segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Opinião do dia – Luiz Sérgio Henriques

As circunstâncias tornaram-se mais dramáticas em momento inesperado, quando, pelo voto, se renovaram os mandatos da presidente, de governadores e parlamentares. De fato, nada lembra o período de graça que se concede a governantes novos - ou reconfirmados -, os tais "cem dias" nos quais o mandatário se mexe com desenvoltura, em meio a relativa distensão do ambiente. Normalmente, a própria oposição ensarilha as armas ou busca reposicionar-se com cautela, reconhecendo à parte vitoriosa a iniciativa do jogo.

Esse período de esperança, porém, está visivelmente abalado: a ele se substituem o temor das crises que se somam e o pressentimento da incapacidade, especialmente por parte do governo federal, de enfrentá-las em sentido positivo. A economia parece exaurida, depois de surfar - irresponsavelmente - no ciclo de prosperidade made in China da primeira década do século. Ainda exibe joias de valor, como o mercado de trabalho aquecido e o aumento do salário mínimo, mas o consenso é que tais joias logo perderão o viço, ausente a variável decisiva do investimento público e privado.

Luiz Sérgio Henriques, tradutor e ensaísta. É um dos organizadores das 'obras' de Gramsci no Brasil. É vice-presidente da Fundação Astrojildo Pereira. O Natal e as circunstâncias. O Estado de S. Paulo, 21 de dezembro de 2014.

Venina diz que alertou Graça pessoalmente

• Presidente alegou não ter entendido e-mail

'Estive com Graça pessoalmente'

• Venina Velosa diz que alertas à presidente da estatal sobre irregularidades não foram só por e-mail

- O Globo

Os avisos dados por Venina Velosa da Fonseca a Graça Foster sobre irregularidades na Petrobras não foram só por e-mail. A ex-gerente da estatal também teve um encontro pessoal com a atual presidente da empresa quando Graça era diretora de Gás e Energia. No encontro, Venina entregou a Graça documentos sobre denúncias na área de Comunicação. A declaração foi feita por Venina em entrevista exibida ontem no "Fantástico", da TV Globo.

A ex-gerente revelou também e-mail que enviou a Graça em outubro de 2011; nele, Venina diz que gostaria de conversar com ela "olhando direto nos seus olhos". Perguntada sobre a declaração de Graça na última quarta-feira de que ela não teria entendido os e-mails, a ex-gerente diz que, como gestora, teria procurado uma explicação - e que Graça tinha acesso a ela e liberdade suficiente para buscar esclarecimentos sobre as questões levantadas.

Venina também falou do impacto das denúncias sobre sua família e das ameaças que passou a sofrer.

Procurada pela Globo, a Petrobras voltou a declarar que tomou as providências necessárias diante das denúncias, e lembrou que Venina foi responsabilizada por uma comissão interna de apuração de corrupção na refinaria Abreu e Lima. O ex-presidente da estatal Sergio Gabrielli disse que nunca foi informado de irregularidades diretamente pela ex-gerente.

Primeiras denúncias
"Desde que eu percebi que havia irregularidades na minha área. Isso aconteceu em 2008. Desde 2008, eu venho reportando esses problemas aos meus superiores, o que culminou agora eu estar levando essa documentação toda ao Ministério Público".

Irregularidades
"São vários tipos. Irregularidades de pagamento de serviço não prestado de contratos que, aparentemente, estavam superfaturados; de negociações que eram feitas onde eram solicitadas comissões para pessoas que estavam negociando e uma série de problemas que feriam o código de ética e conduta da empresa".

Conhecimento
"(Informei) A todos os meus superiores. Informei ao gerente executivo, aos diretores e até a presidente da empresa. Num primeiro momento, em 2008, como gerente executiva, eu informei ao então diretor (de Abastecimento) Paulo Roberto Costa (em prisão domiciliar). Informei a outros diretores como a Graça Foster (atual presidente da Petrobas e ex-diretora de Gás e Energia) e, em outro momento, como gerente geral, eu informei aos meus gerentes executivos, José Raimundo Brandão Pereira (ex-gerente executivo, destituído do cargo em abril deste ano) e o Abílio (Paulo Pinheiro Ramos, gerente executivo). Informei ao diretor (José Carlos) Cosenza (atual diretor de Abastecimento). Informei ao presidente (Sérgio) Gabrielli (ex-presidente da Petrobras e antecessor de Graça Foster). Informei a todas a pessoas que eu achava que podiam fazer alguma coisa para combater aquele processo que estava se instalando dentro da empresa".

Encontro com Graça Foster
"Eu estive com a presidente pessoalmente quando ela era diretora de Gás e Energia. Naquele momento, nós discutimos o assunto. Foi passada a documentação para ela sobre processo de denúncia na área de comunicação. Depois disso, ela teve acesso a essas irregularidades nas reuniões da diretoria executiva. Eu era responsável, como gerente executiva corporativa, pelo orçamento. O que significa isso? Esse projeto vai dar lucro ou prejuízo? No final das contas, é isso que a empresa quer".

Compreensão do e-mail
"Se isso não está suficientemente claro, eu como gestora buscaria uma explicação, principalmente de uma pessoa que eu tinha muito acesso. Nós tínhamos muito acesso, éramos próximas. Então ela teria toda liberdade de falar: "Venina, o que está acontecendo?"
".
Esquartejamento de projetos
"Você tem uma refinaria. São várias unidades que são construídas. Então, você tem várias formas de fazer a contratação. Você facilita ou dificulta a fiscalização. Em nenhum momento, se não houve a compreensão do que eu estava falando, fui chamada a dar esclarecimento sobre o assunto. Então, teve esse momento, e teve agora, no fim da minha gestão em Cingapura que eu fiz relatório em toda minha área de gestão, resultados bons".

Encontro com Paulo Roberto
"Esse evento aconteceu quando eu fui apresentar o problema que ocorreu na área de comunicação. Eu cheguei na sala dele e falei: "olha, aqui tem só uma amostra do que está acontecendo na área". Eram vários contratos de pequenos serviços onde nós não tínhamos conhecimento do tipo de serviço, mostrava esquartejamento do contrato. Naquele momento, eu falei: "eu nunca soube, estou sabendo isso agora e acho que é muito sério e temos que tomar atitude". Aí, ele pediu que eu procurasse o gerente responsável e pedisse para que ele parasse. Eu falei: "ele já fez, não tem como eu chegar agora e falar vamos esquecer o que aconteceu e vamos trabalhar diferente". Existe um fato concreto que tinha que ser apurado e investigado. Nesse momento ele ficou muito irritado. A gente tava sentado na mesa da sala dele. Ele apontou para o retrato do Lula, apontou para direção da sala do Sérgio Gabrielli e perguntou: "Você quer derrubar todo mundo?". Eu fiquei assustada e disse: "Olha eu tenho duas filhas, tenho que colocar a cabeça na cama e dormir e no outro dia eu tenho que olhar nos olhos delas e não sentir vergonha" ".

Pressão
"Durante esse processo todo da comunicação, eu fui muito assediada, fui muito pressionada. O tempo todo havia assistentes do presidente, assistentes dos diretores na minha sala falando: "Tem muita gente envolvida, você não pode tratar essa questão dessa forma". Então, quando a gente conduziu todo o processo, eu tinha que formatar, fazer um documento final para que ele fosse encaminhado para as áreas que teriam que tomar as ações e, na verdade, o que estava ocorrendo era uma pressão grande para que isso não fosse feito. Eu fui lá não pra pedir para formatar. Foi pra falar o seguinte: o que que eu faço? Para quem que eu mando? Diretor? Na verdade, era para pedir conselho. O que eu fiz foi emitir um documento para a diretoria que é quem teria que tomar as ações, copiando o Jurídico e o diretor de Abastecimento".

Afastamento
"Depois que eu apurei essa questão da área de comunicação, depois desse processo todo da área de comunicação, a gente recebeu várias ameaças por telefone. As minhas filhas deveriam ter 5 e 7 anos. Eram bem novas. Tiveram outros momentos mais difíceis. A opção que eles fizeram em 2009 foi me mandar para o lugar mais longe possível, onde eu tivesse o menor contato possível. Aparentemente, eu estaria ganhando um prêmio indo pra Cingapura, mas o que aconteceu realmente foi que, quando eu cheguei lá, me foi dito que eu não poderia trabalhar, que eu não poderia ter contato. Quando me foi informado que seria afastada da minha função, o que foi dito pela Petrobras é que não existia claramente nenhum dolo, nenhum problema. Quando me foi informado, primeiro eu fiquei sabendo pelos jornais, depois o gerente executivo me ligou e eu perguntei: quais as razões? O que ele me respondeu foi o seguinte: estou passando o recado do diretor. Ai eu disse: "então, por favor, me passa o telefone do diretor que eu vou perguntar as razões". O diretor me ligou dizendo que eu estava sendo afastada por falhas em procedimentos administrativos, mas que ele não tinha lido o relatório direito, mas que ia conversar e me dar uma resposta. Eu vendo que não tinha clareza nos motivos, como não sabia o motivo, não me foi dado direito de defesa e não foi me dada informação. Foi aí que eu encaminhei relatório para a presidente Graça perguntando o que tava acontecendo. Para a minha surpresa, na sexta de manhã eu recebo um documento com a minha saída e, na parte da noite, eu recebo um e-mail da presidente pedido para que o diretor jurídico verificasse as providências".

Aditivos
"Nenhuma área de negócio, não só a minha, nenhum gerente executivo, não só eu, assina contrato ou aditivo. Todos os contratos ou aditivos são negociados e assinados pela área de serviço".

