quinta-feira, 11 de julho de 2019

Merval Pereira: Avança a reforma do Estado

- O Globo

Rodrigo Maia foi o grande artífice da união em torno do substitutivo aprovado na Comissão Especial

A relevância da Câmara, como parte de um dos poderes da República, foi o destaque da sessão de ontem, quando a reforma da Previdência foi aprovada em primeiro turno por uma votação surpreendente pelo número de votos bem acima do necessário. Ao final, o presidente Rodrigo Maia já puxou para a Câmara duas novas reformas: a tributária e a reorganização do serviço público, mantendo o protagonismo na reforma do Estado brasileiro.

Há muito tempo não se viam deputados federais tendo o entendimento de que participavam de um momento histórico, sem receio de assumir suas posições.

O presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, foi feliz ao definir as relações equilibradas entre o Legislativo e o Executivo como necessárias para uma democracia forte, chamando a atenção de que investidores, além das questões fiscais controladas, que indicam futuro mais seguro para seus investimentos, também olham para a qualidade da democracia praticada no país.

Raramente se viu no plenário da Câmara uma concordância tamanha. Todos eram favoráveis a uma reforma da Previdência. Um avanço diante da posição de anos atrás, quando muitos insistiam em que não havia déficit no sistema.

O que a oposição alegou é que esta reforma não era a correta para o país. Houve também outra aproximação de posições, no sentido de admitir, com maior ou menor ênfase, que a reforma impõe um sacrifício à população.

O dissenso ficou por contada visão política de cada um, a oposição batendo na tecla de que os menos favorecidos serão atingidos. Os favoráveis à reforma, e não apenas os deputados governistas, defendendo atese de que ela ataca os privilégios do atual sistema previdenciário.

Outra unanimidade ontem na Câmara foi abandeira nacional. Trazida ao plenário pelos favoráveis à reforma, foi também abraçada pela oposição, cada grupo ideológico transformando-a em um símbolo de sua luta.

Nossa bandeira jamais será vermelha, gritaram líderes departidos do centro-direita e liberais. Abandeira nacional não pode ser usada contra os mais pobres, devolveram os líderes da oposição.

Míriam Leitão: A Política levou a reforma à vitória

- O Globo

Reforma da Previdência foi aprovada com amplo apoio. Economia estimada pela Instituição Fiscal Independente será de R$ 714 bilhões

A reforma aprovada é ampla e terá impacto importante nas contas públicas, mas será menor do que o governo previa. Segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI), ficou em R$ 714 bilhões a economia em 10 anos, sem contar outras possíveis mudanças. Ela cria uma espécie de lei de responsabilidade previdenciária para todos os entes da Federação. Portanto, os estados e municípios estão fora do projeto, na definição dos benefícios, mas eles terão que se esforçar para controlar suas despesas na área. A reforma introduz a idade mínima que o Brasil tenta ter há mais de 20 anos. O texto foi aperfeiçoado em alguns pontos ao tramitar no Congresso, mas manteve desigualdades. Na defesa de determinados privilégios, juntaram-se a esquerda e o bolsonarismo, uma realidade que só não é bizarra porque o Brasil sempre foi assim.

O centrão votou em peso na reforma, mas um placar de 379 a 131 mostra um movimento amplo de apoio. No eloquente discurso do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, houve várias indiretas ao próprio governo: “as soluções passam pela política. Não haverá investimento no país se não houver democracia. Eu não saí do meu objetivo nem quando fui atacado.” Todo mundo entendeu a quem ele se referia, e ao episódio em si. Mas o Planalto o elogiou. Era a hora da comemoração. Ontem foi o dia da festa para Rodrigo Maia, que nasceu no Chile, no exílio, filho de político, que tem entre seus nomes, além dos conhecidos, Felinto, Ibarra e Epitácio.

Um dos grandes saltos do projeto está no artigo 40, que deixa claro que estados e municípios terão que buscar equilíbrio financeiro e atuarial. O parágrafo 22º cria uma série de obrigações. Os estados e municípios não podem criar novos regimes próprios e para os que existem haverá lei federal estabelecendo as normas de funcionamento e responsabilidade em sua gestão. Diz ainda como eles vão migrar para o Regime Geral e serão fiscalizados pela União e o controle externo.

Ascânio Seleme: A dimensão do presidente

- O Globo

Todos os movimentos do presidente na reforma foram para oferecer privilégios

Não seria difícil para Jair Bolsonaro ampliar ou manter estável ao invés de ver diminuir o respaldo que recebe do cidadão brasileiro. Depois de seis meses de governo, o apoio incondicional ao presidente limita-se a 33%, um ponto percentual a menos do que tinha no mesmo período o ex-presidente Collor, o mais odiado do Brasil (Temer não aparece na pesquisa DataFolha). Bolsonaro foi eleito no auge de um ciclo de desgaste da esquerda brasileira. Capitalizar essa desilusão política deixada pelo PT de Dilma e Lula seria possível se ele conseguisse sedimentar uma posição de centro direita ou de direita, sem radicalismo.

O que se viu foi o contrário. Penso que erram os que dizem que Bolsonaro está fazendo o que o seu eleitor esperava dele. Ele fez uma campanha com um discurso radical, é verdade, mas foi eleito por um eleitorado bem mais equilibrado. Os radicais estão com ele, mas para ter 55,13% das urnas, o presidente recebeu votos que pertenciam ao PSDB, ao MDB, ao DEM e a outros partidos que gravitam no centro e em seus arredores. Todo o centro estava ávido para apoiar Bolsonaro e com ele governar.

