quarta-feira, 29 de setembro de 2021

Martin Wolf* - A estranha morte da democracia americana

Valor Econômico

Os republicanos já cruzaram seu Rubicão

“Um ‘cesarismo’ americano agora tomou corpo”. Escrevi isso em março de 2016, antes mesmo de Donald Trump se tornar o candidato republicano à Presidência dos Estados Unidos. Hoje, a transformação da república democrática em uma autocracia avançou. Em 2024 ela poderá ser irreversível. Se isso de fato acontecer, mudará quase tudo no mundo.

Ninguém descreveu esse perigo de forma mais convincente do que Robert Kagan. Seu argumento pode ser reduzido a dois elementos principais. Primeiro, o partido Republicano é definido não pela ideologia, e sim por sua lealdade a Trump. Segundo, o amadorístico movimento “parem de roubar” da última eleição se transmutou em um projeto bastante avançado. Uma parte desse projeto é remover autoridades que barraram o esforço de Trump de reverter os resultados das eleições. Mas seu principal objetivo é transferir a responsabilidade de decisão dos resultados eleitorais para legislaturas controladas pelos republicanos.

Se o ciclo normal da política der aos republicanos o controle da Câmara e do Senado, Trump estará protegido e servido pelo Congresso a partir de 2022. Ele detém uma grande maioria na Suprema Corte. Os republicanos controlam todos os níveis de poder em 23 Estados

Vera Magalhães - Prevent Senior e a síntese do horror

O Globo

Foi uma experiência excruciante assistir ao depoimento da advogada Bruna Morato à CPI da Covid. Dolorida, incômoda, nauseante. Não tenho parentes segurados pela operadora Prevent Senior e até aqui tive a sorte, rara no Brasil do biênio 2020-2021, de não ter perdido familiares próximos para o novo coronavírus. Assim, não consigo imaginar a dor de pessoas que estejam nessas situações e tenham assistido ao relato do horror sem antessala.

Bruna representa um grupo de ex-médicos da Prevent que assinou a denúncia de um leque inenarrável de irregularidades cometidas pela operadora e a encaminhou ao Ministério Público e à CPI. Provavelmente, caberá ao primeiro esmiuçar esse caso a fundo e imputar crimes, caso eles sejam comprovados.

Mas a CPI encontrou, nos experimentos e nas práticas denunciados pelos médicos e pela advogada, a materialidade que ainda lhe faltava para as muitas evidências de que houve um conluio entre o governo e a Prevent, diante do qual a agência reguladora dos planos de saúde e os conselhos de medicina foram absolutamente omissos, se não cúmplices, para empurrar literalmente goela abaixo de pacientes um tratamento para Covid-19 sabidamente ineficaz e propagandeá-lo publicamente como forma de desencorajar as pessoas de seguir os protocolos sanitários e a necessidade de distanciamento social ou até de lockdown.

Elio Gaspari - Há uma bomba-relógio no TSE

O Globo / Folha de S. Paulo

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) revelou que nas próximas semanas julgará o processo de cassação da chapa de Jair Bolsonaro e Hamilton Mourão. Parece falta de assunto, mas é bom que se diga: trata-se de uma iniciativa retardatária e inoportuna, caso clássico de tapetão.

É retardatária porque não faz sentido cassar uma chapa três anos depois da campanha durante a qual teriam ocorrido flagrantes transgressões da lei. Tudo indica que as ilegalidades ocorreram, mas, se o Judiciário levou três anos para decidir julgar o caso, deveria reconhecer que sua morosidade causou danos ao bem público semelhantes aos das malfeitorias cometidas. Se o caso envolvesse uma autoridade conduzida a um cargo vitalício, tudo bem, mas cassar uma chapa a um ano do fim do mandato é uma excentricidade.

É inoportuna, porque o país ainda não se livrou da tensão institucional manipulada por Bolsonaro nos seus confrontos verbais com o Judiciário. Uma nova encrenca nesse quintal é coisa desnecessária.

