terça-feira, 8 de novembro de 2022

Merval Pereira - Democracia sob ameaça

O Globo

Uma a minoria da minoria continua insistindo em tentar melar as eleições. Não há razão para contestar as urnas eletrônicas

A democracia brasileira vive seu mais longo período de existência contínua, de apenas 34 anos, está sob ataque, mas resiste. Para tanto, está sendo preciso utilizar a força da lei no seu limite, para que os que querem feri-la de morte não encontrem ambiente propício a seus avanços. Nesse período eleitoral, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que inexiste na maioria dos países e era tido como mais uma das jabuticabas de nossa legislação, mostrou-se essencial para o controle dos antidemocratas que, vencidos nas urnas, tentam ainda tumultuar o país depois do jogo jogado.

Tivemos sorte de que tenha caído nas mãos do ministro Alexandre de Morais o rodízio da presidência do TSE no exato período da eleição presidencial. Moraes forçou os limites da legislação eleitoral, mas sem isso a eleição poderia ter descambado para a desordem por meio do incitamento pelas redes sociais dos radicais, que se transformaram em instrumento político da extrema direita não apenas no Brasil, mas no mundo.

Carlos Andreazza - A transição do orçamento secreto

O Globo

É preciso tratar de PEC da Transição, do risco de normalização do estado de emergência fiscal; como se pudéssemos viver num waiver permanente. Não podemos. Ou: não deveríamos. Não se pode descartar, porém, que governos gostem da ideia. A prática está aí. Temos nos bancado assim. Forjando orçamentos de mentira e depois lhes pendurando gastos de verdade.

Assim será para 2023. Está dado. E sejamos justos. Já estava — como se diz? — precificado que, qualquer que fosse o vencedor, na porteira arrombada por Bolsonaro passariam gastos extras para a manutenção do auxílio a R$ 600. E Lula prometera cuidar do salário mínimo imediatamente. Será ingenuidade esperar que o presidente eleito cometa estelionato eleitoral com o país cindido conforme está.

Míriam Leitão - Problemas reais e volatilidade

O Globo

Novo governo tem questões concretas para resolver bem mais sérias do que a oscilação da bolsa e do dólar

O mercado financeiro gosta de volatilidade. Uma forma de produzir isso é ventilar o nome de um liberal para o comando da economia. Isso eleva as cotações. O nome é depois descartado. As cotações revertem. A preocupação no PT não é com esse tipo de oscilação, mas em procurar um valor para o aumento das despesas, e ao mesmo tempo chegar num acordo interno sobre qual a melhor baliza fiscal para substituir o teto de gastos. O mercado ontem ficou estressado com o nome de Fernando Haddad no Ministério da Fazenda. O novo governo tem uma lista enorme de desafios reais para enfrentar.

Luiz Carlos Azedo - Lula inicia montagem de sua base no Congresso

Correio Braziliense

Lira e Pacheco são importantes para a construção da base parlamentar no novo governo e as medidas dos primeiros 100 dias de governo. O Orçamento de 2023 é uma bomba de efeito retardado

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chega hoje a Brasília com um a agenda carregada, na qual constam reuniões com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e com a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber. Do ponto de vista prático, isso significa que está operando a transição de governo junto aos demais Poderes, o que deve esvaziar ainda mais o poder do presidente Jair Bolsonaro nos dois meses que lhe restam de mandato. Indagado sobre as tensões políticas pós-eleitorais, um ministro do Supremo que dialoga com os dois lados minimizou a importância dos protestos realizados por bolsonaristas no fim de semana: “Lula já assumiu o vértice do sistema de poder”, ou seja, a alta burocracia federal já o pera a transição político-administrativa como deve ser.

Hélio Schwartsman - Reeleição funciona?

Folha de S. Paulo

Nossa experiência com a recondução não é das mais alentadoras

Na linha "coisas que precisamos fazer para fortalecer as instituições após Bolsonaro", um tema que não pode deixar de ser discutido é a reeleição. Confesso que, aqui, tenho mais dúvidas do que certezas.

