sábado, 22 de novembro de 2014

Opinião do dia – Fernando Gabeira

O PT está aí há 12 anos. Lula fez vista grossa para a corrupção? Se você quer definir uma diferença, não se esqueça de que o homem do PT na Petrobrás foi preso. Ele é amigo do tesoureiro do PT. A cunhada do tesoureiro do PT foi levada a depor porque recebeu grana em seu apartamento em São Paulo.

De que passado você fala, Dilma? Como acha que vai conseguir se desvencilhar dele? A grana de suas campanhas foi um maná que caiu dos céus?

Um dos traços do PT é sempre criar uma versão vitoriosa para suas trapalhadas. José Dirceu ergueu o punho cerrado, entrando na prisão, como se fosse o herói de uma nobre resistência. Se Dilma e Lula, por acaso, um dia forem presos, certamente, dirão: nunca antes neste país um presidente determinou que prendessem a si próprio.

Fernando Gabeira, jornalista. Apocalipse, agora. O Estado de S. Paulo, 21 de novembro de 2014.

Dilma escolhe Levy para a Fazenda, mas adia anúncio

• Bolsa teve a maior alta em três anos; circulou na imprensa informações de que o ex-secretário do Tesouro Joaquim Levy assumirá o Ministério da Fazenda, mas o anúncio foi adiado

Tânia Monteiro - O Estado de S. Paulo

Após a notícia de que o ex-secretário do Tesouro Nacional Joaquim Levy poderá assumir o Ministério da Fazenda, o mercado brasileiro esboçou uma reação positiva. O Ibovespa - principal índice do mercado acionário brasileiro -, que estava testando o patamar de 54 mil pontos atingiu a máxima de 56.214 pontos (alta de 5,26%).

No fechamento, registrou alta de 5,02%, aos 56.084 pontos, a maior valorização desde 9 de agosto de 2011, quando subiu 5,1%. Na semana, acumulou elevação de 8,33%, mais do que apagando a perda de 2,72% acumulada até sexta-feira passada. No mês, o índice registra alta de 2,67% e, no ano, ganho de 8,89%. O giro financeiro totalizou R$ 12,233 bilhões.

O anúncio do novo ministro da Fazenda era esperado para esta sexta-feira, mas foi adiado, segundo fontes do Palácio do Planalto. Não há detalhes sobre o motivo de Dilma deixar a divulgação para depois. A notícia, porém, foi suficiente para influenciar a Bolsa e o dólar, que fechou em queda de 2,26%.

A alta da Bolsa pela manhã se deu em razão de China e Europa. Pequim anunciou um corte na taxa de juros, pela primeira vez desde julho de 2012, de modo a incentivar o avanço da economia. Com a notícia, os preços das empresas vendedoras de commodities foram estimulados, com destaque para Vale e as mineradoras europeias. Vale ON teve alta de 6,45% e Vale PNA subiu 6,93%.

A China também anunciou pela primeira vez dados de suas reservas de petróleo, ao comentar que elas são formadas por 91 milhões de barris, e disse trabalhar para ter instalações capazes de armazenar 500 milhões de barris até 2020. A título de comparação, nos EUA as reservas somam 727 milhões de barris.

Neste cenário, Petrobrás disparou tanto nos papéis ON quanto nos PN, com os investidores também aproveitando para ir às compras após os recuos mais recentes. O papel ordinário da estatal teve alta de 11,17% e o preferencial avançou 11,89%.

Outros ministros. Além de Levy, circulou na imprensa que o ex-secretário executivo do Ministério da Fazenda Nelson Barbosa, que também estava sendo cogitado para a Fazenda, deve assumir o Ministério do Planejamento. Carlos Hamilton, diretor de Política Econômica do Banco Central, deve deixar a instituição para assumir a Secretaria do Tesouro. Alexandre Tombini deverá permanecer na presidência do BC.

Também circulou a informação de que a senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) assumiria o comando do Ministério da Agricultura no segundo mandato de Dilma.(Com Fabrício de Castro e

Dilma convida Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda

• Presidente convida Alexandre Tombini a permanecer no Banco Central

• Escolha de Levy teve apoio de Lula e aval de Trabuco, primeira opção para a pasta; mercado reage bem

Vera Magalhães, Andréia Sadi, Valdo Cruz, Mariana Haubert e Julia Borba – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff convidou Joaquim Levy para assumir o Ministério da Fazenda e Nelson Barbosa para o Ministério do Planejamento. O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, foi convidado para permanecer no posto.

Os escolhidos aceitaram os convites para a equipe econômica, mas o governo decidiu adiar para a próxima semana o anúncio oficial.

A ida de Levy para a Fazenda teve apoio do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Teve também o aval do presidente do Bradesco, Luiz Trabuco, primeira opção de Dilma para o lugar de Guido Mantega. Trabuco recusou o convite para atender ao pedido do presidente do Conselho de Administração do banco, Lázaro Brandão, que quer que o executivo o suceda.

Com a postergação do anúncio, no entanto, assessores do Palácio do Planalto passaram a dizer que a presidente ainda pretende definir a área em que cada um atuará. As escolhas devem ser divulgadas até quinta-feira (27).

O mercado reagiu bem à antecipação do convite a Levy, que foi secretário do Tesouro na equipe do ex-ministro Antonio Palocci e hoje é diretor-superintendente da Bradesco Asset Management.

Nelson Barbosa, ex-secretário-executivo da Fazenda, atualmente é professor da Fundação Getulio Vargas.

Durante a semana, Dilma conversou com os três futuros auxiliares separadamente. Ela ouviu cada um sobre os cenários econômicos de 2015 e todos concordaram que deve haver um ajuste fiscal no começo do ano.

Além disso, avaliaram que será um bom sinal ao mercado corte de despesas com seguro-desemprego, pensões por morte e abono salarial a fim de aumentar a economia feita pelo setor público para pagar juros da dívida. "Ela teve a sinalização de que haverá unidade na nova equipe", revelou um ministro.

O governo deve divulgar na próxima semana um pacote fiscal para garantir economia de gastos de 2% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2015. Neste ano, o Tesouro deve fechar com deficit primário.

Depois que a composição da equipe econômica vazou, primeiramente naFolha e depois nos demais jornais e sites, houve reação de setores do PT e do governo.

Um dos principais conselheiros de Dilma na montagem do governo, Aloizio Mercadante (Casa Civil) é um dos que manifestam dúvida sobre a nomeação de Levy, considerado próximo do PSDB e de Armínio Fraga, que seria o titular da Fazenda num governo de Aécio Neves (PSDB).

Pessoas próximas a Levy, no entanto, dizem que ele dificilmente deixará sua posição no Bradesco se não for para comandar a economia. Da mesma forma, o nome de Tombini é considerado de baixa densidade num momento em que a economia patina e o governo precisa emitir sinais de força para o mercado. "Seria transformar o Ministério da Fazenda de uma vez em secretaria", opinou um membro do governo.

Surpresa
Ontem, a Bolsa subiu cerca de 5% e o dólar caiu 2%, com a expectativa do anúncio da nova equipe. Meia hora antes de o mercado fechar, no entanto, o Planalto divulgou que o anúncio não ocorreria nesta sexta (21).

Dilma quer divulgar o pacote completo'' na economia: Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Agricultura e os bancos públicos, como Banco do Brasil e BNDES.

Outra versão é que o Planalto quis esperar a votação do projeto de lei que altera a Lei de Diretrizes Orçamentárias no Congresso, o que permitirá o descumprimento da meta fiscal.

Presidente também atende à indústria e ao agronegócio

• Kátia Abreu, da CNA, e Monteiro, ex-CNI e senador do PTB, vão para pastas da Agricultura e do Desenvolvimento

Ricardo Brito e Nivaldo Souza - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A decisão da presidente Dilma Rousseff de indicar os senadores Armando Monteiro (PTB-PE) e Kátia Abreu (PMDB-TO) para ocupar, respectivamente, os ministérios do Desenvolvimento (MDIC) e da Agricultura tem por objetivo reaproximá-la dos dois setores. Ao mesmo tempo, Dilma busca isolar o líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), dos movimentos que costura para presidir a Casa Legislativa a partir de 2015.

O convite feito por Dilma para Kátia Abreu irrita principalmente o PMDB da Câmara. Atual presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), ela vai ocupar um ministério que hoje é da "cota" dos deputados do partido, com aliados de Cunha integrando a pasta. A indicação não agradou à bancada peemedebista. Um dos integrantes disse que se a presidente fez isso, ela vai ter de dar a eles outro ministério para "compensar".

O ex-ministro Antônio Andrade (MG) teria saído da pasta em março com a promessa de Dilma de que ele indicaria um deputado para ser o titular da Agricultura em 2015, caso ele conseguisse uma boa vantagem eleitoral para a presidente em Minas. Andrade venceu a eleição mineira como vice na chapa do governador eleito Fernando Pimentel (PT) e estaria trabalhando para emplacar o deputado Mauro Lopes (PMDB-MG) no ministério.

A bancada peemedebista do Senado também não considera que ganharia mais uma pasta com a indicação de Kátia Abreu. A avaliação é de que a senadora reeleita é uma neófita na sigla - saiu do DEM e passou pelo PSD antes do PMDB - e não seria um "espaço" para a legenda. Um senador do partido definiu Katia como "um nome bom", mas que seria da cota pessoal de Dilma.

Atualmente, o PMDB tem cinco pastas: Minas e Energia, com o senador licenciado Edison Lobão; Previdência, com o também senador licenciado Garibaldi Alves Filho; Agricultura, com Neri Geller; Turismo, com Vinícius Lages; e Aviação Civil, com Moreira Franco.