E os eleitores de centro e centro direita também queriam acreditar que o capitão se estabilizaria depois de eleito. Qualquer um com mais de uma dúzia de neurônios poderia apontar este como o melhor caminho. Ninguém, além da turma raiz de Bolsonaro, esperava que o discurso radical virasse forma de governo. Não se pode, contudo, acusar o presidente de estelionato eleitoral. Ele disse que era isso mesmo o que faria, embora a maioria não acreditasse porque a alternativa era muito mais óbvia e inteligente.

Há quem afirme que Bolsonaro radicaliza para reduzir sua constante perda de popularidade e guardar pelo menos o apoio de parcela da população que se identifica com esse radicalismo. Desconfio ser o contrário. O presidente nunca tirou o pé do pedal que impulsiona e alimenta seu discurso radical. É com o pé embaixo, e por causa dele, que Bolsonaro perde seguidamente apoio e vai se isolando. E o pior para qualquer um nessa posição é que o círculo mais próximo, formado por parentes, amigos e o cordão dos puxa-sacos não o deixa ver o cerco se fechando.

Bernardo Mello Franco: Uma toga para a bancada da Bíblia

- O Globo

Bolsonaro quer atropelar a laicidade do Estado para dar mais poder aos pastores. Deus acima de todos e as igrejas acima da Constituição

Jair Bolsonaro não perde uma chance de cortejar a bancada da Bíblia. Ontem o presidente começou o dia num culto evangélico no Congresso. Em seguida, festejou o 42º aniversário da Igreja Universal, do bispo e empresário Edir Macedo.

No primeiro compromisso, o capitão ensaiou um discurso de pastor. “A paz de Cristo”, iniciou. “Amém!”, respondeu a plateia. “Vocês são mais que amigos, são irmãos”, continuou o orador.

O presidente voltou a descrever sua vitória como uma missão divina. Em seguida, repetiu a cantilena do país abençoado com terras férteis e “povo maravilhoso”. “O que que nos falta?”, perguntou. “Falta a fé. A vontade de vencer”, ele mesmo respondeu.

A pregação animou os deputados, mas eles queriam ouvir mais. “Poderei indicar dois ministros para o Supremo Tribunal Federal. Um deles será terrivelmente evangélico”, prometeu Bolsonaro. O auditório explodiu em aplausos e gritos de “Glória!”, como nos cultos transmitidos pela TV.

Em governos passados, a bancada evangélica trocava votos por verbas, ministérios e isenções fiscais. Na gestão atual, a turma passou a sonhar mais alto. Quer ascender ao olimpo do Judiciário.

Carlos Alberto Sardenberg: Claro que a Lava-Jato exagera

- O Globo

Os ‘recursos não contabilizados’ viraram lavagem de dinheiro. Caixa 2 passou de infração eleitoral para crime grave

A palavra “mensalão” apareceu na imprensa em setembro de 2004, utilizada pelo então deputado Miro Teixeira, para explicar aquilo mesmo que seria provado mais adiante: que o PT montara um sistema para remunerar aliados.

Miro repercutia, para o “Jornal do Brasil”, uma reportagem de capa da revista “Veja”, na qual se dizia que o PT comprara o apoio do PTB por R$ 150 milhões. O assunto, aliás, circulava no Congresso.

Pois parece que os próprios deputados sérios não colocaram muita fé no caso. Meio que deixaram para lá. Políticos e jornalistas tiveram comportamento semelhante. Eis o que se dizia: isso não vai dar em nada, corrupção sempre ocorreu, é coisa pequena, um problema moral, não político, muito menos econômico.

Talvez tivesse ficado mesmo por aí se um empresário de bronca com sua situação não tivesse filmado um diretor dos Correios embolsando a mixaria de três mil reais, mas contando que o esquema funcionava sob o comando de Roberto Jefferson, então deputado federal e presidente do PTB.

A revista “Veja” publicou a história em maio de 2005. Seguiram-se alguns meses de embates políticos, com a oposição tentando instalar uma CPI, e o governo Lula tentando abafar o escândalo. Lá pelas tantas, Roberto Jefferson, como ele mesmo disse, desconfiou que o PT estava armando contra ele.

Paulo Celso Pereira: No vácuo de poder, entra em cena a Agenda Maia

-O Globo

Foi lastreado na velha máxima de que não há espaço vazio na política que Jair Bolsonaro tomou do PSDB o papel de principal opositor do PT quando os tucanos se enredaram na Lava-Jato. Só que, ao fim da campanha vitoriosa, o presidente abriu mão da tarefa de liderar, junto com os demais representantes eleitos, as mudanças necessárias no país. Ontem, ao aprovar em primeiro turno a reforma da Previdência, o Congresso sacramentou sua tomada deste vácuo de poder.

Ao deixar sua cadeira na Mesa Diretora e subir na tribuna para discursar, aclamado por seus pares, o presidente da Casa, Rodrigo Maia, formalizou esse grito de independência. Há meses o deputado já anunciava em entrevistas e articulava nos bastidores a construção de uma agenda própria do Parlamento diante da falta de disposição do governo em governar por meio de uma coalizão democrática. Ontem, foi formalmente apresentada o que já pode ser chamada de “Agenda Maia”.

William Waack: A marcha da complacência

- O Estado de S. Paulo

Bolsonaro está diante da oportunidade de tirar o País da estagnação

A tramitação da reforma da Previdência foi um exemplo de marcha da complacência. A provável aprovação se dá no limite do insustentável, quando as contas públicas já estão há tempos no alarme vermelho, o Estado perdeu qualquer capacidade de investimento e nem mais sustenta o próprio custeio.

Complacência é uma característica da sociedade brasileira. Foi assim com a inflação, tolerada até o limite do insustentável – a hiperinflação. Depois de duas décadas a resposta veio com o Plano Real, resultante do consenso de que a inflação corrói mais do que a moeda, corrói o tecido social.