Bruno Boghossian - Asfalto e fé

Folha de S. Paulo

Portfólio limitado do governo leva presidente a recalibrar plataforma da reeleição

Jair Bolsonaro aproveitou as cerimônias dos mil dias de governo para testar uma plataforma eleitoral para 2022. Com a gestão desastrosa da pandemia e a condução torta da economia, o presidente tenta turbinar um pacote modesto de obras, transferir responsabilidades para adversários políticos e ampliar o apelo a uma retórica conservadora.

Pela manhã, Bolsonaro voou até o sul da Bahia para lançar um centro esportivo e entregar cinco títulos de propriedade rural. O evento também marcou a inauguração simbólica de meros 9,5 km de estradas federais duplicadas –uma extensão que não cobre nem metade da distância entre o Palácio da Alvorada e a base aérea de Brasília, de onde ele havia decolado horas antes.

Mariliz Pereira Jorge - Mil dias de pesadelo

Folha de S. Paulo

Para a doença causada por ele já há remédio na Constituição

Um assunto que bomba mais no meu WhatsApp do que política são as drogas. Aquelas vendidas em farmácia, teoricamente controladas, para o sistema nervoso central. Que está todo mundo meio mal, não há dúvida. E parece uma óbvia vitória que doenças mentais deixem aos poucos de ser tabu, mas o lado sinistro dessas discussões é que não há pudor em trocar impressões sobre tratamentos, medicamentos, efeitos colaterais.

Reportagem da jornalista Claudia Collucci, nesta Folha, mostra que a venda de antidepressivos e estabilizadores de humor tem aumentado sem parar. Em 2019, 12%. No ano seguinte, 17%. Nos primeiros cinco meses de 2021 a alta já foi de 13%.

Hélio Schwartsman - Mundo precisa de mais vacinas

Folha de S. Paulo

Mais do que nunca, é preciso ampliar a produção dos imunizantes

As vacinas já mostraram que reduzem drasticamente a morbidade e a mortalidade pela Covid-19, além de diminuir a circulação do vírus. Desenvolvidos em menos de um ano, quase todos os biofármacos que chegaram à fase 3 de testes funcionaram —alguns com eficácia de mais de 90%—, o que é muito mais do que sonhavam os infectologistas no início da pandemia. A má notícia é que a imunidade conferida pelas vacinas parece cair em alguns meses.

Um sinal eloquente disso vem de Israel, que, no fim de agosto, após experimentar um recrudescimento da epidemia, começou a oferecer uma terceira dose da Pfizer a todos os que já haviam recebido a segunda ao menos cinco meses antes. Trabalho recém-publicado no "NEJM" envolvendo mais de 1,1 milhão de israelenses de mais de 60 anos mostrou que, 12 dias ou mais após o reforço, a probabilidade de apresentar uma infecção era 11,3 vezes menor no grupo que recebeu a dose extra do que no que estava com o esquema padrão de duas doses. A chance de desenvolver um quadro severo era 19,5 vezes menor. Isso para a Pfizer.

Vinicius Torres Freire - Crise mundial vai encarecer sua gasolina

Folha de S. Paulo

Motivo mais imediato da crise é a falta de gás na Europa, que contagia outros mercados

Falta energia no mundo. A crise pode ser transitória, em parte resolvida em parte com arranjos políticos até o final do ano, mas encarece combustíveis, como a sua gasolina, e a produção de algumas indústrias e serviços, quando não a paralisa. A inflação mundial vai aumentar um pouco mais. Com algum azar e sem arranjos, a crise pode se prolongar até bem entrado o verão do Hemisfério Sul e o inverno do Norte. Nesse caso, haverá mais dificuldades do que preços algo maiores.

O problema mais novo e imediato é a falta de gás natural, retirado das profundezas do chão. Em um ano, o preço do gás mais do que dobrou nos Estados Unidos e quadruplicou, mais ou menos, na Europa —estão nos níveis mais altos em cerca de sete anos.