No caso da escolha de Armando Monteiro, a intenção é tentar levar o PTB a apoiar uma candidatura à presidência da Câmara que será lançada pelo PT para tentar derrotar Cunha. O partido elegeu 25 deputados e terá três senadores a partir do ano que vem.

Ao Estado, Monteiro reconheceu que o partido tem seu "peso" na Congresso. Sem entrar em detalhes, ele disse que, durante a conversa que teve com Dilma ontem, discutiu também a situação política atual. Para ele, porém, uma eventual confirmação sua para o MDIC, seria uma indicação da "cota pessoal" da presidente.

Nomes para banco públicos também começam ser definidos

Renata Veríssimo - O Estado de S. Paulo

Apesar de ter descartado para esta sexta-feira, 21, o anúncio dos novos ministros, a formação do ministério para o segundo mandato de Dilma Rousseff começa a ganhar forma. Além de Armando Monteiro Neto para o Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), a presidente Dilma Rousseff também teria decidido manter Luciano Coutinho à frente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Segundo uma fonte ouvida pelo Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado, Coutinho ficará como presidente da instituição pelo menos no primeiro ano do segundo mandato da presidente.

Dilma avisou hoje pela manhã ao ministro do Desenvolvimento, Mauro Borges, que ele não ficará no cargo. Um interlocutor próximo ao ministro acredita que ele deve compor a equipe do governo eleito de Minas Gerais, Fernando Pimentel, de quem é amigo e trabalhou junto no governo Dilma. Borges ajudou o então ministro Pimentel na elaboração da política industrial do governo e foi presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI).

Borges, segundo fonte, não pretende esperar até o final do ano para deixar o cargo. A informação que circula é a de que Monteiro Neto deve tomar posse já nos próximos dias. Esse pode ser o destino também do ministro da Fazenda, Guido Mantega. Interlocutores do governo admitem que ele pode não esperar até 31 de dezembro para deixar o cargo.

Além do BNDES, uma fonte disse que a presidente também teria decidido que não haverá mudança na Caixa. O petista baiano Jorge Hereda tem a simpatia de Dilma e é muito ligado ao governador da Bahia, Jaques Wagner. Hereda ocupa a presidência da Caixa desde 2011, quando foi alçado ao cargo, depois de exercer a vice-presidência de Governo da instituição.

Dilma fará mudança, no entanto, na presidência do Banco do Brasil. O secretário executivo do ministério da Fazenda, Paulo Rogério Caffarelli, continua sendo o mais provável para substituir Aldemir Bendine.

Planalto vaza nomes, Bolsa sobe, mas Dilma não confirma

• Joaquim Levy será o novo ministro da Fazenda

• Nelson Barbosa assumirá o Ministério do Planejamento.

• Governo vai esperar aprovação da nova meta fiscal para fazer anúncio oficial. Nomes agradam ao mercado, e Bovespa sobe 5%, maior alta em três anos. Escolha de Kátia Abreu para Agricultura irrita o PMDB

Martha Beck e Eliane Oliveira - O Globo

BRASÍLIA - Contrariando expectativas, o governo decidiu não anunciar oficialmente os novos ministros nesta sexta-feira. O GLOBO confirmou, no entanto, que o ex-secretário do Tesouro Joaquim Levy será o novo ministro da Fazenda no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. O ex-secretário executivo da Fazenda Nelson Barbosa vai assumir o Ministério do Planejamento.

Barbosa foi chamado por Dilma e se reuniu com a presidente nesta sexta. Auxiliares presidenciais afirmaram que Barbosa, Levy e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, devem formar o núcleo duro da área econômica. Além deles, a senadora Kátia Abreu (PMDB-GO) é a mais cotada para assumir a pasta da Agricultura.

Levy ajudou Antonio Palocci, quando este assumiu o Ministério da Fazenda, no ajuste fiscal realizado nos primeiros meses do governo Lula, em 2003.

Carioca e especialista em contas públicas, Levy foi chefe da assessoria econômica do Ministério do Planejamento, na gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Também foi subsecretário de Política Econômica da Fazenda e, em seguida, passou a secretário do Tesouro, cargo que deixou, três anos depois, para assumir a vice-presidência de Finanças e Administração do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). De lá, foi convidado para ser secretário da Fazenda do estado do Rio, no primeiro mandato do governador Sergio Cabral.

A confirmação do nome de Joaquim Levy para substituir Guido Mantega ocorre após o governo ter sondado o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, na quinta-feira. Procurado pelo Planalto, o executivo recusou o convite. Segundo interlocutores da presidente, Trabuco seria um bom nome para o mercado, mas sua ida para o governo implicaria contornar uma série de questões societárias e de sucessão no Bradesco.

— Houve uma operação para trazer Trabuco para o governo, mas não deu certo — contou um ministro.

Diretor do Bradesco, Levy é nome bem visto pelo mercado

• Especialista em contas públicas, economista ajudou no ajuste fiscal no governo Lula

Eliane Oliveira – O Globo

BRASÍLIA - Nome bem-visto pelo mercado, o carioca Joaquim Levy foi secretário do Tesouro Nacional na gestão do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci num momento difícil da economia, quando Luiz Inácio Lula da Silva assumiu a Presidência da República, em 2003. Levy foi um dos responsáveis pelo ajuste fiscal feito à época, que deu credibilidade ao governo e pôs as contas em ordem.

Especialista em contas públicas, Levy foi chefe da assessoria econômica do Ministério do Planejamento, na gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Também foi subsecretário de Política Econômica da Fazenda e, em seguida, passou a secretário do Tesouro, cargo que deixou, três anos depois, para assumir a vice-presidência de Finanças e Administração do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). De lá, foi convidado para ser secretário da Fazenda do estado do Rio, no primeiro mandato do governador Sérgio Cabral.

Atualmente, Levy é diretor-superintendente do Bradesco Asset Management (Bram), com a tarefa de consolidar seu processo de internacionalização. Sua ida para a Fazenda foi uma indicação do presidente do Conselho de Administração do Bradesco, Lázaro Brandão.

Nascido em 1961 no Rio de Janeiro e formado em Engenharia Naval, o novo ministro da Fazenda é doutor em Economia pela Universidade de Chicago. Por isso, sua linha de atuação é mais afinada com o pensamento econômico em defesa do livre mercado e distante da linha desenvolvimentista de Dilma.

A indicação de Levy para ministro da Fazenda foi bem recebida pelo mercado financeiro. Um executivo ouvido pelo GLOBO classificou-o como preparado para o desafio: “alguém que conhece bem as políticas públicas e também o sistema financeiro”.

— É alguém preocupado em criar uma agenda positiva para os empresários. O maior problema do Brasil é a crise de confiança — disse o executivo, acrescentando que, se ele aceitou o cargo, é porque obteve garantia de liberdade de ação à frente da Fazenda. — Ele é um cara que trabalha sete (dias) por 24 (horas).

Sob o comando de Levy, o patrimônio cuidado pela gestora de recursos do Bradesco passou de R$ 184 bilhões, em junho de 2010, para os atuais R$ 335 bilhões. Já, quando era secretário do Tesouro, Levy foi o responsável por zerar a cobrança de Imposto de Renda para investidores estrangeiros em títulos públicos, o que ajudou a atrair mais recursos para o país.

No mesmo período, Levy levou a melhor numa queda de braço com Henrique Meirelles, então o poderoso presidente do Banco Central. Levy defendeu que as emissões de títulos da dívida externa do país, atribuição que era do BC, passassem para a ser feitas pelo próprio Tesouro Nacional. E ganhou a briga. O Tesouro, hoje, é quem cuida de suas captações externas.

Nos três anos e meio que ficou à frente da Secretaria estadual de Fazenda do governo do Rio, Joaquim Levy foi responsável por criar o modelo de gestão fiscal que ajudaria o governo a ter sucessivos recordes de arrecadação. E o modelo foi organizado a partir de algumas medidas, entre elas, a reestruturação da Secretaria, que não fazia concurso para novos fiscais há 17 anos.

O governador Luiz Fernando Pezão aprovou a escolha. Quando Levy era secretário de Fazenda, o atual governador ocupava a Secretaria de Obras do estado, e teve que botar a pasta para funcionar com pouco dinheiro:

— Ele é botafoguense doente igual a mim. Vai ver tudo de perto, acompanha tudo. É um grande executivo. Não tinha ninguém melhor no mundo para juntar dinheiro igual a ele. Nos dois primeiros anos do governo (Cabral), a tesoura cantou. (No ministério) Acredito que ele vai virar o jogo em um ano.

Integrantes do governo Cabral confirmam que ele é da linha ortodoxa e não gosta de improvisar. No Rio, estendia a jornada até tarde da noite para cumprir as metas do governo. Mas mantinha a rotina de visitar, de tempos em tempos, a família que ficou nos Estados Unidos, quando ele se transferiu para o Rio.

Levy estava em Paris com Cabral, outros secretários e o empresário Fernando Cavendish, em 2009, no episódio batizado pela imprensa como a “farra dos guardanapos”. Em fotos divulgadas à época, Cabral e alguns secretários aparecem celebrando com guardanapos na cabeça. Levy, no entanto, não está entre eles.

Convite a Katia Abreu para Agricultura abre crise com PMDB

• Cúpula do partido se revolta por não ter sido consultada e ameaça impedir votação da meta fiscal

Fernanda Krakovics - O Globo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff convidou, na última quarta-feira, a senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), que é presidente da Confederação Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), para assumir o Ministério da Agricultura, e ela aceitou. Porém, o vazamento da informação, nesta sexta-feira, abriu uma crise no comando do PMDB, que não foi consultado. Pegos de surpresa, peemedebistas ameaçam se unir à oposição e implodir a votação do projeto de lei que altera a meta fiscal na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2014, caso o governo confirme oficialmente a ida da senadora para a pasta.