Outro exemplo notável de complacência tem a ver com a corrupção. Ela nunca foi novidade. Mas o já conhecido pântano de roubalheira precisou de mais de uma década de aprofundamento e abrangência durante sobretudo (mas não só) governos do PT até provocar a onda de indignação e revolta populares conhecida como Lava Jato.

Vem daí a capacidade dos principais expoentes da Lava Jato de sobreviver com até certa facilidade às denúncias (não são a menor novidade para advogados de defesa) de que violaram as normas do direito ao combater os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Para ser bem entendida nas suas origens, alcance e significados presentes, a Lava Jato precisa ser vista como um símbolo político de enorme relevância. É o símbolo de um enorme “basta” – do fim da complacência com a corrupção (se ela realmente acabou é outro capítulo).

Zeina Latif*: O país do debate difícil

- O Estado de S.Paulo

O avanço da agenda de reformas estruturais esbarra nos velhos hábitos

O debate econômico no Brasil evolui muito lentamente, e muitas vezes sofre retrocessos. No governo Dilma, por exemplo, velhas experiências fracassadas de intervencionismo estatal foram retomadas. A ideologia e o consequente distanciamento da boa prática na gestão de políticas públicas contaram com o apoio de parcela do setor privado que se beneficiou dos estímulos e proteções do governo. Deu errado. Assim como o governo militar deixou como legado a “década perdida” de 1980, Dilma produziu mais uma nos anos 2010.

Um sinal da baixa maturidade do debate público no País é que foi necessária uma grave crise econômica, sucedida de mais um impeachment, para retomarmos uma agenda econômica mais racional e cuidadosa.

Na raiz deste pouco amadurecimento há o estado patrimonialista, que oferece sua mão mais generosa para grupos organizados que têm maior participação nas políticas públicas e no orçamento, tanto nos gastos, como nos benefícios tributários. A mão perversa (a fatura) fica para o restante da sociedade.

*José Serra: As bodas do Real

- O Estado de S.Paulo

O plano fez a sua parte, há 25 anos; agora é necessário que façamos a nossa, a do Brasil real

Na semana passada completamos o jubileu de prata da estabilidade de preços do Plano Real, deflagrada em 1.º de julho de 1994. O lançamento do programa se deu após nove tentativas de derrubarmos a superinflação e estabilizar a economia brasileira: 1979, 1981, 1983, 1985, 1986, 1987, 1989, 1990 e 1991. Todas elas frustradas por restrições externas, falhas de concepção, deficiências na implementação e resistências políticas. Naufragaram planos ortodoxos, como o de 1983; heterodoxos, como o Plano Cruzado; orto-heterodoxos, como é o caso dos Planos Collor. Hoje, duas décadas e meia pós-Real, mantém-se uma estabilidade razoável, embora persista outro desafio: a economia voltar a crescer de forma sustentada.

O conjunto de experiências no combate à superinflação teve um efeito contraditório. De um lado, trouxe lições sobre o que fazer (e não fazer) para que a próxima tentativa de estabilização da economia fosse bem-sucedida. Por outro, como ouvi na época do embaixador Rubens Ricupero, tais experiências acabaram criando no Brasil uma espécie de “síndrome de Elizabeth Taylor”, aquela atriz bonita que teve muitos casamentos, um atrás do outro. A cada anúncio matrimonial se criava a expectativa de que a nova tentativa dessa vez daria certo, apesar do ceticismo reinante. Algo parecido ocorria em relação aos planos de estabilização: depois de várias tentativas frustradas, era difícil evitar o pessimismo sobre as chances de sucesso de uma nova tentativa. Mas nem por isso morriam as esperanças de fazer algo que desse certo.

*Michel Temer: O semipresidencialismo

- O Estado de S.Paulo

Esse sistema seria um obstáculo às crises institucionais causadas pelo presidencialismo

Os fatos determinam o nascimento da lei. Muitas vezes demora. Os fatos repetem-se, exigindo nova realidade normativa. É da repetição, da reiteração, que o Legislativo se sensibiliza e muda o panorama normativo. Nas democracias é assim. A lei surge das realidades sociais retratadas pelos anseios populares.

Recordo o professor Miguel Reale, que lançou a didática e consistente teoria tridimensional do Direito: fato, valor e norma. Ou seja, em ocorrendo o fato, é ele valorado e, se valioso socialmente, nasce a norma. Nas democracias é assim para diferenciar os sistemas autoritários, em que a norma nasce muitas vezes da mente, da “cabeça” dos que comandam centralizadoramente. Para ficar na primeira hipótese, foi assim quando se convocou a Constituinte de 87/88. Quantas vezes delitos, ou seja, fatos cometidos com inaudita violência passam a ser catalogados como crimes hediondos. Foi assim quando os consumidores pleitearem proteção mais acentuada: fez-se o Código de Defesa do Consumidor. E outras centenas de exemplos.

Faço essas preliminares para tratar da modificação do sistema de governo. Não para já, porque o presidente, o vice-presidente e os eleitos do Legislativo o foram debaixo da ordem constitucional vigente. Portanto, deve-se pensar em 2022. E por que a proposta de modificação?

Porque os fatos estão se impondo naturalmente. Creio até que contribuí com eles. No meu governo trouxe o Congresso para governar com o Executivo. Alardeei que exercia um semipresidencialismo.

Foi essa fórmula, aliás, que me permitiu exercitar o governo com grandes e ousadas inovações, como a reforma trabalhista, a do teto dos gastos públicos, a reforma do ensino médio, a recuperação das estatais, a queda da inflação e dos juros a patamares civilizados. Ainda: com boa inserção internacional sustentando a tese do multilateralismo, que tem como exemplo positivo o recente acordo da União Europeia com o Mercosul. Revelando a integração Legislativo-Executivo, não foi pequena a participação dos presidentes Rodrigo Maia e Eunício Oliveira nos temas que acabei de apontar. Rodrigo trabalhou arduamente para buscar a aprovação, ainda em 2017, da reforma da Previdência. Que só não se deu, quando tínhamos os votos necessários, em razão de conluio entre um agente privado e um agente público. 

