sábado, 24 de outubro de 2015

Opinião do dia – Fernando Gabeira

Dilma arruinou o País e precisou de Levy para sanear as contas. De modo geral, isso ocorre em eleições, quando o perdedor deixa para trás uma terra arrasada. Mas o PT ganhou as eleições. Se tivesse perdido, ficaria mais confortável na oposição ao ajuste. Na ausência de um governo adversário, o PT coloca um adversário no governo. Sabendo que Levy propõe medidas duras e tende a fracassar, o PT estará com seu discurso em dia.

O movimento é mais sutil porque tenta atribuir todas as dificuldades do momento à política de Levy, mascarando o imenso rombo deixado pelo próprio governo. Duvido que Dilma e o PT não tenham combinado o clássico movimento morde e assopra. Tanto ela como o PT precisam de Levy: ela para acalmar os mercados e o partido para bater nele.

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Fernando Gabeira, jornalista, “Nessa canoa furada”, O Estado de S. Paulo, 23 de outubro de 2015

Para Lula, PT não deve atuar para ‘afundar’ Cunha

• Ex-presidente nega acordo para ajudar presidente da Câmara, mas diz que governo precisa dele para pautas do interesse de Dilma

Ana Fernandes - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que, em vez de querer “afundar” o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em função das investigações da Operaçao Lava Jato, espera “apenas” que o peemedebista coloque em votação projetos de interesse do governo. Para Lula, Cunha “tem que ter o direito de defesa” tanto quanto ele próprio ou a presidente Dilma Rousseff.

“Enquanto ele for presidente da Câmara, ele vai determinar a pauta do Congresso Nacional e nós temos interesse em aprovar não só parte do ajuste, aprovar a CPMF, o Orçamento, mas aprovar outras medidas que estão lá que são importantes (...) Ao invés de ficar querendo afundar ele, eu quero é que ele coloque em votação as coisas e deixe o processo seguir naturalmente. E quando for julgado, ele vai pagar o preço. É apenas isso que eu quero”, afirmou o ex-presidente à Rádio Metrópole, de Salvador.

Lula defendeu o direito de defesa do peemedebista. “O Eduardo Cunha tem que ter o direito de defesa que eu quero pra mim, para Dilma, para todo mundo. Ele tem que ter apenas o direito de se defender. E se ele for culpado, ele vai pagar como todo mundo tem que pagar nesse País”, disse.

O petista declarou não haver qualquer tipo de acordo com Cunha, como foi noticiado recentemente. Pelo acerto, o governo salvaria Cunha da cassação mesmo após revelação de contas secretas dele na Suíça e, em troca, o deputado frearia os processos de impeachment contra Dilma. “Não tem acordo, porque eu não tenho nem mandato para fazer acordo. O que eu tenho é liberdade para conversar com todo mundo”, disse.

O ex-presidente destacou que estava reunido com a bancada do PT, em Brasília, discutindo a pauta de votações no Congresso, quando saíram as notícias de um acordo costurado por ele com Cunha. “E eu sou obrigado a responder isso? Alguém pergunta assim para mim: ‘presidente, está pronto o acordo?’ Mas que acordo? Eu estou cansado de ilações, não faço política por ilações.”

Lava Jato. Ao ser questionado sobre as referências a seu nome em investigações da Operação Lava Jato, Lula disse estar “tranquilo”. “O papel da oposição é tentar matar o seu adversário. Se não posso na política, vou tentar algum outro jeito. Antigamente, se esperava atrás de uma moita e matava.”

O ex-presidente alegou que a possibilidade de ele ser candidato a presidente da República em 2018 preocupa seus adversários políticos. “Eles já estão preocupados com 2018, em evitar a possibilidade de o Lula voltar – e eu nunca disse a ninguém que vou voltar (...) Sou muito pragmático em Brasília, sinceramente gostaria que não fosse eu o candidato outra vez. Gostaria que nós tivéssemos uma pessoa mais nova, mais competente. O Brasil precisa de novas lideranças”, afirmou.

Reiterou ainda que, apesar do que diga a oposição, o PT não está “morto” e fez uma referência indireta à disputa na capital paulista em 2016. “As pessoas são burras de não perceber que cada eleição é uma eleição. O cara não vai votar no prefeito pensando na presidenta não.”

Estelionato. O ex-presidente falou à rádio que Dilma foi obrigada pelas circunstâncias a fazer o ajuste fiscal, mesmo depois de ter dito, durante a campanha, que ajuste era “coisa de tucano”. “Dilma dizia que ajuste era coisa de tucano e que ela não ia mexer nos direitos dos trabalhadores. E ela foi obrigada pelas circunstâncias políticas”, disse.

Segundo Lula, “a presidente Dilma foi obrigada a manter uma política de subsídio importante para garantir o emprego e outra de desoneração muito grande. Chegou no fim do ano, você percebe que a despesa está um pouco maior do que a receita, então, você é obrigado a parar por uma questão de responsabilidade e a Dilma parou”.

Lula: “Não quero afundar” presidente da Câmara

• Petista afirma que, enquanto chefiar a Casa, Cunha determina pauta

Por O Globo

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou nesta sexta-feira que não quer afundar o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, porque quer a votação das pautas do governo na Casa. Em entrevista à rádio Metrópole, de Salvador, Lula negou que tenha feito acordo com a bancada do PT na Câmara e com Eduardo Cunha para que o deputado não fosse cassado pelas denúncias de corrupção e quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética. Em troca, Cunha não daria andamento ao processo de impeachment.

— Estou cansado de ilações. Acho que o Eduardo Cunha tem que ter todo direito à defesa que quero pra mim, pra Dilma e pra todo mundo. Se ele for culpado, ele vai pagar como todo mundo nesse país. Enquanto ele for presidente da Câmara, ele vai determinar a pauta do Congresso Nacional. E nós temos interesse em aprovar, não só a CPMF, mas parte do ajuste, o Orçamento e outras medidas que estão lá e que são importantes. Então, ao invés de ficar querendo afundar ele, eu quero é que ele coloque em votação as coisas e deixe o processo seguir naturalmente. E quando for julgado, ele vai pagar o preço. Não tem acordo — disse o ex-presidente.

Sobre a relação com o ministro da Fazenda Joaquim Levy e a suposta vontade de indicar o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles para o cargo, Lula disse que não seria desleal com Dilma e, com ou sem levy, vai continuar apoiando o governo.

— Não seria desleal com a Dilma, nem com o Levy, nem com o Meireles. Eu não sou presidente e não tenho direito de indicar ninguém. Eu tenho o direito de torcer para que a presidenta Dilma escolha as pessoas mais corretas. Eu disse ao Levy num visita que a melhor notícia que Dilma tinha dado depois da vitória dela foi sua indicação. Foi o primeiro momento em que a imprensa olhou com carinho uma indicação da Dilma. E ele tem capacidade de fazer o ajuste. Mas ele não tem controle sobre o Congresso Nacional. Se Dilma quiser ficar com Levy, ela fica, se quiser tirar, ela tira. Eu vou continuar apoiando o governo — afirmou Lula, que ainda defendeu o ajuste econômico.

— Na campanha, a Dilma dizia claramente que esse negócio de ajuste era coisa de tucano e que ela não ia mexer no direito dos trabalhadores. Mas ela foi obrigada por circunstâncias políticas a ter que fazer um ajuste.

Sobre a reforma ministerial e as mudanças na Casa Civil, assumida por Jaques Wagner, e na Secretaria de Governo, comRicardo Berzoini, Lula disse que foram boas para “acalmar” o Congresso. Ambas as indicações teriam partido do próprio ex-presidente.

— O Congresso Nacional, me parece, acaba de se ajustar. A ida do Jaques Wagner para a Casa Civil, me parece que deu uma certa tranquilidade, junto com o Ricardo Berzoini. Acho que a coalizão da campanha está mais ajustada agora. E nós temos o problema do Eduardo Cunha, que é um problema que o Congresso tem que resolver e que está sob análise da Justiça. Há pouco a ser feito, quando as coisas estão na mão da Justiça. Temos que separar as coisas. A crise da Lava-Jato não pode se misturar com a crise política.

Lula critica delações e diz que país vive um 'quase Estado de exceção'

João Pedro Pitombo – Folha de S. Paulo

SALVADOR - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou nesta sexta-feira (23) em Salvador que o Brasil vive um "quase Estado de exceção" com as delações premiadas feitas no âmbito da operação Lava Jato.

"Peço que fiquem atentos porque estamos vivendo um momento excepcional em que um cidadão é preso e tem a promessa de ser solto se ele delatar alguém. Aí ele passa a delatar até a mãe, se for o caso", disse Lula para uma plateia de petistas e membros de movimentos sociais.

"O dado concreto que estamos vivendo quase de um Estado de exceção", completou, sob aplausos do público.

O ex-presidente ainda firmou que "não dá pra viver numa sociedade onde o que vale é a suspeição, onde as pessoas são condenadas sem serem julgadas"

E criticou a atuação da imprensa: "Quem condena hoje não é juiz, é manchete de jornal. Não podemos aceitar isso".

Num discurso voltado aos militantes, afirmou que o PT "deve levantar a cabeça": "Temos que lembrar para eles [oposição] que o PT não é meia dúzia, mas somos milhões de homens e mulheres que trabalham e vivem com o suor do seu trabalho".