Filho da senadora, o deputado federal Irajá Abreu (PSD-TO) chegou a parabenizar a mãe na rede de microblogs Twitter, “por mais essa conquista”. Irajá, que também reproduziu uma notícia informando que sua mãe fora convidada para o ministério e havia aceitado, acabou retirando a publicação da rede social.
Atualmente, o Ministério da Agricultura é da cota dos peemedebistas da Câmara, e Kátia é considerada uma “cristã nova” na bancada do Senado. Ela trocou o PSD pelo PMDB há apenas ano, e há senadores peemedebistas mais antigos na fila por um ministério.

Dilma ainda não abriu a conversa com os partidos sobre a reforma ministerial. Segundo peemedebistas, a informação do Palácio do Planalto era que a presidente estava tratando apenas da equipe econômica, que pretendia inicialmente anunciar ontem. Só depois ela negociaria os demais ministérios. O vice-presidente da República, Michel Temer, que é presidente do PMDB, não foi informado sobre o convite feito à Kátia e só ficou sabendo ontem, quando a informação vazou.

Hoje, o PMDB tem cinco ministros: Edison Lobão (Minas e Energia), Garibaldi Alves (Previdência), Moreira Franco (Aviação Civil), Neri Geller (Agricultura) e Vinícius Lages (Turismo). Parte do partido defende a permanência de Geller na Agricultura. Ele também tem como padrinho o senador Blairo Maggi (PR-MT).

A saída de Lobão do Ministério de Minas e Energia é dada como certa. Ele ficou desgastado depois de ter sido citado no escândalo da Petrobras. O ministro nega envolvimento no esquema de desvio de dinheiro. Ainda assim, diante do aprofundamento da operação Lava-Jato, da Polícia Federal, a presidente deve tirar o PMDB do comando da pasta e colocar alguém de sua confiança.

Aproximação gradual
Com a devassa que está sendo feita pela Polícia Federal e pela Justiça na Petrobras, vinculada ao Ministério de Minas e Energia, integrantes do PMDB afirmam que a pasta virou um “pepino” e que o partido não faria questão de mantê-la. Mesmo assim, vão tentar uma compensação.

Egressa do DEM, Kátia Abreu foi um dos expoentes da oposição na gestão de Lula. A aproximação do governo foi feita em etapas. Primeiro, ela se filiou ao PSD, criado pelo ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab para dar suporte ao governo, mas que, num primeiro momento, adotou postura de independência. Ela se aproximou de Dilma durante a discussão do marco regulatório dos portos, matéria de interesse da bancada ruralista para escoamento da produção.

Ministérios: Dilma arrisca para mostrar que não está refém da Lava-Jato

• As escolhas de Armando Monteiro e Kátia Abreu para o governo são uma tentativa da presidente demostrar que não está refém das denúncias na Petrobras. Nomes, contudo, passam longe da unanimidade

Paulo de Tarso Lyra, Grasielle Castro - Correio Braziliense

Embora tenha adiado o início da reforma ministerial, a presidente Dilma Rousseff convidou ontem dois nomes políticos de peso para compor a sua futura equipe de trabalho: o senador Armando Monteiro Neto (PTB-PE) para o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic) e a senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) para o Ministério da Agricultura. Com isso, a presidente tenta passar o recado de que as pastas políticas não ficarão refém da Operação Lava-Jato e da lista de parlamentares envolvidos nas denúncias de corrupção na Petrobras, o que poderia adiar a formação do novo governo para depois de janeiro. Pelo movimento da petista, isso não deve ocorrer.

Monteiro e Kátia, embora não sejam unanimidades nas legendas às quais são filiados nem nos setores que, em tese, representam, são considerados pelo Planalto nomes representativos para estabelecer um diálogo com empresários e ruralistas. Além disso, tiveram papel preponderante durante a corrida eleitoral: o petebista concorreu ao governo de Pernambuco, ao lado do PT; e a peemedebista comprou a briga por Dilma Rousseff junto de representantes do agronegócio, avessos à presidente e declaradamente simpatizantes à candidatura do tucano Aécio Neves (PSDB-MG).

No caso de Armando Monteiro, há ainda uma outra questão: Dilma sinaliza com gratidão a Pernambuco, estado que lhe deu quase 2 milhões de votos de vantagem sobre Aécio no segundo turno das eleições, apesar da família do ex-governador Eduardo Campos ter declarado apoio ao presidenciável tucano.

Interlocutores pernambucanos, contudo, pontuam que Monteiro, apesar de hábil, tem pouco trânsito com os empresários que comandam o PIB nacional. Os representantes da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) e da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) são rompidos com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), que foi presidida por Monteiro por oito anos durante o governo Lula.

O jogo de cena na Fazenda - O Estado de S. Paulo / Editorial

Ninguém com pelo menos dois neurônios funcionando pode ter-se surpreendido com o fato de o presidente do Bradesco, Luiz Trabuco, ter gentilmente recusado o convite de Dilma Rousseff para se tornar ministro da Fazenda. Trabuco compareceu ao Palácio da Alvorada acompanhado de Lázaro Brandão, o presidente do Conselho do banco, sabendo que estava apenas cumprindo o dever de cortesia que a situação impunha. Não estivesse a presidente reeleita trabalhando com uma lista espantosamente pequena de nomes cogitados para o cargo, seria o caso de afirmar que ela nunca teve a intenção de ter o presidente de um dos maiores bancos do País à frente do Ministério da Fazenda, e só chamou Trabuco a Brasília porque sabia que o convite não seria aceito. Seu objetivo era fazer publicamente um gesto de simpatia e "confiança" ao mercado.

O fato é que toda a movimentação do Palácio do Planalto em torno da escalação do Ministério do segundo mandato, em particular da pasta da Fazenda, demonstra que não se pode esperar, a partir do ano que vem, uma presidente da República diferente daquela que o País conheceu nos últimos quatro anos, à frente de uma administração comprovadamente incompetente: ideologicamente sectária e pessoalmente autoritária e intransigente. Dilma Rousseff é intervencionista por formação e militância e como tal nutre extrema desconfiança - se não completa aversão - pelo empreendedorismo privado.
Esse perfil é completado por um temperamento irascível, que se manifesta diante de qualquer contrariedade. Que o digam os auxiliares que com ela convivem, inclusive os ministros.

A renovação de um mandato presidencial não significa necessariamente a necessidade de reformulação do primeiro escalão do governo. Partindo do princípio de que não se mexe em time que está ganhando, a unanimemente reconhecida necessidade da escalação de novos auxiliares para cargos importantes como o de ministro da Fazenda revela apenas que a chefe do governo e seu criador sabem muito bem que nos últimos quatro anos quase tudo deu errado.

Essa questão foi colocada nas eleições de outubro e democraticamente resolvida nas urnas. Dilma Rousseff será a presidente de todos os brasileiros por mais quatro anos e como tal deve ser aceita e respeitada.

Resta, portanto, a cada um cumprir seu papel na discussão nacional sobre a formação do novo governo, emblematicamente simbolizada pelos entendimentos para a escolha do sucessor de Guido Mantega no Ministério da Fazenda. Um ministro que, aliás, tem todos os motivos para não estar nada satisfeito com o fato de que sempre fez rigorosamente tudo o que a chefe mandou e agora é descartado como se fosse o responsável único pelo mau desempenho da economia.

Se dependesse de Lula, que sempre exibiu poderosa intuição e forte sensibilidade política, a condução da economia voltaria a ser entregue a um ministro mais identificado com o mercado e capaz de recuperar a confiança dos empreendedores nacionais e dos investidores estrangeiros. Não há, afinal, outra maneira de o País voltar a crescer social e economicamente.

Dilma, porém, é teimosa. Jamais se disporá a abrir mão da prerrogativa de comandar ela própria a política econômica, o que significa que provavelmente o País continuará a ter mais do mesmo.
Diante disso, é praticamente certo que o novo ministro da Fazenda - que não havia sido escolhido até o momento em que escrevíamos este editorial - será alguém disposto a colocar sua biografia a serviço dos desígnios de uma chefe de Estado obcecada pela ideia anacrônica de que o Estado é fim e não meio.

Receber convite para assumir a pasta da Fazenda sempre foi motivo de orgulho e honra para qualquer homem público. Hoje essa investidura parece estar restrita a quem estiver disposto a pagar o preço de - em troca de alguma notoriedade passageira - levar a culpa se as coisas não derem certo ou aplaudir a chefe na improbabilidade de ocorrer o contrário.

Técnicos alertaram para ‘consolidação de danos’ após veto de Lula

• Equipe do Congresso emitiu parecer sobre riscos três dias após o então presidente barrar suspensão de obras da Petrobrás em 2010

Ricardo Galhardo - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - No dia 29 de janeiro de 2010, três dias depois de o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetar uma decisão do Congresso que determinava a suspensão de quatro obras da Petrobrás suspeitas de irregularidades, técnicos da Câmara e do Senado emitiram uma nota conjunta que alertava para a "consolidação de danos" na estatal caso o veto presidencial fosse mantido.

De acordo com os técnicos do Congresso, as justificativas apresentadas por Lula para vetar a suspensão das obras não mencionam em momento algum as irregularidades graves apontadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). No veto, o então presidente se refere aos indícios de corrupção como "pendências".

Na época, os técnicos do Congresso já alertavam que a decisão de Lula de permitir a continuidade das obras, apesar dos graves indícios de irregularidades, poderia provocar prejuízos irreparáveis à estatal – o veto acabou mantido pelos congressistas.