A Europa depende em parte de gás para fazer eletricidade e para aquecimento doméstico. Fábricas de metais, fertilizantes e materiais de construção do mundo inteiro usam gás. Com o preço do produto nas alturas, começa-se a recorrer mais a óleo combustível, o que pressiona ora marginalmente e ainda mais o preço do barril de petróleo. A produção dos poços por ora está limitada por decisão do cartel dos grandes produtores, a Opep.

Luiz Carlos Azedo - O jogo é jogado

Correio Braziliense

O jogo eleitoral de 2022 começou com uma “folha seca”, a derrubada do veto à formação de frentes partidárias, que mitigando o fim das coligações proporcionais

A frase “treino é treino, jogo é jogo” é de autoria de Valdir Pereira da Silva, mais conhecido como Didi, bicampeão mundial de futebol (1958-1962). O craque não gostava de exercícios físicos e enrolava nos treinos, se prevalecendo de sua reconhecida habilidade com a bola, algo impensável hoje em dia, mesmo para Messi, Cristiano Ronaldo e Neymar. Didi foi um dos melhores e mais elegantes meio-campistas da história. Inventou a “folha seca”, um chute de bico de pé, de fora pra dentro, com a região dos três dedos, no meio da bola parada, que surpreendia os goleiros pela sua trajetória enviesada e a repentina descaída ao se aproximar do gol.

A “folha seca” entrou para a história do futebol aos 27 minutos do segundo tempo do jogo da nossa seleção contra o Peru, classificando o Brasil nas eliminatórias sul-americanas para a Copado Mundo da Suécia, em 1958. Resulta de dois efeitos aerodinâmicos: a “força ascensorial”, a mesma provocada pela curvatura da asa do avião, ao fazer o vento se deslocar mais rapidamente pela superfície superior do que pela inferior, o que faz com que se sustente no ar enquanto há impulsão; e o “efeito Magnus”, no qual a velocidade de giro da bola sobre o próprio eixo, por sua superfície áspera, provoca uma trajetória elíptica, como nos gols de escanteio. Essa combinação torna impossível prever e interceptar o percurso da bola.

O jogo eleitoral de 2022 começou com uma “folha seca”, a derrubada do veto do presidente Jair Bolsonaro à formação de frentes partidárias nas eleições, mitigando o fim das coligações proporcionais. Com isso, duas ou mais siglas com afinidade ideológica e programática poderão se unir para atuar de maneira uniforme em todo o país, sem que seja necessário fundir os diretórios. Entretanto, a união precisa durar quatro anos. A decisão pode facilitar a sobrevivência dos pequenos partidos, mas foi uma jogada das grandes legendas, como o PT e o PSD, interessados em formar amplas alianças nas eleições do próximo ano.

Eliane Cantanhêde - Desvantagem de gaúcho pode se tornar virtude para 2022

O Estado de S. Paulo

O maior empenho do governador Eduardo Leite (RS) para vencer as prévias do PSDB em novembro e viabilizar sua candidatura à Presidência da República em 2022 é transformar sua grande desvantagem na sua principal vantagem: o fato de ser jovem, uma novidade e inusitado para um empreendimento tão audacioso.

Quando lhe perguntam se não é cedo para disputar a Presidência, depois de ter passado apenas pela prefeitura de Pelotas e estar no primeiro mandato no governo do Rio Grande do Sul, Leite sorri: “Bem... É mais do que o Jair Bolsonaro, a Dilma Rousseff, o Lula e o próprio Fernando Henrique tinham quando viraram presidentes”.

E não é que ele tem razão? Apesar dos 28 anos de Parlamento de Bolsonaro, de um ministério e uma secretaria estadual de Dilma, da liderança política e sindical de Lula e da sólida carreira acadêmica de FHC, nenhum dos ex-presidentes teve experiência administrativa numa prefeitura ou num governo estadual, muito menos num governo relevante como o que Leite ocupa.