O ex-presidente ainda criticou a oposição e acusou os adversários de terem preconceito "nojento" contra a presidente Dilma Rousseff (PT) por ela ser mulher.

"Fico puto quando vejo corruptos históricos falando em corrupção. Fico irritado porque parece que os empresários tinham dois cofres, o do dinheiro bom e do dinheiro ruim. O dinheiro ruim ia para PT e o bom para PSDB. É uma coisa insana", afirmou.

Educação
Em Salvador para um evento do PT sobre educação, Lula afirmou que o PT "não deve olhar só para o [ministro da Fazenda Joaquim] Levy" e defendeu que o partido construa uma agenda positiva.

Numa tentativa de estabelecer uma agenda que faça um contraponto à crise enfrentada pela presidente Dilma, Lula falou que vai percorrer o país em defesa do Plano Nacional de Educação.

"A gente tem se dedicar a uma prioridade. Não dá só para ficar só olhando o Levy, o Renan [Calheiros, presidente do Senado], a Dilma, a inflação. Só vamos mudar isso quando fizermos a revolução da educação neste país", afirmou.

Na plateia, cerca de 800 militantes do PT e de movimentos sociais como a CUT (Central Única de Trabalhadores) e o MSTS (Movimento dos Sem Teto de Salvador) acompanharam a fala de Lula.

Com um público abaixo do esperado, a produção do evento teve que retirar 200 cadeiras do auditório.

Lava Jato freia contratação de Lula para dar palestras

Rubens Valente – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Os efeitos da Operação Lava Jato atingiram os negócios do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, fazendo despencar suas palestras remuneradas. Num intervalo de 15 meses, de março de 2014, quando a investigação foi deflagrada, a junho de 2015, Lula foi contratado para apenas seis palestras –uma média de um evento pago a cada 75 dias.

Ao longo dos cinco primeiros meses de 2015, Lula foi remunerado por apenas uma palestra, bancada por uma cervejaria de Petrópolis (RJ).

O quadro era muito diferente antes de 20 de março de 2014, quando foi preso pela Polícia Federal o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, dias após a deflagração da Lava Jato. De 2011 até aquela data, o ex-presidente havia proferido 64 palestras pagas, uma média de um evento remunerado a cada 18 dias.

Os dados constam de um dossiê entregue pelo Instituto Lula ao Ministério Público Federal no Distrito Federal, que investiga supostas irregularidades na relação de Lula com empreiteiras brasileiras e governos estrangeiros.

As empreiteiras envolvidas no escândalo da Petrobras praticamente desapareceram da carteira de clientes de Lula, que recebe por meio de uma microempresa, a LILS Palestras, Eventos e Publicações.

O último evento pago pelas empresas de construção civil –em uma viagem para Angola e Nigéria bancada pela construtora Norberto Odebrecht– ocorreu há mais de um ano, em maio de 2014. Até então, empreiteiros, incluindo Odebrecht, OAS, Queiroz Galvão, UTC Engenharia e Andrade Gutierrez, haviam assumido os custos de 26 palestras e viagens do ex-presidente.

Desde que os primeiros empreiteiros foram presos em decorrência da Lava Jato, em novembro de 2014, até junho passado, Lula não recebeu mais nenhuma palestra nem participou de nenhuma viagem paga por essas empresas. No mesmo período, de cinco palestras realizadas, o ex-presidente não foi remunerado em três ocasiões.

Antes da Lava Jato, as empreiteiras bancaram 38,6% das palestras remuneradas do ex-presidente.

Na investigação, o Ministério Público não indagou ao Instituto Lula os valores recebidos por cada palestra. Reportagem da revista "Veja" de agosto, que citou documento do Coaf, órgão de inteligência financeira vinculado ao Ministério da Fazenda, indicou que a empresa de palestras de Lula obteve R$ 27 milhões nos últimos quatro anos –a cifra não foi contestada pelo Instituto Lula.

Segundo a documentação enviada pelo Instituto Lula aos procuradores da República, nas viagens patrocinadas por empresas e também por alguns governos, Lula reuniu-se com líderes políticos como o ex-presidente norte-americano Bill Clinton e o ex-primeiro ministro francês François Hollande. Em 2013 e 2014, Lula esteve duas vezes com o ex-ditador cubano Fidel Castro e seu irmão, Raúl.

Telegramas
Telegramas sigilosos produzidos pelo Itamaraty e também enviados ao Ministério Público registram parte da movimentação de Lula no exterior. Um deles, classificado como secreto, traz uma descrição de Lula sobre Fidel após o encontro de 2013.

O embaixador brasileiro em Havana, José Eduardo Felicio, disse que Lula lhe contou que "o comandante lhe pareceu muito debilitado". Segundo Lula, Fidel tinha dificuldades de locomoção e "intelectualmente não demonstra incoerência, mas está repetitivo". "Em tom de lamento, o ex-presidente [Lula] expressou: 'Fidel já é história'", escreveu o embaixador.

Outro lado
A assessoria do Instituto Lula disse que o ex-presidente Lula se dedicou mais, em 2014, "às atividades políticas" por se tratar de um ano eleitoral e, em 2015, ao instituto e "a discutir o Plano Nacional de Educação".

O instituto afirmou que o foco do ex-presidente "não é o lucro, diferente de uma empresa privada como o Grupo Folha, que publica a Folha de S. Paulo", mas sim "trabalhar pelo Brasil, sempre dentro da lei".

"Fazer palestras é apenas o exercício legal e legítimo que ele tem de ter um trabalho e uma fonte de renda".

Segundo o Instituto, Lula "fez um número maior de palestras em 2011, depois reduziu suas atividades para se tratar de um câncer e para participar das eleições municipais de 2012. Em 2013 fez mais palestras novamente. Em 2014, ano eleitoral, o ex-presidente se dedicou mais às atividades políticas".

O Instituto criticou o acesso que a Folha teve aos documentos enviados pela entidade ao Ministério Público.

'PSDB não deve ser como PT foi', diz FHC

• Lançamento de livro com gravações do primeiro biênio no Planalto leva ex-presidente a defender gestão e criticar oposição sem estratégia

Pedro Venceslau, Iuri Pitta - O Estado de S. Paulo

Quando decidiu gravar em fitas cassete seu dia a dia no poder, o presidente Fernando Henrique Cardoso, então com 63 anos, planejava que as "confissões" só fossem divulgadas depois de sua morte.

Ao mudar de ideia e publicar em vida os registros da passagem pelo Palácio do Planalto, o tucano revela desabafos, queixas e satisfações, assim como se expõe a reações e desmentidos de quem foi citado. Não renega o que foi dito, e acaba por usar as comparações com o Brasil de hoje para apontar erros não só no governo petista, mas na oposição tucana. "Não acho que o PSDB deva fazer o que o PT fez comigo", diz o ex-presidente.

Na apresentação do primeiro volume de Diários da Presidência, a ser lançado na quinta-feira, FHC aponta alguns dos motivos que o levaram a "publicar ainda em vida informações que foram ditadas para depois da morte": desfrutar o prazer e os incômodos de ver as reações; traçar paralelos entre a dificuldade de governar o Brasil em 1995 e em 2015; mostrar o "infundado de muitas apreciações sobre meu governo, sobretudo quanto a acusações que se repetem". Em entrevista ao Estado, acrescentou: "No momento que o Brasil vive, precisamos abrir o jogo e deixar mais claro como as coisas são. Eu não tenho nada a esconder".

Não há uma forma única de se ler as mais de 900 páginas do primeiro volume, que traz a transcrição de 44 fitas e quase 90 horas de gravações entre o Natal de 1994 e o fim de 1996. Pode-se ler o livro cronologicamente, ou buscar as citações a nomes ou temas. De um jeito ou outro, tem-se um presidente da República registrando como gostaria que seus feitos e intenções fossem lembrados. De certa forma, soa como antídoto ao que Shakespeare dizia ocorrer: "O mal que os homens fazem lhes sobrevive, ao passo que o bem é, na maioria das vezes, sepultado com os seus ossos".

Sem culpa.Ao ouvir as gravações para a edição do livro, com o distanciamento de quase duas décadas, FHC reconhece erros em suas avaliações de momento, assim como as dúvidas e dilemas antes da tomada de decisões. "Posso ter errado, e certamente errei na apreciação de pessoas, fui injusto e tudo o mais. Mas é aquilo", afirmou o tucano. "(Nas gravações) Eu mudo de opinião, fico na dúvida. O ser humano é complexo."

Parte dos desabafos e relatos já renderam queixas dos citados, como o atual presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), cujo nome FHC diz ter recebido do então deputado Francisco Dornelles (hoje no PP-RJ) como indicação para uma diretoria na Petrobrás.

"Naquela altura eu mal sabia quem era Cunha. Eu só tinha registro do que tinha acontecido no governo Itamar (Franco), que ele perdeu o lugar dele lá (a presidência da Telerj, antiga estatal de telecomunicações)", explica o ex-presidente. "Não sei se foi o Dornelles quem pediu. Foi um grupo de deputados, encabeçado pelo Dornelles. Pode ser que ele tenha razão, mas eu não ia inventar isso hoje. As pessoas têm que encarar isso como fatos da vida. Não é culpa."