Passados mais de quatro anos, as quatro obras liberadas pelo petista são citadas pelos envolvidos na Operação Lava Jato como fontes de recursos que alimentaram o esquema de corrupção na Petrobrás.

Graças à decisão de Lula, foram repassados mais de R$ 13 bilhões para as obras nas refinarias de Abreu e Lima (PE), Presidente Getúlio Vargas (Repar), Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) e o complexo de Barra do Riacho (ES). O custo total dos empreendimentos é de mais de R$ 80 bilhões.

Em meados de 2009, o TCU alertou o governo sobre indícios de superfaturamento, pagamentos indevidos, obstrução dos trabalhos de fiscalização e omissão de documentos por parte da Petrobrás, nas quatro obras. Para o tribunal, os indícios eram suficientes para pedir a paralisação das obras. Meses depois, o Congresso acatou a recomendação e determinou ao governo, em um anexo da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2010, a suspensão dos repasses. Lula contrariou a determinação, vetou a decisão do Congresso e permitiu a continuidade das obras suspeitas.

Nas justificativas para o veto, o então presidente alegou que a paralisação provocaria demissão de 25 mil trabalhadores, além de prejuízos mensais de R$ 268 milhões por "degradação" dos trabalhos já realizados e de outros R$ 577 milhões em função do atraso da produção.

Disse ainda que algumas obras estavam 90% prontas e que havia "consenso" entre TCU, Congresso e governo sobre a criação de um grupo de trabalho que permitiria corrigir as irregularidades sem parar as obras. Os técnicos rebateram dizendo que o cálculo não leva em conta os prejuízos causados pelas irregularidades.

Simplismo. "Raciocínios simplistas que ponderem apenas uma parte desta equação, ou seja, apenas o prejuízo causado pela paralisação e não o dano decorrente da continuidade de empreendimentos", diz a nota.

Segundo os técnicos, a análise parcial dos contratos de apenas dois empreendimentos (Abreu e Lima e Comperj) aponta prejuízo de R$ 250 milhões decorrentes de superfaturamento e pagamentos por equipamentos não utilizados.

Em março de 2010, numa visita à Repar ao lado da então pré-candidata a presidente Dilma Rousseff, Lula usou a manutenção dos empregos para justificar o veto. Segundo ele, os trabalhadores não poderiam pagar pela desconfiança do TCU.

"Se tem que fazer investigação, que façam, se tem que apurar, que apurem, mas não vamos fazer com que um trabalhador, um brasileiro que está levando o pão para sua casa, fique desempregado porque alguém está desconfiando de alguma coisa", disse Lula.

O governo nega que a gestão de Lula não tenha dado a devida atenção às suspeitas. Segundo a Casa Civil, ainda em setembro de 2009, antes, portanto, do veto presidencial, a Corregedoria-Geral da União foi acionada pela então ministra Dilma para apurar as suspeitas. Na mesma época, o grupo de acompanhamento do Programa de Aceleração de Crescimento também foi acionado para examinar o relatório do TCU.

Ainda de acordo com o governo, em uma reunião realizada no dia 20 de janeiro de 2010, seis dias antes do veto presidencial, TCU, Casa Civil, Ministério de Minas e Energia e Petrobrás decidiram acompanhar a solução das irregularidades em "reuniões regulares que efetivamente ocorreram".

O governo alega ainda que no ano seguinte o Congresso retirou o embargo às obras e em 2013 o próprio TCU também deixou de recomendar a suspensão dos repasses para os quatro empreendimentos da estatal.

A Petrobrás não negou a acusação de obstrução à fiscalização. Segundo a assessoria da estatal, "Petrobrás e TCU estão em constante processo de entendimento".

Permitir prejuízo ao erário público é improbidade

• Se o TCU descobrir irregularidades graves, o Legislativo pode sustar a execução de contratos

Carlos Ari sundfeld – O Estado de S. Paulo

Cabe ao Tribunal de Contas da União e ao Congresso Nacional a fiscalização externa da administração federal. Se o TCU descobrir irregularidades graves, o Legislativo pode sustar a execução de contratos, evitando, assim, prejuízos para os cofres públicos. No projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2010, o Congresso, alertado por seu órgão auxiliar, que é o Tribunal de Contas, incluiu a previsão de que certos contratos da Petrobrás seriam paralisados.

Mas como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou a sustação, alegando que a medida seria prejudicial e que providências corretivas estariam em curso, chamou a si uma responsabilidade que em princípio não era sua.

O risco é ficar provado que o veto não tinha fundamento. Em condições normais nem o presidente nem a Casa Civil, à época comandada pela hoje presidente Dilma Rousseff, envolvem-se diretamente com contratos das estatais, que são autônomas. Mas nesse caso os contratos só seguiram em curso depois de uma ação direta da cúpula do Executivo federal.

Permitir ou concorrer para que alguém cause prejuízo ao erário público é improbidade administrativa, punida judicialmente com suspensão dos direitos políticos de até oito anos e multa. Em tese, Lula e Dilma poderão ter problemas se ficar provado que agiram maliciosamente - com dolo - ou de modo imprudente ou negligente - com culpa.

Carlos Ari sundfeld é professor de Direito Administrativo da FGV Direito SP

Área técnica foi contra compra da ‘Ruivinha’

• Pasadena era chamada de ‘ruivinha’ após Petrobras constatar que ela estava enferrujada

• Apelido, dado mesmo antes da compra, foi revelado pelo diretor financeiro da Petrobras em depoimento à Comissão Interna de Apuração da estatal

Eduardo Bresciani – O Globo

A ‘ruivinha’ que deu prejuízo

BRASÍLIA - A polêmica refinaria de Pasadena já era malvista pela área técnica da Petrobras desde o início do processo de avaliação para a aquisição. O desconforto era tal que a refinaria americana tinha um curioso apelido dados por funcionários antes da realização da compra. O diretor financeiro da Petrobras, Almir Barbassa, que no cargo desde 2003, contou em depoimento à Comissão Interna de Apuração que a refinaria era chamada de “ruivinha”, e explicou o motivo mostrando o desconforto com o negócio: Pasadena estava toda enferrujada.

“Pessoas desta sede viajaram para avaliação in loco, e houve reação negativa dessas pessoas, que não gostaram do que viram e apelidaram a refinaria de ruivinha, porque estava tudo enferrujado. Havia sentimento muito negativo, mas também desejo muito forte da área Internacional de que o negócio ocorresse”, disse Barbassa em 13 de maio deste ano.

Apontado no relatório da comissão como principal articulador do negócio e responsável em dez das 11 irregularidades levantadas pela investigação interna, o ex-diretor da área Internacional Nestor Cerveró atribuiu o mau estado de conservação à falta de preocupação dos americanos com “aparência”. Ele foi ouvido antes de Barbassa, em 5 de maio.

“Questionado sobre as recomendações iniciais das avaliações, com itens apontando deficiências, o depoente declara que as refinarias nos EUA não têm a mesma preocupação com a aparência como ocorre com as da Petrobras (meio-fio pintado de branco, tanques pintados etc.)”, registra o extrato do depoimento do ex-diretor internacional. Cerveró foi além, dizendo que eventuais problemas nunca foram apontados pela área técnica como “algo inaceitável ou irreparável”. Destacou que a refinaria nunca tinha sido proibida de operar nos EUA.

Prejuízo chega a US$ 530 milhões
O GLOBO teve acesso ao relatório da comissão e aos extratos dos depoimentos prestados. Além de Cerveró, foram apontados como responsáveis pelas irregularidades o ex-presidente José Sérgio Gabrielli, os ex-diretores Paulo Roberto Costa e Jorge Zelada e cinco funcionários. O documento foi encaminhado à área jurídica, para se avaliar a obrigatoriedade de enviá-lo ao Ministério Público Federal. A refinaria foi comprada da belga Astra Oil por US$ 1,25 bilhão, em 2 operações. A Petrobras já reconheceu prejuízo contábil de US$ 530 milhões.

Em seu depoimento, Barbassa fez diversas críticas ao negócio. Para ele, o processo de compra foi “bem rápido”, e a Diretoria Internacional tinha autonomia “muito grande” e adotava procedimentos “mais simplificados”. Destacou que a compra da 1ª metade começou a ser negociada no fim de 2005, e em fevereiro de 2006 já foi aprovada pela Diretoria Executiva e pelo Conselho de Administração. Barbassa disse que a diretoria, em fevereiro, não sabia das cláusulas Marlim e “put option”, que garantiam rentabilidade mínima à sócia e obrigavam a Petrobras a comprar a 2ª metade em caso de desacordo comercial. Afirmou que as cláusulas estavam no anexo XXX e só foram conhecidas após aprovado o negócio. Mas frisou que isso ocorreu antes da assinatura do contrato, em setembro de 2006. Disse que o negócio não foi desfeito pois, na Diretoria Internacional, “havia muita vontade de levar adiante”.

Barbassa contou que só em 2007 sua diretoria conseguiu precificar a cláusula Marlim, e passou-se a saber quanto representariam os 6,9% de rendimento mínimo à Astra. Não disse qual seria esse custo, mas frisou não ser usual que se oferecesse ao vendedor parte do que seria ganho no futuro. Observou que a ampliação da refinaria para 200 mil barris/dia foi adiante mesmo estando no contrato a manutenção em 100 mil barris/dia. Isso gerou briga com a sócia. Afirmou que a compra da 2ª metade foi negociada para se livrar das duas cláusulas. Barbassa disse que Pasadena deu prejuízo todos os anos até 2013 e defendeu seu fechamento.