Rosângela Bittar - Mil noites obscuras

O Estado de S. Paulo

Não se trata do que Bolsonaro fez ou deixou de fazer, mas do que simplesmente destruiu

A tentativa de se aplicar a régua dos mil dias para celebrações demonstrou o que se esperava. O governo Jair Bolsonaro nada tem a festejar. Não há fatos, inspiração relevante ou oscilação dos gráficos que não sejam lamentáveis.

Os historiadores, um dia, se ocuparão do legado de Bolsonaro, suas ações e omissões. Os brasileiros, hoje, se ocupam de sobreviver entre os escombros a que o País está sendo reduzido.

Bolsonaro provocou a deterioração de setores e atividades que até então resistiam ao pessimismo. A começar pela política externa, reduzida a improvisações circenses.

Sua visão reacionária caracteriza a política ambiental, renega os conceitos científicos da saúde, desestabiliza o sistema educacional e inibe as manifestações da cultura.

José Nêumanne* - Populismo contra o povo do mentiroso preguiçoso

O Estado de S. Paulo

Expoente da direita estúpida ajudou a tornar Lula elegível por prever que o derrotará

Em 8 de abril de 2020, Jair Bolsonaro traçou, em cadeia de rádio e TV, as linhas gerais de sua conduta no comando do combate à pandemia da covid-19: receitou cloroquina ineficaz, pregou reabertura do comércio, condenou o uso de máscaras, inculpou prefeitos e governadores por medidas de restrição à circulação de pessoas como forma de evitar o contágio da doença e ainda citou o que o diretor da Organização Mundial da Saúde, de fato, não disse.

Em 18 meses de guerra da Pátria, que ele nunca provou amar, contra o contágio do vírus, chegando perto de 600 mil baixas, muitas delas que poderiam ter sido evitadas, presidiu o populismo contra o povo. Daí 53% dos entrevistados pelo Ipec terem achado sua gestão “ruim ou péssima”. Apesar de bater recorde e ultrapassar a metade, o índice não reflete a dimensão de seu desastre. Após ter festejado a previsão de retomada da economia, pálida, segundo a previsão do Focus (mais 1,88%), a nova fica abaixo de 1%. Enquanto países desenvolvidos crescem aproveitando o êxito de isolamento, uso de máscara e vacina, o tríduo desprezado por seu negacionismo de resultados arrebanha fanáticos seguidores, calculados em 11% da população pelo diretor do Datafolha, Mauro Paulino.

Cristian Klein - A fusão de aflitos entre PSL e DEM

Valor Econômico

União de partidos indica projeto para evitar decadência

Duas premissas da fusão entre o PSL e o DEM são de que eles formarão um megapartido e que a agremiação terá um projeto independente, de terceira via, na eleição presidencial do ano que vem. Nem um nem outro resultado é garantido.

Em termo quantitativo, o primeiro ponto a se considerar é que a nova legenda perderá a ala mais radical de deputados ligados a Jair Bolsonaro. Espera-se que cerca de 25 parlamentares do PSL, na Câmara, rumem para a sigla que o presidente escolher.

A debandada dos “bolsonaristas roxos” praticamente anula o peso com que a bancada de 28 deputados do DEM contribui para a formação da legenda. Entre esses parlamentares, no entanto, também há expectativa de saídas. Como no Rio, onde o DEM é controlado pelo deputado Sóstenes Cavalcante, ligado ao pastor Silas Malafaia, outro ultrabolsonarista, ambos insatisfeitos com a perda da máquina partidária e a suposta independência que a sigla terá em relação ao governo federal.

Paulo Sternick* - Paradoxos suspeitos

O Globo

Atordoar e intimidar o inimigo é uma das táticas necessárias à guerra. A linguagem militar já nos atravessa, e a lógica rasteira da caserna avança sobre a cultura. Mas, na política, ver adversário como inimigo é um inquietante sinal. E a confusão produzida por Bolsonaro parece proposital: visa a não identificar sua estratégia —ou a falta dela. Nem é possível distingui-la de um caráter perturbado. Talvez nem ele saiba exatamente como agir para alcançar o desejo de um poder absoluto e vazio.

