As duas últimas cartas com que contava Bolsonaro – sua associação com o Centrão e o chamado Auxílio Brasil –, cujos efeitos eleitorais ainda não se fazem sentir, já foram jogadas. Ademais, se lhe frustram o que espera dessas duas cartas – o Centrão é, como se sabe, volúvel –, suas pretensões, como as atuais pesquisas indicam, arriscam ser afastadas ainda no primeiro turno eleitoral. Para Bolsonaro a via eleitoral é um caminho de pedras, e, consciente disso, já procurou, como no infausto 7 de setembro, atalhá-lo num golpe de mão mal sucedido. O horizonte que se descortina à sua frente, em sua lógica à moda de Donald Trump é a de suscitar o tumulto, como sinaliza em sua política de procurar confrontos a qualquer pretexto, até na vacinação infantil. Por falta de alternativa, trama-se em favor de uma recidiva de um 7 de setembro.
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
segunda-feira, 20 de dezembro de 2021
Luiz Werneck Vianna*: A nossa geringonça
Paulo Fábio Dantas Neto*: Partidos e lideranças em hora difícil: como sair do beco das madalenas?
Tal situação não foi obra isolada de um bruxo genial do submundo da política. Resultou de ações descoordenadas, ou da pura inação, de forças políticas contaminadas por um esperto oportunismo de curto prazo e tiro curto. Crentes da enganosa sugestão, feita por inimigos da política, de que um salve-se-quem-puder rasteiro pudesse ser kit de sobrevivência na selva para alguns, abriram brechas a sabidos, ao preço de aposentarem a sabedoria política e a noção de centro como eixo agregador. Talvez o vale tudo tenha sido um kit válido só para o PT, que, em 2018, se recuperou, em parte, da devastação eleitoral nas eleições municipais de 2016 e se apresenta de novo ao país agora, montado no seu líder de massas, resgatado da prisão como opção eleitoral relevante, quiçá como uma reencarnação de Noé. Afora esse eco vivo da primeira década do século, o que se vê são escombros e um museu de novidades.
Fernando Gabeira: O ano que passou
O Globo
Mais um ano escorre pelos dedos. Não foi
terrível nem animador, apenas um ano de transição.
O Brasil ficou cansativo com essa
interminável polêmica com o negacionismo. Primeiro, negaram o vírus, depois a
gravidade da pandemia, o número de mortos, a importância da vacina e,
finalmente, o passaporte vacinal.
Foi um ano de grandes debates em Glasgow,
políticas ambientais decisivas nos EUA e na Alemanha, mas termina com uma dura
mensagem da natureza: enchentes no sul da Bahia e o tornado no Kentucky.
A democracia foi ameaçada pelos mesmos de
sempre, mas creio que, ali pelo 7 de Setembro, a ameaça se dissipou, deixando
apenas alguns perplexos caminhoneiros bloqueando estradas no dia seguinte ao
feriado.
Felizmente me deixaram passar para o trabalho presencial. Duplamente vacinado, caí na estrada para desenferrujar os dedos e a sensibilidade. Viver a esperança de voltar ao trabalho e preparar um salto de qualidade para o ano que entra. É o que está ao meu alcance.
Miguel de Almeida: Quando a religião faz mal à saúde
O Globo
O imperador Marco Aurélio (também filósofo
estoico) achava os primeiros católicos uns tipos muito histéricos. Os romanos
ridicularizavam suas construções verbais (Carluxo segue essa tradição) e ainda o
apelo às superstições como discurso de poder.
O uso do medo para torná-lo frágil.
Andasse pelo Brasil contemporâneo, Marco
Aurélio estaria apoplético com a sanha colérica de um Silas Malafaia e sua
intromissão em assuntos que procuram dobrar a sociedade a sua opinião, digamos,
religiosa.
Outros pastores seguem a mesma toada
autoritária, na tentativa de subjugar parte da população que não reza pelo seu
credo.
Os protocristãos são vistos como os
primeiros a querer dominar corpos e mentes dos outros. Até então, as religiões
chamadas de pagãs (designação maldosa forjada pelos cristãos) deixavam a
prática religiosa, e sua escolha, para cada cidadão.
Não havia a intenção autoritária, invasiva, de convencer o outro a praticar a sua crença. Livre escolha, porque todos devemos ser livres para acreditar ou não, seja num único deus ou em vários deuses. Ou em nenhum. Vai da sua fé.
