terça-feira, 8 de março de 2016

Opinião do dia – Alberto Aggio

"O “otimismo da vontade” indica que sobram razões para ir à rua, especialmente quando se trata de superar um governo que tem sua legitimidade manchada pela corrupção e se mostra incapaz de reaver sua credibilidade para enfrentar a crise. O “pessimismo da inteligência” nos alerta que o País precisa se reorganizar e buscar reformas que tornem o Estado mais republicano, aberto à participação e mais eficiente."

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*Alberto Aggio é historiador e professor titular da Unesp. ‘Outra vez, as ruas’, O Estado de S. Paulo, 7.3.2016

Donos de Odebrecht e OAS já negociam delação

• Executivos das duas empreiteiras querem acordo conjunto

Expectativa dos investigadores da Lava- Jato é que informações obtidas durante a colaboração ajudem a esclarecer a relação entre as empresas e os imóveis ligados ao ex-presidente Lula

Antes resistente à delação premiada, o empresário Marcelo Odebrecht, dono da Odebrecht, elabora, com o proprietário da OAS, Léo Pinheiro, uma proposta conjunta de colaboração com o Ministério Público Federal. Os dois empreiteiros, na expectativa dos investigadores, ajudariam a esclarecer as relações entre os dois grupos e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. As duas construtoras ajudaram nas reformas do sítio em Atibaia usado por Lula. A OAS também é investigada pelas obras feitas no tríplex de Guarujá. Preso desde junho de 2015, Marcelo Odebrecht, acusado de corrupção e lavagem de dinheiro, deve ser sentenciado na 13 ª Vara Federal de Curitiba nos próximos dias.

Delações simultâneas

• Marcelo Odebrecht e Léo Pinheiro negociam propor, juntos, acordos de colaboração com a Lava- Jato

Jailton de Caravalho - O Globo

BRASÍLIA - Os empresários Marcelo Odebrecht e Léo Pinheiro, que comandavam duas das maiores empreiteiras envolvidas no escândalo de corrupção na Petrobras — a Odebrecht e a OAS —, estão fechando um acordo entre eles para, em seguida, começar a negociar colaboração premiada com a força-tarefa do Ministério Público Federal à frente das investigações da Operação Lava- Jato. A informação foi passada ao GLOBO por uma pessoa ligada a um dos executivos.

Numa operação casada, Marcelo e Léo Pinheiro querem se colocar à disposição dos procuradores para delatar o que sabem sobre a corrupção na Petrobras e em outras áreas da administração pública. Em troca, pretendem receber os benefícios previstos em lei, assim como outros réus da Lava- Jato. O acordo, segundo a fonte, não envolve combinação de versões entre os executivos. O plano é os dois fazerem opções simultâneas por uma mesma tentativa de resolver o problema.

— O acordo de colaboração de um está casado com o do outro — disse ao GLOBO uma pessoa que acompanha de perto as tratativas entre as partes.

Um dos objetivos da decisão dos donos da Odebrecht e da OAS é salvar as duas empresas de prejuízos irreversíveis ou até mesmo da bancarrota, caso as investigações da Lava- Jato se prolonguem por tempo indefinido. Uma ação conjunta a favor de acordos de delação evitaria, segundo a fonte, um futuro descompasso entre as duas gigantes da construção civil. Odebrecht e OAS acham que uma ação isolada de uma das empreiteiras poderia ser fatal para uma ou para ambas. Uma iniciativa simultânea reduziria riscos.

A delação dos dois empresários poderia ser explosiva. A Odebrecht e a OAS estão entre as maiores financiadoras de campanhas eleitorais no país. As duas empresas também teriam papel fundamental no esclarecimento sobre as questões levantadas na 24 ª etapa da Lava- Jato: as relações entre os dois grupos e o ex-presidente Lula. As empreiteiras fizeram um consórcio informal para fazer reformas em sítio de Atibaia (SP) usado por Lula. O sítio está em nome de Fernando Bittar e Jonas Suassuna. A força-tarefa investiga se o sítio pertence ao ex-presidente.

Os investigadores querem saber também por que a OAS fez reforma num apartamento tríplex no Guarujá. O apartamento era destinado a Lula, mas ele anunciou o desinteresse em ficar com o imóvel depois que os gastos da OAS no empreendimento passaram a ser investigados. Odebrecht e OAS estão entre as cinco empreiteiras que mais repassaram dinheiro para o Instituto Lula e para a LILS Palestras e Eventos, a empresa responsável pelas palestras do ex-presidente.

Segundo a fonte, representantes dos dois empresários participam da negociação, e os dois grupos têm pressa em chegar logo a um desfecho, por questões financeiras e penais.
Pinheiro, que está em prisão domiciliar, já foi condenado a 16 anos de cadeia. Se a condenação for confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4 ª Região, Pinheiro voltará imediatamente à prisão em regime fechado.

A situação de Pinheiro se complicou especialmente depois de deliberação do Supremo Tribunal Federal, mês passado, sobre a execução penal. Para o tribunal, o cumprimento da pena começa a partir da ratificação de condenação em segunda instância e não do trânsito em julgado do processo, como ocorria anteriormente.

O caso de Marcelo Odebrecht é diferente, mas as perspectivas deles não são melhores. O executivo, que está preso em Curitiba desde 19 de junho do ano passado, sabe que tem poucas chances de sair da prisão diante do volume de acusações que surgem sobre o envolvimento da empresa dele com a corrupção na Petrobras.

Devido às investigações, a Odebrecht já perdeu contratos e tem feito corte de funcionários. Outros executivos da Odebrecht já estariam negociando acordo de delação com o respaldo prévio do dono da empresa, embora até agora se dissesse na Odebrecht que Marcelo não iria aderir à delação premiada.

Marcelo enfrenta um complicador a mais, que o pressiona a decidir o mais rapidamente possível. O juiz Sérgio Moro, da 13 ª Vara Federal de Curitiba, está prestes a lavrar a sentença no processo em que ele é acusado de envolvimento em organização criminosa, corrupção e lavagem de dinheiro. Procuradores da República têm interesse no acordo. Mas um deles disse ao GLOBO que são cada vez mais remotas as chances de uma negociação favorável aos empresários a esta altura das investigações. A Lava- Jato já conta com mais de 40 delações, e novos acordos dependem de revelações realmente substanciais e não apenas de declarações tópicas sobre assuntos ainda não totalmente explorados.

— Eu não acredito nisso. Essa conversa (de acordo simultâneo) só poderia ser travada por outras pessoas em nome deles. Alguém falar em nome deles é complicado — disse o advogado Roberto Telhada, defensor de Léo Pinheiro.
O advogado Nabor Bulhões, encarregado da defesa de Marcelo Odebrecht, também negou tentativa de acordo entre os dois executivos:

— Não ouvi isso do Marcelo Odebrecht. Estive com ele na última quinta- feira e o que eu ouvi foi para que eu continuasse na luta pela sua liberdade e pela sua inocência.

Oposição vai usar delação em processo de impeachment

• Senadores batem boca sobre Lava- Jato, com troca de palavrões

Eduardo Bresciani, Letícia Fernandes - O Globo

- BRASÍLIA- Em ofensiva sobre o governo, a oposição decidiu ontem que vai aguardar a homologação da delação premiada do senador Delcídio Amaral ( PT- MS) para pedir o aditamento dela ao processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, acatado pelo presidente Eduardo Cunha ( PMDB- RJ) no início de dezembro. A oposição reiterou que fará obstrução na Câmara e no Senado pela instalação da Comissão do Impeachment; questionou na Procuradoria-Geral da República o uso de aparato da Presidência na visita de Dilma ao ex- presidente Lula, no sábado; e antecipou para hoje uma reunião com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, para discutir o rito do processo de afastamento da presidente. A oposição deseja ainda representar contra Dilma no Supremo, por crime de responsabilidade, com base no teor da delação de Delcídio.

A decisão de adiar o aditamento ao processo de impeachment seguiu a orientação dos autores da petição, os juristas Hélio Bicudo, Janaína Paschoal, Miguel Reale Júnior e Flávio Costa, que preferem aguardar a formalização do acordo. Segundo o líder do PSDB, deputado Antonio Imbassahy ( BA), o aditamento não prejudica o andamento do processo de impeachment na Casa.

No Senado, o dia foi de pronunciamentos fortes, com bate- boca entre senadores do governo e da oposição.

O momento de maior tensão foi durante o pronunciamento de Lindbergh Farias ( PT- RJ). O petista reclamou que políticos do PSDB não eram investigados. O tucano Cássio Cunha Lima (PB) ironizou o petista dizendo que ele não poderia se transformar de “cara pintada” em “cara lavada”. Aloysio Nunes Ferreira (PSDB- SP) chamou Lindbergh de “fanático caluniador”, enquanto o petista cobrava da tribuna investigação de denúncias contra a administração tucana em São Paulo, como o cartel do metrô e as fraudes na merenda escolar. O embate aumentou quando o petista afirmou que os tucanos estavam se juntando a “grupelhos fascistas” para as manifestações a favor do impeachment.

— Respeite a trajetória de quem lutou pela democracia nesse país. Fascista é a puta que pariu — disse Cunha Lima, já se afastando do microfone.

— Deixe-me concluir. Vocês estão juntos com Bolsonaro, sim. Estarão na mesma passeata — rebateu Lindbergh, referindo-se ao deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ).

Em São Paulo, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) afirmou que é preciso acelerar a solução da crise política:

— O Brasil não aguenta ficar derretendo. O Congresso precisa decidir o impeachment.

O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, anunciou que a entidade vai apoiar as manifestações contra o governo Dilma, no próximo domingo.