Assim também podem ser vistas as queixas do então presidente às intrigas entre os auxiliares mais próximos e à defesa de seu governo pelo PSDB. FHC reconhece o papel de deputados e líderes da época, como José Aníbal, Arnaldo Madeira e Aécio Neves, mas aponta como problema a não ser repetido pelo partido a "falta de convicção" dos tucanos nas votações.

"O que eu reclamava era o seguinte: eu sei que nós vamos ganhar. Vai estar lá, no painel (do plenário) que o governo ganhou. Mas eu dizia: vocês vão perder a eleição porque ninguém está lutando ideologicamente. O PT vai lá e diz que isso é traição nacional. Todo mundo fica paralisado", recorda, na entrevista sobre o livro. "Na época era assim: o que o PT falou, está falado. Eu dizia que eles não estavam lutando para fazer uma coisa com convicção. Estão dando um voto sem convicção. Eu quero voto com convicção. Tem que brigar."

É o que se vê no PSDB de hoje, como oposição aguerrida à presidente Dilma Rousseff? Não exatamente, diz o tucano. "Em certas matérias a oposição precisa pensar no País. Não pode votar contra o fator previdenciário. Acho um erro do PSDB no Congresso", avalia Fernando Henrique. "A situação fiscal é dramática e alguma coisa precisa ser feita. Eles (PT e PSDB) estão em uma competição, no calor da batalha. Mas não pode errar estrategicamente."

Fernando Henrique Cardoso ‘Cunha está a um passo de virar réu’

• Antes de lançar o primeiro volume de ‘Diários da Presidência’, FH ataca Lula, dá conselhos a Dilma e critica o próprio partido

Silvia Amorim, Tiago Dantas – O Globo

Não é de hoje que o PMDB é o fiel da balança da governabilidade. O senhor também teve que fazer aliança com eles. Em seu livro, ao falar da pressão por cargos, diz que o PMDB "não é um partido; é uma confederação de interesses". Ainda pensa assim?

Acho que sim. O PMDB era um grande agrupamento de pessoas contra o regime autoritário. O regime caiu e ficou só um grande agrupamento de pessoas. Mas qual o objetivo? Por que valores se bate? Eles gostam de dizer que são o partido da governabilidade. São. Estão sempre no poder.

Seu partido tem buscado aproximação com esse PMDB de olho num impeachment. O PSDB tem até feito um jogo duplo com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, defendendo o afastamento dele em público, mas, nos bastidores, articulando com ele. Aprova isso?

É uma situação embaraçosa. Ele ainda é o presidente da Câmara e muitas decisões passam por ele. Eu acho que (o PSDB) deve pedir o afastamento dele. Se você tiver uma pessoa sobre a qual pesem menos dúvidas no exercício da Câmara, você tem mais jogo político a fazer e um processo mais legítimo. Ele (Cunha) está a um passo de virar réu.

Por "decisões" o senhor quer dizer impeachment?

Não sei se há base jurídica para impeachment. Estamos tapando o sol com a peneira. Está tudo tão errado, que não é questão de impeachment ou não. Houve dinheiro discutível na campanha, e isso já é razão para muita coisa. Se juridicamente tem razão ou não (para afastar a presidente), não é isso que vai comandar o processo. É uma questão política e econômica.

Que saída tem a Dilma?

Se Dilma tivesse tido visão, teria juntado todo mundo e dito: "estamos mal, não importa a culpa de quem é". Ou então não anda. É preciso haver um momento, que eu não sei se vai existir, em que tem que ter liderança. Pensei várias vezes o que faria se estivesse no lugar dela. Posso imaginar as dificuldades. Eu diria: "Está bem, vocês não me querem, vou embora. Mas quero primeiro que o Congresso aprove isso, isso e isso".

Existe clima para isso?

Não, mas acho que é preciso algo desse tipo. A crise não é a Dilma. Ela tem responsabilidades como, por exemplo, na parte energética, onde tudo está errado. Mas a responsabilidade política é do Lula, que transformou o presidencialismo de coalizão em cooptação. Agora complicou muito porque (o governo) tem um Congresso multifacetado e não tem apoio popular nem agenda. O Congresso controla.

Há quem diga que a saída deveria ser construída entre o senhor e Lula.

Deixe eu dizer uma coisa. Quando fui para a África do Sul (no funeral do Nelson Mandela em 2013) e estávamos todos (Sarney, Collor, Lula e Dilma) no avião presidencial, achei que tinha que dizer algo. Disse que o sistema que está aí não funciona mais e que nossos partidos ou não têm força para mudar ou não querem. Estava na hora de discutirmos algo em conjunto. A reação foi nenhuma. Agora é tarde. Nós estamos nas mãos da Lava-Jato e da crise econômica.

Lula pouco aparece no livro, e a reflexão que o senhor faz sobre o PT em 1996 era de um partido que nunca cresceria. Foi um erro de avaliação?

Errei. Eu achava que o PT estava gerindo bem certas cidades e que era bom. Não imaginei que crescesse tanto. O PT estava muito radicalizado. Não fazia alianças. Quando o Lula impôs como condição para ser candidato fazer alianças, começou a crescer. A ausência do Lula (no livro) é porque não tinha projeção naquela época, não tinha importância política. Meu medo era o (Paulo) Maluf.

O senhor foi alertado em 1996 pelo dono da CSN, Benjamin Steinbruch, que a Petrobras era um "escândalo", mas conta no livro que decidiu não "mexer" na estatal. Por quê?

Ele não estava falando de corrupção, mas de gestão, que o conselho era composto pelos próprios diretores. Só isso.

O ex-diretor da Petrobras Pedro Barusco, um dos condenados pela Lava-Jato, diz que a corrupção começou em 1997.

O que começou em 1997 foi uma tentativa de suborno, mas sem a conivência da diretoria. O que vemos agora não é corrupção normal, que pode ter existido no meu tempo na Petrobras, porque é impossível saber se "fulano corrompeu beltrano". Hoje é um sistema organizado, com sopro político, caixa dos partidos.

No livro, o senhor reclama da postura da imprensa e a acusa de ter sido injusta com o início do seu governo. Por que a crítica?

Não acho que a cobertura, em geral, tenha sido injusta. Às vezes, o registro não correspondeu ao que aconteceu. Não posso ter a pretensão de dizer que "o certo era eu". Eu entendia até certo ponto qual é a função da imprensa. A imprensa é naturalmente crítica. Agora, é difícil quando você está sendo objeto da crítica.

O plano era publicar o livro após sua morte. Por que mudou de ideia?

Confesso que não li o livro todo até hoje porque é muita coisa. Mas houve insistência de muitas pessoas para publicar (logo). Pensei: o Brasil está tão complicado que talvez seja o caso de publicar para mostrar como funcionam as coisas por dentro da Presidência. Não tenho ambição de ser mais nada.

Se Dilma fosse capaz de pôr limite à crise, já teria feito, diz FHC

Daniela Lima – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Às vésperas do lançamento do primeiro volume do livro "Diários da Presidência", em que narra seu cotidiano no poder, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso diz que a obra ajudará o país a entender "como o jogo político se dá". "Qualquer sistema implica em distribuição de poderes. A questão é: para quê?", afirma.

Num paralelo com o cenário atual, diz que o país está "ladeira abaixo" e que se a presidente Dilma Rousseff fosse "capaz de botar o limite" à crise, "já devia ter posto". Ele ressalta que "não trabalha para isso", mas que vê o hoje vice-presidente Michel Temer (PMDB) com mais condições de reunir apoio do que a petista. Veja abaixo os principais trechos da entrevista.

Folha - Muita gente se pergunta por que o sr. decidiu publicar esses diários agora...

Fernando Henrique Cardoso - Não é agora, esses dias, essa semana. É em vida. Acho que está na hora do Brasil entender mais diretamente o jogo político, como ele se dá, quais são as dificuldades, o que significa governar. Está tudo tão desarticulado que não custa dar um testemunho sincero, em que não estou escondendo nada, nem a mim mesmo. Não é uma coisa para se tomar como a verdade. É a minha reação sob aquelas circunstâncias.

O vice-presidente Michel Temer procurou o sr. para negar que tivesse atuado para nomear gente no seu governo?

Não foi ele quem me pediu. Eu digo isso [no livro]. O Luís Carlos disse que ele queria... Até faço referências elogiosas a ele: que tem boa construção jurídica, que é discreto. Ele não nomeou ninguém.

O sr. diz também no livro que há 'similitude' entre o cenário de 20 anos atrás e o de hoje.

Nossos costumes evoluíram muito pouco. A herança cultural brasileira é corporativista. E isso evoluiu pouco. Aliás, regrediu recentemente. Eu tinha uma agenda. O tempo todo tentei fazer reformas. Havia uma coalizão para isso. Evidentemente, isso tinha um certo preço.

Qual o preço?

Qualquer sistema implica em distribuição de poderes. A questão é: para quê? Quando se tem uma agenda, você se justifica. É uma justificativa pessoal. 'Por que eu estou cedendo nisso? Porque eu preciso daquilo e aquilo é mais importante. Quando o Executivo está forte, o sistema funciona. Quando está fraco, como hoje, fica paralisado.