Fernando Schüler: Milagre brasileiro

- Folha de S. Paulo

A reforma é quase um milagre porque nosso sistema político é disfuncional

A reforma da Previdência é quase um milagre. O Brasil, aliás, é uma espécie de milagre. Nos últimos anos, aprovamos reformas improváveis, como a PEC do Teto, a reforma trabalhista, a lei das terceirizações, e agora estamos perto de emplacar a reforma previdenciária.

A reforma é quase um milagre porque nosso sistema político é disfuncional. Nesta quarta-feira, 26 partidos votaram na reforma. Catorze deles com dez votos ou mais. Isto é, partidos relevantes, de tamanho médio, incapazes de resolver qualquer coisa, no Congresso, mas capazes de obstaculizar, complicar o jogo, cobrar fatura.

É isso que faz do Brasil a democracia mais fragmentada do planeta, com baixa efetividade institucional e alto custo político na tomada de decisões estratégicas. Mesmo dizendo que não iria fazer esse jogo, o governo liberou alguns bilhões em emendas e recursos para viabilizar a reforma. Alguns acham normal. Ouvi de um deputado que esta era uma forma de “democratizar” o Orçamento. Analistas dizem que o varejo político é um fato normal das democracias, que nosso presidencialismo de coalizão exige isso. De minha parte, só observo. Vejo isso mais como deformação do que uma virtude. Apenas uma deformação com a qual nos acostumamos.

A reforma também é um milagre pelo imenso peso das corporações no jogo político. Vamos lá: por que cargas d'agua o vigia do supermercado, que vira e mexe enfrenta a bandidagem na periferia de nossas cidades, vai se aposentar com 65 anos, e o segurança do Congresso com 53? Não discuto aqui o mérito do trabalho de ninguém, mas por quê? Acertou na mosca o Carlos Góes, quando provocou: para todas as categorias que pedem aposentadoria mais cedo por causa de “circunstâncias especiais”, tenho uma pergunta: sua categoria tem uma condição mais difícil que a de um pedreiro?

Igor Gielow: Aprovação da reforma sacramenta momento de derrota da esquerda

Após impeachment e eleições, PT e aliados tinham na Previdência uma trincheira

Se vários atores da centro-direita poderão reivindicar os louros pela aprovação de forma esmagadora em primeiro turno da reforma da Previdência, Jair Bolsonaro (PSL) e Rodrigo Maia (DEM) à frente, caberá à esquerda o papel de principal derrotada no conflituoso processo.

É claro que o texto ainda pode ser bastante mexido, com propostas inclusive do conflituoso partido do presidente, e o parlamentarismo branco que se insinua mais forte é um problema sério para Bolsonaro. Mas, ao fim do dia, ele estava no campo dos vitoriosos.

A aprovação é uma espécie de terceiro turno perdido para o campo liderado pelo PT. Como nas ocasiões anteriores, o fracasso poderia ensejar reflexões e modulações de discurso; até aqui, o que houve foi a repetição de padrões que não mais funcionam.

Recapitulando, o ocaso da esquerda brasileira teve pelo menos dois episódios centrais anteriores. O impeachment de Dilma Rousseff (PT) em 2016, após a debacle econômica promovida pela presidente e a saraivada da Lava Jato sobre o que sobrou do edifício ético petista, foi essencialmente desestabilizador.

Na sequência, o impacto eleitoral: em 2016, com a perda de bastiões importantes como a cidade de São Paulo no pleito municipal, e em 2018, com a ascensão de Bolsonaro (PSL) à Presidência. Tudo temperado pela prisão de Luiz Inácio Lula da Silva, líder petista que arrastou toda a estratégia da esquerda para dentro de sua cela a partir do ano passado.

Leandro Colon: Votação da reforma é vitória para o governo, e não do governo

- Folha de S. Paulo

Aprovação da Previdência prova força do presidente da Casa, Rodrigo Maia

A aprovação do texto-base da reforma da Previdência em primeiro turno na Câmara é sem dúvida uma vitória para o governo de Jair Bolsonaro, mas não propriamente do governo dele.

A votação prova a força do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e confirma que o toma lá dá cá com emendas parlamentares está mais vivo do que nunca. A velha política entrou em campo no governo Bolsonaro na hora da decisão.

Maia e seus aliados do centrão mostraram ao Palácio do Planalto que a reforma saiu do papel na hora em que eles bem entenderam.

Em seis meses, Bolsonaro fracassou na formação de uma base coesa de apoio e na articulação política do Planalto com os congressistas.

Fragilizado e sem alternativa, terceirizou a Maia a responsabilidade de construir um placar favorável. E assim provavelmente também será na reforma tributária, passo seguinte da agenda econômica legislativa.

É legítimo que Bolsonaro queira faturar politicamente o resultado desta quarta-feira (10) e tentar mostrar uma força política que não tem.

Mas o presidente sabe que não teria sucesso sem a boa vontade de Maia. Do Palácio do Planalto, ele teve de assistir ao discurso do líder do PSL (seu partido), delegado Waldir (GO), no plenário da Câmara, em que seu nome foi ignorado e o de Maia, exaltado. “Sem Rodrigo Maia, nós não chegaríamos a este momento”, disse o deputado. Maia chorou.

A aprovação do primeiro turno confirma que o fisiologismo está impregnado na cultura legislativa. Bolsonaro pode esbravejar à vontade, dizer para seus seguidores que não cedeu. Fato é que a reforma não avançaria sem a abertura do balcão de emendas liberadas por seu governo.

