quinta-feira, 19 de outubro de 2023

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

CNJ revela disposição para aperfeiçoar Justiça

O Globo

Criação de exame para juiz e punição ágil a magistrado que errou são passos na direção correta

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Luís Roberto Barroso, anunciou na terça-feira a criação do Exame Nacional da Magistratura. Só depois de aprovados nesse teste os interessados poderão se inscrever em concursos públicos aos cargos de juiz, aqueles não sujeitos a indicações políticas. As diretrizes do exame serão coordenadas pelo CNJ. A ação foi pensada para diminuir suspeitas de favorecimento de candidatos ligados à cúpula dos tribunais.

A criação do exame não tirará autonomia dos tribunais para organizar seus concursos. Não se trata de uma intervenção. O objetivo é fazer uma prova rigorosa, em escala nacional, que funcione como uma peneira. Uma comissão será formada para definir as diretrizes do teste até novembro. Embora falte determinar quando entrará em vigor, a inovação deverá ser um dos legados de Barroso à frente do Supremo e do CNJ. O exame poderá se tornar um instrumento eficaz para elevar a confiança na Justiça e revela disposição de corrigir as deficiências do Judiciário.

Merval Pereira - Poder contestado

O Globo

Cresce a pressão para que a Suprema Corte dos EUA elabore um Código de Ética interno, para superar as críticas que vem recebendo

A aparente crise entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso é uma disputa de poder que ocorre nas democracias, inclusive nos Estados Unidos, cujos pais fundadores buscaram na teoria da separação de poderes de Montesquieu a base da elaboração da Declaração de Independência de 1776. No momento, cresce a pressão para que a Suprema Corte dos Estados Unidos elabore um Código de Ética interno, para superar as críticas que vem recebendo por atitudes de alguns integrantes.

Essa possibilidade vem sendo discutida há anos, sempre que o Congresso americano ameaça regulamentar as atividades da Suprema Corte a partir de um Código de Ética elaborado pelos parlamentares. Recentemente, a ministra Elena Kagan apoiou a criação de um código, reforçando o grupo de ministros que entendem importante tal conduta diante das acusações que vêm surgindo.

Malu Gaspar - CPI do 8 de janeiro deixa enigmas do golpismo bolsonarista sem solução

O Globo

A sessão da CPI dos Atos Golpistas que aprovou o relatório responsabilizando Jair Bolsonaro e mais 60 pessoas foi palco do teatro que caracteriza eventos do tipo. Aplausos, apupos, agradecimentos emocionados, discursos inflamados e embates duros. Governistas gritavam “sem anistia”, bolsonaristas gritavam “vergonha”.

O líder de Lula no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), agradeceu à oposição por ter insistido tanto para instalar a comissão, enquanto oposicionistas bradavam contra o “relatório do Flávio Dino” e reclamavam do indiciamento de pessoas que nem sequer haviam sido ouvidas.

Respondendo a uma crítica comum ao documento de 1.333 páginas, seu presidente, Arthur Maia (União-BA), reconheceu que “pode ser que [a CPI] não traga nada de novo, mas trouxe a verdade na praça pública, porque aqui não há sigilo”.

Até aí, jogo jogado. Quem já acompanhou uma CPI sabe que é um fórum político por excelência. Por isso mesmo, não é irrelevante que o relatório final tenha recomendado o indiciamento de 29 militares e PMs, incluindo oito generais e dois ex-comandantes das Forças Armadas de Bolsonaro: o almirante Almir Garnier e o general Marco Antônio Freire Gomes.

Nunca houve tantos militares enredados numa CPI na História do Brasil. Não deixa de ser um feito, considerando o esforço de comandantes e parlamentares de todos os matizes para evitar constranger os fardados.

Bruno Boghossian - Excesso de confiança na CPI levou oposição a cair na própria armadilha

Folha de S. Paulo

Bolsonaristas insistiram em comissão, apostaram em teorias conspiratórias e foram derrotados

Jair Bolsonaro (PL) anunciou que abraçaria a missão quando voltasse ao Brasil depois de uma temporada nos EUA. "Estamos focados na CPI dos atos do dia 8 de janeiro", disse o ex-presidente, no fim de março. "Esperamos muito que haja a CPI para levantar isso aí. Foi uma armadilha feita pela esquerda."

A oposição via a Comissão Parlamentar de Inquérito como uma ferramenta para borrar impressões digitais, espalhar alguma confusão e alimentar teorias conspiratórias que pintavam os ataques golpistas como um trabalho interno da esquerda.

A segurança com que deputados e senadores alinhados a Bolsonaro lideraram a coleta de assinaturas para criar a comissão foi o sinal de que eles acreditavam que seria possível dominar as investigações e provocar desgastes ao governo Lula (PT). Meses depois, os oposicionistas caíram no próprio alçapão.