Oposição pressiona STF para apressar rito de impeachment

Oposição vê fragilidade de Dilma e pressionará STF por liberação de rito

• Partidos contrários à presidente avaliam que avanço da Lava Jato reverteu jogo de forças do impeachment e pedirá ao Supremo rapidez na conclusão da análise feita pela Corte sobre o caminho que o afastamento da petista deve percorrer no Congresso

Daniel Carvalho, Beatriz Bulla, Isadora Peron e Igor Gadelha - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal começou a divulgar nesta segunda-feira, 7, o resultado do julgamento do rito do impeachment da presidente Dilma Rousseff no Congresso, o que motivou a oposição a buscar uma reaglutinação de forças na tentativa de aproveitar o que considera ser um momento de fragilidade do Planalto. O complemento do acórdão deve ser publicado hoje no Diário de Justiça Eletrônico e amanhã abre-se prazo de cinco dias para apresentação de recursos.

Com a publicação, a oposição decidiu ampliar a pressão sobre o STF para que a Corte acelere o julgamento dos recursos sobre o rito de impedimento de modo que a comissão do impeachment possa ser instalada na Câmara o quanto antes. Na avaliação da oposição, os últimos episódios da Lava Jato deram novo fôlego à tese do impedimento da presidente, que havia perdido força desde que o STF impôs derrota ao rito de impeachment indicado pela Câmara, em 17 de dezembro do ano passado.

O processo de afastamento de Dilma no Congresso foi aberto com base nas pedaladas fiscais do governo, manobra que consiste no atraso de repasses a bancos públicos a fim de cumprir metas orçamentárias.

Recurso. Líderes de partidos de oposição reúnem-se no fim da tarde de hoje com o presidente do Supremo, ministro Ricardo Lewandowski. Eles querem que a Corte se manifeste sobre questões feitas pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em recurso apresentado no início do ano e que será reiterado hoje, para que, segundo o peemedebista, não haja questionamento de tempestividade. “Se não houver a reiteração, aquele (recurso) não pode ser considerado”, disse o ministro Marco Aurélio Mello.

Caberá ao ministro Luís Roberto Barroso, que apresentou o voto seguido pela maioria do STF, analisar os recursos que forem protocolados nos próximos dias e pedir a inclusão do caso na pauta do colegiado. Na Corte, a intenção dos ministros é dar resposta breve ao caso, respeitados os prazos previstos nos termos da lei.

Cunha e oposicionistas voltaram a conversar sobre o tema. O peemedebista disse que só dará seguimento ao processo depois que o Supremo tiver uma resposta aos embargos. Apesar da pressa, a oposição concordou. A expectativa é de que o plenário do Supremo aprecie os embargos em 15 dias, o que levaria a Comissão Especial a ser instalada somente em abril. Por esse cálculo, deputados só votariam o impeachment em maio.

“Se não tivesse (o Supremo) cometido aquela intervenção que deu inveja aos golpistas militares, o Brasil teria um novo presidente. Se eles (ministros) segurarem (a resposta ao recurso) serão os responsáveis pelo agravamento da crise”, afirmou Darcísio Perondi (RS), da ala oposicionista do PMDB.

Depoimento. A estratégia foi definida em reuniões dos oposicionistas ontem. Eles combinaram que só farão o aditamento ao pedido de impeachment após o STF homologar a delação premiada do ex-líder do governo no Senado Delcídio Amaral (PT-MS), na qual ele acusa Dilma de interferir na Operação Lava Jato ao trabalhar pela nomeação de ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A presidente repudiou as afirmações e negou qualquer tentativa de interferir na operação.
Em outra frente, a oposição estuda apresentar ao STF uma representação para que se abra investigação sobre as denúncias feitas a respeito de Dilma.

No plenário, a intenção dos oposicionistas é obstruir todas as votações, até mesmo a de projetos defendidos pela oposição. “O que a sociedade brasileira espera do Congresso é a instalação da comissão do impeachment, e o Senado, em solidariedade a esse sentimento nacional e à nossa atitude na Câmara, vai fazer um trabalho na mesma direção”, afirmou o líder do PSDB na Câmara, deputado Antônio Imbassahy (BA).

O discurso oficial dos representantes do Palácio do Planalto é de que é preciso dar seguimento à pauta da Casa. Mas, nos bastidores, admitem que a obstrução é benéfica, pois a situação do governo poderia levar a derrotas em matérias perigosas, como a que aumenta de 15% para 19,4% o porcentual mínimo que a União é obrigada a investir em Saúde.

Dilma acusa oposição de dividir o país e volta a defender Lula

• Presidente diz que ‘ certo tipo de luta política’ afeta a economia

- O Globo

- CAXIAS DO SUL (RS)- A presidente Dilma Rousseff voltou a defender ontem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, investigado pela Operação Lava- Jato, e acusou a oposição de dividir o país e de tentar “antecipar as eleições de 2018”.

— A oposição tem absoluto direito de divergir, mas não pode, sistematicamente, ficar dividindo o país. Não pode. Sabem por quê? Porque tem certo tipo de luta política que cria um problema sistemático não só para a política, mas, também, para a economia e afeta a criação de emprego, o crescimento das empresas e ninguém fica satisfeito quando começa aquela briga — disse.

Dilma foi mais enfática na defesa de Lula do que no pronunciamento da última sexta- feira, após a condução coercitiva do ex- presidente, quando dedicou mais tempo a se defender das acusações feitas pelo senador Delcídio Amaral (PT-MS) em delação premiada.

Em seu discurso — que chegou a ser interrompido por gritos de “não vai ter golpe”, durante a entrega de unidades habitacionais do programa Minha Casa Minha Vida em Caxias do Sul ( RS) —, a presidente disse que Lula sempre aceitou prestar depoimento.

— O presidente Lula, justiça seja feita, nunca se julgou melhor do que ninguém, sempre aceitou, convidado para prestar depoimento sempre foi. Então, não tem o menor sentido conduzi-lo sob vara para prestar depoimento, se ele jamais se recusou a ir — afirmou.

O tom mais forte na defesa de Lula, segundo interlocutores do Planalto, se deveu ao encontro que a presidente teve com o petista no último sábado.

— Ela conversou com ele. Ela sentiu o clima. Depois disso, é outra coisa — afirmou um interlocutor do Planalto.

A avaliação do governo foi de que na sexta- feira Dilma não havia se defendido o suficiente das acusações de Delcídio, veiculadas na revista “IstoÉ” no dia anterior. Dilma havia divulgado uma nota rebatendo o senador, mas o pronunciamento foi a primeira oportunidade de verbalizar a defesa do governo.

Ontem, em Caxias do Sul, Dilma fez uma defesa mais contundente de Lula e afirmou que não se deve demonizar pessoas e instituições com opiniões divergentes, mas se deve “exigir respeito”.

Preocupação com violência
A presidente voltou a criticar o que classificou de “vazamentos sistemáticos” de informações sigilosas na Lava-Jato.

— No Brasil, temos assistido a vazamentos sistemáticos e esses vazamentos provam, a partir de um determinado momento, que não são verdadeiros, mas o estrago de jogar lama nos outros já ocorreu.

O governo está preocupado que manifestações programadas para o próximo fim de semana em defesa de Lula sejam criminalizadas. Rui Falcão, presidente do PT, reuniu- se com ministros na manhã de ontem, no Palácio do Planalto, para evitar que a mobilização petista seja prejudicada.

A avaliação no Planalto é que um ato pró- Lula no próximo domingo, mesmo dia em que está marcado um protesto contra o governo, seria arriscado. Isso porque se os atos descambarem para a violência, com milhares nas ruas, o confronto pode ser incontrolável.

— Se os dois grupos se enfrentarem, se alguém sair ferido, vai ser muito complicado e muito triste — define um auxiliar da presidente.

A ideia do PT é trocar de dia, ou manifestar-se em local separado.

— O PT não tem esse histórico de violência. Não vai para arrumar confusão. Então há esse temor de ser criminalizado. Claro que as pessoas respondem quando são provocadas. Imagine isso em uma multidão. Não tem controle — afirmou um assessor do Planalto.

Cúpula do PMDB no Senado dá sinais de que pode mudar de lado

• Esteio da presidente no Congresso, liderança do partido também acha que conjuntura se tornou desfavorável à petista

Erich Decat - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Considerada o fiel da balança na condução do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Congresso Nacional, a cúpula do PMDB do Senado começa a mostrar sinais de divisão. Alguns de seus integrantes avaliam que a conjuntura política se agravou para o governo nos últimos dias e começam rever a posição de apoio, adotada até aqui, pela permanência da petista no cargo.

Em conversas reservadas, a avaliação entre peemedebistas da Casa é de que a “temperatura elevou-se muito” após vir a público trechos da delação do senador Delcídio Amaral (PT-MS) e da possibilidade do surgimento de novos depoimentos de representantes de empreiteiras envolvidas no esquema investigado na Operação Lava Jato.

Em depoimento perante o grupo de trabalho da Procuradoria-Geral da República na Lava Jato, Delcídio acusou Dilma de atuar três vezes para interferir na operação por meio do Judiciário. A presidente negou as declarações do senador. As primeiras revelações do ex-líder do governo fazem parte de um documento preliminar de acordo de colaboração premiada, que ainda precisa ser homologado pelo Supremo Tribunal Federal.

A avaliação no PMDB do Senado que tem atuado internamente na legenda, desde o ano passado, para barrar qualquer avanço do impeachment no Congresso, é de que os episódios recentes podem obrigá-los a passar de uma posição de “defesa do governo” para “expectativa do que pode vir”, considerou um integrante da legenda.