Cerveró apoiou a condução do negócio. Disse não ser comum se alongar sobre “cláusulas de saída” quando se negocia proposta de compra. Seu advogado, Edson Ribeiro, enviou depois carta registrando que a responsabilidade pela compra era do Conselho de Administração, então presidido pela presidente Dilma. Gabrielli também defendeu na comissão a lisura da compra. Em depoimento em 7 de maio, destacou a necessidade de, naquele momento, investir-se em refino no exterior. Costa respondeu a perguntas da comissão antes da delação premiada. Seu atual advogado, João Mestieri, disse que o ex-diretor “não teve nada a ver” com a compra de Pasadena. Mas não comentou a informação de que na delação Costa admitiu ter recebido US$ 1,5 milhão para não atrapalhar o negócio.

Barusco confessa ter recebido US$ 22 milhões da holandesa SBM

• Ex-gerente de diretoria da estatal diz ter embolsado mais de R$ 100 milhões

Jailton de Carvalho – O Globo

BRASÍLIA - Depois de fazer acordo de delação premiada, o ex-gerente da diretoria de Serviços da Petrobras Pedro Barusco confessou ter recebido US$ 22 milhões em propina da SBM, empresa holandesa de afretamento de navios-plataforma. Ao todo, o ex-gerente afirma ter recebido mais de US$ 100 milhões na intermediação de contratos entre grandes empresas e a maior estatal brasileira. O ex-gerente confessou também que recebe propina por negócios escusos na Petrobras há 18 anos, disse ao GLOBO uma pessoa vinculada à investigação.

Barusco fez a confissão num dos depoimentos que vem prestando ao Ministério Público Federal e à Polícia Federal em Curitiba desde que decidiu firmar um acordo de delação premiada com a força-tarefa encarregada das investigações da Lava-Jato. Pelo acordo, Barusco se comprometeu a devolver cerca de US$ 100 milhões, algo em torno de R$ 253 milhões, o maior volume de dinheiro que um investigado resolve devolver aos cofres públicos a partir de uma investigação criminal no país.

São US$ 97,5 milhões depositados em contas no exterior e mais R$ 6,5 milhões que estão guardados em contas bancárias no Brasil. Do total em reais, Barusco vai devolver R$ 3.250.000 para o Ministério Público em Curitiba, que investiga fraudes na Petrobras a partir de negócios do ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa e do doleiro Alberto Youssef com grandes empreiteiras. Outros R$ 3.250.000 serão entregues ao Ministério Público Federal no Rio de Janeiro, que está à frente das investigações sobre pagamentos de propina de representante da SBM para ex-diretores e funcionários da Petrobras.

Os valores das propinas confessadas por Barusco por iniciativa própria surpreenderam até mesmo autoridades acostumadas a investigar grandes escândalos financeiros. Um dos investigadores quis saber como o engenheiro tinha acumulado tamanha fortuna. Os recursos são suficientes para financiar uma campanha à Presidência da República. Barusco respondeu que recebe propina por negócios nebulosos na Petrobras desde 1996. Por isso, teria acumulado mais dinheiro desviado que outros ex-diretores.

Cúmplice de Duque
Barusco é apontado como um dos supostos cúmplices do ex-diretor de Serviços Renato Duque. O ex-diretor teria sido indicado para o cargo pelo PT. Ele nega. Durante um dos depoimentos, um dos investigadores perguntou se parte do dinheiro desviado pelo engenheiro teria algum partido ou grupo político como destinatário. Barusco respondeu negativamente. “Esta era a parte da casa”, disse.

Barusco negociou o acordo de delação por intermédio da advogada Beatriz Catta Preta. O acordo foi assinado na última terça-feira. O engenheiro decidiu colaborar porque foi avisado pelo amigo Júlio Camargo, executivo da Toyo Setal, que seria denunciado. Com receio de ser preso, ele se antecipou e começou a contar tudo. Barusco se aposentou na Petrobras em 2010 e, a partir daí, foi diretor de Operações da Sete Brasil, empresa que tem contrato de US$ 80 bilhões com a Petrobras.

Juiz quebra sigilo de empresas de Youssef até este mês

• Decisão de Sérgio Moro estende período de apuração da Lava-Jato

Cleide Carvalho - O Globo

SÃO PAULO - A Justiça Federal do Paraná determinou a quebra do sigilo bancário das empresas GFD Investimentos, Empreiteira Rigidez e RCI Software no período de 1º de janeiro a 14 de novembro de 2014. As três são empresas de fachada usadas pelo doleiro Alberto Youssef para repassar propinas a agentes políticos. A decisão, do juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal, estende o período de apuração da Operação Lava-Jato para 2014. Até agora, só vinham sendo apurados fatos e movimentações financeiras ocorridos entre 2009 e 2013.

O pedido feito pelo Ministério Público Federal (MPF) abrange a campanha eleitoral deste ano. A Polícia Federal e o MPF suspeitam que as propinas obtidas no superfaturamento de obras da Petrobras tenham sido doadas a partidos políticos ou diretamente a campanhas eleitorais. Dessa forma, a doação estaria sendo usada como forma de lavagem de dinheiro desviado da estatal, uma vez que a propina entraria legalmente no caixa dos partidos e dos políticos.

Doações A PP e PMDB
A Lei dos Partidos permite que empresas doem dinheiro mesmo em ano eleitoral e não há limite de valores. Proíbe apenas doações de entidades ou governos estrangeiros, autoridades e órgãos públicos, autarquias, empresas públicas ou concessionárias de serviços públicos, sociedades de economia mista e fundações mantidas por órgãos ou entidades governamentais, além de entidades de classe ou sindical. O dinheiro pode ser usado em mais de uma eleição e os critérios de distribuição são definidos pelos próprios partidos. Na prática, as autoridades querem descobrir se a Lei dos Partidos foi burlada e se o dinheiro desviado da Petrobras irrigou partidos e campanhas.

Documentos apreendidos na Operação Lava-Jato indicam que Youssef teria intermediado doações para diretórios e deputados do PP e do PMDB na eleição de 2010. Num dos e-mails interceptados pela PF, o doleiro tratou de doações com representantes da Queiroz Galvão e da Jaraguá Equipamentos. Segundo requerimento da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Petrobras, os valores citados corresponderam aos declarados à Justiça Eleitoral. “O PP nacional apareceu em uma conversa entre Youssef e Morais (Othon Zanoide de Morais Filho, da Queiroz Galvão) no dia 17 de agosto de 2010 como destinatário de uma doação de R$ 500 mil que deveria ser registrada em nome da Vital Engenharia, uma das empresa do grupo Queiroz Galvão. O mesmo diretório apareceu também em outra troca de e-mails entre os dois como beneficiário de R$ 2,04 milhões”, diz o documento da CPMI. O TSE registra doações de R$ 500 mil da Queiroz Galvão e de R$ 2,24 milhões da Vital Engenharia ao PP em 2010.

Empresa entrou em liquidação
A Jaraguá Equipamentos fechou contratos de R$ 2,215 milhões com a Petrobras entre 2009 e 2014 e um de R$ 508 milhões em consórcio com a Engesa, com 11 aditivos. Após a Lava-Jato, a empresa entrou em recuperação judicial. Seu dono, Álvaro Garcia, um torneiro mecânico que começou com uma empresa de 10 funcionários em Osasco, afirma estar em depressão. O executivo Paulo Dalmazzo, que dirigia a Jaraguá, afirmou à Justiça que repassou R$ 1,9 milhão à MO Consultoria, empresa usada pelo doleiro, para intermediar contratos com a Petrobras. Entre 2010 e 2012, a Jaraguá Equipamentos depositou R$ 4,5 milhões na conta do PT.

O advogado Adriano Bretas, que defende Youssef, disse ontem que as delações premiadas terminam na próxima semana. De acordo com o advogado, Youssef só deve voltar a falar na próxima semana. Nas alegações da ação que Youssef responde por remessas ilegais por meio da Labogen, a defesa afirma que a investigação alcança quatro deputados federais: André Vargas (ex-líder do PT), Cândido Vaccarezza (PT-SP), Vicente Cândido (PT-SP) e Luiz Argolo (SD-BA). (Colaborou: Fabiana Genestra)

Ação contra formação de cartéis falha no caso da Petrobras – O Globo / Editorial

• Surpreende que as evidências de superfaturamento em grandes obras e encomendas da estatal não tenham chamado a atenção dos órgãos de defesa da concorrência

Desde que a Suprema Corte dos Estados Unidos tomou a célebre decisão, em maio de 1911, que obrigou John Rockefeller a desmembrar a Standard Oil (que na época dominava o mercado de petróleo) em várias companhias, com base na lei antitruste (Sherman) do país, os mecanismos de proteção à concorrência evoluíram em todo o mundo. Grandes fusões e incorporações são submetidas à aprovação dos órgãos de defesa da concorrência antes de se concretizarem, para evitar excessiva concentração de mercado. No Brasil, os ministérios da Fazenda e da Justiça investigam abusos de poder econômico e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) tem competência para multar ou coibir tentativas de cartelização. Agências reguladoras também participam desse esforço, estabelecendo marcos regulatórios para atividades e serviços sob concessão pública ou para os chamados monopólios naturais. Em paralelo, o consumidor conta com uma legislação que o apoia.

Quando se trata de preços finais de bens e serviços, a ação de cartéis e acordos entre empresas concorrentes são muitas vezes detectados quando visivelmente provocam “dumping” (uma manipulação destinada a asfixiar concorrentes indesejáveis) ou destoam dos parâmetros de mercado.