Cumplicidade
"Eu trabalhei junto com Paulo Roberto, isso eu não posso negar. Trabalhei na diretoria de Abastecimento a partir de 2005. Eu diria que, de 2005 a 2006, foi um trabalho muito voltado para melhoria da gestão de abastecimento que culminou no prêmio nacional de responsabilidade. Eu trabalhei com Paulo Roberto. Esse documento se refere à época desse problema da comunicação que eu falei. Quando começamos a trabalhar, eu falo isso para todos que sou subordinada: eu só trabalho mediante os procedimentos e código de ética. Não trabalho se tiver que contrariar isso. Então, quando começou a acontecer, foi o caso do desvio da comunicação. Então, o que eu quis dizer foi: você está me assediando, eu não vou fazer isso, e o desgaste foi muito grande e a história toda já foi contada. Em momento nenhum eu cedi. Se eu tivesse participado de algum esquema, eu não estaria aqui hoje. Eu não teria feito a denúncia. Não teria ido ao Ministério Público e entregue o meu computador com todos os documentos que eu tenho desde 2002".

Código de ética
"Na verdade, as atitudes (que levaram ao afastamento do cargo) não foram fora da ética, nem fora da norma. Foram atitudes pouco corriqueiras para um empregado que quer ver as coisas sendo feitas da forma correta, por um empregado que quer denunciar as coisas escrevendo. Eu escrevi. Eu não entrei na sala e falei, eu registrei. Quando eles falam que eu estou fazendo uma coisa fora do código de ética... Denunciar irregularidade é fora do código de ética?".

Família
"Eu tinha uma família, sim. Um apartamento, marido, duas filhas. Simplesmente o que eles fizeram foi me afastar do meu país, das empresas que eu tanto gostava, dos meus colegas de trabalho. Eu fui para Cingapura, eu não vi minha mãe adoecendo. Minha mãe ficou cega, fez transplante de coração, eu não pude acompanhar. Meu marido não pode mais trabalhar, ele teve que retornar. Eu fui o tempo todo pressionada para fazer coisas que não eram dentro do código de ética da empresa, a única coisa que me sobrou foi meu nome e quando eu vi que eles colocaram meu nome associado a coisas que eu não fazia eu chamei minhas duas filhas e falei "ou eu reajo e tento fazer, limpar meu nome, ou vou deixar isso acontecer, a gente vai ter uma certa tranquilidade agora e o trator vai passar por cima depois. O que vamos fazer?" E minhas filhas falaram "vamos reagir". "

Contratos com o ex-marido
"Na verdade, foram dois contratos, um em 2004 e outro em 2006. Eu me casei em 2007 e a condição para assumir o relacionamento era que o contrato fosse descontinuado. No momento que a gente assumiu a relação, a condição foi: vamos interromper porque tem conduta de ética dentro da Petrobras e minha de que eu não posso continuar. E isso foi feito com parecer jurídico. Agora, só posso dizer que a empresa (dele) é muito competente. Não fui só eu que fiz. A atual presidente, quando trabalhava na diretoria de Gás, também assinou contrato com ele e depois, em 2008, também assinou contrato com a empresa para fazer integração dos modelos de gestão das termoelétricas. Ela fez isso com base nas características técnicas".

Ir até o fim
"Eu vou até o fim, sim. Eu também tenho muito medo. Eu não posso falar que eu não tenho, porque no momento que você denuncia, ao invés de ver respostas para as denúncias, você vê, simplesmente, a empresa tentando o tempo todo falar: "você não é competente, fez um monte de coisa errada". O tempo todo as pessoas tendo que responder, mostrando documentos, que aquilo não é verdade. É uma máquina que passa por cima da gente. Eu tenho medo? Eu tenho, mas eu não vou parar. Eu espero que os empregados da Petrobras - porque eu tenho certeza que não fui só eu que presenciei - criem coragem e comecem a reagir. Nós temos que fazer isso para poder, realmente, fazer a nossa empresa ser de volta o que era. A gente tem que ter orgulho. Os brasileiros têm que sentir orgulho dessa empresa. Eu vou até o fim e estou convidando vocês para virem também".

Objetivo
"O que eu quero é uma empresa limpa. O que eu quero é que os funcionários da Petrobras possam sentir orgulho de trabalhar nessa empresa. O que eu não quero é ouvir o que a gente ouve quando entra no táxi e fala assim: "O senhor pode me deixar ali na Petrobras?". Aí vem a brincadeira: "Você vai lá pegar seu trocado?". Eu não quero isso. O corpo técnico não merece isso. Por isso é que eu estou aqui passando por todo esse desgaste que não é pequeno para gente conseguir reerguer essa empresa novamente".

‘Alertei Graça Foster pessoalmente’, diz ex-gerente da Petrobrás

• Funcionária da estatal, Venina afirma ao ‘Fantástico’ ter sabido de irregularidades e informado, em 2008, à hoje presidente da empresa

O Estado de S. Paulo

A ex-gerente executiva da Diretoria de Abastecimento da Petrobrás Venina Velosa da Fonseca afirmou ter alertado pessoalmente, em 2008, a hoje presidente da estatal, Graça Foster, sobre a existência de irregularidades em contratos na área de comunicação da diretoria em que atuava. A afirmação, feita em entrevista exibida neste domingo, 22, pelo Fantástico, da Rede Globo, contradiz nota publicada pela Petrobrás no dia 19 de dezembro, na qual a empresa afirma que Graça se inteirou dos fatos apenas neste ano.

“Eu estive com a presidente pessoalmente quando ela era diretora de Gás e Energia. Naquele momento, nós discutimos o assunto. Foi passada uma documentação para ela sobre processo de denúncia na área de comunicação. Ela teve acesso a essas irregularidades nas reuniões da diretoria executiva”, afirmou Venina.

No dia 12 deste mês, reportagem do jornal Valor Econômico revelou e-mails enviados por Venina a Graça nos quais ela denuncia irregularidades na área de comunicação da Diretoria de Abastecimento, aumento do custo da Refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco, de R$ 4 bilhões para R$ 18 bilhões, e também denúncias que atingem contratações de fornecedores no exterior.

Venina disse também que alertou outros diretores sobre as irregularidades na Petrobrás. “Num primeiro momento, em 2008, como gerente executiva, eu informei ao então diretor Paulo Roberto Costa, informei a outros diretores como a Graça Foster, e em outro momento, como gerente-geral, eu informei aos meus gerentes executivos, José Raimundo Brandão Pereira e o Abílio (Paulo Pinheiro Ramos), que era meu atual gerente executivo. Informei ao presidente Gabrielli. Informei a todas a pessoas que eu achava que podiam fazer alguma coisa para combater aquele processo que estava se instalando dentro da empresa”, afirmou a ex-gerente.

Em relação à conversa com o ex-diretor de Abastecimento, Paulo Roberto Costa, que ficou no cargo entre 2004 e 2012, Venina disse que ele perguntou se ela queria “derrubar o mundo” em referência ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

“Ai eu falei: ele já fez, não tem como eu chegar agora e falar vamos esquecer o que aconteceu e vamos trabalhar diferente. Existe um fato concreto que tinha que ser apurado e investigado. Aí, nesse momento ele ficou muito irritado. A gente tava sentado na mesa da sala dele, ele apontou pro retrato do Lula, apontou pra direção da sala do Gabrielli e perguntou: você quer derrubar todo mundo? Ai eu fiquei assustada e disse: olha eu tenho duas filhas, eu tenho que colocar cabeça na cama e dormir e no outro dia eu tenho que olhar nos olhos dela e não sentir vergonha”.

“Esse evento aconteceu quando eu fui apresentar o problema que ocorreu na área de comunicação, que eu cheguei na sala dele (Paulo Costa) e falei, olha aqui tem só amostra do que tá acontecendo na área. Eram vários contratos de pequenos serviços onde nos não tínhamos conhecimento do tipo de serviço. Mas mostrava esquartejamento do contrato. Aí naquele momento, eu falei: eu nunca soube, tô sabendo isso agora e acho que é muito sério e temos que tomar atitude. Aí ele pediu que eu procurasse gerente responsável e pedisse para que ele parasse.”

Venina disse também não ter sido a única funcionária de alto escalão a presenciar atos ilícitos dentro da empresa e convocou outros colegas a contarem o que sabem. “Não fui só eu quem presenciou. É essencial que outras pessoas também contem o que viram.” A ex-executiva declarou ainda temer por sua integridade física, mas não pretende recuar nas denúncias. “Eu vou até o fim. Tenho muito medo, mas eu não vou parar (de denunciar)”.

Questionada se participou do esquema ou se foi cúmplice, a ex-gerente executiva negou. “Em momento nenhum eu cedi. Se eu tivesse participado de algum esquema eu não teria feito a denuncia que eu fiz, nem entregue meu computador com todos meu documentos desde 2002.”

Ao Fantástico, a Petrobrás informou que tomou todas as providências para esclarecer as denúncias feitas por Venina e negou que não tenham sido investigadas as irregularidades apontadas. A empresa afirmou também que a funcionária tornou pública as denúncias porque foi apontada como responsável por uma comissão interna. A estatal informou que Graça foi informada por e-mail, e não pessoalmente.

E-mail apócrifo alertou diretores em 2008

• Funcionário autointitulado O Vigilante relatava parte das acusações que surgiram depois, na Operação Lava Jato

• Texto cita Fernando Soares, o Baiano, como um dos lobistas que agia na Petrobras; hoje ele está preso

Mario Cesar Carvalho – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Um e-mail de dezembro de 2008 que circulou na Petrobras já alertava diretores e gerentes que um cartel funcionava dentro da estatal, com divisão de obras por meio de influência política e de lobistas.

Com mais de cinco anos de antecedência, a mensagem relata parte das acusações contra a estatal que surgiram na Operação Lava Jato.