Mirtes Cordeiro*: Reflexão sobre as muitas violências
Os métodos policiais e a lentidão da justiça no trato das questões judiciais muito contribuem para a manutenção da violência.
São muitas as violências que, nestes tempos
modernos, são acompanhadas em tempo real pelos meios de comunicação que a mais
atualizada tecnologia nos proporciona. Não que não ocorressem – as
violências – em tempos anteriores ao nosso, mas nos assustam as formas
sofisticadas pelas quais acontecem e os intervalos de tempo.
A violência no Brasil se instalou com a
colonização e nos acompanha até os dias atuais. Primeiro, aconteceu com a forma
como colonizadores aqui chegaram e se impuseram, tomando as terras dos
indígenas. Em segundo lugar, pela submissão dos índios e posteriormente dos
negros trazidos da África como escravos, por volta de 1530, com a exploração do
pau brasil, uma árvore que produzia madeira de lei e que representou o primeiro
grande ciclo econômico do Brasil.
A madeira era exportada para produzir corantes
para a construção naval e mobiliário de luxo.
“A violência era algo rotineiro na vida dos escravos, e o tratamento violento dedicado a eles tinha o intuito de incutir-lhes temor de seus senhores. Esse medo visava mantê-los conformados com a sua escravização e impedir fugas e revoltas. Uma punição muito comum aplicada sobre eles era o “quebra-negro”, que os ensinava a sempre olharem para baixo na presença de seus senhores”. (Daniel Neves-Escravidão no Brasil)
Marcus André Melo*: O parlamentarismo ajudou na abolição da escravatura
Folha de S. Paulo
Viabilidade do semi-presidencialismo na
agenda do Chile e do Brasil
"O regime parlamentar no Brasil fez a
abolição pacificamente, ao passo que o regime presidencial nos EUA desencadeou
uma revolução tremenda." Medeiros e Albuquerque foi o primeiro entre nós a
fazer um exercício contrafactual relacionando sistema de governo e abolição.
Em "O Regime Presidencial no Brasil" (1914) anotou: "se, em
1887, o Brasil fosse República presidencial e tivesse de eleger o seu
presidente, não elegeria um abolicionista incondicional e sem
indenização".
E completou: "um ano depois, esta solução se impunha e se realizava
suavemente; mas só se impunha e só se realizava suavemente, porque foi possível
sacrificar vários ministérios. Todos viram assim que, esgotadas as outras
soluções, restava apenas a da abolição e incondicional".
Sob o parlamentarismo, alegava, os debates e as soluções insuficientes
produziam queda de ministérios sem fortes descontinuidades. Já o presidencialismo
seria inflexível: os presidentes são forçados a manter seus pontos de vista
"por teima ou coerência" até o fim do mandato.
Celso Rocha de Barros: Por que tem um general no TSE?
Folha de S. Paulo
Em democracias estáveis, ministros da
Suprema Corte não precisam se preocupar em acalmar golpistas
O general
Fernando Azevedo e Silva, ex-ministro da defesa de Bolsonaro, ocupará a
direção-geral do TSE durante a campanha presidencial de 2022. Isto é: quem vai
decidir se a eleição valeu será um sujeito armado que até outro dia era
funcionário de um dos candidatos.
Azevedo e Silva já desempenhou papel
semelhante na eleição passada: por algum motivo até hoje inexplicado, foi
assessor de Toffoli no STF durante a eleição de 2018. Naquela oportunidade,
o STF
decidiu que Lula, que tinha 38% nas pesquisas, não poderia concorrer contra
Bolsonaro, que tinha 18%. Bolsonaro venceu e nomeou Azevedo para a Defesa.
Se o leitor conhecer caso semelhante ocorrido em país de democracia estável, peço que envie carta para a Redação.
Catarina Rochamonte: Ciro e Lula: isso sim é corrupção
Folha de S. Paulo
A declaração de Lula em relação ao
orçamento secreto visava minimizar o mensalão petista
Ciro Gomes nega
envolvimento em esquema de corrupção na construção do estádio Castelão,
supostamente ocorrido entre 2010 e 2013 e que está sendo investigado pela
Polícia Federal desde 2017. Após a PF cumprir mandados de
busca e apreensão em endereços seus e do seu entorno, Ciro alegou
perseguição de Bolsonaro, a quem acusou de ter montado um estado policial.
