Argelina Figueiredo* teme radicalização do presidente se convocação para atos no dia 15 for atendida
Ricardo Balthazar | Folha de S. Paulo
SÃO PAULO - O futuro do confronto entre o presidente Jair Bolsonaro e o Congresso dependerá do apoio que as manifestações convocadas para o próximo dia 15 receberão, diz a cientista política Argelina Figueiredo, professora da Universidade Estadual do Rio.
Na semana passada, Bolsonaro enviou a seguidores mensagens e vídeos que convocam a população para defendê-lo nas ruas no dia 15, data escolhida por grupos conservadores que apoiam o presidente para protestos contra o Congresso.
Para Argelina, Bolsonaro ampliou o espaço dos militares em seu governo, nomeando generais para postos chave no Palácio do Planalto, com o objetivo de intimidar adversários e inibir tentativas de esvaziar o poder do Executivo.
Argelina, 72, é autora de trabalhos acadêmicos influentes sobre a crise que levou ao golpe de 1964 e as mudanças promovidas nas relações entre o Executivo e o Legislativo pela Constituição de 1988, após o fim da ditadura militar e a redemocratização do país.
Atualmente, ela prepara um novo volume com o cientista político Fernando Limongi, da Fundação Getúlio Vargas, e outros pesquisadores, para atualizar o estudo sobre as relações entre o Executivo e o Legislativo, que completou 20 anos no ano passado.
• O presidente começou a semana incitando seguidores a participar de manifestações contra o Congresso e pareceu baixar o tom nos últimos dias. O que isso significa?
Bolsonaro é um agente provocador, como mostra desde o início do governo. Subestimamos o perigo que ele representa desde as eleições de 2018, quando muitos achávamos que não venceria. Mas há um risco grande de ele se transformar num pequeno ditador.
Como presidente, ele tenta impor ao sistema político tudo que teve de engolir quando era apenas um deputado do baixo clero. Suas ideias autoritárias e reacionárias, o desprezo pelas instituições. Tudo isso visando formar uma base de apoio popular que o ajude a confrontar o Congresso.
Ao mesmo tempo, ele se cerca de generais no Palácio do Planalto e afaga suas tropas, as polícias estaduais, os escalões inferiores do Exército. Acho que ele está fazendo isso para contar com os militares como bombeiros para defendê-lo se houver alguma iniciativa para tirá-lo do poder.
• Como os outros Poderes deveriam reagir?
Não faltariam motivos para iniciar um processo de impeachment se a maioria do Congresso quisesse, mas ele está na corda bamba. Ele precisa responder aos desatinos de Bolsonaro, mas não interessa a ninguém uma situação de confronto aberto.
Num cenário que classifico como catastrófico, mas que parece plausível, o presidente pode incitar as pessoas e provocar o caos para que os militares intervenham para manter a ordem. Acho que muitos políticos veem isso e querem evitar que algo assim ocorra.