Idealmente, penso que as limitações a quem pode ou não disputar um cargo devem ser as menores possíveis — isso inclui a Lei da Ficha Limpa. Bons administradores são difíceis de encontrar, de modo que não deveríamos despachá-los depois de apenas um mandato. Desde que existam outras ferramentas para assegurar e promover a alternância no poder, não creio que haja danos democráticos em permitir uma reeleição para postos do Executivo.

Cristina Serra - Bolsonaro: Nunca más!

Folha de S. Paulo

Justiça não é vingança ou revanchismo, é o alicerce que reforça a crença do cidadão na democracia

Foi Arthur Lira, jagunço de Bolsonaro na Câmara, quem deu a senha. Ao reconhecer a eleição de Lula, disse que não aceita "revanchismo ou perseguições, seja de que lado for" e que "agora, é olhar adiante". Traduzindo, vamos passar uma borracha em todos os crimes cometidos por Bolsonaro e a gente (o centrão) não inferniza o governo Lula como Eduardo Cunha fez com Dilma.

Nada mais brasileiro na política, no pior sentido: o acordão, o conchavo, os panos quentes que livram a cara da bandidagem de terno e gravata. Bolsonaro deixará o governo arrastando a mais extensa "capivara" de que se tem notícia no Brasil democrático. De delitos eleitorais a crimes contra a democracia e a saúde pública, como charlatanismo e epidemia com resultado de morte.

Alvaro Costa e Silva - Um meme contra o golpe

Folha de S. Paulo

Até os eleitores antipetistas estão se virando contra o capitão

Nas 45 horas de silêncio à nação depois da derrota nas eleições, Bolsonaro conversou reservadamente com militares, pedindo informações sobre o processo de auditoria nas urnas eletrônicas conduzido pelo Ministério da Defesa. Buscava solidariedade para contestar o resultado, mas não conseguiu.

Optou então pelo discurso covarde. Não reconheceu a vitória de Lula. Ao contrário, incentivou o por ele já esperado surto golpista que havia tomado as ruas. Decidiu passar os últimos dias na Presidência como o chefe da arruaça, valendo-se de extremistas de direita, membros de grupos armamentistas, tolos, lunáticos — e sobretudo de quem os financia. Uma minoria de inconformados "patriotas" e fascistas que, não se iludam, veio para ficar e perturbar o cenário político do país.

Joel Pinheiro da Fonseca - Os limites do Supremo

Folha de S. Paulo

A vitória sobre a desinformação não se dará com a limitação dos discursos

A primeira semana pós-eleição já ilustra o quão anti-democrático é o bolsonarismo. Vimos caminhoneiros bolsonaristas fechando estradas por todo o país, colocando em risco o abastecimento de comida, de insumos médicos e o trabalho de milhões de pessoas; milhares de manifestantes pedindo golpe militar abertamente em diversas cidades, protestando na frente de quartéis; vimos o surgimento de fake news em massa acusando nossas eleições de fraude.

Neste momento, hordas bolsonaristas aguardam ansiosas mais um suposto relatório do Exército que será publicado nos próximos dias e que confirmará a fraude. Recebo também por várias fontes a notícia quentíssima de que Lula teve um AVC e está à hora da morte. Além disso, a nova onda de Covid seria falsa, uma mentira do "establishment" para tirar os manifestantes patriotas da rua.

Eliane Cantanhêde – Desafio gigantesco

O Estado de S. Paulo

Como governar com contas que não fecham? E negociar com o Congresso sem mensalão?

Não foi só Lula que mudou. Mudaram a herança, os tempos, as vacas gordas, a oposição e o próprio mundo, indicando que as condições para o sucesso são menores e os desafios, muito maiores. Mas, se tem alguém que conhece melhor do que ninguém o tamanho do abacaxi que o aguarda no terceiro mandato, esse alguém é Luiz Inácio Lula da Silva.

Essa gente que ataca policiais a pedradas no Pará, expulsa ministro do Supremo de restaurante em Santa Catarina e faz vigília em quartéis é o de menos. São minoria, os black blocs de 2022. O problema é como reativar os instrumentos de Estado e investir nas pessoas, com o teto de gastos e a casa arrombados para a reeleição e contas que não fecham.