A queda da presidente Dilma seria suficiente para resolver a crise?

Vou responder de outra maneira: se o Aécio tivesse ganho a eleição, a situação seria a mais ou menos a mesma, mas haveria um horizonte de esperança. Agora estamos indo ladeira abaixo e alguém vai ter que pôr um limite. Se fosse capaz de botar o limite, já devia ter posto.

Acha que num eventual impeachment o PSDB deveria dar sustentação a Temer?

Não estou dizendo que vai acontecer ou que estou trabalhando para isso, mas acredito que o Michel teria a sensibilidade para ter um apoio mais amplo.

O sr. conta no livro que barrou a nomeação de Eduardo Cunha para um cargo.

Eu não o conhecia. Tinha o registro do tempo do Itamar [Franco]. Sabia que ele não tinha sido reconduzido... Enfim, boatos, que não se comprovam, mas existiam.

E como vê a aproximação do seu partido com ele hoje?

Um lado precisa interagir com o presidente da Câmara. Outra questão é o que ele está sendo acusado, aparentemente com muitas provas. Tem que responder.

A posição do PSDB com relação a ele é satisfatória?

O PSDB fez o que tinha que fazer: pediu o afastamento.

O sr. reclama muito da imprensa no livro, à exemplo do que fazem aliados do governo hoje. É uma prerrogativa de quem está no poder?

Mesmo fora do poder! Vou reclamar já. Outro dia, vi um relato do livro dizer que alguém veio até mim falar que a Petrobras era um 'verdadeiro escândalo'. O escândalo ali se referia à gestão, não era roubalheira. Depois eu resolvi. Como colocaram, parece que eu estava falando de corrupção. Essas coisas, quando se está no governo, isso tudo te deixa bastante chateado.

O sr. não temeu esse tipo de questionamento?

Não. Os diários são um documento histórico. Os chamados escândalos estão lá no livro, Sivam, Pasta Rosa... Nunca fui transigente com essas questões.

O sr. diz que os amigos dão mais trabalho que os inimigos no governo.

Isso é do poder. Ali, entre os ministros, havia cinco ou seis de alta qualidade e muito amigos. São pessoas fora de série e, como é normal, pessoas fora de série são difíceis umas com as outras. Eu arbitrava, com jeito.

O sr. chega a dizer que o 'mal' está no grupo mais próximo...

Eu pedia comedimento, 'não falem tanto'. Mas, no balanço, é uma injustiça que fiz com meus amigos. Uma reação subjetiva, que registrei.

Oposição reavalia apoio a presidente da Câmara

Igor Gadelha - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA Pressionada pelo agravamento das denúncias contra o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e pelos sinais que ele tem emitido ao governo, a oposição começa a avaliar rever seu posicionamento em relação ao peemedebista. Essa revisão, contudo, não será fácil.

Rachados sobre a defesa de Cunha, líderes oposicionistas terão de conciliar, de um lado, o discurso do Solidariedade em defesa de alinhamento a todo custo e, do outro, o discurso do PPS, DEM e PSDB, que já dão sinais de endurecimento contra o presidente da Câmara.

Para os que defendem o início de um processo de distanciamento, a situação de Cunha está cada vez mais complicada e ele tem dado sinais ao Planalto de que pode não embarcar na tese do impeachment. A mudança de posicionamento em relação ao presidente da Câmara já ficou evidente em algumas atitudes nesta semana. Na CPI da Petrobrás, o PSDB apresentou voto pedindo investigação do peemedebista e de todos os demais políticos alvo da Operação Lava Jato. Segundo líderes da oposição, o pedido teria sido articulado pelo do líder do partido na Câmara, Carlos Sampaio (SP), e outros deputados do PT do colegiado, sem combinar com os demais partidos da oposição. O tucano não comentou o assunto.

O ato de Sampaio irritou Cunha e alguns líderes da oposição. O presidente da Câmara reagiu e deu entrevista defendendo cautela em relação à análise de que as pedaladas fiscais apontadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) podem justificar o impeachment de Dilma. "O fato de existir a pedalada necessariamente não quer dizer que tenha havido o ato da presidente da República com relação ao descumprimento da lei. São duas coisas distintas. A pedalada pode ser uma circunstância de equipe", afirmou.

Vacilo. Para o líder do Solidariedade, Paulo Pereira, o Paulinho da Força, a oposição "vacila" com atos contra Cunha. Na avaliação dele, oposicionistas não devem apostar na tese de acordo entre Executivo e presidente da Câmara, pois está "claro que o governo não vai cumprir acordo". "O PT já mostrou que não é confiável. Mesmo com a articulação do (ministro-chefe da Casa Civil) Jaques Wagner, deputados do PT da Bahia (mesmo Estado do ministro) assinaram o processo contra o presidente (da Câmara) no Conselho de Ética", afirmou. "Se o PT tivesse condição de proteger alguém não tinha ninguém preso na (Operação) Lava Jato", acrescentou o deputado.

A reunião entre líderes da oposição está marcada para a próxima terça-feira. Enquanto o novo encontro não é realizado, oposicionistas reafirmam publicamente a nota lançada no dia 10 de outubro, em que defendem o afastamento de Cunha do cargo.

Arrecadação despenca, e governo já revê rombo

• Déficit fiscal, antes estimado em R$ 50 bi ou R$ 70 bi, será recalculado

Nova meta para 2015, que deveria ter sido enviada ontem ao Congresso, foi adiada para a semana que vem

A arrecadação de impostos pela União despencou em setembro, quando foi de R$ 95,239 bilhões, o pior resultado em cinco anos. Com isso, a pouco mais de dois meses do fim de 2015, o governo decidiu recalcular a estimativa de rombo nas contas públicas para este ano. A mais nova alteração nas metas fiscais, que seria enviada ao Congresso ontem, foi adiada para a semana que vem. O governo chegou a prever R$ 50 bilhões ou R$ 70 bilhões de déficit, caso tenha que regularizar todas as chamadas “pedaladas” fiscais. Agora, já não sabe o tamanho do buraco nas contas.

Déficit fiscal ainda sem tamanho

• Arrecadação despenca e governo adia envio ao Congresso de nova meta para as contas públicas

Bárbara Nascimento, Martha Beck - O Globo

BRASÍLIA - A arrecadação de impostos e contribuições federais continua em queda livre e registrou, em setembro, o pior resultado dos últimos cinco anos. A Receita Federal informou ontem que, em setembro, entraram nos cofres públicos R$ 95,239 bilhões, o que representa uma queda real (já descontada a inflação) de 4,12% em relação a igual mês de 2014. No acumulado de 2015, o governo arrecadou R$ 901,053 bilhões, 3,72% a menos do que no mesmo período do ano passado. O dado também foi o pior desde 2010. Os números desanimaram ainda mais a equipe econômica e adiaram o anúncio da nova meta fiscal deste ano.

Isso porque, diante do péssimo desempenho da arrecadação, a Junta Orçamentária decidiu pedir à Receita que refaça suas estimativas. Os técnicos preferiram esperar os números para recalcular o déficit nas contas públicas em 2015. Assim, a pouco mais de dois meses para o fim do ano, o governo não sabe ainda o tamanho do rombo fiscal previsto para 2015. A frustração de receitas é um dos principais motivos que devem levar o governo o a divulgar a revisão da meta fiscal deste ano, admitindo um déficit bilionário.

Havia uma expectativa de que o governo fosse encaminhar ao Congresso uma proposta de alteração da meta fiscal de 2015 — hoje fixada em R$ 8,7 bilhões, ou 0,15% do Produto Interno Bruto (PIB) — até ontem. No entanto, os técnicos não conseguiram fechar os números.

TCU diz que não exigiu ‘pedaladas’ à vista
Isso porque, além da queda nas receitas, o governo ainda estuda como contabilizar no Orçamento deste ano as pedaladas fiscais (atrasos nos repasses de recursos do Tesouro para bancos públicos) que foram condenadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Na quinta-feira, o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, informou que o governo havia recebido da Corte uma sinalização de que todas as pedaladas — calculadas em R$ 40 bilhões — deveriam ser pagas de uma vez. Dessa forma, o resultado de 2015 poderia chegar a um déficit superior a R$ 70 bilhões.

No entanto, ontem pela manhã, a equipe econômica voltou a conversar com os ministros do TCU sobre as dificuldades em quitar a fatura toda este ano. O principal problema é que não há recursos no Orçamento para pagar o valor total. Assim, seria preciso editar uma medida provisória solicitando um crédito extraordinário para esse pagamento, e ainda emitir títulos públicos, o que aumentaria a dívida pública.

Depois da conversa, o TCU divulgou uma nota na qual afirma que ainda não se posicionou sobre a forma como as pedaladas deveriam ser quitadas: “Não há qualquer determinação do tribunal para que o pagamento dos recursos referentes às chamadas pedaladas fiscais seja feito em parcela única ou diferido no tempo”. A nota foi comemorada no Palácio do Planalto e vista como uma sinalização de que a equipe econômica pode ganhar um fôlego maior para acertar o passivo. O Tesouro Nacional considera que essas despesas poderiam ser pagas com menor impacto num prazo de três anos.

