terça-feira, 13 de fevereiro de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Faltam ao MEC plano consistente e habilidade política

O Globo

Camilo Santana assumiu com missão promissora. Até agora, não apresentou agenda capaz de fugir da polarização

O ministro da EducaçãoCamilo Santana, enfrentará dificuldades para aprovar no Congresso o novo Plano Nacional de Educação (PNE), que define estratégias da política educacional pelos próximos dez anos. A responsabilidade não é só dos parlamentares. O governo tem conduzido mal a discussão, abrindo espaço para a oposição assumir a agenda na tentativa de prorrogar o plano atual.

O levante contra a proposta do governo é compreensível. O plano aprovado na Conferência Nacional de Educação (Conae) contém vários equívocos. A começar pelo componente ideológico, numa questão que deveria ser técnica. O documento que serviu de base às discussões da Conae investe contra o ensino doméstico (homeschooling), a militarização de escolas e o movimento Escola sem Partido, marcas da gestão de Jair Bolsonaro. Se a principal crítica — pertinente — ao governo anterior era justamente a politização da educação, qual o sentido de insistir nos mesmos temas, apenas com sinal trocado?

Dora Kramer - Lula subestima Lira

Folha de S. Paulo

Relação de Lira com Lula não está zerada. Trégua vale até que o governo faça sua parte

"Não subestimem esta Mesa Diretora", foi o aviso contundente que o presidente da Câmara deu ao governo na reabertura dos trabalhos da Casa, em 5/2.

O restante do discurso listou fatos já conhecidos sobre as insatisfações do Parlamento: pagamento de emendas, acordos desfeitos, nomeações emperradas e vetos não digeridos.

Rosário desfiado e repetido quatro dias depois em conversa, em tom mais institucional e menos agressivo, entre Luiz Inácio da Silva (PT) e Arthur Lira (PL) no Palácio da Alvorada. Dali o deputado saiu dizendo que a hostilidade havia sido contornada.

Hélio Schwartsman - Virtuosismo militar

Folha de S. Paulo

Não dá para elogiar generais por não terem dado um golpe de Estado

Vocês não vão me cumprimentar? Hoje eu não roubei nenhum banco nem estuprei ninguém. Ridículo, certo? Deixar de cometer crimes não é virtude, mas obrigação. Não me convencem, portanto, as loas à cúpula das Forças Armadas, que teria se recusado a participar do golpe tramado por Bolsonaro e seus asseclas. Pelo contrário, o que vai emergindo das investigações é que mesmo oficiais-generais que não tiveram participação direta na conspiração foram de uma leniência ímpar para com os que tiveram. Não é difícil argumentar que, ao deixar de agir contra os golpistas, cometeram crimes omissivos.

Alvaro Costa e Silva - Tempo da burrice

Folha de S. Paulo

Apesar de alertados, cúmplices de Bolsonaro não mediram os riscos

Um dos conspiradores presentes à reunião de 5 de julho de 2022 no Palácio do Planalto, Anderson Torres foi profético: "Quero que cada um pense no que pode fazer previamente porque todos vamos nos foder", disse o ministro da Justiça de Bolsonaro. Apesar da linguagem tosca, não deixa de ser uma fala com rasgos de inteligência, capacidade que faltou ao "arranjo de dinâmica golpista", nos termos do ministro Alexandre de Moraes, do STF, para autorizar a operação da PF biblicamente batizada de Tempo da Verdade.

Eliane Cantanhêde - Golpe: das palavras aos atos

O Estado de S. Paulo

Com o golpe em curso havia anos, a reunião de julho de 2022 foi só para botar o bloco na rua

A fatídica reunião do presidente Jair Bolsonaro com ministros e assessores, no dia 5 de julho de 2022, para determinar que atuassem para desacreditar as eleições, as instituições e os divergentes – portanto, pelo golpe – foi na sequência de anos de “preparativos”, com manifestações de rua, articulações de bastidores e ameaças golpistas do próprio presidente, contra as urnas eletrônicas, e de seus filhos, contra Supremo, Congresso e mídia, pilares da democracia. A reunião foi para dar um passo decisivo: pôr as ameaças em prática, antes das eleições.

Míriam Leitão - Os elos do golpe e o risco restante

O Globo

O país correu riscos porque foram mantidos em posições estratégicas oficiais que conspiraram contra a democracia

O risco de um golpe militar não acabou no fim do governo Bolsonaro e nem está afastado ainda. É preciso saber melhor as circunstâncias que abortaram a trama e os elementos que permanecem em sedição contra a democracia dentro das Forças Armadas. O coronel Bernardo Romão Correa Neto, que foi preso no domingo ao voltar para o Brasil, é da ativa e foi protegido ao ser enviado para um curso no Colégio Interamericano de Defesa, no qual ficaria até 2025. O general quatro estrelas Estevam Cals Theóphilo Gaspar de Oliveira permaneceu nas Forças Armadas por mais um ano em posição estratégica de comando de tropas.