"Continua a ser praticada livremente toda a sorte de maracutaias e acertos' nas cúpulas da nossa Petrobras. Isso precisa acabar", defendia o funcionário que se autointitula O Vigilante.

O nome fictício que ele escolheu para enviar o e-mail, Norberto Andrade Camargo, é uma junção do nome de três empreiteiras que estão sob investigação na Lava Jato: a Norberto Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa.

Mensagem anônima é considerada por especialistas como um dos instrumentos mais eficazes de combate à corrupção porque o denunciante pode falar o que quiser sem sofrer retaliações.

O e-mail foi enviado a quatro diretores e 16 executivos da petroleira. Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento, Renato Duque, ex-diretor de Serviços, e Nestor Cerveró, ex-diretor da área Internacional, todos réus da Lava Jato sob acusação de terem recebido suborno, aparecem como destinatários, assim como Sérgio Machado, presidente da Transpetro.

Machado se licenciou do cargo depois que Costa disse ter recebido R$ 500 mil de propina dele por conta de contratos superfaturados.

O e-mail também foi enviado a Venina Velosa da Fonseca, ex-gerente da estatal que diz ter alertado Graça Foster em 2007 dos desvios na diretoria de Abastecimento. À época, Graça, a atual presidente da Petrobras, era diretora de óleo e gás.

Todos vão ganhar
A maneira como o funcionário descreve o funcionamento do suposto cartel é similar à narrativa feita por dois delatores da Lava Jato: Julio Camargo e Augusto Miranda, da Setal. Segundo eles, havia um "clube" que loteava obras pagando propina a diretores.

O missivista diz que o fato de a Petrobras não aplicar a Lei das Licitações estimulou "falcatruas e desmandos": "Vence quem combinou vencer e ninguém se queixa, porque todos ganham (...). E ganha o diretor, ganha o lobista e ganha o político".

O e-mail cita o nome de Fernando Soares, chamado de Baianinho, como um dos lobistas que agia na estatal. Soares foi acusado por delatores de ter recebido US$ 40 milhões (R$ 106 milhões) de propina em 2009 e 2010 ao intermediar a venda de dois navios para a diretoria internacional, ocupada à época por Nestor Cerveró.

Soares está preso na Polícia Federal de Curitiba desde 18 de novembro sob acusação de intermediar propina.

O político que indicou Paulo Roberto para a diretoria de Abastecimento, José Janene (PP-PR), também é mencionado na mensagem ao lado do senador Jader Barbalho (PMDB-PA). "Pobres diretores, tornaram-se escravos do Janene, do Jader Barbalho."

Janene morreu em 2010, de problemas cardíacos.

Outro lado
A Petrobras não quis comentar o e-mail de 2008. O advogado de Fernando Soares, Mario de Oliveira Filho, diz que seu cliente só fez negócios lícitos na Petrobras.

A Folha não conseguiu localizar neste domingo (21) assessores de Jader Barbalho.

Brasil não vive crise de corrupção nem tem intocáveis, diz Dilma

• Em entrevista concedida ao jornal chileno 'El Mercurio', presidente comenta sobre denúncias de corrupção na Petrobrás

Ricardo Chapola - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - A presidente Dilma Rousseff afirmou em entrevista concedida neste domingo, 21, ao jornal chileno El Mercurio, do Grupo de Diários América (GDA), que o País não vive uma crise de corrupção. A declaração de Dilma foi dada como resposta a uma pergunta sobre efeitos políticos do esquema de desvio de dinheiro da Petrobrás em seu segundo mandato. O caso é investigado pela Polícia Federal desde março, no âmbito da Operação Lava Jato. Ao defender mais uma vez a punição dos responsáveis pelo esquema, Dilma afirmou que “não há intocáveis” no Brasil.

“O Brasil não vive uma crise de corrupção, como afirmam alguns. Nos últimos anos começamos a por fim a um largo período de impunidade. É um grande avanço para a democracia brasileira”, disse a presidente em entrevista ao jornal. “No Brasil não há intocáveis. Qualquer um que não trate o dinheiro público com seriedade e honestidade deve pagar por isso. É um compromisso do meu governo”.

A presidente manifestou indignação com relação às denúncias de corrupção na estatal e voltou a prometer punição dos responsáveis pelo prejuízo de R$ 10 bilhões aos cofres públicos estimados pelos investigadores. “Minha indignação com as denúncias que envolvem a Petrobrás é a mesma que sentem os brasileiros. E quero, como todos eles, que os culpados sejam punidos”, afirmou ela.
Perguntada sobre como foi liderar uma “campanha séria” anticorrupção sendo filiada ao partido que um dos protagonistas do caso da Petrobrás, Dilma afirmou que o esquema começou a operar na estatal antes de o PT chegar à Presidência da República, em 2002. “Essas investigações têm levado ao desmantelamento de um esquema que é suspeito de ter décadas de existência, antes dos governos do PT”, disse a presidente.

Ela voltou a afirmar ter demitido o então diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa, um dos principais delatores do esquema de corrupção na estatal. “Eu mesma demiti, três anos antes das investigações, o diretor que confessou para a Justiça a existência de um esquema de desvio de dinheiro na Petrobrás”, disse na entrevista.

O caso interferiu diretamente no planejamento de Dilma na reta final de seu primeiro mandato. A presidente foi obrigada a prorrogar a reforma ministerial depois de o Estado revelar, na semana passada, uma lista com nomes de 28 políticos citados por Paulo Roberto Costa à Polícia Federal. Segundo o ex-diretor, as pessoas citadas por ele à PF são supostos beneficiários do esquema de corrupção na Petrobrás.

Antes cotado para assumir algum cargo no primeiro escalão de Dilma, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) deve ser a primeira vítima da “lupa” da presidente.

Cuba. Na entrevista ao jornal chileno, Dilma também comentou sobre a retomada das relações diplomáticas entre Cuba e os EUA. “Isso terá um impacto forte e positivo para toda a América. Uma expressão de que isso já poderá se constatar na Cúpula das Américas, em abril, no Panamá. O encontro e o aperto de mãos de (Raul) Castro e (Barack) Obama será o símbolo de que algo novo está ocorrendo no nosso continente”, afirmou a presidente, ao destacar que o significado histórico da decisão tomada na semana passada.

Filha de Jefferson assume PTB e segue estilo do pai

• Cristiane Brasil acusa PT de montar "caixa de arrecadação" na Petrobras

• Sigla será independente do Planalto, diz ela; o pai, autor da denúncia do mensalão, está preso em regime semiaberto

Bernardo Mello Franco – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O PTB elegeu por unanimidade a sua nova presidente nacional. A ungida é Cristiane Brasil, 41, uma vereadora carioca que ainda terá que esperar até fevereiro para assumir o primeiro mandato de deputada em Brasília.

A escolha soaria estranha se a nova dirigente não fosse filha de Roberto Jefferson, autor da denúncia do mensalão. O ex-deputado está preso em regime semiaberto, mas ainda dá as cartas no partido.

"Ele não está proibido de falar no telefone. Mas quem teve que fazer o trabalho fui eu", diz Cristiane.

Faixa preta de caratê, a petebista indica que seguirá o estilo combativo do pai. Na primeira entrevista no cargo, ela acusa o PT de idealizar e comandar o esquema de corrupção na Petrobras.

"Esse esquema foi criado para financiar o projeto de poder do PT. Eles escolheram a Petrobras para fazer dali o caixa de arrecadação e se perpetuar no poder", diz. "É o maior escândalo de corrupção da história do Brasil. Muito maior do que o mensalão."

A nova presidente do PTB quer frustrar o plano do Planalto de atrair o partido para a bancada governista no segundo mandato. Ela promete que a sigla será "independente", apesar do convite ao senador Armando Monteiro Neto (PTB-PE) para o Ministério do Desenvolvimento.

"Ele é um quadro que orgulha o partido, mas foi uma escolha pessoal da presidente Dilma. O PTB não é base. Teremos independência."

Entre as bandeiras do Planalto que Cristiane quer combater está o projeto de regulamentação da mídia, defendido por Dilma na campanha presidencial. Escalada pelo pai, ela conduziu as negociações para que a sigla apoiasse o tucano Aécio Neves.

"Para nós foi ótimo. O PTB foi um dos únicos partidos que aumentaram sua bancada na Câmara. Passamos de 18 para 25 deputados"

A petebista é só elogios ao pai, a quem descreve como "um fofo". "Sou uma filha apaixonada. Ele é tudo para mim", derrama-se.

Apesar das juras, ela avisa: não pretende reabrir conflitos com os inimigos de Jefferson em Brasília. "Não quero herdar os ódios que meu pai amealhou ao longo da vida."

Ministério encrencado

• Sustentada por uma base política fragmentada e pressionada pelas denúncias na Petrobras, Dilma não consegue conciliar todos os interesses partidários para, enfim, anunciar sua nova equipe

Josie Jeronimo - IstoÉ

O atraso na definição da nova equipe ministerial é um sintoma da dificuldade que a presidente Dilma Rousseff tem para harmonizar uma composição de nove partidos. E os contratempos são tantos que Dilma não resistiu a uma inconfidência. Em conversa com a presidente da Argentina, Cristina Kirchner – em áudio que escapou nos microfones de jornalistas que cobriam a 47ª reunião da cúpula do Mercosul –, ela resumiu seus embaraços na reforma ministerial. "Estou formando. É muito difícil, muito difícil. Você não sabe no Brasil como é difícil." A coalizão presidencial à brasileira supera a tradição das composições partidárias comuns em outros países. Dilma tem 39 ministérios, dezenas de autarquias, agências e empresas de economia mista para distribuir, mas, mesmo com tanto espaço, a acomodação dos aliados continua sendo um grande problema.