No entanto, em obras e encomendas de grande porte, contratadas pelo setor público ou por companhias estatais, o aparato que combate e tenta inibir a cartelização não se mostra tão eficaz, tantas são as denúncias e casos investigados pelos tribunais de contas, controladorias e Polícia Federal. São chocantes as revelações feitas pela Operação Lava-Jato em relação a contratos superfaturados em grandes obras e serviços da Petrobras, especialmente na área de abastecimento de combustíveis (refinarias e outras instalações). Ressalvada a ação do Tribunal de Contas da União, os órgãos de controle e auditoria falharam na prévia detecção das combinações de preços e condições que camuflaram esses superfaturamentos, fonte de alimentação do pagamento de propinas. Os valores envolvidos no esquema de corrupção são aterradores, demonstrando igualmente fragilidade no sistema de combate à lavagem de dinheiro. Os recursos têm origem em pagamentos formais, contabilizados nas empresas, com movimentação bancária. Passaram-se anos até que a atividade de um doleiro reincidente fosse enfim percebida em um esquema criminoso envolvendo executivos da Petrobras e de empreiteiras.

Todo esse episódio sugere mudanças nos controles internos da Petrobras e de outras companhias estatais. Mas as instituições responsáveis, inclusive o Congresso, precisam atuar no aperfeiçoamento da legislação e no uso dos mecanismos já disponíveis de combate à cartelização e de controle externo.

Porta aberta para as especulações

- Zero Hora (RS)

A previsão era de que o anúncio da equipe econômica sairia ontem à tarde, os repórteres correram para o Palácio do Planalto, os nomes vazaram, e a Presidência informou que não haveria anúncio algum. Restou a dúvida: seria apenas um capricho da presidente, irritada com o vazamento, ou reviravolta nas escolhas?

O trio considerado certo para comandar a equipe econômica tem duas características em comum: conhecimento da área e perfil discreto. Joaquim Levy e Nelson Barbosa são técnicos, já passaram pela área econômica do governo Lula, e, mesmo não sendo os preferidos do mercado, não são repudiados. A permanência de Alexandre Tombini segue a mesma lógica: a atuação dele na presidência do Banco Central é sóbria, como tem de ser.

As especulações sobre a equipe econômica tiveram boa receptividade, porque a bolsa subiu 5%, as ações da Petrobras recuperaram parte do valor perdido e o dólar caiu. Registre-se que, durante toda a sexta-feira, o mercado operou sob efeito da informação de que o preferido para a Fazenda, Luiz Carlos Trabuco, do Bradesco, recusara o convite para ser ministro.

As outras especulações não chegam a provocar surpresa, porque os protagonistas são líderes das áreas para as quais estão cotados: Armando Monteiro no Ministério do Desenvolvimento e Kátia Abreu na Agricultura.

Monteiro foi presidente da poderosa Confederação Nacional da Indústria. Entra na cota do PTB, mas o que menos importa na indicação é o partido. O fato de ter sido derrotado na eleição para o governo de Pernambuco não inviabiliza sua indicação, porque a interpretação corrente é de que ele perdeu para um mito, o falecido Eduardo Campos.

Por estranho que pareça, Kátia Abreu é candidata natural, mesmo tendo sido filiada ao PFL, ao DEM e ao PSD. Desde que migrou para o PMDB, a senadora de Tocantins passou a ser cogitada para o Ministério da Agricultura. Presidente da Confederação Nacional da Agricultura, Kátia se aproximou de Dilma no primeiro mandato e se manteve fiel durante a campanha, apesar da preferência do setor pelo candidato Aécio Neves.

Marco Aurélio Nogueira - No fio da navalha

- O Estado de S. Paulo

Há uma dissonância querendo crescer no Planalto. Ela dá o ar da graça mediante uma velha conhecida das esquerdas no mundo todo. Pode ser assim apresentada: quanto mais complexas parecem ser as tarefas do governo reeleito, mais deveriam as forças que o apoiam pressioná-lo a ir para a esquerda, ou seja, a radicalizar suas posições, seu discurso, suas políticas e suas alianças. Se o raio de manobra diminuiu, a melhor saída seria "empoderar" o governo pela via do movimento social, libertando-o dos gargalos que lhe impõem o sistema político e a estrutura econômica.

Todos reconhecem, sem exceção, que ficou mais difícil a situação do governo, em que pese Dilma ter vencido a eleição. Há o megaevento da Petrobrás, cujos desdobramentos não se consegue prever, há o rombo nas contas públicas, a disputa pela presidência da Câmara, o crescimento econômico que não desponta e a inflação que persiste, a educação e a saúde a latejar, tudo isso combinado com a presença de uma oposição mais forte e a necessidade que o governo terá de formar nova maioria no Congresso sem se deixar levar pela chantagem excessiva do PMDB e de seus aliados.

O governo estará obrigado a dedicar tempo e atenção à política, negociar mais e melhor, dialogar de verdade, buscar novas fontes de legitimação e recuperar o tempo perdido, fazendo tudo isso com uma marca clara de inovação. Não poderá simplesmente reproduzir o toma-lá-dá-cá que tem prevalecido nas relações Executivo-Legislativo ou a rotina das políticas assistencialistas dos últimos anos, que deverão ser sustentadas e consolidadas sem que sejam tidas como a única marca registrada da ação governamental. Se o governo forçar a mão, poderá perder parte de seus apoios e comprar briga com o mercado; sua base parlamentar, aliás, que operou em regime de engorda crescente ano após ano, bateu no teto. Se mantiver tudo como está, poderá terminar engessado e frustrar os eleitores que viram na reeleição da presidente a possibilidade de "mudar mais". Caminhará, pois, no fio da navalha.

Um Ministério "mais qualificado" é esperado tanto pelo mercado quanto pelo PT, mas por motivos distintos. Os operadores econômicos querem uma equipe que estabilize e promova crescimento, ao passo que o partido quer nomes que agreguem suas correntes e seus militantes, ajudando-os a permanecer no campo da mudança e do reformismo social. O País, por sua vez, espera que a presidente lhe apresente uma agenda para o futuro.

A "reforma política", que está na ordem do dia, não poderá ser o principal recurso para enfrentar o furacão que se anuncia. Corrupção casa com financiamento eleitoral, mas tem mil tentáculos. Governos podem funcionar seja qual for o sistema de voto. E uma reforma política, por mais bem-sucedida que venha a ser, não produzirá efeitos imediatos nem sobre a dinâmica política, nem sobre a governabilidade, pouco servindo, portanto, para melhorar o desempenho governamental.

O momento indica que o PT deve reposicionar-se. Sua direção nacional fala em "construir hegemonia na sociedade". Se a expressão for bem traduzida, poderá significar que o partido dará maior atenção à elaboração de uma cultura que sirva de parâmetro para a educação política dos brasileiros, podendo até implicar maior questionamento das ações governamentais. Isso jogaria o PT mais no longo que no curto prazo, mais na guerra de posição que na guerra de movimento. O partido, porém, deseja atuar, "em conjunto com partidos de esquerda", para desencadear um amplo processo de mobilização social.

Como disse o governador Tarso Genro (RS) - defensor de uma reestruturação profunda do PT -, o partido "deve deixar de ser mero apoiador-espectador, excessivamente preocupado com cargos e espaços na máquina pública, para se tornar um partido apoiador-proponente, disputando os rumos do governo". Sua proposta põe em xeque o sistema de alianças em vigor, o que significaria aumentar a distância do PMDB: "O governo da presidenta Dilma deve não só ser defendido da direita tradicional dos tucanos, mas também da direita que integra sua própria base parlamentar". Cabe ao PT ser "o núcleo de sustentação mais coerente das medidas progressistas e democráticas do segundo governo Dilma".

Uma "frente de esquerda" voltou assim a frequentar os discursos petistas.

O contraponto tem sido feito pelo ministro Gilberto Carvalho, um dos mais próximos do ex-presidente Lula. Para ele, o momento é de valorizar o diálogo tanto para "reunificar o País" quanto para sanar deficiências que se acumularam. Imprimir outro curso ao governo, corrigir falhas e erros, mas sem implodir a base parlamentar duramente construída, mantendo próximos e unidos todos os partidos que apoiam o governo, sem vetos.

O PT da "frente de esquerda" distingue-se do PT do "diálogo" à direita, mas ambos se compõem: o governo governaria com a aliança à direita e o partido o pressionaria pela esquerda, ativando os movimentos sociais, numa espécie de "duplo poder", o do governo e o do partido.

Diante disso, três questões ficam em aberto. A primeira é se o diagnóstico acerta ao constatar a existência de forças e movimentos de esquerda para integrar uma frente como a pretendida; mesmo que existam, elas podem não ter disposição para atuar de modo unitário. A segunda é se a união dessas correntes encontraria respaldo efetivo no PT e ajudaria o governo. E a terceira tem que ver com o que a "frente de esquerda" fará com os democratas liberais e a esquerda democrática não petista. Se empurrá-los em bloco para a "direita", estará praticando uma infâmia e turbinando as oposições. O mais razoável seria agregá-los ao "novo ciclo reformista" que se deseja inaugurar em 2015. Para isso, porém, a "frente de esquerda" precisaria ser convertida numa "frente democrática", proposta para a qual a cultura petista majoritária não se mostra suficientemente preparada.

Professor titular de Teoria Política e diretor do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais da UNESP

Merval Pereira - Cenário positivo

- O Globo

A escolha do economista Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda, ainda dependente de confirmação oficial, pegou o ex-ministro Maílson da Nóbrega, hoje um conceituado consultor, em meio a uma palestra organizada pela Rede Gazeta de Notícias em Pedra Azul, no Espírito Santo. Ele saudou a escolha, que parece promissora para a tomada de decisões do segundo governo de Dilma, indicando um retorno à racionalidade econômica.

