Para especialistas, discursos com ameaças implícitas servem para acenar à base mais radical de seus apoiadores
Gustavo Schmitt | O Globo
SÃO PAULO — Ao dizer ontem que “está chegando a hora de tudo ser colocado no devido lugar”, o presidente Jair Bolsonaro recorreu novamente a um discurso que dá margem à leitura de ameaças implícitas às instituições democráticas. Na avaliação de cientistas políticos, ele acena mais uma vez à base de apoiadores radicais e testa limites. Irritado, Bolsonaro se referiu ao que considera como “abusos” na ordem do Supremo Tribunal Federal (STF) de quebrar o sigilo bancário de dez deputados e um senador aliados.
Para especialistas, a estratégia do presidente e de alguns de seus ministros de apostar no confronto atende um projeto autoritário, segundo eles construído por meio de tentativa e erros, e que em alguns casos os fazem recuar.
Analistas políticos avaliam que, nos últimos meses, houve uma escalada dessas declarações que podem ser interpretadas como contrárias à democracia, ainda que, por enquanto, não tenham ultrapassado a esfera retórica.
Em referência indireta ao STF, Bolsonaro afirmou ontem, a apoiadores, que não quer medir forças, mas citou a possibilidade de uma “emboscada”, sem deixar claro a que tipo de ação se referia.
— É igual uma emboscada. Você tem que esperar o cara se aproximar. Vem mais, vem jogando ovo, pedra… Falei hoje de manhã: não quero medir força com ninguém. Continua vindo.
As declarações de Bolsonaro foram repudiadas pelo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz:
—Ele, como todos os brasileiros, deve obediência às decisões do Poder Judiciário. Já passou da hora de cessarem as declarações dúbias que geram um clima de instabilidade institucional.
O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Fábio da Nóbrega, foi na mesma linha:
—Democracia pressupõe o respeito ao livre funcionamento dos demais Poderes.