Nos últimos dias, a dificuldade tem sido debelar as insatisfações no PT. Dilma decidiu reduzir a cota do PT para conquistar o apoio dos aliados de uma maneira mais sólida num momento em que precisa estar fortalecida politicamente, por causa das denúncias envolvendo a Petrobras. A provável ascensão ao primeiro escalão de Kátia Abreu (PMDB-TO) e Gilberto Kassab (PSD-SP) reflete esse novo cenário. Mas o xadrez permanece intrincado. O PMDB quer ter prioridade na escolha de cinco ministérios. A dificuldade de Dilma é conciliar os cinco postos com as preferências do partido e as subdivisões da legenda. Embora seja filiada ao PMDB, Kátia Abreu não é considerada da cota do partido. Confirmada, será considerada uma "ministra de Dilma".

A presidente ainda precisa contornar as diferenças regionais entre partidos aliados. O Estado do Ceará pode ganhar dois importantes ministros na nova equipe. Os planos iniciais do governo eram deixar Cid Gomes (PROS) com o Ministério da Educação e o senador Eunício Oliveira (PMDB) com o Ministério da Integração Nacional. Mas Gomes não ficou satisfeito e recusou o convite. O governador do Ceará avalia que a Integração oferece mais dividendos políticos do que a Educação. Até o início de 2014, a cota da Integração pertencia ao PSB. Quando o partido deixou a base do governo para disputar a Presidência, o feudo ficou sem dono. A rejeição de Cid obrigou o governo a rever a programação de distribuição de cargos.

A encruzilhada política de Dilma

• A presidente enfrenta problemas para conciliar os interesses do PT e dos aliados e fechar a equipe para o segundo mandato

- Época

Na última quarta-feira, a presidente Dilma Rousseff participava de uma reunião do Mercosul, na Argentina, quando foi questionada pela colega Cristina Kirchner: "Não vai anunciar o gabinete (ministerial) amanhã?". Dilma respondeu: "Não, estou formando. É muito difícil. Você não sabe como é difícil no Brasil." As duas sorriram, e Cristina desejou "boa sorte" a Dilma. Só foi possível acompanhar o diálogo porque os microfones estavam ligados, e as duas presidentes não sabiam.

O episódio constrangedor apenas confirma aquilo que muitos brasileiros já suspeitavam. Dilma ganhou um segundo mandato à frente do Palácio do Planalto, apoiada numa formidável coligação que lhe garantiu quase 12 minutos de propaganda na TV, muito mais tempo que todos os seus adversários. Essa coligação, imensa e heterogênea, foi montada com o loteamento dos ministérios (39, no total), da direção das estatais e até das agências reguladoras.

Reeleita, Dilma está agora encalacrada entre os interesses do PT, do PMDB e de seus demais parceiros eleitorais. Todos disputam palmo a palmo o espaço na Esplanada e esperam, feito crianças ao pé da árvore de Natal, seus presentes de final de ano.

Por causa da maneira como os governos do PT formam suas coalizões, a composição da nova equipe de governo, numa situação normal, já geraria tensões. Para piorar, o escândalo de corrupção na maior estatal brasileira, a Petrobras, ameaça envolver parlamentares da próxima legislatura e se aproximar ainda mais do Palácio do Planalto. Isso obriga Dilma a construir uma base sólida no Congresso para se blindar, no limite, de um eventual pedido de impeachment. Aproveitando a vulnerabilidade do Planalto e do PT, os parceiros, em particular o PMDB, aumentaram o preço do apoio ao governo. Mesmo com a presença do ex-presidente Lula em reuniões em Brasília, Dilma tem dificuldades para fechar uma equação. Ela nunca escondeu de ninguém sua ojeriza pelas negociações com os partidos aliados.

Há boas razões para duvidar que Dilma encontrará uma fórmula satisfatória (leia a entrevista do cientista político Carlos Pereira, na página 58). Isso poderá pôr o país diante de um cenário preocupante. Além da crise na Petrobras e de todas as suas consequências danosas para a atividade econômica, o Brasil está numa situação bastante complexa. Em boa parte, por causa dos equívocos da gestão da economia por Dilma I, reconhecidos por Dilma II quando indicou Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda. Para tentar pôr as contas públicas em ordem, o governo anunciou que promoverá um ajuste fiscal nos próximos anos. Isso implicará sacrifícios razoáveis. O receituário para superar essas dificuldades é conhecido e, se for bem aplicado, poderá levar o país de volta à rota do crescimento econômico. Ele depende de uma boa gestão da política. Sem ela, os problemas do país aumentarão.

Graça deve ser convocada a depor no MP

Juliano Basile e André Guilherme Vieira - Valor Econômico

CURITIBA, BRASÍLIA e SÃO PAULO - A presidente da Petrobras, Graça Foster, poderá ser convocada a prestar depoimento aos investigadores da força-tarefa da operação Lava-Jato, da Polícia Federal, que apura conluio entre empreiteiras, políticos e funcionários da estatal para desviar bilhões de reais da companhia.

O Valor apurou que Graça ainda não figura como investigada no caso. No entanto, o longo depoimento de quase cinco horas prestado pela ex-gerente Venina Velosa da Fonseca, na sexta-feira, aos procuradores da República revelou fatos que serão apurados em novos inquéritos policiais. A presidente da Petrobras deve ser chamada não somente na condição de testemunha, mas para prestar esclarecimentos a respeito das irregularidades na estatal.

A ex-gerente denunciou internamente por cinco anos diversos problemas em contratos, licitações e práticas da Petrobras. Acabou transferida para o escritório da estatal em Cingapura e, em 19 de novembro deste ano, foi destituída de suas funções.

Na sexta-feira, acompanhada de seu advogado Ubiratan Mattos, Venina entregou documentos e um computador aos responsáveis pelas investigações da operação Lava-Jato. Os e-mails em que Venina fez alertas de irregularidades para Graça Foster e para José Carlos Cosenza, o diretor que preside a comissão de apuração de irregularidades dentro da Petrobras, já estão em poder da força-tarefa, assim como os documentos internos da Petrobras. Com base nessas informações, Cosenza também deve ser chamado a prestar esclarecimentos.

A força-tarefa recebeu informações a respeito de três esquemas de desvio de dinheiro denunciados pela geóloga.

O primeiro esquema envolve desvios na área de comunicação da Diretoria de Abastecimento e foi descoberto por Venina entre 2008 e 2009. Na época, ela era subordinada ao então diretor Paulo Roberto Costa, um dos mentores do esquema de corrupção e seu delator. Ao se queixar com Costa sobre uma série de contratos em que os serviços simplesmente não estavam sendo prestados, Venina alega que viu o então diretor apontar o dedo para o retrato do presidente Lula e perguntar se ela estava "querendo derrubar todo mundo".

O esquema na área de comunicação envolveu supostamente o desvio de verbas para o PT da Bahia, grupo político do então presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli.

Em 3 de abril de 2009, Venina enviou e-mail pedindo ajuda a Graça Foster, então diretora de Gás e Energia, para concluir um texto sobre as descobertas que fez sobre desvios milionários na área de comunicação. A mensagem foi enviada às 3h50 daquele dia. Na mesma data, a comissão interna da estatal concluiu que houve os desvios. Graça, entretanto, não respondeu à mensagem da gerente.

Ao todo, os desvios na área de comunicação do Abastecimento retiraram mais de R$ 58 milhões da Petrobras para serviços que não foram prestados. A estatal informou, em nota, que demitiu o funcionário supostamente responsável pelos desvios - Geovanne de Morais. No entanto, como ele estava sob licença médica, a estatal manteve-o no cargo por mais quatro anos. Ao verificar que Geovanne não foi demitido, Venina obteve parecer jurídico determinando o desligamento do funcionário, mesmo sob licença médica. Ela encaminhou o parecer aos superiores, pois achava absurdo que o funcionário acusado de desvios continuasse sob a folha de pagamento da estatal. Geovanne, porém, não foi desligado de imediato. Passaram-se quatro anos para que ele fosse demitido, informação atestada em nota da própria Petrobras.

A força-tarefa também recebeu documentos a respeito da elevação de custos na refinaria Abreu e Lima, que subiu de US$ 4 bilhões para mais de US$ 18 bilhões. As informações mostram que a terceira fase das obras só foi autorizada um mês após a saída de Venina da área de Abastecimento, em outubro de 2009. Antes de deixar o cargo na diretoria de Paulo Roberto Costa, a geóloga encaminhou notas, e-mails e documentos alertando para a escalada de preços da refinaria.

Um documento interno da Petrobras mostra que Venina fez, a pedido de Paulo Roberto, um plano de antecipação das obras da refinaria, em 8 de março de 2007. Na ocasião, ela deixou claro que o plano envolvia aumento de custos da ordem de US$ 328,7 milhões, para fazer com que a refinaria começasse a funcionar antes da data prevista, conforme pedido do diretor. Venina reitera que o plano foi submetido "à consideração de V. Sa. (Paulo Roberto)" para que, se estivesse de acordo, fosse submetido à diretoria. O plano foi levado à diretoria e, em seguida, ao Conselho de Administração, presidido na época pela então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.

Por fim, os procuradores da República obtiveram documentos a respeito de desvios feitos por negociadores de combustível de navio em unidades da Petrobras no exterior. Mais de mil comunicações entre "traders" de combustível com "fortes evidências" de desvios foram recebidas pelo Ministério Público.
Venina depôs em Curitiba, na sexta-feira, sob proteção policial. Ela também deve ser ouvida pelo juiz Sérgio Moro, que conduz os autos da Lava-Jato na capital paranaense.

Procurados pelo Valor após o depoimento, Venina e seu advogado preferiram não fazer comentários sobre o testemunho.