Míriam Leitão - A bússola dos economistas

O Globo

O mercado errou muito em suas projeções sobre o desempenho da economia brasileira este ano, admite Fernando Honorato, do Bradesco

Os economistas estão errando muito em relação à economia brasileira? Sim, estão. Quem admite isso comanda um dos principais departamentos econômicos do país, o do Bradesco. O economista Fernando Honorato dá até a dimensão do erro. Este ano, o próprio banco teve uma mudança de dois pontos e meio entre o que previa de crescimento do PIB no início e o que prevê agora. O banco projetava 0,5% e está fechando o ano com quase 3%. O mercado errou nas projeções da inflação também. Depois de insistir que o IPCA estouraria a meta, agora a metade dos economistas já aposta que não vai estourar. No FMI, o Brasil foi a maior surpresa, diz Honorato. Em abril o Fundo previa 1% de alta do PIB e em outubro pulou para 3%.

Celso Ming – O que esperar agora?

O Estado de S. Paulo

Fatores novos devem mexer com a economia

A guerra de Israel contra o Hamas tomou conta das apreensões gerais, mas seu impacto sobre a economia global, além da escalada dos preços do petróleo, ainda não está claro. Isso já não é pouca coisa, como parece admitir o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates: “Se a guerra piorar, será a tempestade perfeita”. Mas é cedo demais para levar esse efeito em conta.

Mas há fatores novos que devem mexer com a economia neste resto do ano.

O primeiro deles são as boas surpresas que vêm da China. As últimas informações divulgadas pelo seu Escritório Nacional de Estatísticas dão conta de que o PIB da China cresceu 4,9% no terceiro trimestre deste ano em comparação com o terceiro trimestre de 2022 – acima das expectativas que cravavam um avanço de 4,3%. Ainda não há notícias sobre como o governo de Pequim enfrentará a grave crise da construção civil, mas há indícios de que algum pacote salvador está a caminho. Como o mercado da China é grande absorvedor de commodities, o Brasil poderá tirar bom proveito disso.

Maria Cristina Fernandes - Na ONU, o jogo de um só derrota a paz

Valor Econômico

Só por desconhecimento ou má-fé se pode imaginar que a rejeição da resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas tenha sido derrota brasileira

Só por desconhecimento ou má-fé se pode imaginar que a rejeição da resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas tenha sido derrota brasileira. Se mal-intencionados não se curam, há um lote de razões para resgatar os primeiros.

Foram 12 votos, com uma folga, portanto, de três para a aprovação, impedida pelo veto americano. Entre os votos favoráveis estão França e China. O primeiro precisa de uma mediação para conter atentados que prosperam no país. O segundo optou por fortalecer uma proposta que teve como principal contendor, os EUA.

Entre os favoráveis à resolução constam ainda dois aliados americanos, Japão e Emirados Árabes, único país árabe no CSNU e signatário do acordo de Abraão, com EUA e Israel.

Reino Unido absteve-se porque sua diplomacia segue o compasso da americana, e Rússia porque revidou a abstenção brasileira em sua proposta a despeito de o Brasil ter apoiado suas emendas nessa quarta.

Luiz Carlos Azedo - Quando uma boa ideia começa a dar errado

Correio Braziliense

"Biden, que enfrenta dificuldades na campanha à reeleição, vem se revelando um falcão com a crise em Gaza", avalia jornalista sobre a atuação do presidente dos EUA na drise humanitária do Oriente Médio

A crise humanitária na Faixa de Gaza, em meio à guerra entre Israel e o Hamas, a organização que assumiu o controle do território quando o Exército israelita dele se retirou, expõe a olho nu a crise que a Organização das Nações Unidas (ONU) atravessa, desde a invasão do Iraque pelos Estados Unidos, em 2003. À época, essa foi uma das respostas do governo norte-americano ao atentado da Al Qaeda às Torres Gêmeas de Nova York, em 11 de setembro de 2001, a pretexto de que o ditador iraquiano Sadam Hussein estava produzindo armas químicas — cujos laboratórios nunca foram encontrados. Desde então, apesar das sucessivas intervenções militares do Ocidente, os grupos terroristas e fundamentalistas só aumentaram sua influência no Oriente Médio.

Ontem, depois de muitas negociações entre os 15 integrantes do Conselho de Segurança da ONU, os EUA vetaram a proposta de resolução que garantiria ajuda humanitária efetiva à população civil de Gaza, submetida a intensos bombardeios desde o ataque terrorista do Hamas ao território israelense. Foi o único país a se manifestar contra a ajuda humanitária das Nações Unidas.

Míriam Leitão - Veto dos EUA não é derrota do Brasil, é da diplomacia

O Globo

Foi um banho de água fria para quem achava que a diplomacia poderia fazer o seu trabalho nessa guerra entre Hamas e Israel

Os Estados Unidos vetaram a resolução apresentada pelo Brasil no Conselho de Segurança da ONU para o conflito entre Israel e Hamas, em um banho de água fria para quem achava que a diplomacia poderia fazer o seu trabalho nessa guerra. Não é derrota do Brasil, é da diplomacia

Era uma proposta muito equilibrada, que tentou atravessar todas as dificuldades para construir o consenso: condenava os ataques do Hamas, pedia a liberação de reféns e propunha uma pausa humanitária, sem falar em cessar-fogo, o que poderia incomodar os EUA.