Na lógica que o impeachment ganhou “uma nova possibilidade”, integrantes do partido ressaltam, como ponto-chave, o fato de que, ao contrário do ano passado, o vice-presidente Michel Temer, que também preside o PMDB, e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), têm se aproximado. Os primeiros passos para o apaziguamento foram feitos na montagem da nova Executiva do partido, que deve ser eleita na convenção do próximo dia 12.

Na ocasião, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), aliado de Renan, deverá assumir a primeira-vice-presidência do PMDB, podendo ocupar interinamente o comando da legenda caso Temer se afaste, iniciativa que já ocorreu um outras ocasiões. A demonstração de afinamento entre Temer e Renan também foi exposta na quinta-feira passada, dia que veio a público o depoimento de Delcídio. Na ocasião, o vice foi recebido pelo senador em Alagoas.

PMDB agora fala em ‘independência’ do governo Dilma

Às vésperas da convenção, a base do PMDB nos estados decidiu apresentar uma “moção de independência” em relação à gestão Dilma. Os ministros continuariam nos cargos, mas deputados e senadores ficariam livres para votar contra o governo.

PMDB deve votar moção por ‘ independência’ do governo

• Ministros não sairiam, mas parlamentares ficariam livres para votar

Simone Iglesias - O Globo

- BRASÍLIA- Enquanto o vice-presidente Michel Temer prega pacificação em meio a uma das mais fortes crises políticas da República, o seu partido, o PMDB, dá novos passos para se afastar da presidente Dilma Rousseff, mas sem perder os cargos que hoje tem. A base peemedebista nos estados se mobiliza para aprovar no próximo sábado, durante convenção nacional que reconduzirá Temer ao comando partidário, uma moção pela independência. Só que para evitar serem associados aos movimentos contra o governo, o vice e seus principais aliados — como os ex-deputados Eliseu Padilha ( RS) e Moreira Franco ( RJ) — pretendem ficar longe dos holofotes.

— O governo está desintegrando. Não é hora de se expor — disse uma pessoa próxima a Temer.

Na prática, o rompimento, se aprovado, se dará da seguinte forma: Dilma manterá os peemedebistas que quiser na Esplanada dos Ministérios, mas como “cota pessoal”, e senadores e deputados ficam livres de seguir o governo nas votações no Congresso. Alguns peemedebistas avaliam que essa posição permitiria inclusive que se exigisse mais cargos e nomeações ao Palácio do Planalto.

Com o agravamento da crise política, este formato de ruptura, segundo integrantes da cúpula partidária, já teria a adesão de cerca de 60% dos delegados com direito a voto, de mais da metade dos deputados federais e de um terço dos senadores. A base da moção que será apresentada no sábado é um documento aprovado pelos três estados da Região Sul ( Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná), intitulado “Carta de Porto Alegre”. O texto pede o afastamento “dessa desastrosa condução do país” e que o PMDB atue de forma independente do governo federal nas suas ações e posições no Congresso Nacional. O texto reforça crítica feita por Temer em carta à Dilma no fim do ano passado, em que ele se queixou de ser “um vice decorativo”.

“Temos que desembarcar do governo e construir a unidade em torno do vice-presidente Michel Temer e do partido, para socorrer o Brasil e ajudá-lo a sair do precipício onde se encontra. Isso é incompatível com seguir cegamente um governo que nunca nos ouviu ou respeitou”, diz um trecho da moção que está recebendo apoio de vários outros estados. Ontem, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB- RJ), foi irônico ao ser perguntado se ocorreria o desembarque:

— O PT já está desembarcando. O PMDB talvez sim, mas não sei.

Enquanto parte dos dirigentes estaduais e deputados trabalham abertamente pelo rompimento, há outros setores do PMDB, como parte do Senado, com viés menos crítico ao governo. Essa posição se estende aos atuais ministros. O presidente da Casa, Renan Calheiros (AL), que oscila entre aliado de primeira hora de Dilma e seu potencial algoz, adotou uma posição mais independente. Sua relação com Temer está momentaneamente pacificada e, nas últimas semanas, passou a sustentar uma agenda de votações no Senado com o apoio da oposição.

Elo entre Odebrecht e marqueteiro do PT coopera na Lava Jato

Responsável por planilha da Odebrecht negocia delação

Graciliano Rocha, Bela Megale – Folha de S. Paulo

CURITIBA, SÃO PAULO - Responsável por guardar a contabilidade dos "acarajés", codinome que a polícia atribui à propina nos e-mails trocados entre executivos da Odebrecht, a secretária Maria Lúcia Tavares passou a colaborar com os investigadores da Operação Lava Jato no âmbito da negociação de um acordo de delação premiada.

É a primeira vez que um empregado da maior empreiteira do país passa a colaborar com a investigação. As informações de Maria Lúcia podem ajudar a polícia a esclarecer pagamentos feitos ao publicitário João Santana de 2008 até a reta final da campanha presidencial de 2014.

Era Maria Lúcia, secretária lotada na sede da empresa em Salvador (BA), quem guardava as planilhas indicando pagamentos a "Feira" – o apelido dado ao marqueteiro do PT e à mulher dele, Monica Moura, que estão presos desde o dia 23, em Curitiba (PR).

O acordo de delação ainda não foi homologado pela Justiça, mas a negociação foi confirmada por três fontes com conhecimento do caso.

A virada de Maria Lúcia aconteceu após a prorrogação da prisão provisória dela, em 26 de fevereiro.

Cinco dias depois dessa data, a delegada Renata Rodrigues não pediu a transformação da prisão dela em preventiva (sem prazo determinado para sair), e o juiz Sergio Moro determinou a libertação da funcionária.

Naquela noite, dois advogados ligados à Odebrecht chegaram à sede da PF em Curitiba com o alvará de soltura, mas foram surpreendidos pela informação de que a secretária já havia deixado o local, por uma porta lateral.

Os advogados passaram a exigir uma conversa com o delegado Márcio Anselmo sobre o paradeiro da cliente. Eles não tiveram sucesso, pois o delegado havia deixado a superintendência.

Um integrante da PF afirmou à Folha que a saída por uma porta discreta era parte da colaboração entre a secretária e os investigadores. Procurado, Márcio Anselmo não quis comentar o caso.

No mesmo dia que Maria Lúcia ganhou a liberdade, uma reunião foi convocada às pressas por advogados da Odebrecht para debater a delação da secretária, negociada fora do controle da empreiteira.

Segundo um advogado que atende o grupo ouvido pela Folha, um dos principais pontos de discussão foi que os responsáveis pela defesa não souberam dar o suporte necessário à funcionária.

Caminho do dinheiro
Em uma das planilhas encontradas com Maria Lúcia, com o título "Lançamentos X Saldo (Paulistinha)" estão registrados 41 repasses destinados a "Feira", entre 2014 e 2015, totalizando R$ 21,5 milhões.

Essa planilha só foi anexada no pedido da PF para transformar as prisões de João Santana e da mulher, Monica Moura, em preventiva.

Em outro arquivo, o "Feira -evento 2014", encontrado na casa da secretária, constam repasses totalizando R$ 4 milhões e a anotação "tot.atendida" – "totalmente atendida", na interpretação da PF.

Secretária do ex-executivo Hilberto Mascarenhas, Maria Lúcia também aparecia em trocas de e-mail em que seu chefe aprovava a entrega dos "acarajés" pedidos por outro executivo, Roberto Prisco Ramos.

No primeiro depoimento à polícia, ela disse que as entregas de acarajés "quentinhos" de Salvador para o Rio, se tratavam do quitute baiano.

A Odebrecht e a defesa de João Santana e Monica Moura não quiseram comentar o fato. O advogado de Maria Lúcia não foi localizado.

Aécio diz que PT deveria se defender na Justiça em vez de atacar oposição

José Marques – Folha de S. Paulo

BELO HORIZONTE - O senador Aécio Neves (PSDB-MG) disse nesta segunda-feira (7) que Gilberto Carvalho e o PT deveriam "se defender na Justiça" em vez de "tentar voltar os holofotes para a oposição" após o ex-ministro ter dito que a empreiteira Andrade Gutierrez "banca" o tucano.

Na réplica, Aécio afirmou estar "pronto para ataques", mas evitou comentar as acusações e chamou Carvalho, ex-chefe de gabinete de Lula e ex-ministro-chefe da Secretaria-Geral de Dilma, de "figura de menor estatura" que "não merece sequer resposta". O senador participava de evento de aliados do PSDB em Belo Horizonte e discutia a sucessão do prefeito Marcio Lacerda (PSB) na capital mineira.

"O PT está acuado e esse cidadão, mesmo alvo de tantas e graves denúncias, passou a atacar os adversários", acrescentou. "Deveria o PT voltar-se para se defender na Justiça, seja esse cidadão ou outros que estão acusados dos mais graves crimes", continuou o tucano.

As declarações de Carvalho foram dadas em entrevista à Folha. Para o ex-ministro, se a delação de executivos da Andrade Gutierrez se direcionar apenas contra o PT, será um "escândalo insuportável, porque vai ser a confissão final de que a Lava Jato é dirigida contra o PT".

"Todo mundo sabe que a Andrade Gutierrez é a casa do senhor Aécio Neves, é quem banca o Aécio", afirmou o petista, que é próximo do ex-presidente Lula e investigado na Operação Zelotes, da Polícia Federal, que apura participação de agentes públicos em um suposto esquema de compra de medidas provisórias. Ele diz que não teve envolvimento com ilegalidades.

No evento da capital mineira, Aécio voltou a dizer que o momento é de "serenidade", mesmo termo usado após a condução coercitiva do ex-presidente Lula pela PF na sexta-feira (4), e afirmou que as críticas dos adversários são tentativas de constranger as instituições do país.