O Planalto teve, sim, de liberar dinheiro público aos deputados em troca de votos (e a fatura deve aumentar nas próximas fases da tramitação).

Não foi a passeio que os ministros da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e da Secretaria de Governo, o general Luiz Eduardo Ramos, bateram perna no Congresso horas antes da votação.

Eles tiraram da gaveta as planilhas de emendas parlamentares e prometeram recursos aos deputados.

Nada mais antigo no modelo político.

Vinicius Torres Freire: Reforma da Previdência foi 7 a 1 na esquerda

- Folha de S. Paulo

Partidos de esquerda sofrem derrota imensa, que não foi vitória do governo

Não foi uma vitória política do governo, que pode vir a se beneficiar dessa e doutras mudanças que devem ocorrer na economia, caso Jair Bolsonaro não desarranje o país com seus desvarios.

Foi uma imensa derrota da oposição de esquerda, isolada não apenas no plenário da Câmara, de resto quase inteiramente favorável à reforma da Previdência, uma avalanche de 379 votos a 131; 510 dos 513 deputados votaram.

A oposição não teve voz na rua ou na política partidária. Não teve voz na reforma, pois se retirou para trincheiras perdidas nas montanhas do atraso. Não se prepara para outras avalanches de mudanças que devem revirar a ordem socioeconômica do país. Não faz mais do que esperar talvez uma revolta espontânea da população, pois, até ou quando funcionar o programa de reformas liberais, o país atravessará ainda um deserto de crescimento e precariedade.

Foi uma imensa vitória de Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara e líder do coletivo do miolão do Câmara que aprovou a reforma. Esse líder da direita moderada, de um partido quase extinto no final dos anos petistas, acabou por ocupar quase todo o espaço político-parlamentar que não foi calcinado pela extrema direita.

Maia e o coletivo de líderes do miolão do Congresso acabaram por criar um arranjo talvez provisório, este semestre de “parlamentarismo branco” que aprovou a reforma previdenciária e conteve avanços piores do bolsonarismo. Em discurso no encerramento da votação da reforma, reafirmou seu programa, por assim dizer.

*Marcus Orione: Fim da solidariedade e do espírito social na Previdência brasileira

- Folha de S. Paulo

Atual Previdência atende com uma proteção social mínima em especial nas regiões mais pobres

É o fim da Previdência Social no Brasil. O projeto de reforma da Previdência do governo Jair Bolsonaro já significava o término de um sistema que protege milhões de pessoas —e mesmo com as alterações no Congresso isto não deixará de ocorrer.

Ainda que com suas insuficiências, a atual Previdência atende com uma proteção social mínima —em especial nas regiões mais pobres— idosos, doentes, desempregados.

Enfim, pessoas que contribuem e, diante de contingências como idade avançada e doença, por exemplo, são afastadas do mercado, necessitando da proteção previdenciária.

O projeto tinha três bases: capitalização; retirada das futuras reformas, em questões fundamentais, da Constituição; e severa diminuição de direitos.

As duas primeiras foram afastadas pelo Congresso, e a última permaneceu, ainda que com pequenas variações.

A nossa Previdência pública é montada na solidariedade social. Quem está recebendo benefícios hoje depende da contribuição dos que estão trabalhando —que receberão a partir dos recolhimentos futuros.

Roberto Dias: Outra eleição se inicia para país nenhum

- Folha de S. Paulo

Campanha de 2022 já começou, mas veremos se sobrará nação para o vencedor

Foi bem na metade do ano inicial de seu primeiro mandato que Dilma Rousseff estreou publicamente no terreno da reeleição.

Ela estava em Rondônia quando um repórter quis saber se um dia sairia a ferrovia entre Porto Velho e Vilhena. Dilma desconversava, ele insistiu: "Segundo mandato?"

A presidente respondeu que seu governo já estava fazendo um trecho anterior, entre Uruaçu (GO) e Lucas do Rio Verde (MT), e pendurou a esperança da outra obra na reeleição: "Se tiver segundo mandato..."

Jair Bolsonaro fez o mesmo em momento idêntico, na metade do primeiro ano de seu mandato inicial, com uma diferença: nem precisou ser instado. Aliás, falou e repetiu. "Pegamos um país quebrado... conseguiremos entregá-lo muito melhor para quem nos suceder em 2026", afirmou no sábado.

Luiz Carlos Azedo: A mágica da política

- Nas entrelinhas / Correio Braziliense

“Ontem, vivemos uma inflexão no processo de confrontação que havia se instalado entre o Executivo e o Legislativo, um momento de afirmação da nossa democracia e do Congresso”

Por que a política exerce tanto fascínio, ainda que uma parte considerável da sociedade tenha repulsa aos políticos e nem sequer saiba que essa é uma atitude política, muito mais afirmativa do que a simples indiferença? Talvez a explicação seja seu poder de transformar a vida em sociedade, de viabilizar ambições e projetos coletivos. Essa é a grande mágica da política, embora sua definição básica, do ponto de vista clássico, seja a da ciência prática que tem por objetivo a felicidade humana.

Dizia Aristóteles: “Vemos que toda cidade é uma espécie de comunidade, e toda comunidade se forma com vistas a algum bem, pois todas as ações de todos os homens são praticadas com vistas ao que lhes parece um bem; se todas as comunidades visam algum bem, é evidente que a mais importante de todas elas e que inclui todas as outras, tem, mais que todas, este objetivo e visa ao mais importante de todos os bens; ela se chama cidade e é a comunidade política”. Ou seja, é a arte das artes e a ciência das ciências.