Levy na Fazenda, previsivelmente com poderes para tomar as medidas necessárias e até impopulares, enquadra-se também num cenário que a Macroplan, empresa especializada em estratégia e estudos prospectivos, está elaborando para o Brasil 2015-2018, o terceiro cenário, e menos provável. Assim como Maílson considera uma mudança de rumos na economia como também menos provável, mas que, diante da escolha de Levy, ganhou nova força.

O que Maílson teme é que a presidente Dilma não tenha condições políticas para garantir a atuação de Levy nos dois primeiros anos, que serão muito duros e sofrerão muitas críticas de alas do PT que já o criticavam antes, quando era secretário do Tesouro do então ministro Palocci.

Eu também temo que Levy não tenha um ambiente favorável para exercer todo o poder de que necessitará, Em uma coluna recente, escrevi que Dilma escolher um ministro da Fazenda como Henrique Meirelles ou Trabuco, do Bradesco, seria como dar um salto triplo carpado. Bem que ela tentou, mas a escolha de Levy, sem tanto peso político, também representa um avanço no quadro econômico muito bem-vindo.

O economista Cláudio Porto, da Macroplan, chamou esse cenário de ""reforma política e retorno da racionalidade econômica" que encerraria um aparente paradoxo, pois emergiria de uma grave crise político-institucional em razão de impactos intensos e amplos do "petrolão" associados com uma aguda deterioração de expectativas econômicas em 2015.

Como conseqüência benigna, experimenta o desenrolar de uma ""Operação Mãos Limpas à brasileira" com a punição de corruptores e corrompidos, o que torna praticamente inevitável a reforma política, a "repactuação da governabilidade" e conseqüente redirecionamento da política econômica"pró~mercado"" com uma progressiva reabertura da economia e reconquista da confiança dos principais agentes econômicos em relação ao Brasil.

Neste cenário, o setor privado é o principal "motor" do crescimento, e o "tripé macroeconômico" é revigorado com disciplina fiscal, metas de inflação rigorosas e decrescentes, e câmbio flutuante.

Porto não afirma isso, mas a escolha de Levy para a Fazenda pode ser o indício de que a presidente Dilma está antevendo os desdobramentos do caso da Petrobras e antecipou-se às conseqüências possíveis tentando controlar a parte econômica.

No cenário da Macroplan, o Brasil experimenta uma recessão ou baixo crescimento e aumento temporário do desemprego provavelmente em 2015 e 2016, mas segue uma trajetória semelhante à do primeiro mandato do ex-presidente Lula, com PIB predominantemente ascendente (média entre 3% e 3,5% ao ano) e inflação declinante, podendo chegar a 3,5% em 2018.

Com o prever qual cenário se concretizará? A resposta a essa pergunta, revela Cláudio Porto, presidente da Macroplan, não é nada fácil no atual momento. "Não se pode esquecer que o Brasil chega ao fim do primeiro mandato da presidente Dilma na iminência de uma crise aguda"

As expectativas em relação ao futuro estão sendo conduzidas não apenas pelo conjunto de indicadores econômicos previsíveis no horizonte, mas também em função do quadro político-institucional associado ao desdobramento do atual processo do "petrolão" E antecedentes históricos recentes em nosso país apontam que algumas vezes, se nao chegamos a um "final feliz" pelo menos reorientamos nossas rotas rumo a um "porto seguro".

Renato Andrade - A volta da tesoura

- Folha de S. Paulo

Depois de uma semana de convites, recusas, reuniões secretas, planos A, B, C e boatos, muitos boatos, o governo entra na última semana de novembro com um desenho relativamente pronto da equipe que irá comandar a economia brasileira a partir de 2015.

Até o início da noite de sexta-feira (21), a presidente Dilma Rousseff já tinha escolhido três nomes de peso: Alexandre Tombini, Nelson Barbosa e Joaquim Levy, a grande surpresa.

O anúncio oficial do time só não foi feito porque falta definir um elemento fundamental neste xadrez econômico: qual dos três irá sentar na cadeira de ministro da Fazenda.

A decisão será tomada pela presidente neste fim de semana. O mais provável, ao que tudo indica, é colocar Levy no lugar de Guido Mantega, deixar o Planejamento para Nelson Barbosa e manter Tombini onde ele esteve nestes últimos quatro anos --no comando do Banco Central.

Entregar para Levy as rédeas da Fazenda seria o sinal mais eloquente dado até agora pela presidente sobre o que pretende fazer com a política de controle de receitas e despesas a partir do ano que vem.

Levy cuidou do caixa federal no início do governo Lula. Não era admirado pelos petistas. É daqueles economistas que acreditam que controlar gastos não é pecado, é obrigação de quem assume a responsabilidade de administrar o dinheiro público.

O carioca é a antítese de uma figura emblemática do primeiro mandato da petista: o gaúcho Arno Augustin, atual secretário do Tesouro.

Arno entrará para a história econômica brasileira como o "pai" das manobras e pedaladas adotadas pelo governo federal para "cumprir" as obrigações fiscais assumidas, mesmo não tendo feito isso na prática.

Considerando o que Levy fez durante seu período à frente do Tesouro Nacional de Lula, a Fazenda voltará a usar um instrumento que ficou praticamente esquecido na gaveta do gabinete ministerial: a tesoura

Miriam Leitão - Quase equipe

- O Globo

A escolha de Joaquim Levy para o Ministério de Fazenda tem o poder de alimentar esperanças entre empresas e mercado, tanto que a bolsa subiu com a notícia, depois adiada. Levy tem excelente reputação, desempenhou com eficiência os cargos que ocupou, mas está sendo montada uma equipe heterogênea e não ficou claro se ele terá poder. Aliás, nada ficou claro.

Essa trapalhada de anuncia e depois adia o anúncio passou a ideia de improviso e instabilidade, mas o mercado está demandando tanto otimismo que concluiu que é só uma questão de tempo para se confirmar como ministro o economista Joaquim Levy. Em um segundo momento, as outras questões, óbvias, serão consideradas, mas ontem foi dia de a bolsa comemorar mesmo sem a confirmação oficial.

O maior desafio de Levy será conviver com tanta gente que pensa bem diferente dele. Ele terá que começar escolhendo alguém de peso e competência para o cargo que já ocupou. A Secretaria do Tesouro está em grave crise de credibilidade pela desastrada atuação do atual secretário, Arno Augustin. Ainda não está afastada a ameaça de que Augustin permaneça no governo, e os dois não são compatíveis, para dizer o mínimo. Augustin foi preterido por Palocci, em 2003, em favor de Joaquim Levy. No Palácio, haverá também em posição de poder outra pessoa da qual Levy já discordou muito no passado: o ministro-chefe da Casa Civil, e economista, Aloizio Mercadante.

Será preciso pôr um fim imediato às alquimias fiscais, o que deixará claro o grau de deterioração nas contas públicas. Em um debate público, em 2003, logo no início do governo Lula, o então presidente do BNDES Carlos Lessa defendeu a mudança na Lei de Responsabilidade Fiscal e o então todo poderoso ministro José Dirceu disse que o governo cumpria a lei, mas não se conformava com o seu rigor. Levy respondeu que não havia motivos para mudanças na lei e que ela havia mostrado “eficácia e flexibilidade”.

Nelson Barbosa se preparou para o cargo de ministro desde que saiu do governo após 10 anos trabalhando com Guido Mantega, ora no Planejamento, ora na Fazenda. Na Fundação Getúlio Vargas, ele continuou sendo interlocutor frequente de pessoas do governo. A operação de sua saída foi vista como preparação para voltar ministro, mas da Fazenda. Nas conversas e entrevistas, ele passou a se distanciar de algumas posições de Guido Mantega. Disse numa entrevista para mim em fevereiro deste ano que não havia mais espaço fiscal para desonerações porque o país estava com dificuldades nas contas. As desonerações continuaram e ontem o governo anunciou a micrometa de superávit de R$ 10 bilhões. No começo do ano, a meta era de R$ 116 bilhões.

O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, fica mais forte com um ministro da Fazenda mais fiscalista, porque isso retira o peso que está hoje todo em cima da política monetária. Mas se houver um grande conflito em torno do aperto nas contas públicas, Joaquim Levy brigará sozinho.

Em artigo publicado recentemente com o título “Robustez fiscal e qualidade do gasto como ferramentas do crescimento”, Joaquim Levy defendeu teses que são consideradas heréticas no atual governo, como: mudar o foco da dívida líquida para a dívida bruta; adotar um primário de 2,1% do PIB sem truques para reduzir a dívida pública a 50% até 2018; entrar para a OCDE; moderar transferências e subsídios, inclusive para empresas; parcimônia no uso das desonerações; explicitar a trajetória para o gasto corrente do governo.

Há três cenários: ou ele muda e se adapta; ou ele dura pouco no cargo; ou o governo muda. A terceira é a mais improvável.

Celso Ming - Condições adversas

• O governo Dilma parece não ter se dado conta de que os ventos mudaram. Continua imaginando que o Brasil é eternamente abençoado por Deus, o que dispensa criatividade e trabalho, e que o resto do mundo está sempre pronto a curvar-se

- O Estado de S. Paulo

A nova equipe econômica assumirá suas funções num momento em que o Brasil já não se impõe como a grande promessa de potência econômica.

De uns anos para cá, o B do Brics é percebido como um gigante metido em enroscos que não sabe aproveitar as oportunidades que surgem.

O governo Dilma parece não ter se dado conta de que os ventos mudaram. Continua imaginando que o Brasil é eternamente abençoado por Deus, o que dispensa criatividade e trabalho, e que o resto do mundo está sempre pronto a curvar-se.