A Receita justifica que o resultado da arrecadação é uma consequência do mau desempenho da economia, que derruba a produção e o lucro das empresas. A arrecadação referente ao Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), por exemplo, teve uma redução real de 12,42% entre janeiro e setembro. A receita proveniente do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) também teve um forte queda: de 12,93%.

As desonerações tributárias também são apontadas pelo Fisco como um fator que pesou no resultado. Nos primeiros nove meses deste ano deixaram de entrar nos cofres R$ 79,5 bilhões por conta de desonerações, ante R$ 72,1 bilhões em 2014. O maior peso é da folha de salários, que representou uma renúncia fiscal de R$ 18,1 bilhões. O governo não conseguiu aprovar a redução da desoneração da folha para diversos setores. E mesmo o que foi aprovado só terá efeito financeiro no ano que vem, explicou o chefe do centro de estudos tributários e aduaneiros da Receita, Claudemir Malaquias:

— Uma composição de fatores determina o resultado negativo da arrecadação. Alguns são estruturais... Outro é a atividade econômica, ela não está nos patamares esperados.

Sinais de crise por toda parte

Regina Alvarez - O Globo

BRASÍLIA - A arrecadação em queda, mês após mês, é o sinal mais evidente de que está muito difícil para o governo fechar as contas do ano. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, assumiu em janeiro prometendo um superávit fiscal primário equivalente a 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB ), e as últimas projeções, vazadas por diferentes fontes, indicam que o déficit chegaria a 1,2% do PIB, se regularizadas as pedaladas fiscais, repasses devidos pelo Tesouro Nacional aos bancos públicos.

Os sinais da crise estão em toda parte, e o governo contribui para tornar as expectativas ainda mais sombrias com a comunicação caótica de sua equipe. Nas últimas duas semanas, surgiram dezenas de versões para o tamanho do rombo das contas públicas, que estica ou encolhe a cada reunião. E outras tantas para a fórmula de arrumar as contas.

Para quem assiste de fora, a impressão é que a equipe econômica e o próprio governo estão divididos em relação ao caminho que deve ser adotado na política fiscal. O discurso desarticulado e confuso e os sinais contraditórios não contribuem para recuperar o que o governo mais precisa neste momento: confiança e credibilidade.

Governo vai informar deficit 'parcial' na próxima semana

Valdo Cruz, Dimmi Amora – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O governo Dilma vai criar uma cláusula especial na nova meta para as contas públicas que deve enviar ao Congresso na próxima semana.

O mecanismo vai permitir que até R$ 42 bilhões referentes ao pagamento de dívidas com bancos públicos, as chamadas pedaladas fiscais, sejam incluídos apenas depois de negociações com o Tribunal de Contas da União.

Ou seja, o deficit primário (gastos menores que a arrecadação, sem contar despesas com juros) que será previsto na nova meta, entre R$ 50 bilhões e R$ 57 bilhões (de 0,85% a 0,95% do PIB), será referente apenas à frustração da arrecadação esperada.

O valor exato dependerá da orientação do TCU sobre a forma de pagar o passivo das pedaladas fiscais: de uma só vez ou de forma parcelada.

O governo que evitar novas contestações judiciais –as contas de 2014 foram reprovadas pelo tribunal por causa do uso desse artifício fiscal, o que serviu de base para pedidos de abertura de um processo de impeachment.

Divergências
A nova previsão da meta foi adiada para a próxima semana por causa de divergências na equipe econômica.

O Ministério da Fazenda trabalhava com um rombo primário de R$ 50 bilhões, e o Planejamento, com um de R$ 57 bilhões.

Além disso, enquanto a Fazenda prefere parcelar o pagamento das pedaladas para evitar um rombo elevado, a equipe do Planejamento defende zerar a conta das pedaladas fiscais.

Na noite de quinta-feira (22), o governo chegou a divulgar que o TCU havia determinado o pagamento total do passivo e chegou a informar que, com isto, o deficit primário iria superar R$ 70 bilhões.

O tribunal, porém, negou a informação ontem. Integrantes do TCU avaliam que uma decisão final do órgão não sairá antes de dezembro, depois de o órgão analisar recursos do próprio governo.

Há dúvidas sobre se o governo pode ou não parcelar esses débitos com bancos públicos, pois não há lei que permita esse parcelamento.

No entanto, alguns ministros tenderiam a aceitar um cronograma para evitar um impacto ainda maior das contas públicas.

Em nota, o TCU informou que "não há qualquer determinação do tribunal para que o pagamento dos recursos referentes às chamadas 'pedaladas fiscais' seja feito em parcela única ou diferido no tempo" e que "somente se pronunciará quanto ao mérito após apreciação dos recursos pelo plenário".

À espera do leilão
Num cenário extremo, somando o deficit previsto pelo Planejamento (R$ 57 bi) com o pagamento total das pedaladas (R$ 42 bi), o rombo nas contas do governo federal poderia chegar perto de R$ 100 bilhões (1,7% do PIB).

O Palácio do Planalto acredita, porém, que essa conta será menor com a entrada de receitas extraordinárias ainda neste ano.

O governo vai informar ao Congresso, junto com a previsão de nova meta, que espera diminuir o deficit em pelo menos R$ 11 bilhões, receita que pode ser gerada pelo leilão de 29 usinas hidrelétricas em 2015, previsto para o início de novembro.

Brasil fecha 1,24 milhão de vagas de emprego formal em um ano

• Em setembro, o Brasil fechou 95.602 vagas formais de emprego, o pior resultado para o mês da série histórica iniciada em 1992

Bernardo Caram - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - No mês de setembro, o Brasil fechou 95.602 vagas formais de emprego, segundo informou nesta sexta-feira, 23, o Ministério do Trabalho e Emprego e Previdência Social, o pior resultado para o mês da série histórica iniciada em 1992. Os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) são fruto de 1.326.735 admissões e 1.422.337 demissões. No acumulado dos últimos 12 meses, o País fechou 1,24 milhão de vagas.

O resultado foi muito inferior ao registrado em setembro do ano passado, quando ficou positivo em 123.785 vagas pela série sem ajuste. Desde janeiro deste ano, o saldo de postos fechados é de 657,8 mil. Os dados são sem ajuste, ou seja, não incluem as informações passadas pelas empresas fora do prazo.

Os dados relativos ao mês passado são os primeiros divulgados sob a gestão de Miguel Rossetto à frente da pasta que fundiu Trabalho e Emprego e Previdência Social. O ministro optou por não conceder coletiva de imprensa para comentar os números.

O resultado ficou perto do teto das expectativas do mercado para o mês passado. De acordo com levantamento do AE Projeções, serviço da Agência Estado, apurado com 20 participantes, a expectativa era que o mercado de trabalho com carteira assinada tivesse retração de vagas em setembro, com resultado negativo entre 45.000 a 102.510, sem ajuste. O resultado foi pior que a mediana apurada, que esperava um corte de 61.500 postos de emprego formal no período.

Setores. O setor de serviços foi o responsável pelo maior número de vagas formais de trabalho fechadas em setembro. No total, foram encerradas 33.535 posto no setor. O número é resultado de 530.846 admissões e 564.381 desligamentos no período.

Todos os setores da economia fecharam vagas no mês passado. O segundo maior responsável por fechamento de postos no mês passado foi a construção civil, com saldo negativo de 28.221. O comércio encerrou 17.253, seguido da indústria de transformação, com menos 10.915.

Tradicionalmente com saldo positivo, mesmo enquanto outros setores demitiam, a agricultura fechou 3.246 vagas no mês passado. Já a administração pública registrou retração de 1.088 postos de emprego formal.

"Já era esperada uma deterioração em serviços, mas o resultado veio bem pior do que esperávamos", disse o economista Thiago Biscuola, da RC Consultores.

Para ele, a baixa expectativa do comércio para as vendas de fim de ano afetou a geração de empregos formais no segmento em setembro. "Se o comerciante espera um Natal fraco, ele não vai contratar. E setembro costuma ser mês de contratação para as empresas que se preparam para o movimento maior de fim de ano", disse.

Biscuola também disse que, além de as empresas estarem demitindo mais, elas estão postergando contratações em razão das incertezas da economia. "Há problema de confiança. Por mais que muitos empresários não saibam qual é o impacto da piora fiscal do governo em seus negócios, eles veem os juros subindo e sentem mais dificuldade para conseguir crédito. Isso afeta a confiança e ele evita contratar", afirmou.

Corte de vagas e diminuição da renda levam mais mulheres a buscarem emprego

• Avanço de 2,7 pontos porcentuais na taxa de desemprego no último ano superou as estimativas mais pessimistas; número de mulheres que integram a força de trabalho, seja empregadas ou buscando um trabalho, cresceu em um ritmo maior que o de homens

Mário Braga - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - O avanço de 2,7 pontos porcentuais na taxa de desemprego no último ano é classificado por especialistas ouvidos peloBroadcast, serviço de informações em tempo real da Agência Estado, como muito intenso, supera as estimativas mais pessimistas e mostra que a deterioração do mercado de trabalho surpreendeu negativamente, acompanhando o desempenho pior que o esperado da economia ao longo de 2015.

A eliminação de postos de trabalho e a diminuição da renda levaram cada vez mais pessoas, principalmente as mulheres, a buscar uma ocupação, de forma a compensar o risco ou mesmo a demissão dos chefes das famílias.