Com reeleição ameaçada no Senado, Renan reforça aproximação com Planalto

Raquel Ulhôa – Valor Econômico

BRASÍLIA - Cenário ainda considerado mais provável por lideranças do Senado, a reeleição do senador Renan Calheiros (PMDB-AL) na presidência da Casa, em fevereiro, começa a ser questionada com maior intensidade, dentro e fora do seu partido. Ex-governador e ex-presidente do PMDB, Luiz Henrique (SC) está sendo estimulado a se candidatar - e não descarta. O líder do PSDB, Aloysio Nunes (SP), defende que o PMDB consulte os demais partidos. E a ideia de a oposição lançar um nome foi tratada entre os presidentes do DEM, José Agripino (RN), e do PSDB, Aécio Neves (MG).

"O processo não foi deflagrado ainda e, por enquanto, estou na expectativa. Existe, por parte de companheiros de todos os partidos, é verdade, uma forte inclinação pelo meu nome. Recebi sinalizações de líderes e companheiros da grande maioria dos partidos", afirmou Luiz Henrique ao Valor. "Em qualquer hipótese, a oposição caminha para ter um candidato. Eu e Aécio já conversamos", disse Agripino.

"Vai ser um ano tenso [2015]. A situação econômica vai se agravar e, em consequência, a social também. O cenário político é de grande incerteza em função da Operação Lava-Jato [da Polícia Federal, que investiga esquema de corrupção na Petrobras ]. O ideal é que a gente tenha uma Mesa Diretora com grande apoio interno. Para isso, acho importante que o PMDB faça sondagem nos outros partidos, para ver qual dos seus membros terá mais condições de congregar a Casa", ponderou Aloysio.

A ala do PMDB mais ligada a Renan diz que, se ele não disputar a reeleição - por decisão própria ou obstáculos políticos-, o candidato natural é o atual líder da bancada, Eunício Oliveira (CE), principalmente pela função que ocupa. A avaliação do grupo é que Eunício teria os votos da maioria da bancada, embora Luiz Henrique possa ter mais apoio em outros partidos.

A suposta citação de Renan como beneficiado pelo esquema de corrupção na Petrobras, que teria sido feita pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, em depoimento dado por acordo de delação premiada com o Ministério Público, é considerada insuficiente para comprometer sua reeleição. Primeiro, por não haver provas. Segundo, porque falta mais de um mês para a eleição da Mesa Diretora. Até lá, tudo pode mudar.

Mas predomina, nos bastidores do Senado, receio de novas revelações da Operação Lava-Jato comprometendo Renan, a ponto de ele desistir de concorrer à reeleição. Já há quem defenda, na direção do PMDB, que a melhor posição para o alagoano seria a presidência do partido. Manteria força e prestígio, sem ficar tão vulnerável a pressões externas. Para isso, no entanto, o vice-presidente da República, Michel Temer, não seria reconduzido.

A aliados próximos, Renan não demonstra preocupação com eventuais denúncias. Há dois anos, na véspera de ser eleito para o atual mandato de presidente do Senado, o então procurador-geral da República, Roberto Gurgel, apresentou denúncia contra ele pelos crimes de peculato, falsidade ideológica e uso de documento falso. Isso foi visto entre os senadores como ato político, para tentar impedir sua eleição, e acabou tendo efeito contrário sobre alguns senadores.

Politicamente frio e habilidoso, o senador de Alagoas tem, hoje, mais força do que naquela época, pela proximidade conquistada com a presidente Dilma Rousseff, especialmente após as manifestações de rua, de 2013. E pelo empenho em agradar à sua bancada e aos senadores de outros partidos. Se não for seriamente atingido por denúncias até o final de janeiro, é favorito a permanecer no cargo.

Os encontros e os telefonemas trocados entre Renan e Dilma têm sido frequentes. Recentemente, a presidente teve de aceitar a indicação do senador Vital do Rêgo (PMDB-PB) para o Tribunal de Contas da União (TCU), embora defendesse a indicação da ministra Ideli Salvatti para a vaga. Mas Renan avisou-a que a ex-senadora petista teria dificuldade de ser aprovada na Casa e a presidente cedeu. Em outros tempos, a presidente provavelmente nem negociaria, avaliam pemedebistas.

O alerta de Renan sobre o risco de derrota de Ideli ocorreu logo depois de o Congresso rejeitar o decreto presidencial que tratava de conselhos populares. O presidente do Senado também havia avisado a presidente de que esse seria o desfecho. Sugeriu que ela enviasse um projeto de lei, para ser discutido no Legislativo. Ela insistiu e saiu derrotada.

Atualmente, nos entendimentos pela composição do ministério, Renan foi claro, em conversa com a presidente, ao dizer que o PMDB do Senado quer mais espaço no governo do que a bancada da Câmara. Dilma chamou-o para consultá-lo sobre proposta que Temer levara a ela para que o PMDB do Senado tivesse dois ministérios; o da Câmara, outros dois; e o próprio vice teria dois em sua cota pessoal.

Renan rejeitou. Disse que a bancada de senadores tem 25% dos votos na Casa, enquanto a de deputados tem apenas 11% da Câmara e ainda vota dividida. Ainda não houve definição. Ele luta por três ministérios para a bancada do Senado, incluindo nessa cota Kátia Abreu (TO) na Agricultura - opção de Dilma. Os nomes cotados são os do líder do governo na Casa, Eduardo Braga (AM), e o de Eunício. Ainda não houve definição.

Dilma mostra preocupação com a agressividade da oposição a partir do próximo ano. Contou a Renan ter assistido à sessão do Congresso destinada à votação do projeto que permitiu ao governo não cumprir a meta do superávit primário. Terminou de madrugada. Disse ter ficado impressionada com a "virulência" da oposição. Isso aumenta a dependência do governo do presidente do Senado.

Com habilidade para distribuir espaços de poder no Senado, Renan enfraqueceu o grupo de pemedebistas que, no início de 2013, se dizia independente. Hoje, ainda existem resistências, mas sem articulação organizada. Desde já, Renan tem feito gestões para atender às preferências dos senadores eleitos, que tomarão posse em fevereiro, por gabinetes e apartamentos. Patrocinou trocas, para tentar atender a todos.

O PMDB, por ter maior número de senadores, indica o candidato oficial a presidente da Casa, mas o nome tem de ser votado no plenário. A oposição costuma lançar alguém para marcar posição. O PMDB tem outros nomes considerados para o cargo, como Waldemir Moka (MT), que tem bom trânsito em todos os partidos. Mas nenhum deles - Moka, Luiz Henrique ou Eunício - tem a intenção de disputar com Renan. São colocados como alternativa a eventual saída de Renan do jogo.

Um nome forte do partido, cotado para as vagas mais importantes, é o de Romero Jucá (RR). Assim como a definição dos ministros do PMDB do Senado, a sucessão na Mesa tem implicações na divisão dos demais cargos do partido, como lideranças e presidências de comissões. Mas o quebra-cabeça só deve ser decidido na segunda quinzena de janeiro.

Carlos Pereira: “O PT não sabe fazer coalizão de governo”

• O cientista político diz que os governos petistas não sabem dividir o poder com os aliados - e isso está na raiz do petrolão

Guilherme Evelin - Época

O professor da Fundação Getulio Vargas Carlos Pereira formou-se em medicina, mas preferiu seguir carreira acadêmica como cientista político. Tornou-se um arguto analista do funcionamento da política no Brasil. Para ele, o sistema precisa de ajustes, mas é bom porque tem garantido, numa democracia relativamente jovem, estabilidade política, resolução de conflitos sem violência, redução da pobreza, equilíbrio macroeconômico e representação de interesses no jogo político. Num trabalho recentemente apresentado na Universidade de Oxford, no Reino Unido, ele argumenta que os escândalos se sucedem porque o PT, em seus governos, não tem dividido o poder com seus aliados, regra essencial do presidencialismo de coalizão.

ÉPOCA - Teremos uma tempestade perfeita em 2015?

Carlos Pereira - É muito provável. Embora esteja muito otimista com o Brasil, estou pessimista com o governo. O governo perdeu consideravelmente seu poder no Congresso, apesar de ser majoritário. Há agora uma bancada de oposição não só numericamente mais forte, mas com figuras aguerridas e maior peso político. Existe também um cenário de explosão do maior escândalo de corrupção de nossa história. Será difícil para o governo escapar de ser chamuscado. O receio é que a mesma polarização das eleições seja reproduzida em 2015, num quadro de paralisia da economia, crescimento da inflação e desemprego.

ÉPOCA - A presidente Dilma Rousseff corre risco de impeachment?

Pereira - Esse risco só se tornará real se evidências concretas relacionarem diretamente Dilma ao petrolão. Um impeachment depende também de condições políticas. Falando de um cenário hipotético, diferentemente de Collor, Dilma tem um partido político com base e inserção social. CUT, MST, sindicatos e movimentos sociais sairão em defesa do governo. Esses grupos irão para a rua e alegarão que isso é um golpe, embora a Constituição brasileira pressuponha o impeachment como uma saída legal, diante de conflitos que envolvem crimes de responsabilidade. Já há manifestações de pequeno porte pelo impeachment. Se evidências surgirem, ocorrerão manifestações maiores. Então, os dois grupos entrarão em conflito.

ÉPOCA - Isso pode trazer grande instabilidade para o país?

