*Antonio Gramsci (1891-1937). Cadernos do
Cárcere, v.1. p. 100. Civilização Brasileira, 2006.
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
sexta-feira, 19 de maio de 2023
Opinião do dia – Antonio Gramsci* (a força das ideias)
Vera Magalhães - 'Déjà-vu'?
O Globo
Impasse sobre exploração de petróleo na foz
do rio Amazonas prenuncia reedição do embate entre a ministra do Meio Ambiente
e desenvolvimentistas do PT e do governo
A saída do senador Randolfe Rodrigues da
Rede está longe de ser o ponto principal da controvérsia em torno da negativa
do Ibama de conceder licenciamento ambiental para a exploração de petróleo na
foz do Rio Amazonas. O que o episódio evidencia é a possibilidade de, cedo
demais, começar uma queda de braço entre Marina Silva e a ala mais
desenvolvimentista do partido e do governo, como aconteceu no primeiro mandato
do presidente Lula, acarretando a saída da ministra do Meio Ambiente do time.
Marina saiu vencida em todos os embates que travou contra a visão de que a exploração mineral e as grandes hidrelétricas seriam passaportes do Brasil rumo ao desenvolvimento econômico, pouco importando se, para tanto, fossem sacrificadas populações locais e a preservação da Amazônia, no caso das usinas, embora diga que não foi isso que motivou seu pedido de demissão.
Bernardo Mello Franco – A CPI dos agrotoscos
O Globo
Dominada por bolsonaristas, comissão
estreia com palavrões e ataques aos sem-terra
A CPI do MST mal começou, mas já mostrou a
que veio. Será uma trincheira do bolsonarismo para atacar os sem-terra, o
governo e a esquerda em geral. A comissão é um consórcio entre a bancada
ruralista e a bancada da bala. Os dois grupos indicaram o presidente, o relator
e a maioria dos titulares e suplentes.
Os trabalhos serão comandados pelo tenente-coronel
Luciano Zucco. Em discurso na tribuna, ele deixou claro que não pretende
esperar a investigação para dar a sentença. “Esta CPI vai mostrar que o MST não
é um movimento social, e sim criminoso”, disse.
O relator será Ricardo Salles, ex-ministro de Bolsonaro que já defendeu receber os sem-terra à bala. Em sua primeira campanha, ele fez apologia explícita à violência no campo. Defendeu o uso do fuzil como antídoto “contra a esquerda e o MST”.
Luiz Carlos Azedo - A segunda morte de Collor de Melo
Correio Braziliense
No poder, enfrentou uma sucessão de crises
financeiras e fracassou no combate à hiperinflação. Os planos Collor I e Collor
II foram desastrosos. Mas o colapso de seu governo foi ético e político
Velha raposa política britânica, o
primeiro-ministro do Reino Unido, Winston Churchill, dizia que “a política é
quase tão excitante como a guerra, e não menos perigosa: na guerra, a pessoa só
pode ser morta uma vez, mas, na política, diversas vezes”. É o caso do
ex-presidente Fernando Collor, que a maioria dos ministros do Supremo Tribunal
Federal (STF) condenou, ontem, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro em
um processo da Operação Lava-Jato. A sessão foi suspensa com o placar de 6 x 1
e deve ser retomada na próxima quarta-feira. Relator, o ministro Edson Fachin
recomendou a pena de 33 anos e 10 meses de prisão.
Votaram pela condenação os ministros Alexandre de Moraes, André Mendonça, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia. O ministro Nunes Marques votou pela absolvição de Collor. Para ele, não ficou comprovado que o ex-presidente tenha se beneficiado de desvios na BR Distribuidora. A pena total de Collor ainda não foi definida. Ele foi responsabilizado por indicações políticas para a BR Distribuidora, empresa subsidiária da Petrobras, e teria recebido R$ 20 milhões como contraprestação à facilitação da contratação da UTC Engenharia. A ação penal tramitava desde 2017 e os crimes teriam sido cometidos entre 2010 e 2014, ou seja, no primeiro mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, que não está envolvida no caso.
Reinaldo Azevedo - TSE impede uso da lei para fraudar a lei
Folha de S. Paulo
Por que Deltan perdeu ganhando e este
escriba ganhou perdendo. Coisas da vida
Deltan
Dallagnol perdeu o mandato, mas não o rebolado do baixo jacobinismo
reaça, indo até o chão do messianismo barato. O TSE cassou por
unanimidade o registro de sua candidatura, e ele anunciou uma nova cruzada
contra os três Poderes. Se termina de novo em depredação, não sei. Acho que os
"tiozão" vão preferir encher o tanque com combustível mais barato...
Convocou um levante contra os tribunais, evidenciando não ter a menor esperança
de que a decisão vá ser revertida. Comparou-se a José, o filho de Jacó; a
Daniel, o da cova dos leões, e
a Jesus, o nazareno. Mas sem exageros: no papel de mártir, dispensa os
rigores da prisão, a fuça das feras ou o sofrimento da cruz. Na fronteira do
ridículo, esse rapaz nunca hesitou em dar o passo seguinte.
Antes que volte a seu discurso doidivanas da quarta (17), é preciso corrigir uma inverdade que se espalhou na imprensa. O relator do caso, Benedito Gonçalves, não fez uma "interpretação extensiva" do conceito de Processo Administrativo Disciplinar (PAD). Advogados tarimbados e alguns com tarja de "juristas" incorreram no que, em certos casos, é erro decorrente de opinião que precede a leitura do voto e, em outros, má-fé. "Então você não admite opinião divergente?" É certo que sim. Desde que se divirja do que está escrito, não de uma inferência sem amparo no texto.
Hélio Schwartsman - Leis e democracia
Folha de S. Paulo
Não faz sentido tentar limitar o poder do
eleitor de fazer más escolhas
Nunca gostei da Lei da Ficha
Limpa. Ela impediria a população de colocar no poder um herói como
Robin Hood. Não acho que Lula seja
um Robin Hood, mas lamentei que essa norma o tenha impedido de concorrer em
2018. De modo análogo, lamento que tenha sido agora usada para cassar Deltan
Dallagnol, que tampouco considero um herói.
Há, contudo, uma diferença importante. A declaração de inelegibilidade de Lula era consequência automática da aplicação da letra da lei, já que, à época, ele sofrera condenação judicial proferida por órgão colegiado e por crimes inabilitantes. No caso de Dallagnol, a inelegibilidade não é tão óbvia. Na verdade, os ministros do TSE que o cassaram fizeram uma interpretação bem expansiva da legislação.
Bruno Boghossian - Centrão acelera o plano Tarcísio
Folha de S. Paulo
Trio bolsonarista fala de inelegibilidade e
desenha articulações partidárias por governador paulista
Na política, mesmo as hipóteses costumam
ser tratadas com cautela. Um presidente impopular não admite publicamente
que corre
risco de sofrer impeachment. Um candidato pouco competitivo evita
especulações sobre o apoio que dará no segundo turno, sob pena de reconhecer a
derrota com antecedência.
Aliados de Jair Bolsonaro deixaram a fase da hipótese para trás quando o assunto é a inelegibilidade do ex-presidente. Na mesma semana, Valdemar Costa Neto, Ciro Nogueira e Flávio Bolsonaro falaram do cenário com desenvoltura e deitaram cartas na mesa sobre a sucessão na direita.
Vinicius Torres Freire - CPIs e guerrilhas no Congresso
Folha de S. Paulo
Inquéritos e movimentos para derrubar
iniciativas de Lula mostram desordem política do governo
O Congresso está
livre, pesado e solto. Ainda é má notícia para o governo. Note-se a quantidade
de CPIs que vão sendo aprovadas, algumas delas capazes de produzir espuma
tóxica. Há também planos para derrubar iniciativas de Luiz Inácio Lula da
Silva tais como os decretos anti-armas ou demarcações de terras
indígenas.
Por enquanto, são escaramuças e focos de
guerrilhas políticas. Mas indicam a grande dificuldade do governo de fazer um
acordo suficiente para pacificar em particular a Câmara, o que quer dizer Arthur Lira (PP-AL),
seu presidente, e lideranças agregadas.
O acordo é intragável e pode ser venenoso. Basicamente, significa entregar a Lira e seu comando colegiado uma variante do controle sobre o fluxo de emendas parlamentares.
Eliane Cantanhêde - A invasão da CPI
O Estado de S. Paulo
A CPI do MST, que é contra Lula, vai inflacionar os preços da votação da âncora fiscal
Cumpriu-se a profecia (inclusive de
Fernando Haddad) de que a nova âncora fiscal teria mais de 300 votos na decisão
sobre a urgência, que é apenas o primeiro passo. Depois o caminho costuma ficar
mais íngreme e árido, com grande risco de surpresas, e o problema não é do (ou
só do) governo, mas principalmente do Congresso.
Diferentemente do PL das Fake News e das mudanças no Marco do Saneamento, há um consenso favorável à nova âncora fiscal. Daí o placar de 367 votos a favor e 102 contra a urgência. Mas já há 40 emendas à proposta e, por exemplo, PSOL e Rede, aliados do governo, votaram contra a urgência. Eles, de um lado, o Centrão, do outro, e o PT atrapalhando o tempo todo, acenam com muita negociação, o que corresponde a muita cobrança.
Laura Karpuska* - Redes de intrigas
O Estado de S. Paulo
O PL das Fake News mostra a dificuldade do Congresso, bem como a complexidade do assunto
No filme Rede de Intrigas de 1976, Howard
Beale, um apresentador de noticiário na televisão, é demitido devido à baixa
audiência do seu programa. Em um surto emocional ao vivo, Beale anuncia que vai
se matar na televisão na semana seguinte. A emissora decide mantê-lo no ar e
estreia o programa A Hora da Raiva, onde Beale desabafa sua raiva contra a
sociedade e o sistema.
Em uma cena clássica do cinema, Beale grita
“I’m mad as hell and I am not going to take it any longer” (“Estou furioso e eu
não vou mais tolerar isso”, na minha tradução livre). Ouvem-se pessoas gritando
o mesmo por suas janelas na cidade de Nova York. É a previsão do entretenimento
dominando a comunicação saudável. O que importa é a distração em si.
Se Paddy Chayefsky, o criador do roteiro do filme Rede de Intrigas, encontrasse Orwell e Huxley, a distopia resultante poderia ser muito parecida com o que vivemos hoje com as redes sociais.
Maria Cristina Fernandes - Barradas no baile da política
Eu & Fim de Semana / Valor Econômico
No país com uma das piores desigualdades de
gênero na política, levantamento mostra que a maior parte das prefeitas são do
NE, com nível superior e do serviço público. Um quarto delas são solteiras
Em outubro de 2020, Francisca das Chagas
Costa da Silva, registrada na Justiça Eleitoral como Tica Costureira,
candidatou-se a vereadora pelo PSDB de Mossoró (RN), mas não gastou um tostão,
não divulgou sua candidatura e não obteve sequer seu próprio voto.
O Tribunal Regional Eleitoral potiguar
considerou que Francisca havia desistido da candidatura e rejeitou a ação de
investigação judicial eleitoral, mas o recurso à decisão acabaria por ser
acolhido pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Na semana passada, o TSE reconheceu fraude à cota de gênero, anulou os votos recebidos pelo PSDB e cassou o mandato da vereadora Larissa Rosado, eleita pela legenda e hoje no União Brasil. Era a única vereadora da Câmara de Mossoró.
César Felício - A LDO poderá amarrar o governo
Valor Econômico
Relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias
quer diminuir discricionaridade do Executivo
O projeto de arcabouço fiscal poderá
significar para o governo Lula, na prática, um teto de gastos, mas agora por
lei complementar, e não como matéria constitucional. A depender dos partidos
que formam a maioria na Câmara, este será o caminho.
Um sinalizador nessa direção são as
intenções do relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano,
deputado Danilo Forte (União Brasil-CE). A LDO, como dispõe o projeto do
arcabouço fiscal logo em seu artigo 2, estabelecerá “as diretrizes da política
fiscal e as respectivas metas anuais para o resultado primário”.
O tema deve começar a tramitar com força no Congresso assim que a tramitação do arcabouço encerrar. E será feita sem pressa: Forte não descarta a aprovação apenas no segundo semestre, embora em tese a LDO devesse ser votada antes do recesso do meio do ano. O “timing” será decidido pelo dono da pauta na Câmara, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), com quem o relator da matéria é muito bem entrosado. Toda a negociação para a aprovação do arcabouço está sendo feita pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, diretamente com Lira.
Naercio Menezes Filho* - Tecnologia, trabalho e Bolsa Família
Valor Econômico
Não haverá solução no futuro a não ser
transferir renda para um número cada vez maior de pessoas
A desigualdade de renda entre os
brasileiros caiu em 2022 para o nível mais baixo da última década, segundo
dados divulgados recentemente pelo IBGE. Esta queda ocorreu tanto devido à
recuperação do mercado de trabalho para os trabalhadores menos qualificados no
período pós-pandemia, como pelo aumento das transferências de renda do programa
Auxílio Brasil, na tentativa de Bolsonaro de ganhar a eleição presidencial. Mas
a desigualdade por aqui permanece entre as mais elevadas do mundo.
Muitos analistas destacaram que esta queda da desigualdade foi bem-vinda, mas esperam que as futuras quedas dependam mais do trabalho do que de transferências, pois não haveria como aumentar ainda mais os gastos com o Bolsa Família. Outros analistas aventaram a possibilidade de que a queda na oferta de trabalho que ocorreu no final de 2022 teria sido causada por esse aumento das transferências, pois os beneficiários prefeririam receber as transferências do que procurar um trabalho formal. Quão realistas são estas preocupações?
Bruno Carazza* - Reflexões sobre o caso Dallagnol
Valor Econômico
Fim prematuro da carreira do ex procurador
da Lava Jato poderia deixar um legado para o país
A imagem do powerpoint virou meme, mas ela
esconde uma lição para o combate à corrupção no Brasil. A cassação de Deltan
Dallagnol, em muitos sentidos, remonta àquele 14 de setembro de 2016. Olhando
retrospectivamente, o slide com círculos, setas e Lula no centro foi o primeiro
erro crucial da Operação Lava Jato.
Os procuradores, policiais federais e
fiscais da Receita, além do próprio ex-juiz federal Sérgio Moro, nunca
esconderam que a Operação Mãos Limpas italiana foi o modelo seguido pela Força
Tarefa de Curitiba para investigar e condenar os envolvidos no maior escândalo
de corrupção já descoberto no Brasil.
Além do uso de novos e velhos instrumentos
como conduções coercitivas e acordos de colaboração premiada, os integrantes da
Lava Jato se valeram da espetacularização das ações e a comunicação ostensiva
na imprensa e nas redes sociais para angariar apoio popular – e judicial – para
as suas ações contra os políticos e executivos de grandes empresas envolvidos.
Curiosamente, a Operação Mãos Limpas começou a perder credibilidade e sofrer retrocessos quando alguns de seus expoentes cederam ao canto da sereia da política. Por aqui aconteceu o mesmo.
O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões
PEC da Anistia só faz aumentar o desgaste da política
O Globo
Que garantia terá o eleitor de que nos
próximos pleitos o Congresso não mandará às favas regras que aprovou?
Sem nenhum constrangimento, parlamentares
das mais variadas legendas e inclinações ideológicas aprovaram na terça-feira,
na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, a Proposta de
Emenda à Constituição (PEC) que promove a maior anistia da
História recente a partidos que cometeram irregularidades na prestação das
contas eleitorais ou que descumpriram as cotas destinadas a aumentar a
participação de mulheres e negros nos pleitos.
Ninguém tem o direito de se dizer surpreso com a insólita e oportunista coalizão de apoio à PEC da Anistia, aprovada na CCJ por 45 votos a 10. O arco se estende do líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), ao líder da oposição, Carlos Jordy (PL-RJ), passando por parlamentares de direita, de esquerda e de centro — tudo para livrar as legendas de qualquer mordida nos fartos recursos públicos distribuídos pelos fundos eleitoral e partidário. Apenas o Novo e a federação PSOL-Rede foram contra a proposta.