Após ficar em 4,7% em outubro de 2014, o desemprego iniciou uma firme trajetória de alta até bater 7,6% em agosto e repetir a taxa em setembro deste ano, segundo revelou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística nesta quinta-feira. É o maior avanço já registrado em um ano na série histórica da Pesquisa Mensal de Emprego (PME), que teve início em março de 2003 e cobre as regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador e Recife.

Sem precedentes, o avanço do desemprego no período foi muito superior ao que os economistas imaginavam no início do ano. Em janeiro, as projeções mais pessimistas apontavam uma taxa de desocupação de até 6% em 2015. Em março, o desemprego já estava em 6,2%. "Esse ajuste foi feito num período de tempo muito pequeno. É um sinal de que realmente os empregadores já não estavam vendo um quadro de recuperação e, por isso, resolveram fazer um corte forte e imediato na força de trabalho", avaliou a economista-chefe da ARX Investimentos, Solange Srour.

As demissões crescentes são apenas um dos fatores que pesam para aumentar o desemprego entre os brasileiros. O economista da RC Consultores, Thiago Biscuola, aponta outra razão: o aumento de pessoas dispostas a trabalhar, a chamada População Economicamente Ativa (PEA). "Havia pessoas se ausentando do mercado de trabalho, seja para estudar ou porque não precisavam, já que o chefe de família conseguia pagar todas as contas. Como a situação mudou, mais gente está procurando um trabalho, o que contribui para este salto no desemprego", explicou.

O total de vagas eliminadas no País ultrapassou a marca de 1,2 milhão nos 12 meses até setembro de 2015, conforme dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) divulgados nesta sexta-feira (23). A indústria de transformação e a construção civil, setores que sentiram primeiro os efeitos da desaceleração da economia, respondem juntas por 942 mil empregos a menos no período, 76% do total.

Entre setembro de 2014 e o mesmo mês deste ano, a PEA avançou 1,0%, enquanto a População Ocupada (PO), formada por quem tem emprego ou trabalha por conta própria, recuou 1,8%. O principal fator que tem levado as pessoas a voltar à força de trabalho é a diminuição da renda das famílias, explica Biscuola, seja porque alguém foi demitido ou porque os reajustes salariais não estão acompanhando a inflação. "A deterioração do quadro econômico também faz as pessoas terem mais receio, por isso muitas voltam a procurar emprego prevendo um futuro mais incerto e talvez mais difícil", acrescenta o especialista.

A análise dos dados do IBGE feita pelo Broadcast reforça esta análise. O desemprego subiu mais entre os chefes de família isso é sinônimo de homens, passando de 2,8% em setembro de 2014 e chegando a 4,8% em setembro deste ano. No mesmo sentido, é possível perceber que o número de mulheres que integram a força de trabalho, seja empregadas ou buscando um trabalho cresceu em um ritmo maior que o de homens. Na comparação com setembro de 2014, sem ajuste, a PEA feminina avançou 1,25%, enquanto a masculina teve alta de 0,83%. "A função de chefe de família ainda é muito concentrada nos homens. Na hora que se tem aumento de incertezas e mais demissões, as mulheres são mais incentivadas a procurar emprego", explicou Biscuola.

Informalidade. A taxa de desemprego só não subiu ainda mais porque muitos dos demitidos ou aqueles que não conseguiram ser contratados decidiram encontrar uma solução sem depender de um empregador. De setembro de 2014 a setembro de 2015, aumentou em 2,6% o contingente de quem trabalha por conta própria. Para O economista da Tendências Consultoria Integrada, Rafael Bacciotti, o aumento desse tipo de atividade no último ano é muito significativo. "A perda de dinamismo da economia afeta a contratação por carteira assinada e, como alternativa, os trabalhadores se alocam na informalidade ou no pequeno empreendimento, com ou sem empregado", afirmou. Biscuola, da RC Consultores, também destaca esta tendência no mercado de trabalho brasileiro. "Quem é demitido, por exemplo, não vai ficar parado. Eles usam o dinheiro da rescisão ou o que têm na poupança e abrem o próprio negócio", exemplificou.

País elimina 3 mil vagas de emprego por dia

Nos últimos 12 meses, o país eliminou 1,238 milhão de vagas com carteira assinada. Ou seja, a cada dia, 3.393 trabalhadores perderam o emprego. No mês passado, os postos de trabalho fechados superaram as vagas criadas em 95.602, no pior resultado dos últimos 23 anos.

Nos últimos 12 meses, país perdeu 3 mil vagas com carteira por dia

• Número de desligamentos já supera o de admissões em 1,2 milhão no período

Geralda Doca - O Globo

BRASÍLIA - O mercado formal de trabalho cortou no mês passado 95.602 empregos — pelo sexto mês consecutivo. Foi o pior resultado da série do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), iniciada há 23 anos. No mesmo período de 2014, foram criadas 123.785 vagas com carteira assinada. Entre janeiro e setembro, já foram fechados 657.761 postos com carteira assinada e, nos últimos 12 meses, o resultado negativo chegou 1,238 milhão. Ou seja, a cada dia, 3.393 trabalhadores, em média, perderam o emprego desde setembro do ano passado.

Segundo o diretor do Departamento de Emprego e Salário do Ministério do Trabalho, Márcio Borges, o comportamento do mercado de janeiro até agora indica que o país vai fechar o ano com saldo negativo de vagas formais. Para o especialista do site Trabalho Hoje, Rodolfo Torelly, a perda deverá se aproximar de 1,5 milhão. A tendência negativa deve continuar. Os meses de outubro e novembro devem vir fracos, e dezembro é tradicionalmente um mês negativo devido às demissões de trabalhadores temporários e de informações tardias de demissões. Em 2014, foram gerados 396,9 mil empregos, queda de 64,4%, na comparação com o ano anterior.

Quatro das cinco regiões no negativo
Em setembro, que costuma ser um mês positivo para o mercado formal devido às contratações temporárias para as vendas de Natal, houve demissão generalizada em todos os setores da economia. Serviços foi o segmento que mais dispensou, com saldo negativo de 33.535 postos, sobretudo nos ramos de comércio e administração de imóveis, transportes e comunicações e hotéis e restaurantes. O setor, que até o ano passado sustentava o mercado de trabalho, já cortou 32.550 postos nos primeiros nove meses de 2015.

Os números de setembro foram influenciados, ainda, pela construção civil, que fechou 28.221 vagas no mês passado, e pelo comércio, que eliminou outras 17.253. A indústria de transformação eliminou 10.915 postos, menos do que a média de 51 mil dos últimos meses, mas o setor foi o que mais demitiu entre janeiro e setembro, com saldo negativo de 287.472. O setor agrícola dispensou 3.246 empregados em setembro, mas, no ano, é o único com saldo positivo, de 106.459 postos.

— Estávamos esperando uma reversão do processo em setembro, que costuma ser satisfatório. Mas, isso não aconteceu — disse Borges, do MTE.

Com exceção da região Nordeste, que registrou saldo positivo de 26.113 postos, devido, principalmente, ao ciclo sucroalcooleiro nos estados de Pernambuco, Alagoas e Rio Grande do Norte, as demais regiões cortaram empregos no mês passado. No Sudeste, foram fechados 88.204 postos, e o nível do emprego caiu em todos os estados da região. No Rio, foram fechadas 7.510 vagas. A região Norte perdeu 3.470 empregos; a Sul, 21.088 e a Centro-Oeste, mais 8.958.

De acordo com o Caged, a queda no nível do emprego formal foi maior nas regiões metropolitanas, onde foram demitidos 52.417. No interior, o saldo ficou negativo em 41.409 postos. O agronegócio está evitando um recuo ainda maior nas contratações, segundo o Ministério do Trabalho.

Debate: Qual é a saída para a crise



Convite


• Data: Quinta, 5 de novembro às 18:00 - 21:30


• Local: Associaçao Scholem Aleichem- ASA - Rua São Clemente, 155 fundos - Botafogo - Rio de Janeiro (perto da Estação do Metrô Botafogo)


• Debatedores: os economistas Mansueto Almeida (IPEA), Felipe Salto (FGV-SP), José Luis Oreiro (UFRJ) e Sérgio Besserman (PUC-Rio)


• Promoção: Fundação Astrojildo Pereira (FAP)


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Marco Aurélio Nogueira - Um preço alto demais

- O Estado de S. Paulo

Treze anos depois da posse de Lula, o medo está vencendo a esperança. Houve importantes avanços sociais, mas eles não se mostraram sustentáveis. A correlação de forças não se alterou, mudanças estruturais não se realizaram e o conjunto das políticas de Estado mal saiu do lugar. O País continua patinando em termos de saúde, educação e infraestrutura. O prometido “espetáculo de crescimento” não passou de um jargão solto no ar e o governo Dilma está na ponta do precipício.

Como foi possível que tudo desse tão errado? Há diagnósticos parciais, quase sempre envenenados pela luta político-partidária que engessou a sociedade desde que Lula foi eleito presidente. A polarização dos últimos anos afastou o debate público do fundamental.