Há, portanto, dois campos num mesmo universo: o da ética, associada à felicidade individual do homem; e a política propriamente dita, que se preocupa com a felicidade coletiva. O problema é que nem sempre as duas andam juntas, e esse divórcio costuma ser muito perigoso. O próprio filósofo grego, discípulo de Platão, provou desse veneno quando caiu em desgraça e foi parar no exílio. Isso não impediu, entretanto, que, milênios depois, seu pensamento metafísico fosse um dos pilares do processo civilizatório ocidental.

Embora defendesse a existência de um Deus único acima de tudo, base da teologia católica, Aristóteles considerava a existência de um mundo único, um só objeto. E que, para ser feliz, é preciso fazer o bem a outrem. Por isso, o homem é um ser social e, portanto, um ser político. Por consequência, cabe ao Estado “garantir o bem-estar e a felicidade dos seus governados”. Testemunha da crise da democracia escravagista, escreveu a Política, seu grande tratado sobre o tema, no qual discorreu sobre a democracia, a aristocracia e a monarquia.

No fundo, essa é uma visão otimista, que se faz necessária no momento em que estamos vivendo, de certa forma sombrio e até atemorizante, por essa razão, impregnado de pessimismo. Sob certos aspectos da atual crise da democracia representativa e de uma onda regressista em relação aos costumes, a política é a nossa grande esperança. A aprovação da reforma da Previdência pela Câmara, ontem, por 379 votos, contra 131, portanto, um escore bem maior do que os 340 previstos pelos governistas, ainda que existam muitos destaques a serem apreciados, é demonstração de que a política ainda é o caminho para resolver os problemas da nossa sociedade.

Há muitas críticas à reforma, e uma justa oposição dos setores que por ela se consideram mais prejudicados, porém, a votação de ontem foi um daqueles momentos mágicos da política, no qual o Congresso brasileiro encontra saída para os desafios da nação. Ao contrário do que alguns defendem, sem a política não há soluções pactuadas na sociedade, ainda que reflitam o melhor do Iluminismo. O que há é imposição.

Ontem, vivemos uma inflexão no processo de confrontação que havia se instalado entre o Executivo e o Legislativo, um momento de afirmação da nossa democracia e do Congresso. É óbvio que se avultam os líderes que protagonizaram esse processo, em particular, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-DF), o grande artífice da aprovação da reforma. Seu papel como articulador da maioria é conhecido, mas há que se destacar o papel de negociador com o Executivo e interlocutor com a oposição, pois sua atuação tem se pautado pelo diálogo, a moderação e a prudência, além do respeito às ideias divergentes e às minorias.

Cristian Klein: Vitória 'terrível' para Bolsonaro

- Valor Econômico

Perfil de vaga do STF recai sobre o evangélico Bretas

No dia em que a Câmara dos Deputados começava a aprovar a reforma mais requisitada pelo mercado, o presidente Jair Bolsonaro iniciou a manhã parafraseando a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, a quem já dedicou palavras pouco elogiosas. Em março, Bolsonaro disse que ouve "qualquer ministro, até a Damares". Comparada a um patinho feio da Esplanada, a pastora - que no discurso de posse afirmou que "o Estado é laico, mas esta ministra é terrivelmente cristã" - parece ter ganhado e inspirado o coração e a mente do presidente. Em culto realizado na Câmara pela Frente Parlamentar Evangélica, Bolsonaro confirmou ontem o plano: "Poderei indicar dois ministros para o Supremo Tribunal Federal. Um deles será terrivelmente evangélico".

Ao arremedar o advérbio tão caro a Damares, o presidente batiza as escolhas de seu governo. Arrisca ser comparado a Ivan, o Terrível (1530-1584), o primeiro czar russo. Autoritário, muito religioso, com mania de perseguição, Ivan teria matado o filho e o neto, depois de espancar e levar a nora ao aborto, porque julgou suas roupas indecentes. Historiadores atribuem a fama de Ivan tanto à crueldade - comum à época - quanto a graves transtornos mentais. Bolsonaro não é o czar. Até porque o codinome "Russo" já foi reservado, pelos procuradores da Lava-Jato, ao ministro da Justiça Sergio Moro, segundo mensagens vazadas pelo site "The Intercept".

Com a declaração sobre o Supremo, Bolsonaro, quem sabe, até crie esperanças na ministra, que além de pastora é, furtivamente, advogada. Mas é o juiz federal da Lava-Jato no Rio, Marcelo Bretas, quem já se animou. Começa a recair sobre ele a expectativa da indicação. Frequentador da igreja Comunidade Evangélica Internacional da Zona Sul, Bretas foi criado numa família evangélica e tem um irmão pastor. Bastante ativo nas redes sociais, 20 das 70 mensagens (28,5%), desde novembro, que constam em seu perfil do Twitter tem conotação religiosa.

Ribamar Oliveira: Regras fiscais terão novo desenho

- Valor Econômico

Ideia é compatibilizar o teto de gastos com a "regra de ouro"

Um novo desenho institucional para as regras fiscais brasileiras começou a ser discutido pela Câmara dos Deputados com representantes do governo, mesmo antes da aprovação da reforma da Previdência Social. O objetivo é construir uma proposta que compatibilize a chamada "regra de ouro" das finanças públicas com o teto de gastos, de forma a torná-los eficazes.

Para isso, a ideia é aproveitar a PEC 438/2018, de autoria do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), que está em análise na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara e que será apreciada por uma comissão especial a partir de agosto. A estratégia conta com o apoio do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que tomou a iniciativa de colocar a PEC 438, apresentada no ano passado, novamente em tramitação própria.

O deputado Felipe Rigoni (PSB-ES) será o relator da PEC na comissão especial. Ele criou uma equipe de consultores para ajudá-lo na tarefa. Uma primeira reunião dos consultores com representantes do Ministério da Economia já foi realizada na semana passada e outras virão. "Vamos construir a PEC de forma integrada [com o governo]", disse Rigoni ao Valor.

