraiva Guerreiro. Durante os governos Geisel e Figueiredo, respectivamente, o Brasil abandonou o alinhamento automático aos Estados Unidos.

Guerra comercial
Nessa época, o redirecionamento da política externa para as relações Norte-Sul mirava principalmente a África e os países árabes; o eixo do comércio mundial não havia se deslocado do Atlântico para o Pacífico, como acontece agora. Mas, com essa mudança, a China acabou se transformando no principal parceiro comercial do Brasil, desbancando os Estados Unidos. Ocorre que nossa infraestrutura de comércio exterior e logística está voltada para o Atlântico, não temos escala de investimentos para redirecioná-la ao Pacífico com a eficiência e a rapidez necessárias. Quem paga o preço é a nossa indústria.

É nesse contexto que o jovem chefe do Departamento de Estados Unidos, Canadá e OEA do Itamaraty, o ministro de primeira classe Ernesto Henrique Fraga Araújo, encantou Bolsonaro com um artigo “presbítero” publicado na revista do Itamaraty, intitulado “Trump e o Ocidente”. No texto, afirma que o presidente norte-americano está salvando a civilização cristã ocidental do islamismo radical e do “marxismo cultural globalista”, ao defender a identidade nacional, os valores familiares e a fé cristã. Música para os ouvidos de Bolsonaro.

Entretanto, o cargo de ministro das Relações Exteriores exige muito mais do que uma visão religiosa de mundo. Outros nomes já foram sugeridos a Bolsonaro, entre os quais o atual embaixador no Canadá, Paulo Bretas, e os ex-embaixadores em Washington Roberto Abdenur, Sergio Amaral e Rubens Barbosa. A escolha de um deles definirá os rumos da política externa de Bolsonaro, num momento em que o Brasil, como outros emergentes, pode virar marisco na guerra comercial entre os Estados Unidos e a China. Os efeitos das tarifas impostas por Trump às importações chinesas, assim como das restrições de acesso a tecnologias americanas, já desaceleram o comércio mundial, o que não é bom para o Brasil, a não ser que os Estados Unidos voltem a reduzir a sua taxa de juros, o que enfraqueceria o dólar e beneficiaria os emergentes. Mas aí já é adivinhação.

Bruno Boghossian: Cortina de fumaça

- Folha de S. Paulo

A cada choque, o presidente eleito ganha tempo para tapar os buracos de seu programa

Os desencontros entre o novo presidente e o velho Congresso funcionam como uma cortina de fumaça conveniente para JairBolsonaro. O impasse sobre a reforma da Previdência e a aprovação do reajuste para o Judiciário encobrem o fato de que, após meses de campanha e semanas depois da eleição, o futuro governo não apresentou os detalhes de seu plano para a economia.

A cada choque com o mundo político de Brasília, o presidente eleito ganha tempo para tapar os buracos de seu programa. Embora o ajuste das contas públicas seja considerado urgente, o gabinete de transição gasta mais tempo desmentindo a própria equipe do que expondo seus projetos prioritários.

Desde a vitória de Bolsonaro, sua equipe deu repetidas demonstrações de interesse em aprovar ainda este ano algumas mudanças no sistema de aposentadorias. O próximo governo pode ter ideias brilhantes para resolver o rombo da Previdência, mas não se empenhou por um único minuto em tirá-las do papel.

Vinicius Torres Freire: É Natal nas previsões econômicas

- Folha de S. Paulo

Melhora financeira leva bancões a estimar crescimento razoável em 2019

A alegria dos povos do dinheiro arrefeceu depois da eleição, quando tiraram o bode político do mercado. O ânimo balança, mas não cai. Por ora, basta até para estimular previsões mais otimistas para a economia em 2019, como crescimento de 2,5% e Selic estável. A condição, como está todo o mundo enfadado de saber, é que venham reformas.