Pedro Fernando Nery – A fórmula ideal

O Estado de S. Paulo

O governo tem como transferir renda a quem ganha o salário mínimo sem aumentá-lo

Além do leilão do auxílio emergencial, a campanha presidencial teve o leilão do salário mínimo. Depois de Lula prometer o retorno da política de valorização real, Bolsonaro também propôs reajustes anuais acima da inflação – chegando na véspera do pleito a anunciar um salário mínimo de R$ 1.400 para 2023. Qual a fórmula ideal para o salário mínimo?

A política de valorização, que vigorou até 2019, dava ao salário mínimo não apenas a inflação, mas o crescimento do PIB. Reajustes relevantes deixaram de ser dados já em Dilma 2, porque o PIB não crescia.

Rubens Barbosa* - Lula e a política externa do novo governo

O Estado de S. Paulo

Na formulação de políticas, medidas práticas tenderão a ser matizadas por sugestões dos partidos que apoiaram e viabilizaram a vitória.

No primeiro pronunciamento público depois do anúncio do resultado da eleição, o presidente eleito mencionou as principais prioridades de seu futuro governo na área externa.

Lula ressaltou que o Brasil estará de volta ao cenário internacional com o protagonismo de que gozava no passado, com o objetivo de recuperar a credibilidade, a previsibilidade e a estabilidade para trazer de volta os investimentos externos. Enfatizou que o Brasil vai buscar um comércio internacional mais justo e retomar as parcerias com os EUA e a União Europeia (UE), em novas bases. Nesse contexto, mencionou que não interessam ao Brasil acordos comerciais que condenem nosso país ao eterno papel de exportador de commodities e matéria-prima. Seu governo irá apoiar uma nova governança global e, nas Nações Unidas, a reforma do seu Conselho de Segurança, com o aumento do número de países com assento permanente e o fim do atual direito de veto. Vai combater a fome e a desigualdade no mundo e promover a paz. 

Andrea Jubé - PSB vê reviravolta após revés nas urnas

Valor Econômico

Governo não poderá ser de esquerda, diz presidente do PSB

O PSB, um dos principais partidos da base de sustentação do futuro governo Lula, emergiu das urnas com apenas 14 deputados federais, menos da metade dos 32 titulares eleitos em 2018. Com a evasão dos dissidentes, a bancada chegará ao fim do ano com 24 parlamentares, evidenciando um processo de encolhimento durante o governo Bolsonaro, de franca hegemonia da direita.

O partido de Miguel Arraes e Eduardo Campos também amargou duas derrotas difíceis de digerir: uma delas foi para o PSDB na disputa pelo governo de Pernambuco, Estado que governa há 16 anos. A outra foi a de Márcio França, que liderou até a reta final as pesquisas sobre a eleição para a vaga de senador por São Paulo, mas perdeu a cadeira para Marcos Pontes (PL).

Em contrapartida, os sinais são de que o PSB tem tudo para recuperar musculatura diante do capital político que envergará na gestão do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O PSB tem o vice-presidente eleito e coordenador da transição, Geraldo Alckmin. Além disso, reelegeu três governadores: Renato Casagrande (ES), Carlos Brandão (MA) e João Azevêdo (PB). O senador eleito pelo Maranhão, Flávio Dino, deve migrar para o primeiro escalão, mas a suplente, Ana Paula Lobato, também é do PSB.

Maria Cristina Fernandes - Ansiedade com ministério é uma reprise torta de 2002

Valor Econômico

Pastas políticas e Itamaraty hoje são tão importantes quanto a Fazenda

Dez dias antes do primeiro turno, o presidente de um dos maiores bancos de investimento do mundo fez uma reunião em São Paulo com seus principais executivos para a América Latina e Brasil, além de investidores locais. Disse que estava desencantado com o eixo Rússia/China, além de temer a situação interna de Chile e Argentina. Por isso, era aqui que queria aportar. Um investidor lhe perguntou se a perspectiva era independente da eleição presidencial. “Sim”, respondeu.