"Acho que teremos um bom e construtivo debate sobre a 'regra de ouro' e regras fiscais no geral", disse uma autoridade do governo. Depois de aprovada pela Câmara, a PEC terá que ser analisada também pelo Senado. Mesmo assim a expectativa de Rigoni e da própria equipe econômica é que as novas regras entrem em vigor já em 2020.

Ricardo Noblat; Passa a reforma, ficam os privilégios

- Blog do Noblat / Veja

A avalanche que ninguém esperava
Foi discurso de candidato – a presidente da República, a vice, ou na pior das hipóteses, a governador do Rio de Janeiro, o seu Estado. Ao celebrar a aprovação do texto-base da reforma da Previdência, Rodrigo Maia, presidente da Câmara, fez questão de dirigir-se ao país, não somente a seus colegas. E chorou – antes e depois de falar.

Maia é um chorão. De uma família de chorões. Para superar a tensão, chora e às vezes sai chutando seus adversários. Diz-se acostumado a viver sob intensa pressão desde quando dividia o útero da mãe com sua irmã gêmea. Sabe guardar ressentimentos. Mas é pragmático o bastante para esquecê-los se for o caso.

Por ora, não foi o caso de desprezar os ataques que sofreu do presidente Jair Bolsonaro, e dos devotos dele em recentes manifestações de rua encomendadas. Maia virou boneco inflável gigante alvo de insultos. Sua vingança foi não mencionar o nome de Bolsonaro no discurso aplaudido de pé por seus pares.

Um discurso redondo, de improviso, mas pensado de véspera, embora sob a emoção de um resultado surpreendente até para ele. Na semana passada, quando admitiu haver votos suficientes para aprovar a reforma, Maia não tinha certeza disso. Pelo contrário: temia que faltassem votos, algo como uns 30 dos 308 necessários.

Desembarcou, ontem, na Câmara seguro de que contaria com 330 votos em um total possível de 513. Mesmo assim seria uma vitória expressiva. No governo de Fernando Henrique Cardoso, a reforma da Previdência foi derrotada porque faltou um único voto. Os governos seguintes preferiram bancar arremedos de reforma.

Então ocorreu a avalanche que deixou todo mundo perplexo, a começar por Maia e a terminar por Bolsonaro que nunca suou a camisa para aprovar a reforma. Suou para livrar os policiais militares da reforma. Votaram 510 deputados – 379 a favor, 131 contra. Maia viu o resultado no placar eletrônico e não acreditou.

O que aconteceu? Ao invés de dar ao governo a reforma que ele pedira, os deputados decidiram fazer a sua. Convenceram-se de que não dava mais para ignorar que o país caminharia para o buraco se não reformasse a Previdência. A estarem certas as pesquisas, a maioria dos brasileiros pensa a mesma coisa.

Fez-se a reforma – ou melhor: foi dado o passo mais difícil na direção de fazê-la. Hoje, a Câmara votará pontos da reforma destacados e ela poderá ficar menor. Em seguida, a bola será chutada para o Senado. Ali, se tentará incluir Estados e municípios no momento excluídos da reforma.

Uma reforma concebida para acabar com os privilégios manteve vários deles e aumentou outros. Mas como o mundo gira, a Lusitana roda e as pessoas vivem mais, é assunto para ser resolvido na discussão da próxima reforma.

Esquerda em estado de choque

Feridas abertas
Nem nos seus piores pesadelos, os partidos de esquerda sonharam com uma derrota tão acachapante como a que colheram na Câmara dos Deputados com a votação da reforma da Previdência.

A crise global do conservadorismo

- The Economist / O Estado de S.Paulo

Em vários países, a centro-direita vem dando lugar a uma direita radical, pessimista e revolucionária

Vladimir Putin, presidente da Rússia, afirmou que a noção de liberal é “obsoleta”. Discordamos. Não só porque ele disse ao Financial Times que o liberalismo tem a ver com imigração, multiculturalismo e política de gênero, mas também porque escolheu o alvo errado. A noção que está mais ameaçada no Ocidente é o conservadorismo. E você não precisa ser um conservador para achar isso preocupante.

No sistema bipartidário, como o adotado nos EUA e no Reino Unido, a direita está no poder, mas somente porque abandonou os valores que a definem. Em países com muitos partidos, a centro-direita vem sendo corroída, como na Alemanha e na Espanha, ou mesmo eviscerada, como na França e na Itália. E, em outros lugares, como na Hungria, com uma tradição democrática menos antiga, a direita partiu diretamente para o populismo sem mesmo experimentar o conservadorismo.

O conservadorismo não é tanto uma filosofia quanto uma disposição de espírito. O filósofo Michael Oakeshott o definiu muito bem: “Ser conservador é preferir o familiar frente ao desconhecido, o que já foi experimentado ao que não foi ainda tentado, preferir o fato e não o mistério, o real e não o possível, o limitado e não o ilimitado, o próximo e não distante”.

Como o liberalismo clássico, o conservadorismo é uma criação do Iluminismo. Os liberais afirmam que a ordem social surge espontaneamente com os indivíduos agindo livremente, mas os conservadores entendem que a ordem social vem em primeiro lugar, ela cria as condições para a liberdade. Busca a autoridade da família, a Igreja, a tradição e as associações locais para controlar a mudança e torná-la mais lenta. Mas essa demolição vem ocorrendo com o próprio conservadorismo e isso vem partindo da direita.

A nova direita não é uma evolução do conservadorismo, mas um repúdio dele. Os usurpadores estão ressentidos e descontentes. Eles são pessimistas e reacionários. Olham o mundo e veem aquilo que o presidente Donald Trump chamou de “carnificina”. Observe como eles estão estraçalhando uma tradição conservadora atrás da outra. O conservadorismo é pragmático, mas a nova direita é fanática, ideológica e sem preocupação com a verdade.