Se a cada meta econômica não atingida o governo culpa a crise externa é, também, porque não parece ter entendido que a maré virou.

Há alguns anos, o Brasil era visto como grande oportunidade na área das commodities, porque o setor estava bombando, graças à grande demanda por matérias-primas provocada pelo arranque da China. Foi o que levou gigantes da mineração e do petróleo a fazer loucuras só para estar no País. Este parece ter sido o principal fator que favoreceu as lambanças aprontadas pelo empresário Eike Batista.

Este ciclo se inverteu e as cotações das commodities escorregam por um vasto tobogã, não propriamente por redução da demanda global – que continua crescendo -, mas porque os preços atraentes estimularam a produção em toda parte e a oferta disparou.

Ninguém sabe nem quando nem em que nível irão parar as cotações. Essa até agora inigualável fonte de riquezas vai rareando, como veio de minério em fase de esgotamento. A política econômica do segundo mandato Dilma terá de ser formatada sob condições adversas de temperatura e pressão.

Ainda na semana passada, a presidente Dilma apontava para o afluxo anual de US$ 60 bilhões em Investimentos Estrangeiros Diretos (IEDs) e concluía que o investidor externo não está atacado pelo mesmo desânimo demonstrado pelo investidor brasileiro. Mas, tomado assim, com casca e tudo, este pode ser um indicador enganoso.

O capital estrangeiro ainda aflui não porque esteja entusiasmado com o desempenho da economia brasileira e de suas perspectivas, mas, em parte, porque não tem muita opção; e, também, porque já está aqui e não pode deixar seus projetos pela metade.

As estatísticas mostram que cada vez menos investimentos se destinam à indústria brasileira, cujo futuro está minado pela baixa produtividade e pela falta de políticas voltadas para sua recuperação. Além disso, a ameaça de que os títulos de dívida do Brasil sejam rebaixados pelas agências de classificação de risco é muito grande. Isso, por si só, tende a reduzir os investimentos por aqui.

Também não dá mais para contar com o rápido crescimento econômico. O Brasil se notabiliza hoje por ser um país com baixíssimo nível de poupança, mais preocupado em consumir o que produz do que em investir.

Não se pode esperar, também, que o mercado de trabalho continue a fornecer farta mão de obra a baixos custos. Mesmo com esses PIBs miseráveis, o mercado de trabalho está cada vez mais estreito, situação de pleno-emprego. Um aumento da velocidade de crescimento teria de contar com o aumento da produtividade do trabalho, o que não é tarefa para resultados imediatos.

Ferreira Gullar expõe no Rio peças em metal e aço

• Fruto de um passatempo do poeta, colagens em relevo são lançadas em edição com livro artesanal

Nani Rubin – O Globo

RIO — Hábil como poucos com as palavras, o poeta Ferreira Gullar mantém há cerca de 20 anos um passatempo que expõe outro talento seu, menos conhecido do público, mas admirado por tantos amigos que o visitam em seu apartamento de Copacabana: o manejo de papéis e tesoura, em colagens que disputam cada espacinho vago nas paredes superpovoadas da casa. Se, como assevera Gullar, “o poema nasce do espanto” — e, por falta de espanto, de sua pena não tem saído poesia ultimamente —, as colagens são uma obra do acaso, um lance de pata de seu gato Gatinho, que certo dia mexeu nos papéis sobre a mesa, provocando uma desordem criativa.

Pois essas colagens, que já deram origem a dois livros, os infantis “Zoologia bizarra” e “Bichos do lixo”, e há pouco tempo começaram a virar tridimensionais, com tiras que saltam do papel, se retorcem e revelam o outro lado, foram transformadas agora em peças de aço e metal. São 30 diferentes obras, em tiragens de três, cada, que acompanham um requintado livro artesanal, com fotografias de Nana Moraes e poemas do próprio autor (cada livro, vendido por R$ 12 mil, contém uma obra). “A revelação do avesso — Colagens em relevo de Ferreira Gullar”, é editado pelo UQ!, selo de livros artesanais da Aprazível Edições, de Leonel Kaz e Lucia Bertazzo, em conjunto com a Dan Galeria, de São Paulo, e vem numa imponente caixa de madeira. O lançamento no Rio acontece neste sábado, a partir das 16h, na Graphos: Brasil, onde as colagens ficarão expostas até 6 de dezembro.
Gullar, que costuma apontar reiteradamente, em sua coluna semanal na “Folha de S.Paulo”, o que considera a falta de sentido de parte da produção de arte contemporânea, diz que não teme virar “vidraça”:

— Não estou preocupado com isso. Primeiro porque não me considero artista plástico. Fiz como hobby, não estou preocupado com crítica, não quero ser consagrado como artista plástico. Faço por prazer. Mas, de qualquer maneira, acho que há uma diferença muito grande entre fazer uma coisa como essa, que visa a dar alegria, agradar às pessoas, e botar cocô na lata (referência à obra “Merda d’artiste”, feita pelo italiano Piero Manzoni em 1961) ou urubu na gaiola (alusão ao trabalho "Bandeira branca”, que Nuno Ramos apresentou na Bienal de São Paulo de 2010). É algo muito diferente, não tem nada a ver uma coisa com a outra. Sempre fui a favor da criação na obra de arte, defendi todas as vanguardas, pratiquei vanguarda como poeta... Minha posição não é de crítico conservador, mas as coisas têm um limite. O cara dizer que colocar um urubu dentro da gaiola é fazer arte... não há Jesus Cristo que me convença disso.

De volta às artes visuais, após meio século
As colagens em relevo marcam o retorno de Gullar às artes visuais, décadas após o “Manifesto neoconcreto" (1959), por ele redigido, em que defendia a experimentação nas artes e a importância da intuição em sua criação, em contraponto ao racionalismo acentuado do grupo concreto de São Paulo. Parte de uma turma que congregava, entre outros, Amilcar de Castro, Hélio Oiticica, Lygia Clark e Lygia Pape, Gullar produziu, na época, os poemas-objetos e o “Poema enterrado”, construído na subsolo da casa do fotógrafo José Oiticica Filho, pai de Hélio.

— O que nós fizemos no neoconcreto foram obras de arte. Que desenvolviam, davam desdobramento à arte concreta — defende.

Os poemas-objetos eram cubos de diferentes cores, com uma palavra escrita numa plaquinha de madeira sob eles. A ideia era que depois de manuseados pelo espectador, e depois de revelada a palavra (“Lembra” era uma delas), o cubo, ao ser devolvido ao lugar, já não era o mesmo, pois havia uma palavra pulsando dentro dele. O “Poema enterrado” surgiu como um desdobramento disso: uma sala de 3m x 3m, com um cubo vermelho, dentro do qual havia um cubo verde. Este, por sua vez, trazia um cubo branco onde havia a palavra “rejuvenesça”. Gullar frisa que essas experimentações “não tinham nada a ver com épater, escandalizar as pessoas”:

— Era um trabalho que se inseria dentro da pesquisa que nós todos estávamos fazendo: a Lygia com os “bichos”, o Oiticica com os objetos dele, o Amilcar com as esculturas. Escandalizar não era a minha.

A ideia de arte de Gullar é clara. E, para não haver dúvida, ele cita Tom Jobim. Quando perguntavam ao maestro por que fazia música, ele respondia: “Para dar prazer às pessoas”.

— Arte é para dar alegria, não é para torturar as pessoas. Mesmo quando se faz algo dramático, uma peça, por exemplo, não é para torturar. É para expressar e superar o drama que se está vivendo. A arte é a superação do sofrimento, da banalidade. Agora, o sujeito fazer uma arte que é a própria banalidade, isso é antiarte.


Aos 84 anos, completados em 10 de setembro, o autor do aclamado “Poema sujo” (1976), vencedor do prestigiado Prêmio Camões de literatura (2010), recém-eleito para a Academia Brasileira de Letras (a posse será no dia 5 de dezembro), conta que, em princípio, não pensava em expor suas obras, surgidas como algo despretensioso. Mais tarde, aceitou mostrá-las. E, depois, acabou persuadido a fazer o livro. Na introdução, ele escreve: “Me convenceram, alegando que não importava se eu sou ou não artista plástico; importava é que as colagens em relevo eram bonitas e originais. Tomei-me de entusiasmo e continuei a produzir estas colagens em relevo, que me divertem muito. Se são arte ou não, pouco importa, já que não me pretendo artista mesmo”, diz.

Futuramente, “A revelação do avesso” terá uma segunda tiragem, com 30 novas peças. Em papel de algodão importado do Japão, totalmente artesanal, o volume traz conhecidos poemas de Gullar que parecem feitos sob medida para ilustrar as colagens. Na caixa já vem impresso um trecho de “Improviso matinal”: “como um barulho/ a manhã/ se desembrulha/ no ar”.

Quanto aos poemas, ele não faz planos.

— O poema nasce de alguma coisa que revela a estranheza do mundo, ou a beleza, aí está criado o clima para escrever a poesia. Se não tem esse clima, não se escreve. E, se escrever, sai ruim. Muitos poetas consagrados caíram na bobagem de fazer poesia sem o espanto, para mostrar que continuam poetas. Eu estou pouco me lixando. Se eu parar de fazer poesia, parei. Imagina, um dia eu vou parar de viver. Parar de fazer poesia é o mínimo.

A revelação do avesso”
Onde: Graphos: Brasil — Rua Siqueira Campos 143 sobreloja 129, Copacabana (2255-8283)

Quando: Lançamento do livro hoje, às 16h; exposição de seg a sex, das 10h às 19h, sáb, das 10h às 14h. Até 6 de dezembro.

Quanto: Grátis

Classificação: Livre