É fato que Bolsonaro tentou interferir na Polícia Federal —o que, aliás, foi
denunciado por Sergio Moro—
porém, o que efetivamente conseguiu de controle é incerto. Pelo que até agora
se sabe, a referida investigação da PF foi realizada no âmbito da sua autonomia
institucional.
No mesmo dia em que foi deflagrada a operação batizada ‘Colosseum’, lia-se em
manchetes a seguinte frase do ex-presidente Lula: "Isso sim é
corrupção". Não, ele não se referia à suposta corrupção de Ciro no
Castelão, mas sim à suposta corrupção do orçamento secreto, por meio da qual o
presidente Bolsonaro teria comprado o apoio do Centrão.
A declaração de Lula em relação ao orçamento secreto visava minimizar o
mensalão petista. Mas ambos foram esquemas armados para corromper parlamentares
com o fito de submeter o Congresso Nacional. A existência de um não diminui a
gravidade do outro.
Bruno Carazza*: Presentão de Natal antecipado
Valor Econômico
Novo valor do fundão mostra apetite
insaciável dos políticos
Luciano Bivar é considerado o dono do PSL.
Em 2018, sua legenda abrigou a candidatura de Jair Bolsonaro e, graças a ele,
elegeu também 52 deputados e 4 senadores. Devido a esse resultado, e à recente
fusão com o DEM, formando o União Brasil, Luciano Bivar terá à sua disposição
R$ 1,05 bilhão para gastar nas eleições do ano que vem - R$ 900 milhões do novo
fundão e mais R$ 150 milhões do fundo partidário.
Abstraída a taxa cambial, podemos dizer que
o União Brasil é o primeiro unicórnio da política brasileira. Se em 2018 Bivar
reservou R$ 1,8 milhão para financiar sua própria campanha a deputado federal,
imagina quanto terá no próximo pleito.
A proposta de elevar o fundo eleitoral de R$ 2,1 bilhões para algo em torno de R$ 5,7 bilhões foi vetada por Jair Bolsonaro em agosto. Foi uma jogada de mestre: como sabia que os congressistas derrubariam o veto, o presidente jogou para a torcida. Tanto é assim que seu novo partido, o PL, deu 40 votos (de um total de 44 presentes) para aumentar o fundão. Mesmo com o posicionamento contrário de Flávio e Eduardo Bolsonaro, o PL terá sua parcela ampliada de R$ 118 milhões para R$ 330 milhões em 2022 - e certamente boa parte desse dinheiro ajudará na tentativa de reeleição do clã e de seus amigos mais chegados.
Denis Lerrer Rosenfield*: Liberdade e comprovante de imunização
O Estado de S. Paulo
Como se pode bem apregoar que as pessoas,
no uso de sua liberdade individual, possam ameaçar a existência do outro?
Uma questão que deveria ser banal, proteger
os cidadãos contra pessoas irresponsáveis que prezam contagiar os outros,
torna-se um problema que envolveria princípios como o da liberdade.
Principalmente a partir da eleição do atual presidente, as formas mais
extremadas da liberdade individual são evocadas para justificar iniciativas
autoritárias e para permitir que o contágio se espraie entre todos. O
favorecimento da morte toma o lugar da defesa da vida.
Do ponto de vista dos princípios, tal
comportamento não faz nenhum sentido, salvo para os que tiram proveito do jogo
da morte em sua acepção física e política. Física, porque a irresponsabilidade
governamental já vitimou mais de 600 mil brasileiros; política, porque se
tornou a forma bolsonarista de governar. Mais especificamente, como se pode bem
apregoar que as pessoas, no uso de sua liberdade individual, possam ameaçar a
existência do outro? É o direito à infecção generalizada, à propagação da
doença e da morte como se fosse um direito individual, assegurado
constitucionalmente?
Tomemos um exemplo para melhor esclarecer um argumento que por si só deveria ser evidente, não fosse o fanatismo que tomou conta de boa parte da sociedade brasileira. Imaginemos uma pessoa portadora de aids. Tem ela o direito de transmitir o HIV no exercício de sua liberdade individual? Pode ela assumir o seu gozo sexual como um direito assegurado, transmitindo o seu vírus para terceiros? Não seria algo chocante? Tratar-se-ia de liberdade ou de aniquilação do outro? Por que nos insurgimos contra este tipo de comportamento, e somos complacentes com a transmissão da covid-19 em nome de uma suposta liberdade?