Pereira - Seria um grande teste para as instituições democráticas. Até que ponto elas estão suficientemente maduras para segurar um processo de impeachment com grande polarização? Esse cenário tende a se tornar ainda mais complicado, porque o PT gerencia de forma ruim suas coalizões. O PT, tradicionalmente, desde quando Lula assumiu a Presidência, preferiu construir coalizões com número grande de parceiros, muito heterogêneos. Eles não têm uma plataforma comum de ação. É difícil coordenar uma coalizão dessas, e o PT ainda tem optado por não compartilhar poder com os parceiros, numa postura monopolista de concentração de poder. Lula alocou 60% dos 35 ministérios no começo de seu governo nas mãos do PT. Seu principal parceiro, o PMDB, só tinha dois ministérios. Depois, conseguiu ampliar, mas continuou subcompensado. O governo Dilma continuou com uma coalizão grande demais, heterogênea e monopolista. Isso gera tensões e animosidades internas. Aí o governo tem de encontrar outros mecanismos de recompensa para esses parceiros. Agora, nessa situação de vulnerabilidade do governo, o preço desse apoio, principalmente do PMDB, aumentará muito.

ÉPOCA - Mas o PMDB será atingido em cheio pelo petrolão.

Pereira - Por isso mesmo, o preço do apoio aumentará. Para que eles continuem unidos sem risco de quebra. Por quase três semanas, o PMDB fez corpo mole em relação à mudança da meta fiscal. Deu um sinal à presidente de que o futuro do governo depende do PMDB. Se ela não percebeu e continuar menosprezando o PMDB e outros parceiros, todos esses atores aumentarão seu poder de barganha, à medida que o governo se fragilizar.

ÉPOCA - Como o senhor acha que o governo reagirá?

Pereira - O governo assumiu uma postura defensiva de transferir responsabilidade. Dilma pegou a bandeira da reforma política para mostrar que a culpa não é do governo, mas do sistema político. O governo também tentará se aproximar cada vez mais da sociedade, com essas saídas plebiscitárias, à medida que, progressivamente, perder apoio no Parlamento e tornar-se refém dos parceiros. É esse cenário bastante negativo que vejo para o governo, mesmo que não surjam vinculações diretas entre Dilma e o petrolão. O governo ficará muito vulnerável, reagindo ao turbilhão de denúncias que não para.

ÉPOCA - No primeiro mandato, a presidente Dilma mostrou quase nenhuma aptidão para esse jogo político com o Congresso.

Pereira - Ela se mostrou, com certeza, uma péssima gerente da coalizão. Criei um índice de custo de governo. Calculei todos os custos que o Executivo tem com seus aliados - com cargos, ministérios e emendas parlamentares no Orçamento, desde 1994 (começo do governo Fernando Henrique Cardoso) até agora. Esse custo vem crescendo exponencialmente. O índice tem três variáveis: tamanho da coalizão, heterogeneidade ideológica e capacidade do governo de compartilhar o poder com os parceiros. O resultado foi claro: quanto maior a coalizão, quanto mais heterogênea ela é e quanto menos poder é compartilhado, maior é o custo de governar. Também dividi a variável custo pelas iniciativas do Executivo aprovadas no Congresso. Na série histórica, o governo mais ineficiente é da Dilma. Ela gasta muito e consegue aprovar o mínimo possível. Se você não gerencia bem a coalizão, não escolhe bem os aliados, não tem uma agenda em comum com eles nem compartilha poder, não adianta gastar mais. Não conseguirá mais apoio.

ÉPOCA - Dilma, no segundo mandato, poderá mudar a gestão política, como deu a entender que mudará na economia?

Pereira - A indicação do Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda não foi um movimento para a coalizão. Foi um movimento para os eleitores. A sociedade ficou dividida nas eleições sobre duas crenças. A primeira, claramente favorável à proteção e à inclusão social, foi encarnada pela candidatura dela. A candidatura de Aécio Neves encarnou fundamentalmente os princípios de equilíbrio macroeconômico. A sociedade queria as duas coisas. Nenhuma das candidaturas ofertou as duas ao mesmo tempo. Por isso, a margem de vitória dela foi tão pequena. Ela sabe disso e que enfrentará um ano difícil. Se não desse um sinal para esse eleitorado perdedor, as condições de governo ficariam piores. A indicação de Levy foi menos uma concessão à gestão da coalizão e mais sinal de sobrevivência política depois de uma eleição muito competitiva. Com relação à gestão da coalizão, espero que ela aprenda com os erros do passado. Mas nada me leva a achar que ela mudará de postura.

ÉPOCA - Por que o senhor está então otimista com o Brasil?

Pereira - Estou otimista com a evolução e a maturidade das instituições, como o Ministério Público, os Tribunais de Contas, a Controladoria-Geral da União, a Polícia Federal. São tantos grupos capazes de identificar malfeitos que mesmo pessoas muito ricas e muito poderosas não são capazes de subornar segmentos dessas instituições de controle. Isso mostra a grande solidez das instituições democráticas.

ÉPOCA - Apesar disso, o petrolão ressuscitou a discussão sobre uma reforma política. Critica-se o presidencialismo de coalizão.

Pereira - Quando o modelo é bem gerido, o custo é baixo. Já tivemos governos anteriores que geriram bem. O governo Fernando Henrique Cardoso montou uma coalizão de apenas quatro parceiros: PSDB, PFL, PTB e PMDB. Os quatro tinham uma agenda parecida de centro-direita, a favor da privatização, do controle inflacionário, da modernização da economia. Todos falavam a mesma linguagem. FHC levou em consideração o peso de cada um desses partidos no Congresso para alocar ministérios e cargos. Isso comprometeu os partidos com seu governo. Com a chegada de Lula e o desrespeito a essa regra de ouro da gestão de coalizão -dividir poder levando em consideração o peso de cada um -, surgiu progressivamente a necessidade de criar moedas de troca heterodoxas. O mensalão foi isso, assim como o petrolão. Esses escândalos de corrupção ocorrem nos governos petistas pelo não entendimento de como funciona o presidencialismo de coalizão. Existe, no âmago do PT, uma dificuldade de entender que é necessário compartilhar poder para que o presidencialismo de coalizão funcione bem. O PT, diferentemente de outras siglas brasileiras, tem muitas facções. Parece muito o partido peronista argentino. Tem vários grupos que fúncionam como partidos dentro do PT. O PT prefere ser proporcional com as facções internas e desproporcional com os parceiros externos da coalizão. Só que são os parceiros externos que têm peso político no Congresso. Ao fazer isso, o PT precisa arrumar outras moedas, como o petrolão e o mensalão, para fazê-los felizes. Como há muitos escândalos, a percepção da opinião pública é que há algo de errado no sistema político. O problema é de gestão. Não está no desenho do sistema. Ele tem falhas e precisa de ajustes, mas funciona relativamente bem. Se tivéssemos um grupo político que entendesse melhor o presidencialismo de coalizão, os problemas seriam menores.

Gilmar Mendes: "Vivemos uma escalada das degradações"

• Ministro do STF diz que a Lava Jato pode atingir outros órgãos do governo e que não adianta discutir financiamento de campanha antes da revisão do sistema eleitoral

Eumano Silva - IstoÉ

Os brasileiros devem se preparar para viver, em 2015, um ano de grandes desafios nos três poderes da República. Esse é o diagnóstico do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF). A mais alta corte do Judiciário deverá julgar, por exemplo, várias questões relacionadas ao salário do funcionalismo público, assunto que tem reflexos no Executivo e no Legislativo. O caso que vai mobilizar as principais autoridades do País, no entanto, será o escândalo da Petrobras.

As decisões do STF sobre as descobertas da Operação Lava Jato, da Polícia Federal, podem atingir caciques políticos com mandato eletivo, executivos e donos de grandes empresas – em especial empreiteiras –, integrantes do governo atual e de gestões passadas. Pelo que viu, até agora, Mendes se diz "chocado e perplexo" com a extensão da rede criminosa que sangra os cofres da maior estatal do País. Na opinião do ministro, os tentáculos da poderosa organização ilegal podem chegar a outros órgãos do governo. "É difícil imaginar que haja negócios regulares nesse ambiente", afirma Mendes.

ISTOÉ - O STF está preparado para essa situação?

GILMAR MENDES - Penso que sim. O tribunal tem crescido em momentos difíceis, isso é próprio de instituições com certa tradição. Muitas vezes o tribunal é maior do que a composição individual, que às vezes deixa a desejar. Mas a gente não pode atribuir essa missão exclusivamente ao tribunal. É fundamental que o estamento político realize sua missão. Por exemplo, a reforma política não pode ser obra de tribunal.

ISTOÉ - O que mais chama sua atenção nesse processo deflagrado pela Operação Lava Jato?

GILMAR MENDES - Estou chocado e perplexo com as revelações em torno da Petrobras. Um dia desses um jornal publicou que, entre dirigentes da Petrobras, havia até um tipo de troca de créditos de propina. É difícil, diante da narrativa a que tivemos acesso até aqui, imaginar que haja negócios regulares nesse ambiente. Chega ao cidadão, mesmo aos mais simples, a ideia de que essa é a rotina. Isso choca. É a normalização do mal.

ISTOÉ - Por que isso acontece?

GILMAR MENDES - Até pouco tempo atrás costumava-se dizer que a corrupção estava associada ao financiamento eleitoral. Mas estamos a ver que os recursos não fluem necessariamente para os caixas dos partidos. Há patrimonialização, contas no exterior em volumes elevadíssimos, até uma devolução de US$ 100 milhões. Fala-se também, nas delações, de pessoas que já assumiram compromisso de devolver R$ 500 milhões. No mensalão, nós orçávamos os valores dos desvios em torno de R$ 170 milhões e achávamos que aquilo era significativo.

ISTOÉ - Qual é o grande ensinamento do processo do mensalão?