"Cabe a nós da oposição protegermos as nossas instituições e garantirmos que elas não sofram qualquer tipo de constrangimento, como passou o PT a tentar fazer nos últimos dias, atacando a Lava Jato, o juiz [Sergio] Moro, a Polícia Federal, o Ministério Público, quando deveria estar dando respostas que os brasileiros estão aguardando", afirmou.

Aécio disse que irá às manifestações contra o governo marcadas para domingo (13), mas ainda não definiu o local.

O tucano almoçou em Belo Horizonte com líderes do PSDB e partidos aliados. Ele tenta articular um nome do partido para suceder Lacerda nas eleições deste ano. O prefeito não participou da reunião.

STF começa a publicar decisão sobre rito do impeachment

Márcio Falcão – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O STF (Supremo Tribunal Federal) começou a publicar nesta segunda-feira (7) o resultado do julgamento que definiu o rito do processo de impeachment presidente Dilma Rousseff no Congresso.

O texto, que traz o resumo da sessão, foi divulgado no Diário da Justiça Eletrônico. Nesta terça (8), será publicado um complemento do acórdão com a íntegra dos votos revisados dos ministros.

É a partir da publicação de todo o teor do acordão que as partes podem recorrer, em até cinco dias, da decisão do Supremo, questionando eventuais omissões, contradições e obscuridades.

No início de fevereiro, no entanto, o comando da Câmara chegou a apresentar recurso ao STF pedindo a revisão dos principais pontos do julgamento sobre a tramitação do processo da petista. Alguns ministros diziam que a tendência era que o recurso fosse negado, uma vez que a Câmara antecipou etapas.

Agora, o ministro Luís Roberto Barroso vai decidir se leva para votação o recurso da Câmara antes do documento com o resumo da sessão ou se pede para a Câmara se manifestar se quer ou não apresentar um novo questionamento ao tribunal.

No julgamento de 2015, o STF anulou a comissão pró-afastamento que havia sido formada na Câmara e deu mais poder ao Senado no processo. A maioria dos ministros entendeu que não cabe votação secreta, como havia definido Cunha, para a eleição da Comissão Especial que ficará encarregada de elaborar parecer pela continuidade ou não do pedido de destituição de Dilma na Câmara.

O STF também fixou que o Senado não fica obrigado a instaurar o impeachment caso a Câmara autorize (com aval de 342 dos 513 deputados) a abertura do processo. Para os ministros, a Câmara autoriza, admite o processo, mas cabe ao Senado decidir sobre a instauração.

Com isso, a partir da instauração do processo por maioria simples (metade mais um, presentes 41 dos 81 dos senadores) no plenário do Senado, a presidente da República seria afastada do cargo, por até 180 dias, até o julgamento final. A perda do mandato dependeria de aprovação de 54 dos senadores. A palavra final para o afastamento de Dilma ao Senado agrada ao Planalto.

Em mais de 50 páginas de recurso, a Câmara crítica o julgamento do Supremo. "Nunca na história do Supremo Tribunal Federal se decidiu por uma intervenção tão profunda no funcionamento interno da Câmara dos Deputados, restringindo, inclusive, o direito dos parlamentares."

"Os fatos e a história não podem ser manipulados e propositadamente direcionados para conclusões errôneas, precipitadas e graves. Talvez não se tenha notado ainda a relevância dessa decisão não só quanto ao processo de impeachment em si, mas ao futuro institucional da Câmara dos Deputados, e do próprio Legislativo".

Cunha ainda justificou a decisão de ingressar com a ação antes da divulgação do resultado e apontou que a medida representa a "defesa da liberdade da Câmara em praticar seus atos internos, sem interferência do Poder Judiciário".

"É importante registrar que a interposição desde logo dos embargos de declaração se justifica porque a matéria decidida é inédita, relevantíssima do ponto de vista institucional, e acarretou uma guinada na jurisprudência dessa Corte quanto à intervenção em matéria interna corporis de outro Poder da República".

Dilma critica oposição e juiz Sergio Moro no RS

Sérgio Ruck Bueno - Valor Econômico

CAXIAS DO SUL (RS) - Em meio ao agravamento da crise política, a presidente Dilma Rousseff aproveitou a cerimônia de entrega simbólica de residências do programa Minha Casa Minha Vida ontem em Caxias do Sul para fazer um desagravo ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, conduzido coercitivamente para depor no âmbito da Operação Lava-Jato na sexta-feira. Ela também fez uma crítica indireta ao juiz federal Sergio Moro, que determinou a medida contra Lula, e atacou a oposição, quer "antecipar a eleição de 2018" e "sistematicamente" fica "dividindo o país.

Recebida com gritos de "não vai ter golpe" e "Dilma, guerreira da pátria brasileira" por militantes do PT, do PCdoB e de centrais sindicais, a presidente afirmou que parte da crise econômica "é devida também à sistemática crise política que provocam no país aqueles que são inconformados, que perderam as eleições e que querem antecipar a eleição de 2018".

"A oposição tem absoluto direito de divergir, mas não pode sistematicamente ficar dividindo o país, porque tem certo tipo de luta política que cria um problema sistemático não só para a política mais para a economia, a criação de emprego e o crescimento das empresas", disse Dilma. O governo, ao contrário, quer sempre a unidade do país", acrescentou.

Sobre a condução coercitiva de Lula, a presidente afirmou que "não tem o menor sentido" conduzir "sob vara" pessoas que jamais se recusaram a depor, "como é o caso do presidente Lula, que nunca se julgou melhor do que ninguém". Segundo ela, também não cabe afirmar, "como disse certo juiz", que a medida serviria para proteger Lula. "Tem proteção que é muito estranha", completou.

A presidente também criticou os "vazamentos sistemáticos" que vêm ocorrendo nas investigações da Lava-Jato, pois mesmo depois de ficar demonstrado que não eles são verdadeiros, "o estrago já ocorreu". Mesmo assim, afirmou que "não podemos demonizar ninguém, pessoas e órgão de imprensa. Não podemos demonizar opinião diferente da nossa, mas temos de exigir respeito para si e dar o respeito aos outros".

Dilma defendeu os ajustes feitos pelo governo para enfrentar a crise econômica e afirmou que os cortes de gastos preservam o "mais importante", como o Minha Casa Minha Vida. "Muita gente queria que a gente acabasse [com o programa], mas não só mantivemos como vamos lançar a fase três, com mais 1,5 milhão a 2 milhões de moradias que vão se somas às mais de 4 milhões das fases um e dois.

Impeachment irá aguardar STF e atos de rua

Por Thiago Resende, Carolina Oms, César Felício e Marcos de Moura e Souza – Valor Econômico

BRASÍLIA e BELO HORIZONTE - A oposição à presidente Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados irá aguardar novas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), para avançar na articulação do pedido de impeachment. Em diversas reuniões no dia de ontem, os oposicionistas decidiram que é necessário esperar a homologação da delação premiada do senador Delcídio do Amaral (PT-MS) pelo STF para fazer um aditamento ao pedido de impeachment acatado pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em dezembro.

Pesa também na oposição a decisão de esperar as manifestações previstas para 13 de março. A avaliação é que existe risco de confronto, o que já estaria chamando a atenção do Exército e poderia levar a novos desdobramentos da crise.

A oposição ainda irá esperar a análise do recurso de Cunha ao julgamento do STF que determinou o rito do processo. O STF invalidou o rito estabelecido por Cunha e determinou que o processo tenha escolha da Comissão Especial em votação aberta e aceitação prévia do Senado para o afastamento da presidente, se o pedido for aprovado. O acórdão da decisão foi divulgado ontem pelo Supremo, mas a oposição está convicta que Cunha não permitirá o avanço do impeachment sem a análise dos embargos.

Cunha reapresenta hoje o recurso ao julgamento do Supremo que definiu o rito do processo de impeachment. Ele já havia protocolado os embargos de declaração, mas isso foi antes de a Corte publicar o acórdão da decisão.

"Não podemos ultrapassar o Judiciário. Nosso desejo é que a Câmara instale depois dos julgamentos dos embargos que trarão esclarecimentos finais", afirmou o líder do PSDB, Antonio Imbassahy (BA).

Cumprida esta etapa, o pedido de aditamento do impeachment seria apresentado pelos seus autores (Janaina Paschoal, Hélio Bicudo e Miguel Reale Júnior) diretamente à Comissão Especial. "Não queremos depender de Eduardo Cunha para uma nova decisão", comentou o líder do DEM na Câmara, Pauderney Avelino (AM). O presidente da Câmara informou à oposição que, mesmo com o aditamento, o processo do impeachment de Dilma não precisa voltar à estaca zero. As acusações à presidente apenas seriam incorporadas ao pedido que já tramita na Casa.

Até a votação dos embargos, as bancadas do PSDB, DEM, Solidariedade, PPS, PSB, PSC e dissidentes da base de apoio do governo, como uma ala do PMDB, PP e PSD, prometem obstruir a análise dos projetos na Câmara. Os oposicionistas não precisam quantos deputados integram o movimento. De acordo com um levantamento do Movimento Vem Pra Rua, que apoia o impeachment e organiza manifestações no domingo, são apenas 166 votos favoráveis ao impeachment na Câmara, ou 176 votos a menos que o necessário para a proposta passar.

Oposicionistas, principalmente do PPS, fazem a interlocução com o Supremo e vão tentar antecipar, de amanhã para hoje, uma reunião com o presidente da Corte, ministro Ricardo Lewandowski, para pedir celeridade ao julgamento dos embargos.

O movimento no dia 13 contará com a participação ativa da oposição, ainda que parte dos organizadores tenha tirado o impeachment do foco da discussão e centrado as convocatórias no apoio à Operação Lava-Jato.