Juros, dólar, Bolsa e risco-país voltaram a níveis pré-campanha eleitoral. Em alguns casos, voltaram aos bons patamares em que estavam em março, quando o caldo começou a engrossar, então por causa de problemas externos (Donald “Nero” Trump, juros americanos, Turquia e Argentina indo à breca etc.).

Os departamentos de pesquisa econômica de Bradesco e Itaú elevaram suas estimativas de crescimento. O motivo mais recente do discreto otimismo é a melhora das condições financeiras no mercado, por sua vez estimulada por uma esperança nada discreta de que virão reformas.

“Olhando à frente, elevamos a projeção do crescimento do PIB em 2019 de 2% para 2,5%. A mudança é consequência da perspectiva de condições financeiras mais expansionistas, em particular com juros de mercado mais baixos e preços de ativos (por exemplo, ações) mais elevados”, dizem os economistas do Itaú, chefiados por Mario Mesquita.

Janio de Freitas: O governo é civil

- Folha de S. Paulo

Será crucial desvendar quanto os militares estarão dispostos a proteger Bolsonaro

O futuro das incertezas e dos temores com o governo Bolsonaro depende, a rigor, de um fator dominante sobre todos os demais. E ausente das cogitações atuais por ainda faltarem motivos que o tornem perceptível.

Em todas as possíveis circunstâncias que não sejam de aceitação majoritária com o andar de tal governo, os outros Poderes e a legislação dispõem de variadas medidas corretivas. Aplicá-las, porém, não decorre só de existirem.

As injunções políticas e os interesses representados no Legislativo e no Judiciário combinam-se como força decisória. Não, porém, no caso de Bolsonaro.

Se as coisas desandarem, o importante para antever o seu rumo será desvendar quanto os militares estarão dispostos a empenhar em barragem de proteção a Bolsonaro. O que dependerá da identificação, ou confusão, entre o Exército e o governo conduzido por ex-ocupantes das suas casernas.

O trabalho para criar essa identificação vem desde a campanha, à qual deu contribuição por certo significativa. Mas sua intensificação pós-resultado eleitoral ganha proporções mais do que inadequadas.

Entrevista- Gabeira: Bolsonaro representa uma forma de virar a mesa

André Vargas | Revista ISTOÈ

Observador da realidade brasileira desde 1979, quando voltou do exílio após a Anistia, o mineiro Fernando Gabeira, 77 anos, foi jornalista, ativista e político, voltando ao jornalismo após o fim de seu quarto mandato como deputado federal pelo Rio de Janeiro, em 2011. Desde 2013, ele apresenta um programa de reportagens que leva seu nome no canal GloboNews. Com passagens pelo Partido Verde (PV), que ajudou a fundar, e Partido dos Trabalhadores (PT), com o qual rompeu, Gabeira crê na reconstrução da esquerda brasileira e dos movimentos sociais sem as amarras petistas. Dono de uma lucidez crítica e desprovida de pudores ideológicos, ele falou sobre os acertos da campanha de Bolsonaro, as conexões de seu populismo com o de Donald Trump, o surgimento de uma nova direita via redes sociais, a relevância do jornalismo diante das fake news e o papel dos militares no novo governo.

• O que você achou do resultado geral das eleições?

Não meu surpreendeu. Sua vitória afirmou três pontos. Primeiro, foi uma grande crítica ao sistema político. Bolsonaro representa uma forma de virar a mesa. Depois, uma possibilidade de luta contra a corrupção. E, finalmente, a expectativa de uma política de segurança eficaz. Embora, não necessariamente ele será capaz disso. Bolsonaro apenas apresentou essas ideias com mais ênfase e de forma mais clara para o entendimento popular.

• As eleições de Bolsonaro e de Trump foram parecidas?