Na economia, por exemplo, a corrente mais liberal afirma que houve descuido com as contas públicas e excesso de intervenção estatal, que os gastos não levaram em conta a capacidade de arrecadação do Estado. A crise externa desempenhou um papel, mas o problema principal foi interno, pois o governo abandonou os “fundamentos econômicos” e trouxe de volta a inflação e a “irresponsabilidade fiscal”. Optou-se pela continuidade dos gastos públicos sem o devido cuidado com as receitas e a estabilidade. A única saída é um aperto fiscal duro.

Os economistas mais alinhados com o governo e o PT, por sua vez, não concordam com esse diagnóstico. Eles se subdividem em duas correntes: os “novos desenvolvimentistas”, mais tradicionais, e os “social-desenvolvimentistas”, que defendem a combinação de políticas sociais ativas com investimentos em infraestrutura energética e logística. Ainda que seja favorável a medidas anticíclicas, esta segunda corrente não as vê como algo permanente. Tem pontos de contato com a “nova matriz econômica”, mas não a endossa como coisa sua. Não é tão “estatista” e “intervencionista” quanto ela, por exemplo. Nem aplaude a opção pelo consumo como impulsionador do crescimento. Para ela, a orientação geral beneficiou os setores sociais mais fragilizados, mas os erros de gestão e algumas escolhas equivocadas foram tão graves que tornaram inevitável um ajuste.

Os “social-desenvolvimentistas”, porém, opõem-se ao que chamam de “austericídio”, defendendo um ajuste calibrado para recompor a capacidade de financiamento do Estado.

No fundo desse debate, está a questão do Estado, verdadeiro divisor de águas no mundo contemporâneo. Mas do mesmo modo que os liberais entendem o valor da regulação e sabem que é insensato discutir se o Estado deve ou não intervir na economia, os “social-desenvolvimentistas” entendem que as contas públicas precisam de equilíbrio e hoje o ajuste é inevitável. Uns e outros aceitam que os setores público e privado precisam trabalhar juntos. Sabem, também, que cortar gastos públicos tem efeitos perversos no emprego e na renda. E que um aperto duro demais pode fazer a recessão se estender no tempo e ser mais profunda.

Ambas as correntes são críticas do governo atual. Deveriam dialogar mais entre si. A contraposição dogmática das visões, porém, bloqueia a formação de uma agenda econômica. O debate gira em torno de dois polos incomunicáveis, que se comportam com autossuficiência, como se não existissem mais alternativas.

A saída mais sensata e inteligente seria o entendimento entre governo, trabalhadores e empresários, em nome de um ajuste que não dizime a sociedade. Mas ninguém patrocina isso.

O calcanhar de Aquiles dos governos petistas tem sido a política de coalizões, ou seja, o modo como o partido buscou compensar a falta de maioria parlamentar e de condições de governabilidade.

Recusando-se a investir numa frente social-democrata que reunisse PT e PSDB, a opção petista foi buscar o “baixo clero” do Congresso Nacional, ou seja, os partidos menores. Uma opção de risco, porque o preço cobrado pelo apoio foi alto e teve de ser pago em moeda, não só com cargos e favores.

O episódio do “mensalão” escancarou o procedimento, que espalhou seus venenos pelo sistema. O partido recompôs sua base, aliou-se ao PMDB e passou a fazer vista grossa para o crescimento da corrupção, agora praticada mediante empreiteiras e empresas públicas, como a Petrobrás. Ainda que não tenha impedido que Lula e Dilma se reelegessem em 2006, 2010 e 2014, tal política amarrou e enfraqueceu o PT, forçando seus governos a uma entrega ao PMDB, que, aos poucos, foi engolindo o partido e a agenda governamental.

A política de coalizões se articulou com uma política de “aliança de classes” por meio do Estado. Lula atraiu o apoio do grande empresariado e dos setores organizados da classe trabalhadora em nome de uma política expansionista que anunciava ganhos para todos, beneficiando os mais pobres com políticas assistencialistas e de transferência de renda. O Estado converteu-se no grande articulador político do País. Para manter os inúmeros aliados, Lula, Dilma e o PT concederam todos os anéis, viraram as costas para a esquerda democrática e passaram a tratar os adversários como inimigos.

Cortaram o País em duas metades. Ajudaram a alimentar o “ódio” de que tanto reclamam hoje.
Com o fracasso da política econômica, a difícil reeleição em 2014 e a falta de molejo político da presidente, o governo Dilma passou a perder apoios em cascata. Deixou de coordenar até mesmo as próprias bases. Nada do que tenta fazer funciona.

Sem forças para repor a política de alianças e coalizões, o governo ficou sem capacidade de agendamento e ação. Abriu-se, assim, o cenário surreal em que nos encontramos, no qual um governo recém-empossado parece prematuramente envelhecido e caminha para o ostracismo, ameaçando arrastar a sociedade consigo.

A gritaria é geral, mas pouco se faz para que se reponham as bases da convivência civilizada e produtiva entre os que pensam diferentemente.

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Marco Aurélio Nogueira é professor titular de teoria política e coordenador do núcleo de estudos e análises internacionais (neai) da Unesp

Igor Gielow - Uma ruína em construção

- Folha de S. Paulo

A crise política passa por um momento de paralisia sob tensões contraditórias, se é que esta é uma imagem adequada para ilustrar o bizarro peso conferido às ações de um único homem, Eduardo Cunha, para determinar seu pretenso desfecho.

Uma esperança de resolução de resto vã, porque o país vai lentamente se esfarelando. Nem cito aqui as estripulias do mercado. Deixemos as Moody's da vida de lado.

Falemos de Francisca, típica cidadã que viveu a ascensão ilusória dos anos Lula, devidamente hagiografada pelo Ipea e por viúvas do petista.

Ela trabalha como diarista no Plano Piloto da capital. Cobra R$ 120 por dia e descarta buscar a formalização. "Assinar carteira prende. Prefiro controlar meus horários", diz.

Seu filho mais velho mal se formou em uma faculdade paga, com auxílio federal, e foi dispensado do estágio em um escritório de administração de imóveis em que trabalhava.

Ingressou, sem entrar na estatística formal, no contingente de desempregados cujos números tenebrosos revelados pelo Ministério do Trabalho na sexta (23) insinuam um monstrengo de dois dígitos a assombrar o país ao lado de sua coirmã de mesmo vulto, a inflação.

"Agora acho que ele vai ajudar o tio numa oficina, enquanto não arranja emprego. E eu vou abrir dois dias na semana para trabalhar", conta Francisca, que trocou a "marca boa" de arroz que comprava por uma mais barata –de R$ 10,50, e não mais R$ 13, o pacote de cinco quilos.

Dilma ocupa seu terceiro mandato, contado a partir de uma reforma ministerial que já dá sinais de cansaço, quase exclusivamente de uma dança da morte com o Cunha para evitar seu impeachment. O presidente da Câmara, por sua vez, só trata de como permanecer na cadeira.

O que pensa Francisca disso tudo? "A Dilma e o Lula são culpados pela desgraceira toda. Esse Cunha eu vi na TV, tem algum problema, né?"

Míriam Leitão - Prisioneiros do passado

- O Globo

A economia argentina está estagnada e com inflação de 25%, mas a taxa pode ser maior, já que o governo manipula os indicadores. A pobreza está aumentando, o déficit primário é de 6% do PIB, o Judiciário está tolhido, e o país, isolado internacionalmente. Ainda assim, o candidato apoiado por Cristina Kirchner está na frente nas pesquisas para as eleições de amanhã. O país vive ainda à sombra de Perón.

O Brasil enfrenta grave crise, mas o país não aceita certos absurdos. A presidente Dilma manipulou indicadores fiscais e está respondendo por isso com ameaça, inclusive, de perda de mandato; a inflação brasileira está perto de 10% e o nível é considerado intolerável. Na Argentina, convive-se há anos com uma taxa de dois dígitos e o fato de que o órgão oficial de estatística manipula ou omite indicadores. O percentual de pobres deixou de ser divulgado porque, segundo o governo, isso “estigmatiza” as pessoas de baixa renda. Um argumento falso, o que se quer é esconder o aumento da pobreza.

O governador da Província de Buenos Aires, Daniel Scioli, o candidato apoiado por Cristina Kirchner, está na frente neste primeiro turno. Se tiver 40% dos votos, ganha já no domingo. O candidato da oposição Mauricio Macri é o prefeito de Buenos Aires. Assim, a disputa volta a se dar em torno dos políticos da capital.

O pior lado da cultura política argentina é o incompreensível apego a uma liderança que surgiu nos anos 1940. É mais ou menos como se a sombra de Getúlio Vargas dominasse a política brasileira. Há vários candidatos peronistas e ainda em torno dessa figura completamente desatualizada é que o debate se dá no país, com os candidatos querendo provar que são mais genuinamente peronistas. Scioli inclusive já nomeou a sobrinha-neta de Eva Perón como ministra, caso se confirme sua eleição.

O período Cristina Kirchner chega ao fim deixando como legado uma devastação econômica, mas ela permanece com popularidade remanescente, tanto que o candidato que apoiou está na frente. Scioli faz aquele jogo de sempre: aceita o apoio, mas fala em renovação e dá sinais aos investidores que iniciará uma era de maior controle das contas públicas.