O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), alertou ontem em Belo Horizonte para o risco de confronto nas ruas. O tucano, que irá participar do ato, afirmou que se aliados do PT organizarem manifestações pró-governo no mesmo dia isso será uma provocação.

"Estamos convidando os brasileiros para no domingo, dia 13, estarem nas ruas mostrando sua indignação com tudo isso que está acontecendo com o Brasil", disse o senador. "A saída para nós se dará sempre aquilo que prevê a Constituição, mas eu antecipo que essa manifestação do dia 13 pode ser um indutor muito importante". Ele citou três opções para o que considera ser o desfecho da crise: impeachment, cassação pelo Tribunal Superior Eleitoral dos mandatos de Dilma e do vice Michel Temer (PMDB) ou a renúncia.

Aécio disse que considera legítimo que quem apoia o governo e o PT também se manifeste, mas mencionou uma condição: "Poderão fazer a mesma coisa no tempo certo, num outro momento". Se protestos pró-PT forem convocados também para o domingo, "aí não é manifestação, aí é uma tentativa de confronto".

O PT e movimentos sociais que apoiam o governo estão convocando oficialmente atos para os dias 18 e 31. Nas redes sociais, contudo, simpatizantes do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mencionaram a intenção de irem às ruas protestar contra o impeachment durante a manifestação de domingo.

Tanto Aécio quanto Pauderney confirmaram que ouviram diretamente de militares preocupação em relação ao ambiente nas ruas - algo que também já teria sido expresso a governadores. Segundo Aécio, faltou a lideranças do PT serenidade ao convocarem apoiadores a irem para as ruas. "Obviamente aqueles que têm responsabilidade constitucional de manter a ordem no Brasil ficam atentos a isso", disse. (Colaborou Cristian Klein, do Rio)

Crise política inviabiliza a aprovação de reformas

Por Flavia Lima – Valor Econômico

SÃO PAULO - As chances de uma melhora significativa do cenário fiscal são ínfimas, mesmo que houvesse uma mudança de governo, segundo economistas ouvidos pelo Valor. A presidente Dilma pode até conseguir aprovar medidas como a adoção de uma banda para o superávit primário, mas a volta da CPMF ou reformas que exijam uma mobilização maior do Congresso, como a da Previdência, estão praticamente descartadas.

"No processo de substituição [de governo] teríamos no dia seguinte outro Executivo, mas o Legislativo continuaria o mesmo", diz Jorge Simino, diretor de investimentos e patrimônio da Fundação Cesp.

Rodrigo Melo, economista-chefe da Icatu Vanguarda, avalia que as medidas sugeridas pela Fazenda - como o estabelecimento de limite para os gastos públicos - são incompatíveis com o quadro atual. "Impor um teto com base nos gastos mais elevados de toda série histórica e sem uma reforma da Previdência não faz sentido", diz. Para ele, mesmo em um novo governo uma mudança na dinâmica da dívida pública acabaria recaindo, primeiramente, no aumento de impostos.

Crise política enterra expectativa de avanço dos ajustes neste ano
As chances de uma melhora significativa do cenário fiscal no curto prazo são ínfimas, mas o quadro não deve ser muito menos desafiador em uma eventual mudança prematura de governo. Para especialistas, o governo atual pode até emplacar medidas como a introdução de bandas de superávit primário, mas a volta da CPMF ou reformas que exijam uma mobilização maior do Congresso - cruciais para tirar o país do caminho do superendividamento - estão fora de questão. Ao mesmo tempo, existem muitas dúvidas sobre a margem de manobra para um novo governo aprovar reformas estruturantes, impopulares de qualquer forma.

"No processo de substituição [de governo] teremos no dia seguinte outro Executivo, mas o Legislativo continuará o mesmo. Se pode dizer que a habilidade do Executivo em lidar com o Legislativo será outra e vice-versa. A realidade é que vamos continuar tendo uma fragmentação partidária muito grande e é muito complicado fazer previsão nesse cenário", diz Jorge Simino, diretor de investimentos e patrimônio da Fundação Cesp.

Rodrigo Melo, economista-chefe da Icatu Vanguarda, avalia que as chances de avanços no campo fiscal no governo Dilma são baixas e as medidas sugeridas pela Fazenda incompatíveis com o quadro atual. "Impor um teto com base nos gastos mais elevados de toda série histórica e sem uma reforma da Previdência não faz sentido", diz Melo. Para ele, a oposição vai travar a pauta para discutir o impeachment, cujas chances, diz, aumentaram.

Mesmo diante de uma próxima equipe econômica "brilhante", Melo mostra ceticismo. "Para fazer o ajuste, vai ser preciso colocar a mão na sujeira em meio a um Congresso bastante fragmentado. Fora que, caindo esse governo, os grupos organizados vão fazer barulho". Segundo Melo, mesmo em um governo novo, a tarefa de mudar a dinâmica da dívida pública vai acabar recaindo primeiro sobre impostos, embora não seja o ideal. "Pode sair também a reforma da Previdência, com aumento da idade mínima ou a diminuição da diferença entre os gêneros."

Para analistas e gestores financeiros, a dívida bruta, hoje em 66% do PIB, pode, se nada for feito, atingir 90% do PIB em 2018 - o que exigiria inflação alta o suficiente para erodir o valor da dívida e evitar o calote. Eventual troca de governo não seria garantia de solução no campo fiscal, mas abriria uma possibilidade, diz um economista de uma gestora de recursos que não quis ser identificado. Para ele, a avaliação é que com Dilma no poder dificilmente existirá condição política de se fazer reformas amplas e necessárias. "Enquanto não se define o cenário político, nada deve andar no Congresso."

Para esse economista, mantido o status quo, o melhor que se pode esperar é uma banda mais ampla de superávit primário que, na prática, abrirá espaço para o governo ter um novo déficit fiscal; talvez algum avanço na discussão do teto de gasto e uma reforma modesta da Previdência. "Não acredito na aprovação da CPMF", diz a fonte.

Mesmo em cenário alternativo, no qual a presidente se mantenha onde está, mas fique claro que o PT está fora do jogo em 2018, não é possível esperar que a oposição se mobilize para aprovar questões fiscais importantes, pensando na possibilidade de se tornar governo em 2018. "Há sempre o receio de aprovar medidas impopulares e comprometer as próximas eleições para deputado ou senador", diz Melo. Para Simino, a oposição pode avaliar que encaminhar as reformas necessárias é dar chance ao adversário e preferir não correr o risco. "O que vai prevalecer para mim é uma incógnita."

"O jogo continua sendo não cooperativo até que fique claro que o PT está morto", diz a fonte que preferiu não ser identificada. Para ele, a oposição tem muito medo de Lula, eleitoralmente falando. "A oposição já o subestimou no mensalão e não quer cometer o mesmo erro agora", diz.

Analistas dizem ainda que a formação de um novo governo teria efeito positivo sobre as expectativas de empresários e consumidores, mas isso não autorizaria ninguém a apostar em números muito superiores à alta de 0,5% esperada hoje para o PIB de 2017. "Difícil saber quanto o PIB pode ser melhor sem Dilma. Volta a confiança dos empresários, mas os ajustes necessários à economia se contrapõem a isso", diz Melo, ao fazer referência ao momento pelo qual passa a economia argentina. "É uma conta complicada de fazer".

Com ou sem Dilma, o quadro econômico para 2016 está dado e indica uma contração da atividade entre 3,5% e 4%. Para Simino, da Fundação Cesp, é possível que os preços dos ativos "saiam na frente" no último trimestre deste ano, antecipando a hipótese de que a expectativa de uma coordenação mais profícua entre Executivo e Legislativo ao longo de 2017 traga algum alento no ano que vem. "Mas colocar tudo isso nos preços dos ativos tem um tanto de açodamento. Não dá para se deixar levar por um entusiasmo tão significativo. Não tem cenário fácil."

PPS conclama todos brasileiros a irem às ruas contra a corrupção e pelo impeachment de Dilma no dia 13

A Comissão Executiva Nacional do PPS aprovou, nesta segunda-feira,(03/03/2016) nota pública conclamando os brasileiros a irem às ruas no próximo domingo, dia 13, contra a corrupção e pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff.

No documento, o partido manifesta apoio ao “juiz federal Sérgio Moro e à força-tarefa da Operação Lava Jato, integrada pelo Ministério Público Federal, pela Receita Federal e pela Polícia Federal”, diante das tentativas do governo Dilma, do PT e do ex-presidente Lula de “barrar as investigações sobre o escândalo da Petrobras.”

Para a legenda, há ainda a “necessidade de os partidos com representação no Congresso Nacional exigirem a renúncia imediata do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara, visando resgatar o protagonismo do Parlamento neste processo”.

O PPS repudia ainda as iniciativas de desmoralização da Lava Jato e defende que o afastamento da presidente Dilma “pelo Congresso Nacional é a forma mais democrática e constitucional de superarmos a paralisia política e econômica do País”.

Veja abaixo a íntegra da nota.

Todos às ruas pelo Brasil, no combate à corrupção e pelo impeachment de Dilma

O processo de isolamento do governo Dilma Rousseff se agrava com o avanço das investigações da Operação Lava Jato, colocando no centro da apuração a presidente, sob suspeita de crime de responsabilidade pelo seu envolvimento com o escândalo de corrupção na Petrobras, que veio à tona na delação do ex-líder do governo do PT, senador Delcídio do Amaral.

Amplos setores da sociedade, da Igreja Católica, de entidades como a Fiesp (Federação das Indústrias de São Paulo) a OAB Nacional (Ordem dos Advogados do Brasil), e empresários, bem como de partidos políticos, dentre eles o PSB, PSOL e Rede, avançaram no posicionamento contra o governo, rumo à oposição, criando uma nova realidade política no País, na qual a construção do governo de transição tem maior chance de êxito.