Há pontos em comum. O principal é a utilização das redes sociais. A seguir, é a expectativa de alcançar o homem comum, colocando-o contra o que dizem ser o sistema. Ambos os políticos se mantêm distantes dos partidos políticos, apesar de Trump ter a força do partido Republicano por trás. Ambos também se mostram distantes da mídia, de especialistas, de técnicos e de intelectuais. Todavia, Bolsonaro fez uma campanha bem modesta. Trump não só tinha muito dinheiro arrecadado, como uma rede de televisão [Fox] grande e conservadora ao seu lado. Por isso, acho que a campanha do Bolsonaro foi mais difícil.

• A democracia de coalizão que pautou a Nova República está exaurida?

Tanto que a proposta do vencedor é superá-la por meio da escolha de ministros que sejam técnicos, competentes e independentes de filiações partidárias. Será uma tentativa de superar o modelo anterior, o que é de difícil realização. O novo presidente terá que ser um pouco mais aberto, a ponto de entender que, se houver gente competente e honrada nos partidos para ocupar alguns postos no governo, ele terá que abrir espaço. Um governo não pode discriminar seus políticos. Seria algo extraordinário.

• Como o senhor avalia o crescimento político dos evangélicos. Hoje daria para governar sem eles e sua agenda conservadora?

O campo que elegeu Bolsonaro é diversificado. Há os evangélicos e também jovens liberais que fazem apologia do estado mínimo, além de intelectuais e propagandistas de direita que surgiram na mídia e nas redes sociais nos últimos tempos. Os evangélicos sempre estiveram na política, só que agora encontraram um candidato que, além de professar o mesmo credo, parece disposto a aceitar uma série de reivindicações. Algumas podem ser problemáticas, como a ideia recente de transferência da embaixada brasileira em Israel para Jerusalém. Temos no Brasil uma grande harmonia entre as comunidades judaica e árabe, além de relações comerciais com países do Oriente Médio, grandes compradores de nossos produtos. Isso poderia nos prejudicar.

A nova ceia da esquerda sem o PT

Como a oposição, Ciro Gomes à frente, constrói um novo e propositivo modelo de contraponto ao futuro governo, livre do “quanto pior, melhor” e das amarras autoritárias impostas pelo petismo

Rudolfo Lago, Ary Filgueira e Wilson Lima | ISTOÉ

A chuva batia forte. Das telhas do prédio térreo da sede do PDT em Brasília ecoava um som retinente, por vezes quase ensurdecedor. De pé na ponta de uma ampla mesa na qual almoçavam cerca de 40 pessoas – os principais dirigentes do partido e os atuais e novos deputados e senadores -, Ciro Gomes enfrentava o barulho torrencial com um discurso entusiasmado.

“Estamos com a faca e o queijo nas mãos”, disse ele na tarde da quarta-feira 7.“Iniciamos a construção de uma alternativa progressista não petista para a sociedade”. Ao final, o presidente do PDT, Carlos Lupi, entoou um “parabéns a você”. Na véspera, fora aniversário de Ciro. O político paulista, mas de sotaque cearense, completou 61 anos à frente daquela que pode ser a sua maior tarefa: liderar um movimento de oposição com a capacidade de redimir e consertar os graves erros cometidos pelo PT durante o período em que atuou para ser hegemônico sobre todos os demais agrupamentos de centro-esquerda do País.

Claro, para nova ceia da oposição, o PT não foi nem será convidado a repartir o pão. Se tudo o que começou a ser pavimentado der certo, Bolsonaro lidará com uma oposição de outra natureza e caráter. Que declara não trabalhar pelo “quanto pior, melhor”, doutrina esta professada quase como um dogma pelo petismo. Que se pretende propositiva, discutindo pontualmente com o governo e até podendo, em determinados momentos, negociar e apoiar propostas. Que não terá como tarefa reconstruir a narrativa da história, como reza a cartilha do PT, ao se declarar vítima de um “golpe político-midiático” e colocando-se como a única alternativa ao “retrocesso democrático” que diz enxergar no governo eleito de Jair Bolsonaro. “Esse é o nosso primeiro ponto de diferença”, disse Ciro à ISTOÉ. “Nós não vemos a democracia em risco como o PT”.