GILMAR MENDES - Do ponto de vista institucional, acho que mostrou que se encerrou um ciclo tendencial de impunidade. Virou um processo símbolo, por conta de todas as implicações, dos sujeitos envolvidos. Do ponto de vista processual, mostrou-se também que é quase impossível julgar um processo com 40 pessoas, aqui, no plenário do Supremo. Por isso, fragmentamos as competências do plenário, passamos para as turmas e estamos a exercitar essa segmentação de processos.

ISTOÉ - Apesar das condenações do mensalão, o escândalo da Petrobras demonstra que as práticas corruptas continuaram. Houve mesmo esse aspecto educativo?

GILMAR MENDES - A gente percebe que tem algum efeito, talvez, tendo em vista a delação premiada agora. As pessoas viram, por exemplo, que os operadores, como o publicitário Marcos Valério ou Kátia Rabello, do Banco Rural, tiveram penas elevadas, se levarmos em conta as que foram aplicadas às pessoas do segmento político. Tenho a impressão de que isso estimulou esse ânimo de cooperação que nós estamos vendo e que está resultando positivo. Mas concordo que a práxis indica uma certa normalização desse tipo de conduta. Se imaginamos que essa rede de propinas se instalou há muitos anos na Petrobras, por que não estará também em outras estatais, nos fundos de pensão e em outros entes sob a influência desse Estado ocupado partidariamente?

ISTOÉ - A Petrobras sobrevive a essa crise?

GILMAR MENDES - Esse é o grande desafio. Nós que tínhamos tanto orgulho da Petrobras, de suas façanhas históricas, estamos todos constrangidos e envergonhados. Essas investigações nos Estados Unidos são constrangedoras. Empresários que também têm raízes no exterior dizem que essas investigações se refletem também em outras empresas brasileiras. É a credibilidade do País que está sendo afetada. Estamos sendo apresentados como culturalmente corruptos. Isso é extremamente grave, precisamos reagir. Vivemos uma escalada das degradações.

ISTOÉ - Por que o sr. pediu vista de um processo que acaba com as doações eleitorais das empresas privadas?

GILMAR MENDES - O discurso fácil é que a corrupção existe por conta do financiamento das empresas privadas. Parece que o petrolão está desmentindo isso. O Brasil chegou ao modelo do financiamento das empresas privadas depois do episódio do impeachment do presidente Fernando Collor. Foi a CPMI do Paulo César Farias e do Collor que recomendou a adoção do financiamento das empresas privadas, com um certo limite, para evitar o caixa 2. E agora se diz que o financiamento das empresas privadas rima com corrupção. Parece que se imaginava, com isso, mudar o sistema eleitoral. O partido que desenhou essa proposta (o PT) queria o financiamento público e o voto em lista. A minha objeção é que nós temos de discutir o sistema eleitoral para saber qual é o modelo de financiamento. E não discutir o modelo de financiamento para definir o sistema eleitoral.

ISTOÉ - Nas contas eleitorais da presidente Dilma, o sr. chegou a suspeitar de doações feitas no caixa 1 com dinheiro ilegal...

GILMAR MENDES - Não se sabe, necessariamente. Chamo a atenção para o fato de que não adianta simplesmente vedar a participação das empresas privadas se nós não definirmos qual vai ser o modelo eleitoral. E, claro, temos de definir o custo de campanha. O publicitário Duda Mendonça disse que é preciso acabar com as campanhas artificiais na televisão. Vimos agora que, dos gastos da campanha presidencial vitoriosa, mais de R$ 70 milhões foram para o (marqueteiro) João Santana.

ISTOÉ - O que os técnicos do TSE apontaram de mais importante no trabalho sobre as contas da presidente Dilma?

GILMAR MENDES - Os técnicos apontaram alguns desvios, mas um percentual alto estava no fato de não ter havido a prestação de contas no tempo certo, o que é um problema operacional sério para os partidos e, por isso, reconhecemos. Algumas incongruências nós apontamos. Por exemplo, o segundo maior gasto, de R$ 24 milhões, foi para aquela empresa de São Bernardo dirigida por um motorista. Surgiram dúvidas se determinada empresa fez doação porque é grande beneficiária de financiamento do BNDES. Há nisso uma condicionalidade, ou não? A mesma coisa vale para empresas prestadoras de serviço para o governo. Tudo isso não é suscetível de ser examinado no âmbito do TSE. Por isso, mandamos essas dúvidas para os órgãos competentes como Ministério da Fazenda, Coaf e TCU para que possam também fazer a devida avaliação.

ISTOÉ - Além dos julgamentos de pessoas com direito a foro especial, que outros casos vão mobilizar o STF em 2015?

GILMAR MENDES - Teremos a retomada das atividades nas causas de repercussão geral – algumas já foram colocadas este ano. Por exemplo, o direito a uma possível revisão geral anual dos salários dos funcionários públicos. Isso começou a ser julgado e está com um pedido de vista. Temos a desaposentação, também já colocada, várias questões de índole tributária e os planos econômicos, cuja votação ficou suspensa. Há também refregas corporativas. Nós temos muitas questões salariais tensionando o ambiente. Os próprios juízes estão mais reivindicativos. Nós temos essa questão do auxílio-moradia e certamente outras categorias vão tentar também obter algum tipo de vantagem. Vislumbro um ano muito tenso nesse ambiente corporativo, especialmente no STF.

ISTOÉ - Até que ponto essas ações que aumentam os gastos públicos ameaçam as contas do governo?

GILMAR MENDES - Estou muito preocupado com esse quadro. Tenho a responsabilidade fiscal como um pressuposto de toda a ação estatal. Quando começamos a conceder vantagens sem base legal, em geral infringimos também a lei orçamentária e corremos o risco de, daqui a pouco, termos dado um benefício sem termos condições de assegurar a sua continuidade. Na magistratura federal nós já temos o auxílio-alimentação e, recentemente, o auxílio-moradia, baseado em uma liminar do ministro Luiz Fux, estendido pelo CNJ. Tem um valor único, de R$ 4.500, independentemente do local onde a pessoa vive, e de o sujeito ter ou não imóvel. Isso convida outras categorias a reproduzir a mesma prática, como já acontece no Ministério Público, que é paradigma dessa ação. A defensoria pública está fazendo a mesma coisa. Daqui a pouco, vêm auditores, delegados, consultores legislativos e assim por diante.

ISTOÉ - A Comissão da Verdade recomenda uma reinterpretação da Lei da Anistia. O sr. acredita que possa haver uma mudança nessa questão?

GILMAR MENDES - Vamos aguardar a provocação. Existe um dado que, às vezes, escapa. A ideia da anistia ampla, geral e irrestrita veio também no próprio processo constituinte, no artigo 4° da emenda que convocou a Assembleia Nacional Constituinte. Está na base da nossa ordem constitucional. A emenda incorporou aquela regra básica. A mim me parece que esse debate foi levado a cabo com toda a competência em todos os sentidos pelo tribunal.

Maior resistência contra Levy virá de aliados, diz Aécio

• 'Ele sabe que é um corpo estranho nesse processo', afirma tucano, que promete lutar contra o aumento de impostos

Governo vai provar do seu veneno na economia

• Senador cita 'neoliberalismo petista' e diz que não apoiará criação de novos impostos

Valdo Cruz, Daniela Lima – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Derrotado na disputa pela Presidência da República em outubro, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) aposta que as medidas da nova equipe econômica da presidente Dilma Rousseff serão insuficientes para conter o clima de desconfiança com os rumos do país. "O governo vai provar do seu próprio veneno."

Ele afirma que o próximo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, enfrentará mais resistência da base do governo do que da oposição. "Ele sabe que é um corpo estranho neste processo", diz. E, em tom irônico, arremata: "Vamos conhecer o neoliberalismo petista".

Aécio promete não apoiar aumentos de impostos propostos pelo governo para fazer um ajuste de R$ 100 bilhões em 2015. "De onde vai vir isso?", questiona.

O tucano afirma não ver motivos para um impeachment de Dilma, como têm defendido alguns grupos em protestos de rua, mas defende a investigação da campanha. Revela ainda que ficou "decepcionado" com a atuação do ex-presidente Lula, com quem tinha boa relação.

Aécio desconversa sobre nova candidatura e faz acenos na direção do colega Geraldo Alckmin (PSDB-SP).

Folha - Fica mais difícil criticar o novo governo agora que ele assume uma política econômica semelhante àquela que o sr. defendia?

Aécio Neves - Ao contrário. Acho que fica difícil para este governo sustentar o discurso da eleição. O país cantado para os brasileiros --equilibrado, próspero, com inflação sob controle-- é, na verdade, uma grande ilusão. A cada medida que o governo anuncia, ele, na verdade, corrobora todos os alertas que fizemos na campanha eleitoral.

A que se refere?

Anúncios de ajustes fiscais extremamente duros, as maldades anunciadas agora pelo futuro ministro [da Fazenda, Joaquim Levy]. Na verdade, estamos vendo uma grande esquizofrenia, uma contradição entre aquilo que se anuncia e aquilo que o governo vem praticando. Conheceremos o neoliberalismo petista [risos]. Vamos ver até quando as convicções da presidente se alinharão com as da equipe que ela nomeou.

Vão vir ao Congresso propostas de aumento de impostos, cortes, mudanças no seguro-desemprego. O PSDB vai aprovar essas iniciativas?

Disse a campanha inteira que não faria pacotes. Os nossos ajustes seriam feitos a partir da credibilidade que nós inspiraríamos no mercado. Como eles não têm esse ativo, o que se anuncia é um pacote de maldades.

Será contra novos impostos?

Claramente. E qualquer alteração de direitos trabalhistas teria que ser negociada com as centrais sindicais. Estamos voltando ao tempo do pacotaço. Para se alcançar o superávit proposto pela nova equipe, de 1,2% do PIB, é preciso um ajuste em 2015 de R$ 100 bilhões. De onde vai vir isso? O governo vai provar seu próprio veneno.