Uma boa reforma: Editorial / Folha de S. Paulo

Texto da Previdência é um avanço rumo à racionalidade orçamentária e à justiça social

O texto da reforma da Previdência aprovado em primeiro turno pela Câmara dos Deputados prevê a mais ampla alteração já feita nas aposentadorias do país.

Marco histórico à parte, mais importante é assinalar que, embora contenha falhas, a reforma significa inegável avanço rumo à racionalidade orçamentária e à justiça social —e merece ter seus dispositivos centrais preservados nas próximas etapas da tramitação.

Sua inovação mais importante, a fixação de idades mínimas para a obtenção dos benefícios, constitui prática corriqueira no mundo. Segundo estudo publicado pelo Ipea há dois anos, 164 de 177 países pesquisados aplicam tal exigência.

Em grande parte deles, aliás, o piso etário tem subido para acompanhar a tendência de aumento da longevidade da população, também observada no Brasil.

O texto votado pela Câmara estabelece como norma geral idade mínima de 65 anos para homens e 62 para mulheres —melhor seria se não houvesse diferenciação. O tempo mínimo de contribuição, hoje de 15 anos no setor privado, sobe a 20 apenas para os homens.

Avanços e perda de oportunidade na reforma: Editorial / O Globo

Se idade mínima para a aposentadoria é positiva, redução de desníveis esbarra nas corporações

Os 331 votos contrários à retirada da reforma da Previdência da pauta, proposta pela oposição, dados na noite de terça-feira, foram um indicador de que o projeto das mudanças ultrapassaria com alguma folga o apoio mínimo de 308 deputados, exigido para a aprovação de emendas à Constituição. O que ficou comprovado pelos 379 votos a favor da reforma, contra 131. Aprovado em primeiro turno, o projeto de emenda Constitucional (PEC) segue para a apreciação em segundo, com chances sólidas de ser referendado. O que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, deseja que ocorra ainda até domingo, a fim de que a PEC seja logo remetida ao Senado.

Caso não haja emendas que levem a que partes do projeto retornem à Câmara, a PEC da reforma, da maneira como está, traz avanços num sistema previdenciário que há tempos caducou, deixando de refletir a realidade demográfica do país, além de ser causa do agravamento de desigualdades.

A fixação, afinal, de uma idade mínima para a obtenção da aposentadoria (65 anos, homens; 62, mulheres) — nas Américas, apenas Brasil e Equador não seguem este parâmetro — é essencial para que seja contida a tendência de aposentados terem baixa idade média (no INSS, aquém dos 60 anos), quando a sobrevida das pessoas com mais de 60 anos chega aos 80, mesmo em regiões mais pobres. Tem lógica aritmética o crescimento descontrolado dos déficits previdenciários.

Crise também prejudica investimento em inovação: Editorial / Valor Econômico

Poucos temas atraem tanta atenção de empresários e investidores atualmente quanto o da inovação. A mobilização em torno do assunto é enorme e existe grande interesse no mundo corporativo sobre métodos que possam facilitar ou mesmo viabilizar o financiamento de medidas que possam tornar uma companhia ou um banco ou mesmo um órgão governamental mais inovador.

Sabe-se também que o Brasil apresenta avanços em inovação em algumas áreas específicas. O exemplo mais evidente é o setor financeiro - muitas soluções para pagamentos e outras operações bancárias são consideradas mais avançadas do que em outras nações. Outro caso emblemático é o do setor de cosméticos, no qual algumas empresas conseguiram ter destaque internacional por meio de investimentos em produtos inovadores.

Não existem dúvidas, além disso, que uma mola fundamental para um período de crescimento econômico duradouro é o investimento público e privado em pesquisa e desenvolvimento. E o Brasil, atolado num crescimento medíocre nos últimos anos, só ganharia com o impulso que fosse dado por mudanças de procedimentos inovadores.

Liberdade econômica, na medida: Editorial / O Estado de S. Paulo

Milhões de empregos e bilhões de dólares têm sido perdidos no Brasil por causa dos entraves à produção e aos negócios. Remover entraves e abrir espaço à livre-iniciativa e à capacidade empreendedora são os grandes objetivos da Medida Provisória (MP) 881, também conhecida como MP da Liberdade Econômica. Mas é preciso evitar a confusão entre ampliar a liberdade, restringir direitos e afrouxar de forma injustificável o poder de fiscalização do Estado. Esse perigo é indisfarçável no texto apresentado pelo relator da matéria, deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), e ainda sujeito a debate na Comissão Mista. Tornar o País mais eficiente é o objetivo básico da MP 881. Visíveis no dia a dia dos cidadãos, os grandes complicadores da vida dos brasileiros também são conhecidos internacionalmente. Têm sido apresentados nas classificações de competitividade e em relatórios periódicos de entidades públicas e privadas.

Um dos documentos mais conhecidos é o Doing Business, do Banco Mundial, sobre as condições de negócios em países-membros. O Brasil aparece em 109.º lugar, entre 190 países, no relatório citado pelo Ministério da Economia ao apresentar a MP. Em outros estudos, como os do Fórum Econômico Mundial, as classificações são também muito ruins.

Atividades econômicas classificadas como de baixo risco ficarão livres de autorização prévia, se a MP for aprovada.

Antonio Machado: Cantares

Luz del alma, luz divina,
faro, antorcha, estrella, sol…
Un hombre a tientas camina;
lleva a la espalda un farol.

Luz do espírito, luz sagrada,
lanterna, tocha, estrela, sol…
Um homem às cegas na estrada;
leva nas costas um farol.

Ballet Furia: Fuego Flamenco