Centro tenta se reagrupar após resultado das urnas

Lideranças iniciam conversas que podem resultar em novas composições; no campo da esquerda, legendas ainda têm tarefa de sobre sobreviver à cláusula de barreira

Pedro Venceslau e Ricardo Galhardo | O Estado de S.Paulo

Forças de centro e legendas de esquerda tentam se adaptar ao novo cenário político no País, depois da eleição de Jair Bolsonaro (PSL) à Presidência e da “onda conservadora” que ampliou o espaço de siglas de direita no Parlamento e governos estaduais. No primeiro caso, lideranças que tentaram, sem sucesso, articular uma candidatura consensual ainda no primeiro turno das eleições iniciaram conversas que podem resultar em novas composições partidárias. No campo da esquerda, o esforço também passa por sobreviver à cláusula de barreira, dispositivo que restringe ou impede a atuação parlamentar de um partido que não alcança um determinado porcentual de votos.

O primeiro movimento concreto nesse sentido vem do PPS, presidido por Roberto Freire. A legenda vai realizar em meados de janeiro um congresso extraordinário para mudar de nome, estatuto e se integrar aos grupos de renovação política Agora, Livres e Acredito. A Rede, partido da presidenciável derrotada Marina Silva, e que elegeu apenas um deputado federal, negocia com o próprio PPS e pode integrar o novo partido. O assunto será pauta de uma reunião da Rede neste fim de semana, em Brasília.

Segundo Freire, a Rede foi convidada a indicar delegados para o congresso do PPS em janeiro. “Estamos de braços abertos para receber a Rede”, disse Freire, ao Estado. Se optar por não se fundir, a Rede perderá o acesso ao Fundo Partidário e tempo de televisão.

O avanço do governador eleito de São Paulo, João Doria, sobre a executiva do PSDB – que será renovada em maio – também levou tucanos derrotados nas urnas a pensar em alternativas. O tema foi debatido em um jantar na terça-feira passada, em Brasília, no apartamento do senador Tasso Jereissati (CE). Estavam presentes o presidente do PSDB, Geraldo Alckmin, e os senadores Ricardo Ferraço (ES) e Cassio Cunha Lima (PB).

Segundo reportagem do jornal Valor Econômico, Alckmin e Tasso avaliaram que a permanência no PSDB ficaria insustentável se Doria levar à frente seu projeto de aproximação com o governo Bolsonaro.

'Frente cívica' deixa de lado temas como 'Lula Livre'

Para atrair adesão de 'centro democrático', grupo propõe concentrar críticas à atuação de Bolsonaro na Presidência

Ricardo Galhardo | O Estado de S.Paulo

Partidos e organizações de esquerda articulam a criação de uma “frente cívica” – que seria aberta ao que seus líderes chamam de “centro democrático” – para fazer oposição ao governo Jair Bolsonaro (PSL). A preocupação declarada do grupo é barrar eventuais iniciativas que coloquem em xeque liberdades civis. Temas que podem dividir, como o “Lula Livre” e pautas econômicas, serão deixados de lado.

A diferença entre a “frente cívica” e outras iniciativas já existentes, segundo seus organizadores, é a intenção de ampliar a participação para além das fronteiras da esquerda e atrair setores do centro. Por isso, pautas econômicas ou de interesse específico de determinado partido ou movimento serão deixadas de lado. O foco serão temas do discurso de Bolsonaro, antes e depois da eleição, como Escola sem Partido, liberdade de imprensa, Lei Rouanet, ameaças à oposição, direitos de minorias LGBT, negros e mulheres e questões ambientais.

“O 'Lula livre' está na pauta do PT e da Frente Brasil Popular e do PT mas obviamente que pode haver quem não ache que é prioritário”, diz a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR). “Nós não temos nenhuma pretensão de hegemonizar nada”, afirma Gleisi.