O Partido Popular Socialista (PPS) vem a público manifestar seu apoio ao juiz federal Sérgio Moro, e à força-tarefa da Operação Lava Jato integrada pelo Ministério Público Federal, pela Receita Federal e pela Polícia Federal, diante das tentativas de barrar as investigações sobre o escândalo da Petrobras.
Repudiamos também as iniciativas para desmoralizar a Operação Lava Jato levadas a cabo pelo PT, pelo próprio governo Dilma e pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que passou a ser investigado pelo MPF, sobretudo depois da última sexta-feira, quando ele foi levado coercitivamente a depor nas dependências da área presidencial do aeroporto de Congonhas, em razão das suspeitas de formação de patrimônio com recursos desviados da Petrobras por empreiteiras “amigas”
.
Dilma, por sua vez, também agiu no mesmo sentido ao substituir recentemente o ministro da Justiça com nítido propósito de dificultar as investigações em curso. Além disso, em gesto nada republicano, utilizou todo o aparato de transportes e segurança da Presidência para uma visita de solidariedade a Lula, cujo nítido proposito foi desautorizar as ações da Polícia Federal, do Ministério Público e do juiz Sérgio Moro.

Entendemos que a saída da crise é política, por isso defendemos o impeachment da presidente Dilma. O afastamento dela pelo Congresso Nacional é a forma mais democrática e constitucional de superarmos a paralisia política e econômica do País, como já experimentado no impeachment do ex-presidente Collor, fato que por si só criou uma nova dinâmica no Brasil. Um outro caminho ainda poderá ser dado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) no processo em curso de impugnação da chapa encabeçada por Dilma.

Impõe-se a necessidade de os partidos com representação no Congresso Nacional exigirem a renúncia imediata do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara, visando resgatar o protagonismo do Parlamento neste processo.

No próximo domingo, dia 13 de março, grandes manifestações de apoio ao combate à corrupção, à Operação Lava Jato e a favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff serão realizadas em todo o País.

Daí porque conclamamos todos os cidadãos e cidadãs a irem às ruas com suas famílias, levando bandeiras do Brasil, cartazes e faixas que expressem sua opinião sobre o que está acontecendo.

Ou você vai, ou ela fica!

Fora Dilma!

Comissão Executiva Nacional
Brasília, 03 de março de 2016.”

Déjà vu - Merval Pereira

- O Globo

No artigo que escreveu em 2004 para a Revista Jurídica do Centro de Estudos Judiciários (CEJ) do Conselho de Justiça Federal sobre a Operação Mãos Limpas, ocorrida na Itália nos anos 1990, o juiz Sérgio Moro a classifica como “uma das mais impressionantes cruzadas judiciárias contra a corrupção política e administrativa”.

Quando destaca “a relevância da democracia para a eficácia da ação judicial no combate à corrupção e suas causas estruturais”, Moro diz que “se encontram presentes várias condições institucionais necessárias para a realização de ação semelhante no Brasil, onde a eficácia do sistema judicial contra os crimes de ‘ colarinho branco’, principalmente o de corrupção, é no mínimo duvidosa”.

Depois disso, já marcado como especialista no combate à lavagem de dinheiro, ele assessorou a ministra Rosa Weber no julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal. Hoje, está à frente da Operação Lava- Jato, que caiu em seu colo em Curitiba por uma associação de fatores que levaram a investigação quase banal de doleiros ao centro de um dos maiores escândalos de corrupção política do mundo, como o caso da Petrobras foi classificado recentemente pela ONG Transparência Internacional.

No artigo, ele analisa o caso de Bettino Craxi, líder do Partido Socialista Italiano (PSI) e ex-primeiro ministro, um dos principais alvos da Operação Mãos Limpas. Moro ressalta que Craxi, já ameaçado pelas investigações e depois de negar várias vezes seu envolvimento, reconheceu cinicamente a prática disseminada das doações partidárias ilegais, em famoso discurso no Parlamento italiano, em 3 de julho de 1992, usando argumentos muito semelhantes aos que o PT vem usando:

“(...) Mais, abaixo da cobertura do financiamento irregular dos partidos, casos de corrupção e extorsão floresceram e tornaram- se interligados. (...) O que é necessário dizer e que, de todo modo, todo mundo sabe, é que a maior parte do financiamento da política é irregular ou ilegal. Os partidos e aqueles que dependem da máquina partidária ( grande, média ou pequena), de jornais, de propaganda, atividades associativas ou promocionais... têm recorrido a recursos adicionais irregulares (...)”.

Em dezembro de 1992, relata Moro, Craxi recebeu seu primeiro “avviso di garanzia", um documento de dezoito páginas, no qual era acusado de corrupção, extorsão e violação da lei reguladora do financiamento de campanhas. A acusação tinha por base, entre outras provas, a confissão de Salvatore Ligresti, suposto amigo pessoal de Craxi preso em julho de 1992, de que o grupo empresarial de sua propriedade teria pago, aproximadamente, US$ 500 mil desde 1985 ao PSI para ingressar e manter- se em grupo de empresários amigos do PSI.

Na segunda semana de janeiro de 1993, Craxi recebeu o segundo “avviso di garanzia", com acusações de que a propina teria também como beneficiário o próprio Craxi, não só o PSI.

Os pagamentos seriam feitos a Silvano Larini, que seria amigo próximo de Craxi. Larini e Filippo Panseca seriam os proprietários da empresa da qual Craxi alugaria suas mansões opulentas em Como e Hammamet. Craxi ainda recebeu novos “avvisi de garanzia” antes de renunciar ao posto de líder do PSI, em fevereiro de 1993. Sua popularidade logo se transformou em repúdio, e certa ocasião foi alvejado por uma chuva de moedas na rua.

Também viu seu nome envolvido no escândalo da Enimont, empresa química formada por joint venture da Ente Nazionale Idrocarburi ( ENI), a empresa petrolífera estatal italiana, e a Montedision, empresa química subsidiária do grupo Ferruzi ( considerado o segundo maior da Itália, após a Fiat). O governo acabou comprando a parte da empresa privada, mas a preço superestimado que gerou o pagamento de cerca de cem milhões de dólares a vários líderes políticos, dentre eles Craxi.

A operação “mani pulite” também revelou que a ENI funcionaria como uma fonte de financiamento ilegal para os partidos e teria efetuado pagamentos mensais aos principais partidos políticos durante anos. Bettino Craxi, diante das acusações e condenações, autoexilouse, em 1994, na Tunísia, onde faleceu em 2000.

O PSI sofreu uma grave crise financeira e, em 1994, o 47 º Congresso resolveu dissolver o partido. Seus seguidores acabam divididos ente o Forza Italia, de centro-direita, liderado por Berlusconi, e o Partido Democrático, de esquerda. Mais tarde, em 1998, surge o Socialisti e Democratici Italiani, que em 2009 voltou a ser o PSI.

Jogo duplo - Hélio Schwartsman

- Folha de S. Paulo

A Lava Jato está transcorrendo ao mesmo tempo em dois teatros de operações –um propriamente jurídico e outro político. A simultaneidade gera certa confusão.

No plano do Judiciário, a condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinada pelo juiz Sérgio Moro não terá maiores consequências. Foi por certo um exagero autorizar que se leve à força para depor alguém que ainda não se recusara a fazê-lo, mas esse é um deslize menor, insuficiente para anular o inquérito ou mesmo mudar a situação dos personagens investigados.

Diga-se, "en passant", que essas "conduções" são uma mania besta de policiais, promotores, juízes e CPIs. Se todo investigado tem o direito constitucional de não produzir prova contra si mesmo, isto é, de manter-se em silêncio, não há por que levá-lo contra a vontade a lugar nenhum. Tudo o que as autoridades têm a fazer é registrar sua recusa a defender-se preliminarmente. O resto é guerra psicológica, um recurso do qual, em tese, o Estado não deveria se valer.

Já no plano político, o jogo é outro. O passo em falso de Moro –talvez uma resposta à pressão do ex-presidente por mudanças no Ministério da Justiça– deu a Lula a oportunidade de discursar como vítima de uma injustiça. É só o que ele queria para deixar o papel de alguém que deve explicações e abraçar a fantasia do sujeito que luta para livrar-se do arbítrio estatal. Lula pôde trocar o constrangedor silêncio que vinha mantendo pelo palanque no qual acabou lançando sua candidatura à Presidência em 2018.

Não penso, porém, que o novo vigor de Lula irá muito longe. Sua fala pode ter animado a militância petista, mas não muda o quadro geral nem no plano judiciário, onde as investigações prosseguem, nem no político, onde o governo do PT agoniza e o apoio popular ao partido é declinante, sem perspectiva de a economia produzir boas notícias.

A marcha do impeachment - Luiz Carlos Azedo

• O impeachment da presidente Dilma Rousseff voltou à pauta com toda força

- Correio Braziliense

Por uma série de razões, entre elas a incapacidade de o Congresso construir saídas para a crise, os partidos sistematicamente recorrem ao Supremo Tribunal Federal (STF) para resolver suas divergências. Os resultados são decisões judiciais intempestivas e erráticas, que truncam ainda mais o processo político e complicam a situação. A mais recente foi a intervenção aberta do STF no rito de apreciação do impeachment, cujo acórdão foi publicado ontem.