O ultraje sofrido pela maioria dos brasileiros com essa trama macabra justifica a criação de um novo mote: “Bolsonaro nunca mais”. O sono da democracia produziu um monstro. É preciso acordar do pesadelo e começar a pensar em 2023, na reconstrução do nosso orgulho abatido, na renovação da esperança e da alegria, na crença real num futuro suave. É preciso dar emprego e melhorar a renda. Reabilitar o Estado e dar-lhe condições de voltar a investir.

Roberto DaMatta - Um brasileiro em Nova York

O Globo / O Estado de S. Paulo

1.Nascido no gigante adormecido, Jair Bolsonaro foi à cidade que jamais dorme para fazer um discurso na ONU.

O resultado foi um discurso pífio e um patético flagrante do Supremo Mandatário e de sua comitiva desamparados, comendo pizza numa calçada. É claro, como já mencionei aqui, Bolsonaro se acha acima das normas e da biologia, embora tenha contraído a doença. Superiores não se vacinam e, irresponsavelmente, esquecem o caráter exemplar de seus cargos. Você pode ser individualista, mas o vírus é coletivista.

Bolsonaro é uma extremada ambivalência ambulante, essa marca dos poderosos nacionais. Pois — com raríssimas exceções — ter poder no Brasil é “ter a faca e o queijo nas mãos”, é ignorar normas. Seja porque os “superiores” não lhes obedecem; ou porque estão convencidos de que são seus donos. Afinal, eles as inventam e, se têm esse poder, não precisam segui-las. Elas são feitas para o “povo”. As elites legislativas (que estão em todo lugar) relativizam tudo com o “você sabe com quem está falando?”.

Só que, em Nova York, as regras valem para todos. Um presidente pode declarar uma guerra, mas não acaba com o ataque viral... Recusando fazer em Roma como os romanos, Bolsonaro viu sua teimosia virar pizza.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

A dilapidação do Orçamento

O Estado de S. Paulo

Enquanto o Legislativo não cria regras de transparência para as emendas de relator, é urgente que órgãos de controle se debrucem sobre essas destinações

A Câmara dos Deputados organizou, no dia 23 de setembro, um debate com especialistas em gestão e direito público sobre os Impactos das Emendas de Relator no Orçamento Federal. Sintomaticamente, o debate foi promovido não pela Comissão do Orçamento, mas pela Frente Ética Contra a Corrupção. “Eu vejo uma corrupção sistêmica orquestrada por dois Poderes para fraudar o Orçamento público”, denunciou o professor de Direito Financeiro Heleno Taveira Torres. “É uma espécie de mensalão por dentro. A diferença é de meios: o que antes era feito com recursos estranhos ao Orçamento agora está sendo feito por dentro do Orçamento. O resultado é o mesmo: a compra de apoio de base parlamentar.”

Como apontou o diretor da Instituição Fiscal Independente, Felipe Salto, “o Orçamento público deveria ser o ápice do processo democrático, porque se trata de discutir a melhor alocação de recursos”. Com vistas à colaboração entre os Poderes eleitos para esse processo, a Constituição previu a possibilidade de emendas parlamentares na proposta orçamentária anual encaminhada pelo Executivo ao Congresso. Por meio delas, os parlamentares e suas bancadas poderiam orientar os recursos às necessidades da população.

Poesia | Ferreira Gullar - No mundo há muitas armadilhas

No mundo há muitas armadilhas
e o que é armadilha pode ser refúgio
e o que é refúgio pode ser armadilha

Tua janela por exemplo
aberta para o céu
e uma estrela a te dizer que o homem é nada
ou a manhã espumando na praia
a bater antes de Cabral, antes de Tróia
(há quatro séculos Tomás Bequimão
tomou a cidade, criou uma milícia popular
e depois foi traído, preso, enforcado)

No mundo há muitas armadilhas
e muitas bocas a te dizer
que a vida é pouca
que a vida é louca
E por que não a Bomba? te perguntam.
Por que não a Bomba para acabar com tudo, já
que a vida é louca?

Música - Zélia Duncan - Jura