MDB promove armistício entre seus caciques para garantir sobrevivência

Para viabilizar plano, partido quer manter Senado com Renan e se colocar como independente

Marina Dias | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A cúpula do MDB articula um armistício entre suas principais lideranças para tentar garantir a sobrevivência do partido e protagonismo no Congresso durante o governo de Jair Bolsonaro (PSL).

O plano foi colocado em marcha no início desta semana e terá ao menos duas frentes: manter o controle do Senado com Renan Calheiros (AL) na presidência da Casa e ecoar o discurso de que a sigla será independente —e não oposição— a partir de 2019.

Isso vai permitir tanto um alinhamento à pauta econômica de Bolsonaro, principalmente quanto à reforma da Previdência, como deixa a porta aberta para que o partido se afaste do novo governo quando achar conveniente.

Dirigentes do MDB consideram o futuro da gestão Bolsonaro bastante incerto. Afirmam que é preciso esperar que ela comece de fato para entender como o Planalto vai estabelecer sua correlação de forças com o Congresso.

O capitão reformado se elegeu com um discurso antissistema, anticorrupção e contra a velha política e tem dito que não vai governar cedendo cargos em troca de apoio político.

Já nomeou, porém, dois deputados do DEM para seu primeiro escalão: Onyx Lorenzoni (Casa Civil) e Tereza Cristina (Ministério da Agricultura).

O presidente do MDB, senador Romero Jucá (RR), preferiu se escaldar. Afirmou que acabou a era de seu partido como o “da governabilidade”.

Freio a Bolsonaro

Senado articula barrar Escola sem Partido e ‘agenda da bala’

Amanda Almeida | O Globo

BRASÍLIA - Coma perspectiva de um novo governo patrocinando projetos polêmicos — como a liberação do porte de armas, o enquadramento de movimentos sociais na Lei Antiterrorismo e o Escol asem Partido —, parlamentares de diferentes partidos se articulam par atentar fazer do Senado a “casa do equilíbrio” da República. Temendo a radicalização nessas pautas, até senadores de PT e PSDB admitem se alinhar na votação dos projetos.

As costuras passam pela escolha do presidente do Senado, no ano que vem. Diferentes lideranças defendem um senador de perfil moderado, sem alinhamento direto com o presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), mas que não faça parte da oposição a ele. Por trás desse discurso, a articulação é para encontrar um nome com força para pôr freio a eventuais propostas na agenda do governo que provoquem tensão social.

— Há muitos senadores novos cuja opinião não conhecemos, mas o consenso entre os partidos é a favor de uma Casa moderada, que não faça oposição sistemática. O governo foi eleito e o Brasil tem de ir para frente. Tudo aquilo que for de interesse do país, vamos votar a favor. Mas, também agiremos para que questões mais radicais sejam contidas aqui e a gente mantenha o equilíbrio — diz o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). 

Assessores dos partidos na Casa calculam que, entre os 81 senadores, Bolsonaro tem, por ora, uma bancada de cerca de 20 parlamentares de partidos como o PSL, PSC, PTB e Podemos alinhados a ele.

A tentativa da legenda do presidente eleito é aumentar esse número. A intenção das lideranças que defendem a necessidade deter um Senado capaz de barrar uma agenda muito conservadora é formar maioria junto com a “oposição ferrenha” a Bolsonaro, além dos senadores independentes, que admitem apoiar o presidente eleito em parte da agenda econômica, mas não nos projetos com maior apelo ideológico.

As razões para o veto: Editorial | O Estado de S. Paulo

Além do descaso com as finanças públicas e da indiferença com a situação dos mais de 12 milhões de desempregados no País, o aumento de 16,38% do salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), aprovado pelo Congresso na quarta-feira passada, fere a Constituição. Há, assim, um motivo técnico cristalino para que o presidente Michel Temer vete o imoral reajuste - os atos do Poder Legislativo devem se submeter aos mandamentos constitucionais.