Na visão americana, um cessar-fogo significaria não dar a Israel, que foi atacado, o direito de se defender, apesar de já haver seis mil mortos na região dos dois lados.

Eugênio Bucci* - Quando a guerra vira entretenimento

O Estado de S. Paulo

As plateias não se informam sobre os acontecimentos – elas se empanturram e se dopam, insaciáveis

À medida que a tragédia se adensa no Oriente Médio, o destampatório performático triunfa e cega. A cada lance obscuro e trágico, mais se excitam os espectadores, em sua superficialidade chapada e esfuziante. As redes sociais entram em alvoroço, as plateias repetem palavras de ordem lacrimosas e a carnificina se converte em melodrama pungente e barulhento. Essa gritaria feita de platitudes altissonantes e insensíveis é a prova definitiva de que “não há limites para a insânia”, como dizia um velho jornalista. A opinião pública entra em demência.

Um ser racional – esse tipo em extinção – pode até vislumbrar, por teimosia, uma esperança tímida num acordo de paz para a Faixa de Gaza e suas redondezas, mas não terá nenhuma ilusão de que o bom senso terá vez sobre a face da Terra. A guerra avança como um estranho e mórbido entretenimento participativo. Essa é a nossa maior danação.

William Waack - Não há boas opções para EUA e Israel

O Estado de S. Paulo

O que existe são estratégias militares sem estratégias políticas

Joe Biden exortou Israel a não se deixar consumir pela raiva trazida pelas atrocidades terroristas do Hamas. E, assim, evitar “erros” que os Estados Unidos cometeram depois do 11 de Setembro.

Foi um clássico conselho do faça o que eu digo, mas não faça o que eu fiz. O então senador Joe Biden, que presidia a Comissão de Relações Exteriores do Senado americano, foi um dos 77 que autorizaram o presidente George W. Bush a empregar força militar no Iraque. A invasão de 2003 é considerada um dos maiores desastres estratégicos da história americana, e o preço é pago até hoje.

O problema é que, no momento atual, não há boas opções nem para os Estados Unidos nem para Israel, a quem Joe Biden literalmente abraçou. Os americanos são vistos na região como cúmplices dos israelenses, sem condições de atuar como “mediador honesto”. Mas se dissociar de Israel está fora de cogitação.

Vinicius Torres Freire - Ajuda para Gaza vai criar um campo de refugiados faminto e lotado

Folha de S. Paulo

Caminhões do Egito vão poder levar víveres para palestinos, mas situação seguirá desesperadora

Um grande caminhão-pipa pode carregar 20 mil litros d'água. Em uma situação de "emergência humanitária", um mínimo do mínimo de água tratada por pessoa seria de 7,5 litros por dia, segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde) —para beber e comer, basicamente.

Dada a população de Gaza, estimada em 2,23 milhões, seriam necessárias 835 viagens de caminhões-pipa, por dia, para que as pessoas tivessem ao menos aquela ração mínima de água para situações de catástrofe —guerra, terremoto, furacão etc.

Essa aritmética rudimentar do horror serve para ilustrar um comentário sobre a possibilidade de que caminhões de ajuda humanitária ora no Egito entrem em Gaza, por permissão de Israel.

A tripa de terra sitiada tira quase toda sua água de poços e de dessalinização, parados porque a única usina elétrica do território parou, por falta de diesel industrial (que vinha de Israel); o fornecimento da empresa de água de Israel obviamente parou também.

Maria Hermínia Tavares - A vitória dos extremistas

Folha de S. Paulo

Uns e outros só se saciarão com o aniquilamento do inimigo

Há uma história por trás do massacre de israelenses pelo Hamas e da guerra terrível que certamente se seguirá à barbárie do 7/10.

É a história do fracasso de uma saída negociada capaz de permitir a convivência de dois povos que consideram seu o mesmo pedaço de terra —uma derrota devastadora para todos quantos por ela se bateram e nela ainda acreditam.

Pelo menos duas oportunidades foram perdidas. A primeira, em 1947, quando os países árabes rejeitaram a proposta de partilha da Palestina. Em consequência, no ano seguinte, tentaram varrer do mapa o recém-criado Estado de Israel. É bom que se diga: os territórios então destinados aos árabes dali eram maiores do que os em disputa hoje.

Ruy Castro - A vida em vão

Folha de S. Paulo

A guerra no Oriente Médio começou como de vida ou morte para os dois lados. Mas ambos já perderam

Perdi quase 20 amigos na pandemia. Tão ruim quanto nunca mais vê-los era pensar que estavam morrendo na época mais triste da nossa história, num Brasil que jamais teriam imaginado chegar àquele ponto ---a caminho de uma ditadura pior que a de Getulio (1937-45) e a dos militares (1964-85).

O país a que dedicaram a vida, certos de que um dia teríamos desenvolvimento com liberdade, riqueza com justiça social e alegria com responsabilidade, não podia ser o de Bolsonaro. A morte naquele momento, e em condições tão cruéis, era a derrota, a sensação de que tinham vivido em vão.

Poesia | História pátria. Ascenso Ferreira. Allan Sales

 

Música | HABANERAS DE CADIZ ( Versión Son Cubano ) Sanamé y su Son