O coronel Correa Neto está preso entre os seus. Foi detido pela Polícia Federal no aeroporto e entregue à polícia do Exército. Dos três passaportes que possuía, um era diplomático. Ele ganhou um curso de aperfeiçoamento no exterior, pago com os nossos impostos, depois de ter feito o que fez. O coronel, como mostrou a operação Tempos Veritatis, combinou diretamente com Mauro Cid a reunião com os kids pretos, os militares formados nas Forças Especiais. Ele quebrou a hierarquia, passou por cima dos seus comandantes imediatos, falou diretamente com o ajudante de ordens do presidente, intermediou reunião de militares da ativa, selecionando apenas os da linha dura, nos preparativos de um golpe de estado. E, mesmo assim, foi enviado para um curso nos Estados Unidos.

Paulo Feldmann* - Estado a serviço de grupos

O Globo

Todo funcionário público deveria trabalhar para o Estado, nunca para atender um governante específico, menos ainda um partido

Existe no Brasil uma grande confusão entre os conceitos de Estado e governo. Resumidamente, podemos dizer que o Estado abrange toda a sociedade política e é algo duradouro, enquanto o governo é apenas uma das instituições que o compõem — as outras são o Legislativo e o Judiciário. O governo administra apenas o Poder Executivo, e por um curto período de quatro anos, após o qual há eleições. O Estado não pode nem deve servir a nenhum grupo político, porque permeia tudo, sendo soberano, impessoal, estável e permanente. Infelizmente, no Brasil, o Estado tem sido capturado por grupos políticos por meio da figura dos cargos de confiança.

Lucio Rennó* - Crise da democracia no Brasil

Correio Braziliense

Há fortes indícios de que se tramou, de forma organizada e em momentos sequenciais orquestrados, a derrubada do regime democrático no Brasil. Desde 1964, o país não enfrentava a ameaça de um novo golpe vitimando a democracia

Os eventos desvendados na semana passada pelas investigações da Polícia Federal apontam para fatos extremamente graves que ocorreram no Brasil nos dois últimos anos, ao menos, da gestão do presidente Jair Bolsonaro. Há fortes indícios de que se tramou, de forma organizada e em momentos sequenciais orquestrados, a derrubada do regime democrático no Brasil. Desde 1964, o país não enfrentava a ameaça de um novo golpe vitimando a democracia. Após o processo de redemocratização, as elites e a população, embora de forma reticente e inconstante, como mostram dados de opinião pública, abraçaram o regime democrático.

Isso mudou dramaticamente de 2013 em diante, chegando ao seu ápice no governo Bolsonaro. É fato que o país viveu intenso processo de desgaste do regime, com um recrudescimento de enclaves autoritários na sociedade e nas elites políticas. A retórica autoritária voltou a ser bradada. Os violentos protestos de rua em 2013, os primeiros em sua magnitude após décadas, desencadearam um processo acentuado de queda do apoio popular aos políticos no poder e de insatisfação com o funcionamento das instituições democráticas. O humor da população azedou.

André Gustavo Stumpf - A conciliação na política brasileira

Correio Braziliense

A harmonização entre adversários é tradição que vem desde o Império. Quem rompe com este círculo costuma pagar preço elevado

Interessante e inteligente a sequência de visitas que o presidente Lula fez aos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Todos eles são governados por expoentes da oposição ao governo. O presidente da República percebeu que o momento é de conciliar, e trabalhar junto com outros personagens fora de seu circuito partidário, para poder propor projetos e avançar na conquista de territórios políticos. A eleição municipal é a antessala da eleição presidencial. É da tradição brasileira a conciliação que vem desde o Império. Quem rompe com esse círculo costuma pagar preço elevado.

O presidente Lula fez questão de se deixar fotografar abraçado a Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, o mais destacado aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro, talvez candidato à reeleição em São Paulo ou numa jogada mais ousada à Presidência da República. O presidente assinou documento que libera verbas federais para construção do túnel Santos-Guarujá, que também deverá receber dinheiro do estado de São Paulo. E colocou-se publicamente à disposição do governador paulista. Ele prega a conciliação e o respeito democrático que permita a convivência dos antagônicos no mesmo espaço político.

Poesia | Manuel Bandeira - Evocação do Recife

 

Música | Terceiro Dia - Bloco da Saudade