O art. 169 da Constituição estabelece que “a despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar”. E o § 1.º do mesmo artigo assegura que a concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração pelos órgãos da administração direta ou indireta só poderá ser feita se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes e se houver autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

A Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2019 não contém nenhuma autorização para o aumento do subsídio dos ministros do STF. Vale lembrar que o reajuste aprovado na quarta-feira passada pelo Congresso altera a remuneração de todos os juízes do País - e isso também não está previsto na LDO de 2019.

De juiz a ministro: Editorial | Folha de S. Paulo

Sergio Moro precisa evitar que combate à corrupção não atropele impessoalidade da máquina policial

O Ministério da Justiça, a ser comandado pelo juiz Sergio Moro a partir de janeiro, é uma das organizações políticas brasileiras mais longevas. Comemorará dois séculos de existência em julho de 2022, dois meses antes de o país festejar o bicentenário da Independência.

Tradicionalmente, veio exercendo o papel de mediador entre os Poderes Executivo e Judiciário. Com o tempo, acumulou tarefas diversas como as de zelar por concorrência na economia, status dos estrangeiros no território nacional, cooperação internacional, comando da Polícia Federal e administração dos presídios da União.

Nunca, no entanto, comportou-se como pivô do combate à corrupção e ao crime organizado no país, principal objetivo de Moro a julgar pelas suas primeiras entrevistas.

A dificuldade começa na concepção do sistema de freios e contrapesos moderno, adotado na Constituição de 1988. O poder, os recursos e a iniciativa para agir estão mais concentrados no Executivo.

A tarefa, por seu turno, de controlar os excessos da ação, na qual se insere o combate à corrupção, fica a cargo dos outros dois Poderes, bem como de burocracias autônomas especializadas, como é o caso do Ministério Público Federal e do Tribunal de Contas da União.

A Polícia Federal, embora esteja formalmente sob a alçada do Ministério da Justiça, desenvolveu características e prerrogativas funcionais que a tornaram parecida com aquelas duas últimas organizações. Comporta-se mais como organização de Estado que de governo.

Crise nos estados pode surpreender novos governantes: Editorial | O Globo

Eleitos precisam manter foco na realização dos ajustes fiscais e das reformas estruturais

O Ministério da Fazenda divulgou um alerta, na semana passada, sobre a degradação das finanças dos estados. Advertiu para uma “possível disseminação de situações de insolvência”, caso não sejam realizadas reformas estruturais para mudar o rumo das contas, tornando-as superavitárias. O Banco Mundial já havia avisado sobre a possibilidade de insolvência de uma dezena de estados em 2021, mantidas as condições atuais. Os novos governadores devem se surpreender com maiores limitações na administração das contas públicas. Fator de pressão relevante é o aumento do custo de serviço (juros e amortizações) das dívidas. Em 2016, diante da mais profunda recessão da história, governo federal e Congresso decidiram dar um alívio aos estados. Promoveu-se uma redução temporária no valor das parcelas pagas. Esse desconto baixou a despesa financeira para 6% da receita corrente líquida. O benefício vai acabar no próximo ano, como determina alei complementar (156/2016).

Os novos governadores assumem na fase de normalização dos pagamentos do serviço das dívidas. Isso vai resultar num aumento da despesa para cerca de 10% da receita líquida. Haverá um impacto significativo nas administrações. Alguns dos recém-eleitos já falam em apresentar propostas para nova renegociação das dívidas.

Teresa Cristina - Filosofia (Noel Rosa)

Carlos Drummond de Andrade: Sentimental

Ponho-me a escrever teu nome
Com letras de macarrão.
No prato, a sopa esfria, cheia de escamas
e debruçados na mesa todos contemplam
esse romântico trabalho.
Desgraçadamente falta uma letra,
uma letra somente
para acabar teu nome!

- Está sonhando?

Olhe que a sopa esfria! Eu estava sonhando ...
E há em todas as consciências um cartaz amarelo:
"Neste país é proibido sonhar."