Do ponto de vista político, o caso é o seguinte: o Palácio do Planalto, através de seus líderes, tentou controlar a comissão especial que apreciaria a admissibilidade do pedido de impeachment. Como a comissão formada pelos líderes foi derrotada por uma chapa alternativa no plenário da Câmara, os governistas recorreram ao STF, que virou o jogo. A partir de um voto polêmico do ministro Luiz Barroso, a maioria dos ministros derrotou o relator do caso, ministro Luiz Fachin, e anulou a eleição. Encampou a interpretação de que caberia aos líderes dos partidos, monocraticamente, indicar os membros da comissão, cabendo ao plenário da Câmara apenas homologar ou não a chapa formada. Nada de candidaturas avulsas, como ocorre nas eleições da Mesa e de todas comissões permanentes e temporárias da Casa.

Data vênia, a decisão foi política. Não se baseou na exegese do regimento interno da Câmara, mas numa leitura da situação política cujo maior objetivo foi dificultar a tramitação do impeachment da presidente Dilma Rousseff. Além de anular a eleição, o STF também atribuiu ao Senado o poder de anular a admissibilidade do pedido caso venha a ser aprovada pela Câmara, que perdeu a prerrogativa de afastar Dilma interinamente, até que o julgamento do impeachment fosse concluído pelo Senado.

Essa parecia ser uma sábia decisão, pois afastava do horizonte um cenário de radicalização política. Naquele momento, como agora, a presidente Dilma Rousseff acusava a oposição de impedi-la de governar e de dividir o país. Imaginava-se que o impeachment agravaria a crise econômica e social. A decisão do Supremo parecia sepultar o pedido da oposição, ainda mais porque a presença do deputado Eduardo Cunha no comando da Câmara desgastava a proposta perante a opinião pública.

Entretanto, depois da decisão do STF, a presidente da República continuou a tomar decisões erráticas e a crise econômica se agravou. A Operação Lava-Jato ganhou proporções ainda maiores e a radicalização política, protagonizada pelo PT, subiu alguns degraus. Para completar, Dilma tomou as dores do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e passou a atacar a força-tarefa da Operação Lava-Jato e o juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba, numa tentativa de barrar a investigação criminal que apura o escândalo da Petrobras.

Caso o rito do impeachment tivesse seguido o regimento da Câmara, o assunto já estaria resolvido, com uma provável vitória do governo, pois a oposição não tinha votos suficientes para aprová-lo naquele momento. Esse resultado reduziria o nível de incertezas políticas, pois restaria à oposição afiar as espadas para as eleições municipais e a sucessão de Dilma em 2018. O imponderável seria apenas o julgamento do pedido de cassação da chapa Dilma-Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por abuso de poder econômico durante a campanha de 2010.

Eis, porém, que o impeachment da presidente Dilma Rousseff voltou à pauta com toda força. Foi inflado pela prisão do marqueteiro João Santana, responsável pela campanha eleitoral da presidente Dilma Rousseff em 2014, e pela iminente delação premiada do senador Delcídio do Amaral (PT-MS), ex-líder do governo no Senado. A condução coercitiva do ex-presidente Lula para depor como suspeito na Lava-Jato politizou de vez a Operação. Manifestações contra e a favor do governo estão sendo convocadas para o próximo domingo.

A Comissão do Impeachment na Câmara, porém, ainda aguarda julgamento dos embargos de declaração apresentados pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Com a publicação do acórdão, a tendência é que o julgamento aconteça nas próximas duas semanas. Sendo assim, a comissão especial da Câmara será instalada no final de abril.

Provavelmente, a Câmara votará o pedido em maio. Se for aprovado, seguirá para o Senado. Se os senadores optarem pelo arquivamento, o processo será encerrado até o final de maio, mas, diante da situação da economia e do ambiente político, o Senado pode aceitar o pedido. Nesse caso, a presidente Dilma teria que se licenciar por 180 dias. Michel Temer assumiria interinamente a Presidência. Entre julho e agosto, Dilma estaria afastada. Poderia apelar novamente ao Supremo para adiar a conclusão do julgamento no Senado para outubro ou novembro. Ninguém sabe o que vai acontecer até lá.

À espera de 13 de março - Raymundo Costa

• PT cobra pedágio de Dilma agora que Lula se diz candidato

- Valor Econômico

Enquanto era Dilma contra Eduardo Cunha, o presidente da Câmara dos Deputados, a balança pendeu para o lado da presidente da República. Ajudou inclusive a barrar o andamento do processo de impeachment. Agora são Lula, Dilma e o PT contra Sergio Moro. O "aplaudaço" ao juiz, na noite de sexta-feira, parecem indicar um final diferente, apesar dos protestos contra os procedimentos de Moro e da Polícia Federal em relação a Lula. A prova dos nove é domingo, 13 de março.

Lula foi a 117ª condução coercitiva autorizada por Sergio Moro. O que mostra um padrão da força-tarefa, segundo os advogados que criticam a maneira como é tocada a Operação Lava-Jato, muitas vezes nos limites do estado de direito. Mas o juiz Moro teria muito o que explicar se tivesse tratado o ex-presidente de forma diferente dos demais. O ex-senador Pedro Simon dizia que se fez a CPI dos corruptos, mas não a dos corruptores. Essa é a bússola de Moro.

Lula explorou o quanto pode o incidente. Deixou as dependências do aeroporto de Congonhas, onde foi ouvido pela Polícia Federal, direto para o PT, no centro velho de São Paulo, que também já estava tomado por manifestantes. A mesma coisa em São Bernardo, para onde foi em seguida. Em princípio, nada ficou acertado sobre sua participação, à noite, no evento programado para o Sindicato dos Bancários.

Em atos anteriores, o PT nunca havia conseguido lotar a quadra do sindicato, com capacidade para algo em torno de três mil pessoas. "Desta vez não tinha como andar na quadra", disse uma das pessoas que acompanharam Lula, ao longo do dia. O ex-presidente estava em casa, quando soube que o sindicato estava lotado, e decidiu ir. Falou por 1h27min.

Até o fim deste mês, o PT e partidos satélites da Frente Brasil Popular têm programadas mais três manifestações. Uma hoje, em comemoração ao Dia da Mulher, um ano depois do pronunciamento de Dilma que desencadeou a onda de panelaços no país. O outro será no dia 18, e o terceiro em 31 de março, não por acaso a data do aniversário do golpe militar de 64. Essa é a programação oficial do PT, mas a cúpula partidária reconhece que "tem muita gente com atividades autônomas" previstas para o 13 de março, mesmo dia que a oposição vai às ruas protestar contra o governo federal.

Segundo o PT, serão atividades fora do eixo de concentração das manifestações contra Dilma e Lula. O presidente do PSDB, Aécio Neves, condenou as convocações que o presidente do PT, Rui Falcão, fez da militância para defender Lula. Disse que ele não fez nenhum apelo à "serenidade". Falcão respondeu que o PT estava "sereno" e que Aécio deveria esperar pela eleição de 2018 e não se mostrar tão ansioso pelo poder. O bate-boca certamente não contribui para o desarmamento dos espíritos e o trabalho da polícia.

A presidente Dilma entrou no enredo pela insatisfação do PT. Seu pronunciamento na sexta-feira foi muito criticado pelos dirigentes partidários e pelos mais próximos de Lula, que na prática reverberavam o que dizia o líder. Incomodou, particularmente, Dilma se declarar "inconformada" com a condução coercitiva de Lula e "indignada" com a delação do ex-líder Delcídio do Amaral. Dilma correu para São Bernardo.

O que o PT quer de Dilma é que a presidente "perceba" o "golpe" em movimento, que também é contra ela. E que a sua base social não é o mercado e não são os coxinhas. O que a cúpula partidária espera é que ela se dirija ao povo e anuncie a retirada de pauta da reforma da Previdência. Até mesmo porque não há chance de a proposta passar no Congresso.

Dilma teve um jantar com o PDT. Pediu três coisas. Primeiro, apoio à mudança nas regras de exploração do pré-sal feita no Senado. Os pedetistas responderam que não votam o projeto aprovado e são contrários a mexer na política do pré-sal. O segundo ponto foi a CPMF. Os parlamentares responderam que ainda não têm uma posição firmada (o PT apoia). Por fim, Dilma falou sobre a reforma previdenciária. O PDT disse que era contra. Então são 20 deputados do PDT, se fizer a pergunta ao PT serão mais 60, a mesma coisa no PCdoB. "Onde ela vai encontrar voto para aprovar a PEC da Previdência?", pergunta um dirigente petista.

Só haverá uma aproximação maior de Dilma em relação a Lula se a presidente der uma guinada na economia e assuma que o Executivo também é um dos poderes da República - independentes e harmônicos - e não pode assistir inerte a consecução de um golpe. Para o PT, não havia nenhuma razão para a condução coercitiva de Lula, a não ser o espetáculo midiático para animar o 13 de março. O monitoramento do partido nas redes sociais indica um aumento da mobilização para o domingo, após a publicação da delação de Delcídio e da sexta-feira.

No momento em que a candidatura Lula está posta, o que deve abreviar ainda mais o governo de Dilma, esse é o pedágio que o PT cobra da presidente. No próprio PT há quem diga que ela estará perdida de vez, se pagar.

PMDB quer saltar fora
A delação do senador Delcídio do Amaral e a condução coercitiva de Lula reforçaram as alas do PMDB que defendem o rompimento com o governo federal, na convenção marcada para este sábado. 

A Região Sul toda fechou com essa posição, num encontro realizado no fim de semana em Porto Alegre. Além do Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina, também defendem o rompimento as seções do PMDB da Bahia, Espírito Santo, Acre e Pernambuco, entre outras. 