A disposição se confirmou no fluxo de estrangeiros para a bolsa, a queda no dólar e no Ibovespa em alta no dia seguinte ao segundo turno. E se manteve com a repercussão internacional da vitória de Luiz Inácio Lula da Silva. Nesta segunda, em questão de minutos, Henrique Meirelles deixou de ser o ministro dos sonhos e Fernando Haddad, o dos pesadelos. Nem por isso, esta reprise da atribulada transição de 2002 sugere que a história se repetirá. Naquele ano, o rebaixamento do peso do Brasil na carteira de títulos da dívida externa de países emergentes do JP Morgan acabou levando Lula a antecipar o ex-presidente mundial do Banco de Boston, recém-eleito deputado federal pelo PSDB, para o Banco Central. Ainda assim, o anúncio só foi feito em dezembro.

Pedro Cafardo - ‘Herança Ipiranga’ vai dar muito trabalho

Valor Econômico

Escolhas de Lula, especialmente na economia, vão determinar se grande união de forças democráticas e pessoas de bem em todo o país vai seguir junta em seu governo

Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito presidente e vai tomar posse para o seu terceiro mandato. Ele só conseguiu superar o bolsonarismo em razão de uma grande união de forças democráticas e pessoas de bem em todo o país, com esmagadora votação no Nordeste.

Agora, a pergunta número um, inevitável, é: essa união vai continuar a partir de 1º de janeiro ou os novos aliados voltarão para seus cantos e retomarão a oposição feroz ao governo de centro-esquerda, como ocorreu nos mandatos anteriores de Lula e Dilma?

A resposta é “depende”. Depende da política a ser adotada, principalmente na economia. Nessa turma que apoiou Lula tem de tudo em matéria de pensamento econômico, variando de heterodoxos/progressistas a radicais ortodoxos/liberais. Essas duas correntes se uniram para derrotar o presidente Jair Bolsonaro, num movimento saudável para a democracia.

Luiz Gonzaga Belluzzo* - O mundo dos Quanta e a economia

Valor Econômico

Somente tornando-se capaz de fazer mais e melhor, uma economia gera mais valor e renda

Em seu livro “Abismo Vertiginoso”, Carlo Rovelli nos atrai de forma brilhante e esclarecedora para o mundo estranho e fascinante da física quântica. A estranheza não se abateu tão somente sobre os ombros dos leigos curiosos - como este que ora tem a ousadia de lhes escrever sobre o tema - mas afetou os cérebros privilegiados que se dedicaram a estudar os fenômenos quânticos com dedicação e expertise.

No livro, Rovelli apresenta um exemplo simples: “Tomemos um objeto, a cadeira que tenho diante de mim. É real e de fato está diante de mim: não há dúvida. Mas o que exatamente significa que aquele conjunto seja um objeto, uma entidade, uma cadeira, real? A noção de cadeira é definida por sua função: um móvel construído para que possamos nos sentar. Pressupõe a humanidade, que se senta. Não diz respeito à cadeira em si: diz respeito à maneira como a concebemos”.

Uma versão sintética de suas concepções pode ser haurida em um artigo publicado recentemente no jornal The Guardian:

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Lula precisa dar prioridade a resgate da Educação

O Globo

Área devastada durante os quatro anos de governo Bolsonaro é a mais crítica para o futuro do Brasil

Desde a posse do presidente Jair Bolsonaro, o Ministério da Educação foi visto como um palco essencial na “guerra cultural” contra a esquerda. Quatro anos e cinco ministros depois — Ricardo Vélez Rodrigues, Abraham Weintraub, Carlos Alberto Decotelli, Milton Ribeiro e Victor Godoy —, o governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva terá de se desdobrar para recuperar o atraso gerado pela inépcia na gestão da pasta mais importante para o futuro do Brasil.

Não faltaram evidências de corrupção. As suspeitas derrubaram o ex-ministro Milton Ribeiro, acusado de pedir, em nome de Bolsonaro, ajuda para pastores lobistas que destinavam recursos do MEC a prefeituras mediante propina. Mas o problema mais grave foi o apagão educacional durante a pandemia. O MEC pouco — se algo — fez para facilitar o acesso dos alunos de baixa renda ao ensino à distância.

Poesia | Mundo Grande (Carlos Drummond de Andrade)

 

Música |Edu Lobo e Mônica Salmaso - Mulher de cada Porto (Edu Lobo/Chico Buarque)