Os argentinos são o melhor exemplo do caminho econômico que o Brasil deveria evitar, mas o atual governo parece querer seguir. A inflação oscila entre 25% a 35% ao ano. Ninguém sabe ao certo. O que se tem certeza é que o número do órgão oficial de estatística, 15%, está subestimado.

O dólar por lá tem um mercado oficial, cotado a 9,5 pesos, e outros dois paralelos, um legal, e outro ilegal, onde se compra a moeda americana com preços em torno de 14 a 16 pesos. Com baixas reservas cambiais, o governo impõe à população e às empresas um regime de controle no câmbio. 

Para comprar moeda americana, é preciso enviar uma justificativa formal ao órgão responsável. O turista tem que mostrar a passagem comprada e dizer quantos dias pretende ficar no exterior. A empresa importadora tem que explicar a razão da compra, e muitas vezes fecha a encomenda, mas não consegue os dólares com o Banco Central. Fica inadimplente. Já as multinacionais têm dificuldade de enviar lucros para as matrizes fora do país.

O economista do Itaú Unibanco Juan Barboza, que acompanha a economia argentina, diz que o novo governo terá que enfrentar uma série de ajustes no ano que vem. Além disso, o país tem a pior classificação de risco pelas agências, CCC, porque não consegue chegar a um acordo com seus credores para pagar a dívida externa. Está banida do mercado internacional de crédito.

— Nossa projeção é de crescimento zero do PIB no ano que vem, com uma inflação de 35%. O novo governo terá que cortar subsídios e outros gastos, e também terá que elevar os juros e permitir a desvalorização do peso. Haverá uma forte perda na renda da população — disse Barboza.

A recessão no Brasil afeta os argentinos. O Brasil é o principal parceiro do país, mas produtos brasileiros enfrentam barreiras comerciais e cambiais. A corrente de comércio entre os dois países já está 18% menor de janeiro a setembro deste ano, em relação ao mesmo período do ano passado. Nós não estamos bem e sabemos disso, mas a Argentina continua sendo o caminho a ser evitado.

Farinha do mesmo saco – Editorial / O Estado de S. Paulo

De um homem público capaz de negar evidências inquestionáveis e cometer perjúrio perante uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) pode-se esperar toda sorte de transgressão de princípios legais e morais. Por isso não causou espanto que, mais uma vez se prevalecendo do poder que lhe confere a presidência da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) tenha assumido uma atitude que só pode ser interpretada como oferta ao Planalto de uma despudorada barganha, ao manifestar a opinião de que, “por si só”, o fato de o governo ter praticado as chamadas pedaladas fiscais “não significa que seja razão do pedido de impeachment” da presidente Dilma Rousseff. O bloqueio das contas da família Cunha na Suíça e o sequestro desse dinheiro determinado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) acabaram levando o presidente da Câmara à óbvia tentativa de oferecer seu poder de barrar o impeachment em troca de apoio político do Planalto para obter no Conselho de Ética da Câmara e, se for o caso, no plenário da Casa, os votos necessários para impedir a cassação de seu mandato.

Na Suprema Corte não parece haver dúvidas sobre a existência das contas que Eduardo Cunha nega ter na Suíça, bem como da origem desses valores. A atitude do deputado, aliás, é indício claro de que a origem do dinheiro é suspeita, porque o simples fato de manter contas bancárias no estrangeiro não é crime. A não ser que elas tenham sido abertas em desacordo com a legislação brasileira e sirvam a propósitos espúrios. É exatamente disso que parece convencido o ministro Teori Zavascki, que ao decretar o sequestro de quase R$ 10 milhões de duas contas de Cunha na Suíça argumentou que há “indícios suficientes de que os valores eram provenientes de atividades criminosas”. Entendeu ainda o ministro que, uma vez que a investigação iniciada pela Justiça suíça foi transferida para o Brasil, havia “evidente risco de desbloqueio e consequente dissipação desses valores”. O dinheiro ficará agora bloqueado em conta judicial no País, até a conclusão do processo em que Cunha é réu.
Em mais uma demonstração de que o presidente da Câmara não poderá contar senão com o rigor do STF, o ministro Teori Zavascki também indeferiu, na quarta-feira, o pedido da defesa de Eduardo Cunha para que o inquérito sobre as contas na Suíça tramitasse sob segredo de Justiça.

O parlamentar peemedebista continua fazendo tudo o que está ao seu alcance, como presidente da Câmara, para protelar as decisões que não lhe interessam. Pelo Regimento Interno da Casa, cabe à Mesa, sem julgamento de mérito, protocolar todos os requerimentos encaminhados pelos deputados ou pelas bancadas, deferi-los ou indeferi-los ou ainda encaminhá-los, quando é o caso, para decisão plenária. Cunha tem sistematicamente esticado os prazos para essas medidas burocráticas da Mesa ao limite máximo permitido pelo Regimento. Isso retarda, por exemplo, o funcionamento do Conselho de Ética, que terá de se manifestar sobre o pedido de cassação do mandato de Cunha por quebra de decoro parlamentar.

Como já afirmamos, a desfaçatez com que o parlamentar peemedebista coloca a Casa que preside a serviço de seus interesses pessoais enodoa a imagem de todo o Poder Legislativo e agrava o descrédito dos brasileiros nas instituições políticas. Pior ainda quando essa manobra espúria envolve a chantagem política que faz com a presidente da República, sobre cuja cabeça pesa a ameaça de impeachment. E é absolutamente inaceitável, na perspectiva do respeito devido às instituições democráticas, que Dilma Rousseff esteja pronta, ansiosa mesmo, por fazer tudo o que estiver a seu alcance – fazer “o diabo”, como ela afirma – para se livrar da punição que seria o seu afastamento da Presidência da República. Essa medida, obviamente, exige estrita obediência aos preceitos constitucionais e à lei ordinária, ainda que corresponda ao desejo claramente manifestado, nas ruas e nas pesquisas de opinião, pela maioria esmagadora dos brasileiros.

Dilma Rousseff e Eduardo Cunha têm lá suas peculiaridades, mas são todos farinha do mesmo saco. Fizeram tudo de errado que podiam fazer no exercício de elevadas funções públicas que a Nação lhes confiou. Agora, esperneiam, tentando ganhar tempo, mas seu destino está selado. Deixá-los impunes equivaleria à decretação da falência de nossas instituições democráticas.

A insensata criação de mais uma estatal – Editorial / O Globo

• Apesar da longa experiência negativa com a estatização, pensa-se em criar empresa pública para ajudar nos projetos de infraestrutura. Um erro

Um governo petista propor a fundação de mais uma estatal não é novidade. Faz parte de uma visão ideológica de mundo. Segundo ela, será pelas mãos do Estado que o povo chegará ao paraíso — algo jamais realizado em qualquer parte do planeta. A excentricidade está em a ideia surgir em meio a uma das mais severas crises fiscais da história da economia brasileira, situação em que se deve fazer o oposto: vender estatais. E outro aspecto curioso é a sugestão partir de uma comissão criada pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, economista sabedor dos malefícios da estatização.

Conclui-se, então, que devem ser convincentes as justificativas para a fundação da Estruturadora Pública Nacional, a ser chamada de EPN. A área de atuação da possível nova estatal é mesmo estratégica: elaboração de projetos de infraestrutura (portos, aeroportos, ferrovias, rodovias), à margem da Lei de Licitações, para serem entregues à iniciativa privada. Portanto, é uma forma de se ganhar tempo e supostamente eficiência num elo de fato complexo em qualquer investimento do tipo com alguma ingerência do Estado.

Infelizmente, mesmo que a ideia conte com o aval de Levy, o histórico centenário do Estado brasileiro garante de antemão o fracasso para o empreendimento.

A História é sábia professora. Por isso cabe relembrar a criação da Infraero relatada pelo seu próprio avalista, o ex-ministro Delfim Netto. Então poderoso dono da pasta da Fazenda, no governo militar do presidente Médici, Delfim foi convencido pelos próprios militares que os aeroportos precisavam de uma estatal para administrá-los. Seria uma empresa “enxuta”, ágil, eficiente. Décadas depois, diante de uma paquidérmica Infraero, ineficiente, loteada por partidos políticos, aparelhada, Delfim registraria o arrependimento público.

O enredo se repete com esta tal EPN. Também é anunciada como uma estatal “enxuta” — na verdade, uma contradição em termos.

Outro aspecto negativo da proposta é que já existe a Empresa de Projetos e Logística (EPL), também estatal e com atribuições semelhantes. Não se tem notícia de grandes avanços na infraestrutura depois de sua criação. Nem assim e mesmo que venha a ser fundada a nova empresa, a EPL seria extinta, um outro erro.

Existem 143 estatais controladas pela União, das quais 18 são dependentes do Tesouro. Não se afasta a possibilidade de a EPN ser mais uma.

Se em geral a experiência de empresas estatais é negativa, na infraestrutura não se tem notícia de êxito. A Valec, por exemplo, criada como subsidiária de engenharia da Vale, passou a tratar de ferrovias. Nada produziu de importante, a não ser pelo menos um escândalo de corrupção, em que foi preso seu presidente, José Francisco das Neves, o Juquinha, apadrinhado pelo PR.

Se o governo quer dar velocidade aos projetos de infraestrutura, proponha mudanças na legislação e melhore a qualidade da gestão nas áreas devidas. Fundar estatal é mais do mesmo.