Antonio Cláudio Mariz de Oliveira*: Combate ao crime: mentira usada como arma política
O Estado de S. Paulo.
A pregação de punições rigorosas, a repressão e a ameaça de cadeia para corruptos são fórmulas que apenas iludem a sociedade
Existem temas que são adotados por
políticos como símbolos de sua atuação dentro ou fora do Parlamento. Lembro-me
da persistência – quase obstinação – do senador Nelson Carneiro em relação ao
divórcio. Empreendeu uma incansável batalha em prol da possibilidade do
rompimento do vínculo matrimonial. Contra a sua pregação ergueram-se vozes e
forças poderosas. A Igreja, as entidades religiosas, a imprensa conservadora e
todos os segmentos sociais que por razões diversas defendiam a ideia de ser o
matrimônio indissolúvel se voltaram contra ele e contra o seu pleito.
Outra ardorosa postulação foi em prol da
adoção da pena de morte no País. O seu prosélito foi o deputado Amaral Netto.
Discussões acerbas, nos dois casos,
envolveram a sociedade, que se dividia. A favor ou contra.
O divórcio foi finalmente aprovado, mas a
pena de morte continua proibida. O aborto é outra questão de infindáveis
debates.
Essas questões, no entanto, foram postas de
forma clara, sem subterfúgios, sem encobrir a intenção de enganar.
Pois bem, o inverso ocorre com o apregoado
combate à corrupção por meio da sanção penal, em que é omitido um aspecto
fundamental: a punição só é aplicada após o crime ter sido cometido. Assim, ela
não o evita. É óbvio: as causas deste crime, sim, é que deveriam ser
combatidas, e não apenas as suas consequências.
Os defensores daqueles temas nunca
procuraram usar falsos argumentos de persuasão. Não apresentam alegações
ilusórias e distantes da realidade. A opção é feita como um ato de vontade que
se apresenta sem vícios.
O posicionamento nesses temas pode ter se transformado num canal político, mas como decorrência natural, sem constituir o objetivo visado.
Lula e Alckmin dão novo passo em aliança para 2022 com 1º encontro público
Petista fala em superar rivalidades do passado em jantar organizado pelo grupo Prerrogativas
Carolina Linhares, Bianka Vieira / Folha de S. Paulo
SÃO
PAULO - O ex-presidente Lula (PT) e
o ex-governador
Geraldo Alckmin (sem partido, ex-PSDB) fizeram neste domingo
(19) sua primeira
aparição conjunta em público em meio a articulações para que o
ex-tucano seja vice do petista na disputa
para a Presidência nas eleições de 2022.
O esperado encontro entre os dois ocorreu
durante um jantar promovido pelo grupo
de advogados Prerrogativas, que contou com cerca de 500 convidados
no restaurante A Figueira Rubaiyat, em São Paulo.
Entusiastas da chapa viram
no evento um grande avanço para a formalização da união, que poderia já ser
anunciada no início do ano que vem.
Em discurso de 42 minutos, Lula minimizou o
passado de rivalidade com outros grupos políticos, em recado que pareceu
talhado para os que lembram as trocas
de farpas entre os dois.
"Não importa se no passado fomos adversários.
Se trocamos algumas botinadas.
Se no calor da hora dissemos o que não deveríamos ter dito. O tamanho do
desafio que temos pela frente faz de cada um de nós um aliado de primeira
hora", disse Lula.
"É este o verdadeiro motivo pelo qual
estamos reunidos aqui nesta noite: a nossa fé na democracia."
Dentro do restaurante, a área reservada a
Lula, Alckmin e outros políticos foi separada dos demais convidados do mundo
jurídico. O local era cercado por um biombo. Lula e Alckmin se sentaram na
mesma mesa no jantar.
O clima era descontraído, e a conversa, segundo políticos presentes, girou em torno de assuntos gerais. Os detalhes do acerto entre Lula e Alckmin não seriam discutidos diante do público, dizem aliados de ambos.
Oposição unida vence no Chile
Chile elege esquerdista Boric à Presidência, em derrota de pinochetista Kast
Líder dos protestos estudantis de 2011 se torna candidato mais votado da história chilena, ao reunir apoio de 4,6 milhões de eleitores
Sylvia Colombo / Folha de S. Paulo
SANTIAGO - O esquerdista
Gabriel Boric, líder dos protestos estudantis de 2011, foi eleito presidente do
Chile neste domingo (19) ao derrotar o ultradireitista José Antonio Kast. Ao
reunir o apoio de 4,6 milhões de eleitores (55,8% contra 44,1%), o nome da
Frente Ampla se tornou o candidato mais votado da história chilena.