A carta propõe que o partido "se afaste dessa desastrosa condução do país e atue de forma independente do governo federal". Prudente, o vice-presidente Michel Temer cancelou sua ida ao encontro. Os dirigentes do PMDB ainda esperam que a poeira assente para indicar o rumo que pretendem tomar. Mas a posição dos governistas está enfraquecida. Símbolo maior desse enfraquecimento é o senador Roberto Requião (PR), um dos principais esteios do PT no PMDB, que também esteve em Porto Alegre e assinou a carta de rompimento.

Dez anos depois... - José Casado

• Lula se acha injustiçado no inquérito sobre a corrupção na Petrobras, mas nunca pediu desculpas a Francenildo, cujo direitos foram violados e a vida foi devassada pelo seu governo

- O Globo

Dilma Rousseff, ontem, em Caxias do Sul (RS), para militantes do Partido dos Trabalhadores: — O presidente Lula, justiça seja feita, nunca se julgou melhor do que ninguém. Lula, sexta- feira, em São Paulo: — Antes deles ( policiais, procuradores e juízes) já fazíamos as coisas corretas nesse país... Eu fui melhor que todos. Eu fui melhor que todos cientistas políticos, fazendeiros, advogados e médicos que governaram este país.

Lula é um hábil ator da política- espetáculo. Soube com antecedência e reagiu de forma estudada. “Vou ser preso ou vão fazer a minha condução coercitiva”, avisou na véspera a Gilberto Carvalho — contou o ex-secretário presidencial à repórter Natuza Nery.

O momento mais espontâneo da sexta talvez tenha sido a conversa gravada e divulgada pela aliada Jandira Feghali (PCdoB- RJ). Ao telefone com a presidente, Lula disse o que pensa sobre as instituições, sugerindo um rumo para o processo sobre corrupção na Petrobras: “Que enfiem...” Não se conhece resposta de Dilma.

Lula sabe, também, que deverá ser denunciado. É a tendência da procuradoria com base em evidências sobre as finanças de cinco grandes empreiteiras, responsabilizadas por quase 70% da corrupção comprovada em negócios da Petrobras durante o governo Lula. Entre outras transações, os procuradores descreveram pagamentos de R$ 560 mil mensais ao ex-presidente, de 2011 a 2014. Lula defendeu- as: “Já se deram conta de que o salário de muita gente na Justiça vem dos impostos que pagam essas empresas?”

Preferiu dever respostas substantivas, como se desejasse entregar- se às suspeitas. Reverberou contra as instituições e voltou a sinalizar que a História é ele. Arrematou com seu estado de espírito: “Indignado”, “magoado” e “perseguido”.

Por coincidência, neste março completam- se dez anos daquela que talvez tenha sido a maior das injustiças cometidas pelo Estado brasileiro contra um cidadão comum: Francenildo dos Santos. Aos 24 anos, ganhava por mês (R$ 370) quase 1.500 vezes menos do que Lula recebeu das cinco empreiteiras do caso Petrobras.

Caseiro no Lago Sul, em Brasília, em 2006 testemunhou cenas dos porões do poder, como o trânsito de malas de dinheiro em ambiente de festas libertinas. Num ano eleitoral marcado pelo inquérito do mensalão, confirmou à repórter Rosa Costa que o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, frequentava a casa.

Convocado à CPI, foi silenciado pelo senador Tião Vianna ( PT), que obteve uma liminar no Supremo. O número do seu CPF foi levado da Secretaria da Receita, comandada por Jorge Rachid, para o Palácio do Planalto. Ali, Lula se reunia com o ministro Palocci e o presidente da Caixa, Jorge Mattoso. À noite, o ministro recebeu de Mattoso um envelope com a violação do sigilo bancário de Francenildo na Caixa, relatou o repórter João Moreira Salles.

O governo espalhou cópias de extrato bancário onde constava depósito de R$ 30 mil. Tornou o caseiro suspeito de corrupção, a soldo dos “inimigos” eleitorais. A farsa não durou. Foi comprovado que o dinheiro fora doado pelo pai do caseiro, em parcelas, para ajudá- lo a comprar uma casa.

Desempregado e com a vida vasculhada, Francenildo aguentou firme. Até sugeriu que a devassa se estendesse ao seu voto na eleição de 2002: ajudara a eleger Lula presidente, de quem jamais recebeu sequer um pedido de desculpas.

Novos tempos na América do Sul - Sergio Amaral*

- O Estado de S. Paulo

O referendo na Bolívia, que sepultou a possibilidade de Evo Morales disputar um quarto mandato, é mais um sinal dos novos tempos. O primeiro foi a derrota de Nicolás Maduro nas eleições legislativas na Venezuela, que deu à oposição a maioria no Congresso. Acuado por uma crise econômica sem precedentes e por um estreitamento de sua margem de manobra política, Maduro é uma pálida imagem do que foi o comandante Hugo Chávez em seu país e na América do Sul.

O segundo sinal foi a eleição de Mauricio Macri, que restaurou a esperança e a confiança no soerguimento da Argentina, após o desastre em que acabou o período kirchnerista. Em pouco mais de dois meses o novo presidente sinalizou os novos rumos do país: a liberalização e a abertura da economia, com medidas concretas como a liberalização de preços, a retirada dos impostos e registros de exportação, a determinação em retomar negociações com parceiros comerciais e credores externos.

O Brasil também caminha em direção à mudança. Cresce a convicção de que as políticas do governo não se sustentam. Dilma Rousseff vive sob o fogo cruzado das pressões, de um lado, de parte do Ministério, do Partido dos Trabalhadores (PT) e dos movimentos sociais para que afrouxe a austeridade fiscal – se é que chegou a ser implantada efetivamente – e abandone partes essenciais da reforma da Previdência; e, de outro, dos agentes econômicos e de boa parte da opinião pública para que reduza os gastos públicos, implemente reformas efetivas nos campos previdenciário, tributário e trabalhista para evitar uma deterioração ainda mais séria da economia, sobretudo no momento em que a crise da economia mundial parece chegar a nós, mais uma vez, agora sob o efeito do baixo crescimento, da perda de ativos e ameaça ao sistema bancário nos países desenvolvidos.

Ora Dilma se volta para o PT e os sindicatos e declara apoiar suas reivindicações, ora promete aos empresários austeridade e as reformas da economia. Os jornais publicam, cotidianamente, os acenos da presidente a um e outro lados, como se fosse possível conciliar propósitos antagônicos, que se distanciam ainda mais pela radicalização que o próprio PT estimulou para ganhar as eleições e agora, no governo, não consegue mais conter.

Dilma não tem como resolver o dilema hamletiano em que se enredou, porque pretende ser e não ser ao mesmo tempo. Precisa de ambos os lados: do PT, dos partidos aliados e dos sindicatos, para manter os votos que protegem o seu mandato; e dos empresários, para preservar o que resta da confiança e evitar a falência da economia.

Sem falar da vulnerabilidade externa, pois o Brasil já é classificado como risco maior do que a Turquia, que está em guerra, e a Rússia, abalada por severas sanções econômicas.

A paralisia do governo, sobretudo no trato da economia, alimenta a insegurança e o temor de que o País não aguentará o agravamento das contas públicas, o aprofundamento da recessão e do desemprego, a persistência da inflação e a imprevisibilidade da Operação Lava Jato. O impasse reforça o pressentimento de que, depois da Venezuela, da Argentina e da Bolívia, será a vez do Brasil.

Vale lembrar que a América Latina, não obstante as diferenças entre os países, evolui em ondas. Nos anos 1960, foi a vez dos golpes militares. Em seguida, nos 80, a década da democratização. Nos anos 90, foram as reformas econômicas. Por fim, no início do novo século, a emergência dos movimentos populares e as consequentes reformas sociais.

Agora, a sociedade parece dizer sim às reformas sociais, mas não à custa da desorganização da economia, como ocorreu na Venezuela e na Argentina, e está em via de ocorrer no Brasil, até porque o descalabro fiscal, a inflação, o desemprego e a recessão começam a corroer importantes conquistas sociais construídas ao longo de 20 anos, desde o lançamento do Plano Real.

Se o governo e o PT parecem não querer enxergar o que acontece em nossa vizinhança, obcecados que estão pela ameaça de impeachment da presidente e pelo propósito de permanecer no poder, custe o que custar, parece estranho que a oposição não tenha ainda tirado todas as consequências das profundas transformações em curso. Parece, também, dominada pela pauta do Congresso Nacional, a favor ou contra o impeachment. Não conseguiu ainda convergir para uma liderança, ou lideranças comuns. Não logrou apresentar uma proposta alternativa à população que afirme, com base em programas concretos, aquilo que parece ser a demanda da sociedade: reforma social, sim; desestabilização da economia, não. Nem alcançou até agora a sintonia com os segmentos que parecem constituir o derradeiro baluarte do petismo, ou seja, as camadas de renda mais baixa, sobretudo no Nordeste, em suma, “o povo” de que o PT se julga dono e que a oposição tem o pudor de conquistar.

A primeira eleição de Lula mudou o jogo da política. O líder petista mostrou que era possível ganhar eleição à revelia das elites e da mídia, graças à sua capacidade de falar a língua do povo, adotar a sua agenda e governar para ela. A partir de então, a fórmula tem dado resultado. Hoje, no entanto, o PT e seus dirigentes, Lula incluído, baixaram ao fundo do poço na aprovação popular por terem traído a confiança das brasileiras e dos brasileiros. Mas se os partidos da oposição não conseguirem levar em conta os novas realidades da sociedade e as novas regras do jogo político, é possível que a fidelização das massas – por ganhos sociais por vezes reais, outras vezes enganosos e fruto de uma propaganda maciça – venha a dar mais um alento eleitoral ao PT, apesar dos destroços na economia e da corrupção estampada pela Lava Jato.

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*Sergio Amaral é diplomata, foi Secretário de Comunicação Social da presidência da República no governo FHC