O sr. ligou para parabenizar Joaquim Levy? Ele colaborou com sua campanha.

Talvez solidariedade fosse mais apropriado [risos]. Não, eu jamais iria constrangê-lo. Respeito muito o Levy, mas ele sabe que é um corpo estranho neste processo. Ele será combatido até mais pela base do governo e dos setores que o sustentam do que pela oposição.

O sr. pediu a investigação da campanha de Dilma. Não há risco de alimentar a tese de que não aceitou a derrota?

Esse é o discurso do PT. Fui o primeiro a assumir a derrota, quando liguei para a presidente. Mas a vitória não dá salvo-conduto a ela. Se houve ilegalidade, existem outras sanções [fora a perda do mandato]. Se amanhã ficar provado que os Correios omitiram material dos adversários para favorecer o governo --o que não muda a eleição, mas é um crime--, essa pessoa tem que ser responsabilizada.

A oposição tem ressaltado que o sr. tem um patrimônio de 51 milhões de votos. Quantos são de Aécio Neves e quantos são apenas anti-Dilma?

O PT, pela primeira vez, enfrentará uma oposição que reflete o sentimento de uma sociedade. Agora, não vamos cometer o erro crasso de personalizar a oposição. A oposição tem que ter vários rostos. A Marina [Silva] é, o PSB é, e nós somos oposição. Vamos estimular as pessoas a ter uma militância pós-eleição. Esse é o maior ativo. É uma coisa viva. É isso que assusta o PT.

Têm ocorrido atos anti-PT. Um grupo que defende a volta dos militares se somou a eles. Como vê esses eventos?

Não podemos permitir que os saudosistas do autoritarismo se transformem agora nos nossos black blocs e inibam manifestações democráticas. Essa, inclusive, tem sido a estratégia do PT: misturar as coisas. Fora da democracia, nada nos interessa.

Existem elementos para pedir o impeachment?

Não. Não trabalho com essa hipótese. Estamos fazendo aquilo que na democracia é permitido: acionar a Justiça pedindo investigação. Pode ser até que se comprove que não houve nada, mas este é um direito inalienável.

Pretende ir a atos anti-Dilma?

Não tenho programação para isso. Quero ter uma agenda de viagens pelo país.

Depois das caravanas do ex-presidente Lula teremos caravanas de Aécio Neves?

Não é isso. Quero continuar mostrando o Brasil real em contraponto à propaganda oficial. Quero fazer, por exemplo, uma viagem desde São Roque [de Minas], onde nasce o rio São Francisco, até onde ele se encontra com o oceano.

Preparação para 2018?

Quero me reencontrar com as pessoas que sonharam comigo, com um tempo novo. Perdi a eleição, não perdi a luta política. O governo está ajudando a mostrar que eu estava falando a verdade, e não eles. Não preciso ser candidato à Presidência para continuar atuando. A candidatura não é uma carreira.

Mas o sr. pensa em ser candidato novamente?

Não mesmo. Talvez já tenha cumprido o meu papel. O candidato vai ser aquele que tiver as melhores condições de enfrentar o governo. Meu papel é manter a oposição forte. O governador de São Paulo [Geraldo Alckmin] é um nome colocado e tem todas as condições. Outros nomes serão lembrados. Seria um erro antecipar este processo.

Vê envolvimento da presidente no caso da Petrobras?

Não acho que a presidente se beneficiou de forma pecuniária, para ela, pessoalmente. Politicamente, claro que se beneficiou. Ela e todo o governo, desde lá atrás.

Anotações [encontradas em meio ao material apreendido em uma das empresas] apontam que o sr. teria sido procurado por uma empreiteira para segurar a CPI. Isso ocorreu?

Nunca. Basta ver o meu papel nisso. Fui eu o responsável, em última instância, pela instalação da CPI. Estimulei o relatório paralelo da oposição, que indicia todo mundo.

Teme que o Brasil pare, já que donos das grandes empreiteiras estão presos?

Não. O que tem que parar é a corrupção. Outras empresas surgirão para ocupar o espaço. Esse discurso é dos que querem que as investigações se limitem a onde chegaram.

Várias empresas envolvidas na Lava Jato doaram para sua campanha. Acha que o escândalo forçará mudanças no sistema de financiamento?

Não cometam o equívoco --porque atende o interesse de quem não quer apuração nenhuma-- de confundir doação legal com corrupção, com crime. Agora, acho que o sistema de financiamento vai ter de ser mudado. Talvez limitar doações de empresas para que não tenham o peso que tiveram nestas eleições.

Qual o papel do ex-presidente Lula no caso da Petrobras?

A Justiça vai definir. O fato, e quem diz não sou eu, mas a Polícia Federal, é que a partir de 2003 constitui-se no seio da Petrobras uma organização criminosa.

A eleição mudou sua relação? Em setembro, ele disse que o sr. era "amigo". Depois o chamou de "filhinho de papai".

Nunca tratei adversários como inimigos. Era até um pouco cobrado por isso. Confesso que me decepcionei apenas com o tom, porque a crítica política deve existir. Não sei se fez bem à alma dele. Acho que ele se apequenou.

O sr. sofreu dupla derrota em seu Estado. O que aconteceu?

A derrota ensina e a responsabilidade é minha. Houve um processo de desconstrução, nossa candidatura não conseguiu ampliar forças e perdemos a eleição. É do jogo. Nunca me achei o dono da vontade dos mineiros. Desejo que o governador eleito [Fernando Pimentel] tenha sucesso, é importante para Minas manter as conquistas.

FHC chegou a dizer que Dilma é uma presidente ilegítima. O sr. concorda?

Não chego neste termo. Acho que é uma presidente apequenada pela forma como venceu as eleições e pela --usando um termo adequado-- dependência de sua base. No momento em que era necessário um presidente que conduzisse o país, nós temos uma presidente conduzida. Ela começará [o segundo mandato] de uma forma pior do que termina o primeiro.

Ricardo Noblat - A diretoria que fura poço...

- O Globo

"Quem olhar (...) a Petrobras nos últimos dez anos e projetar para o futuro conclui que fizemos um grande ciclo ".
Dilma

Nada de mais exato foi dito até aqui para definir a pretensão dos partidos políticos na hora de lotearem o governo em nome da governabilidade. "Aquela diretoria que fura poço" é uma expressão cunhada por Severino Cavalcanti (PP-PE), ex-presidente da Câmara dos Deputados, que renunciou ao mandato para escapar de ser cassado. Havia recebido um "mensalinho" de concessionário de restaurantes da Câmara.

SEVERINO não queria um cargo qualquer para alguém do seu partido — de preferência, um nome escolhido por ele. Queria algo equivalente a uma diretoria da Petrobras responsável por "furar poço". Um emprego desses mexe com muito dinheiro. E, por mexer, permitiria a transferência de uma fatia dele para financiar campanhas eleitorais e enriquecer os mais destacados membros do PP.

POR QUE O espanto? Guarde seu espanto para o que lhe passo a contar. Você já deve ter ouvido falar do ex-deputado Valdemar Costa Neto, ex-presidente do Partido da República (PR). Sim, é aquele mesmo do processo do mensalão, condenado a sete anos e 10 meses de prisão em regime semiaberto por corrupção, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. Ficou preso 11 meses.

CUMPRE o resto da pena em casa, em Brasília. Pode ser encontrado com frequência na sede do PR, uma sala alugada no Bloco D, Torre A do edifício Liberty Mall. O presidente de direito do PR é Alfredo Nascimento, ex-ministro dos Transportes, demitido por Dilma em 2011 sob suspeita de corrupção. O presidente de fato é Valdemar . Nada se faz dentro do PR sem a aprovação dele.

O PR É UM PARTIDO de porte médio. Saiu da eleição deste ano com 34 deputados federais — tinha 32. E com quatro senadores, o mesmo número que tinha. Seu apoio na eleição para presidente da República foi intensamente disputado por Dilma e Aécio Neves. Tudo porque dispunha de um minuto e poucos segundos de propaganda eleitoral. Mercadoria que valia ouro. Dilma venceu a disputa.

PARA TAL, foi obrigada por Valdemar a chafurdar na lama. De dentro da penitenciária da Papuda, onde ainda estava preso, ele cobrou de Dilma a cabeça de César Borges, ministro dos Transportes. César é do PR, mas, uma vez ministro, passou a ignorar Valdemar. Só fazia o que Dilma mandava. Foi submetido à humilhação de ser transferido para uma função menos importante.

AINDA NÃO SATISFEITO, Valdemar cobrou também a cabeça do general Jorge Ernesto Fraxe, diretor-geral do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), subordinado ao ministro dos Transportes. Trata-se de um dos cargos mais cobiçados na República. Lida com muito dinheiro. Até 2016, somente na recuperação de estradas federais, gastará R$ 16 bilhões. Imagine!

VALDEMAR levou a cabeça do general. Pelo acordo firmado com Dilma, uma vez que ela se reelegesse, o PR indicaria o novo ministro dos Transportes e o diretor-geral do Dnit. Valdemar espera que ela cumpra a palavra. Não é tão simples para ele manter unido o PR a serviço do governo. De resto, sai caro. Deputados e senadores pedem ajuda o tempo todo. Alguns, mensalmente.

AH, SE A polícia escutasse os acertos que rolam para a montagem do futuro governo. Reproduzem-se as condições necessárias para que ele funcione como uma incubadora de escândalos. Meritocracia? Salvo raras exceções, esqueça. Prevalecerá o tome lá (cargos e grana fácil), me dê cá (votos no Congresso). Era uma vez o mensalão. O petrolão ainda está no forno. A seguir ... Aguardem. Só um pouco