Aos 35 anos, Boric será, ainda, o mais
jovem presidente da história do país e vai suceder o direitista Sebastián
Piñera, que termina em março de 2022 seu segundo mandato. O pleito também teve
55% de participação, índice superior ao do primeiro turno (47%) e do plebiscito
para a Constituinte (42,5%).
Na praça Baquedano —também chamada de
Dignidade—, epicentro dos protestos de 2019, apoiadores do novo líder se
dirigiram com bandeiras do Chile, outras com o nome de Boric e muitas mais com
o símbolo dos indígenas mapuche. Ambulantes vendiam bandeiras, bonés e cerveja,
embora houvesse quem passasse pelo local com sua própria garrafa de champanhe
para acompanhar o discurso do eleito.
No palco, próximo à praça, o futuro
presidente chileno disse que o "crescimento econômico do Chile hoje tem
pés de barro" e prometeu fortalecer as pequenas e as médias empresas.
Também destacou que os direitos humanos são essenciais e pediu que o país nunca
mais tenha "um presidente que ataque o seu próprio povo". "Às
vítimas de abusos, afirmo que não nos cansaremos de buscar verdade e
reparação."
Boric também prometeu um sistema de saúde
que "não discrimine ricos e pobres", um programa de cuidado para
mulheres e "aposentadorias dignas". "Não podemos deixar que
sigam enriquecendo com nossas aposentadorias." As promessas se chocarão
com um Congresso dividido, com o qual será necessário realizar acordos para
viabilizar projetos como as reformas da Previdência e tributária.
Ele será também o presidente que comandará o país durante o plebiscito pela
aprovação ou rejeição da nova Constituição, hoje redigida pela Assembleia
Constitucional democraticamente eleita. Caso a nova Carta seja aprovada, também
caberá ao novo líder comandar a implementação do documento.
Numa eleição em que os partidos tradicionais foram rejeitados nas urnas, o esquerdista leva ao poder uma nova geração de políticos que surgiram com as revoltas estudantis de 2011. Para conseguir o apoio necessário para a vitória, porém, Boric buscou moderar seu discurso, considerado radical por muitos setores, e se reconciliou com a Concertação, aliança de centro-esquerda que governou o Chile por 20 anos. Nas últimas semanas, obteve o apoio dos ex-presidentes Ricardo Lagos e Michelle Bachelet.
O que a mídia pensa: Editoriais /Opiniões
EDITORIAIS
Ampliar o foco
Folha de S. Paulo
Projeto peca ao privilegiar aspectos de
varejo empresarial na regulação de redes
Não há dúvidas de que a explosão das
comunicações promovida por serviços de busca na internet, redes sociais e
plataformas de troca de mensagens, além dos benefícios embutidos, também trouxe
riscos e desafios novos às sociedades.
Nos regimes abertos, o processo concorreu
para acentuar as tensões com os direitos a expressão, privacidade, informação,
livre iniciativa e propriedade. A escala das manipulações propiciada pela
tecnologia provocou temores sobre a equidade da disputa eleitoral e a própria
estabilidade da democracia.
Como resposta, ocorre uma onda de
regulamentações estatais a fim de mitigar os efeitos nocivos da expansão
digital e compatibilizá-la com a arquitetura constitucional. Nessa esteira se
discute no Congresso Nacional o projeto (2.630, de 2020) para instituir a Lei
Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet.
Apelidado de projeto das
fake news, o relatório vigente —que acaba de sair de comissão
especial na Câmara— toca em vários temas, da publicidade digital e eleitoral à
remuneração da atividade jornalística, do veto a contas automatizadas não
identificadas à obrigação de provedores de publicar relatórios de transparência
sobre suas intervenções contra usuários.
Os riscos implícitos no texto são conhecidos do estilo legiferante brasileiro: favorecer interesses particulares e hipóteses mal sustentadas à custa do desenvolvimento econômico e tecnológico e pressupor que cliente e eleitor precisam ser protegidos com paternalismo, porque facilmente manipuláveis.
Poesia | Fernando Pessoa: Cartas de amor são ridículas
Ridículas.
Também
escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As
cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas,
afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me
dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A
verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
(Todas
as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas).