terça-feira, 1 de setembro de 2015

Opinião do dia - André Lara Resende

A crise política agrava a crise econômica provocada por uma política econômica anacrônica e equivocada, a partir de 2008. A crise financeira nos países centrais foi usada para justificar o aumento irresponsável dos gastos públicos. Sob pretexto de implementar uma política anticíclica keynesiana, partiu-se para uma demagógica política de subsídios, transferências e aumento dos gastos do governo que quebrou o Estado. A crise política e a revelação da corrupção institucionalizada se sobrepõem às dificuldades da economia. O quadro é muito complicado. Ainda não é possível ver como será revertido.
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André Lara Resende, economista, é um dos pais do Real em entrevista: ‘Mais pobres são os mais afetados por recessão’. O Globo, 31 de agosto de 2015.

Governo busca aval do Congresso para cobrir rombo de R$ 30 bi no Orçamento

• Projeto de lei de 2016, com previsão de déficit, propõe aumento de impostos e corte de gastos em programas sociais para equilibrar as contas; ministros pedem ajuda ao Parlamento; Dilma se reúne com líderes da base aliada e conversa por telefone com Renan

Tânia Monteiro, João Villaverde, Isadora Peron e Daniel Carvalho - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Com déficit no Orçamento de R$ 30,5 bilhões e sem alternativa para bancar os gastos públicos, a presidente Dilma Rousseff decidiu nesta segunda-feira, 31, buscar no Congresso aval para o projeto de lei orçamentário de 2016 que aumenta impostos de celulares e bebidas, entre outros, além de cortar gastos em programas sociais vitrine de sua gestão, como o Ciência Sem Fronteiras, que terá R$ 1,4 bilhão a menos no próximo ano, e o Pronatec.

A opção de dividir com deputados e senadores os danos políticos do projeto foi decidida na reunião da coordenação política do governo logo pela manhã no Palácio do Planalto, quando houve a defesa da mobilização do Legislativo para promover uma espécie de “reforma estrutural emergencial” a fim de tentar encontrar recursos para melhorar as contas públicas, pelo menos em 2016. O crescimento da economia foi reduzido de 0,5% para 0,2% no próximo ano.

À tarde, os ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento) apresentaram a proposta, que contém o rombo bilionário inédito, e explicitaram a estratégia.

Barbosa sugeriu a participação do Congresso na busca da saída para a crise. O ministro disse que o governo tem trabalhado em “soluções” para o déficit de R$ 30,5 bilhões – indicando medidas para controle dos gastos da Previdência – e citou a importância de envolver o Congresso no processo. 

“São medidas que precisam ser construídas com o diálogo e com o Congresso, passando pelo fórum com as centrais sindicais para discutirmos a Previdência Social, depois faremos o mesmo com o setor da saúde e já estamos fazendo isso com o funcionalismo.”

Levy sugeriu ainda a participação “da sociedade” e disse que, “com diálogo”, a “equação Brasil” terá solução. “Essa é a minha convicção. Essa equação, não só as agências (de rating), mas a população toda, vai ajudar a resolver.”

Cunha e Renan. Após a apresentação do Orçamento do próximo ano, Dilma se reuniu separadamente com líderes da base na Câmara e no Senado. Deputados sugeriram que ela vá até o Congresso defender a proposta. A ideia foi refutada pelo ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e pelo líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE). Mas, segundo relatos, Dilma se mostrou simpática à proposta. Ela também agendou um encontro nesta terça à tarde no Planalto com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), seu desafeto político, para tratar do assunto.

O primeiro sinal positivo à mobilização do governo veio com a declaração do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que está se reaproximando do Planalto. “O Orçamento de 2016 com o déficit tem de mobilizar a todos – Congresso, governo e sociedade – para que se encontre uma saída para o País”. A postura do presidente do Senado animou o Planalto e Dilma pediu o empenho de todos no governo para melhorar a relação com o PMDB.

Antes do envio da proposta orçamentária deficitária ao Congresso, Dilma fez questão de falar por telefone com Cunha e com Renan, para apresentar a situação crítica das contas públicas e pedir ajuda para que não sejam criadas novas despesas e derrubados vetos presidenciais que elevem gastos como o aumento de 56% para o Judiciário. O governo quer o apoio do Congresso para encontrar saídas para as chamadas “reformas estruturais emergenciais”, que aumentem a arrecadação.

O rombo previsto só não é maior porque o governo cortou despesas em programas como o financiamento estudantil (Fies) e anunciou a redução no ritmo da nova fase do Minha Casa Minha Vida e nos projetos do Programa de Aceleração do Crescimento, além de diminuir subsídios ao Plano Safra e aos investimentos de empresas.

Caso tivesse bancado a volta da CPMF, que renderia uma arrecadação de cerca de R$ 70 bilhões, o governo enviaria uma proposta orçamentária não só sem déficit fiscal, mas com um pequeno superávit. A opção “realista”, pode, no entanto, colocar em risco o selo de “grau de investimento” do Brasil nas agências internacionais de rating. Esse selo garante a investidores internacionais que o País é seguro.

Dilma mandou Levy anunciar o déficit ao lado de Barbosa

• Foi a presidente que deu a ordem para que os ministros da Fazenda e do Planejamento fizessem juntos o comunicado

Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Foi a presidente Dilma Rousseff que arbitrou a disputa interna e também deu a ordem para que os ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento) anunciassem, lado a lado, a proposta de Orçamento de 2016, com déficit primário de R$ 30,5 bilhões.

Derrotado nas discussões que culminaram com a apresentação de um projeto escancarando a previsão de desequilíbrio fiscal, Levy pretendia sair da reunião desta segunda-feira, 31, da coordenação política, no Planalto, e viajar para São Paulo, onde faria palestra no Fórum Exame. O anúncio do Orçamento de 2016 seria feito apenas por Barbosa.

Dilma não autorizou a saída “à francesa” de Levy, que foi obrigado a cancelar o compromisso. Sob argumento de que uma nova ausência do titular da Fazenda poderia alimentar especulações sobre demissão, num momento em que o governo assume fragilidade na economia, a presidente mandou Levy aparecer ao lado de Barbosa.

Em maio, o titular da Fazenda deixou o colega do Planejamento anunciar sozinho o corte de R$ 69,9 bilhões em gastos públicos. Levy queria tesourada maior e perdeu. À época, alegou estar com “forte gripe” para não comparecer à entrevista.

Agora, Levy defendia um corte maior de despesas, da ordem de R$ 15 bilhões. Dilma vetou. Nas reuniões para fechar o Orçamento, o titular da Fazenda foi contra o governo explicitar o déficit e admitir que vai gastar mais do que prevê arrecadar em 2016. Disse que o sinal negativo poderia pôr em xeque a recuperação econômica e provocar a perda do grau de investimento do País.
Barbosa, por sua vez, acreditava que a recriação da CPMF poderia ajudar a sair dessa encalacrada, além de financiar a saúde. Sem apoio de políticos e empresários, porém, o governo recuou na batalha da CPMF. Nessa disputa, todos perderam um pouco, mas Levy foi o maior derrotado.

Governo prevê deficit de R$ 31 bilhões e aumento de tributos

• Dilma faz apelo a aliados para elevar receitas e evitar 'rombo fiscal'

Dilma aposta no PMDB para reduzir deficit no Orçamento

• Proposta entregue ao Congresso com rombo inédito é mal recebida pelo mercado

• Governo propõe aumentos de impostos e ainda conta com deputados e senadores para recriar a CPMF

Natuza Nery, Eduardo Eucolo, Isabel Versiani, Marina Dias, Mariana Haubert e Valdo Cruz – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Sob ataque pesado do mercado financeiro e isolado politicamente, o governo apresentou nesta segunda-feira (31) sua proposta de Orçamento para 2016 com um deficit inédito de R$ 30,5 bilhões, apostando no apoio do PMDB para tentar reduzir o rombo no Congresso.

O saldo negativo nas contas do governo projeta um cenário ainda mais sombrio para a economia brasileira no ano vem e reforça a expectativa de que o país perderá em breve o selo de bom pagador das agências internacionais de classificação de risco.

A primeira reação dos investidores foi muito pessimista. A notícia de que o governo apresentaria o Orçamento com deficit derrubou o principal índice da Bolsa brasileira e contribuiu para a alta do dólar durante o dia.

Apesar de o governo ter prometido que o Orçamento apresentaria um retrato mais realista do estado das contas públicas, os números se baseiam numa previsão de crescimento de 0,2% em 2016, enquanto as projeções do mercado indicam queda de 0,5%.
A proposta do governo inclui aumentos de tributos que ainda precisam ser aprovados pelo Congresso e receitas com vendas de ativos que podem não se concretizar, no valor total de R$ 50 bilhões.

O Orçamento também prevê cortes de despesas em programas federais, incluindo o Ciência sem Fronteiras, uma das bandeiras do primeiro mandato de Dilma Rousseff.

Como não haverá dinheiro suficiente para bancar a meta original de superavit primário, a economia necessária para o pagamento dos juros da dívida, o governo agora tentará convencer o Congresso, que é comandado pelo PMDB, a buscar soluções para promover um aumento extraordinário de receitas.

O buraco de R$ 30,5 bilhões, equivalente a 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto), é resultado do fraco desempenho da economia e da desistência do Planalto de recriar um imposto sobre transações financeiras nos moldes da antiga CPMF, que foi extinta em 2007. A forte oposição de políticos e empresários fez cair a única chance de evitar que as contas fechassem no vermelho.

Ministros da presidente Dilma esperam que a Câmara e o Senado possam criar uma contribuição semelhante à CPMF, exclusiva para a saúde e que seria compartilhada com Estados e municípios.

Saídas
Horas depois de entregar sua proposta ao Congresso, a própria presidente fez um apelo para que sua base no Congresso ajude a construir "saídas para o rombo fiscal".

"O deficit pode ser eliminado de diversas formas", afirmou o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, durante entrevista para explicar a proposta de Orçamento. "Vamos construir soluções para o aumento de receita e diminuição de despesas".

Ele disse que será preciso encontrar caminhos para lidar com questões difíceis como despesas obrigatórias, especialmente os gastos com a Previdência Social, que devem subir de R$ 89 bilhões neste ano para R$ 125 bilhões.

"Isso significa discutir qual é o cenário de evolução do gasto da Previdência, quais são as fontes e usos de recursos para a saúde, qual é a política de longo prazo para o funcionalismo público, que são as principais despesas obrigatórias da União", disse.

Os aumentos de tributos sugeridos pelo governo em sua proposta serão detalhados nesta terça (1º). O principal é a revisão da isenção de PIS/Cofins para computadores, tablets e smartphones, que depende do Congresso.

O governo propõe também que sejam revistos a isenção de IOF nos empréstimos do BNDES para infraestrutura, o IR sobre direitos de imagem e o IPI de bebidas como vinhos e destilados, na fabricação nacional e importação.

Governo assume risco de criar impasse político

• Rombo pode levar o Congresso a atrasar a votação do Orçamento e, com isso, aumentar a incerteza do mercado

Gustavo Patu – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Em pouco mais de quatro meses, a equipe econômica que a todo momento prega "realismo" apresentou três projeções disparatadas para o saldo das contas do Tesouro Nacional em 2016.

Em abril, o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias enviado ao Congresso previa uma poupança de R$ 104,6 bilhões para o abatimento da dívida; em julho, a meta despencou para R$ 34 bilhões; apenas um mês depois, um deficit de R$ 30,5 bilhões.

Se o exército de técnicos do Executivo calcula com tamanha imprecisão as perspectivas para uma economia que se deteriora rapidamente, é difícil imaginar como um Legislativo sem liderança vá produzir um Orçamento equilibrado até dezembro.

Ao desistir de propor a volta da CPMF e transferir a tarefa de fechar as contas fiscais a deputados e senadores, o governo Dilma Rousseff assumiu o risco de criar um impasse político –capaz de atrasar por meses a aprovação da lei orçamentária e agravar a incerteza do mercado credor e investidor.

Com a redemocratização do país, o Congresso ganhou novos poderes para deliberar sobre a programação das despesas federais, mas nunca quis saber de discutir prioridades e muito menos buscar fontes palpáveis de recursos.

A prática histórica dos parlamentares se limita a incluir no Orçamento despesas destinadas a demandas miúdas de seus redutos eleitorais, justificadas com estimativas fantasiosas de receitas extras.

No restante do cotidiano legislativo, os partidos preferem apoiar medidas de apelo popular e empresarial: em geral, mais benefícios sociais e novas vantagens tributárias setoriais. A responsabilidade de negociar limites e vetar excessos é do Executivo.

O experimento de esperar do Congresso Nacional um remendo fiscal de emergência acontece enquanto a dívida pública dispara –de 53% do PIB (Produto Interno Bruto), no início de 2014, para 65% agora, a caminho dos 70%– e o Palácio do Planalto não consegue controlar sua base de apoio.

Deficit pode crescer
A política de metas fiscais, iniciada em 1999, tinha o papel de dar alguma previsibilidade à trajetória futura das contas públicas. Se já havia caído nos últimos anos, essa previsibilidade ficou mais perto de desaparecer agora.

Não será surpresa se mesmo o projeto deficitário de Orçamento venha a se mostrar otimista: o texto lista quase R$ 50 bilhões em receitas ainda obscuras.

Estão nesse grupo R$ 37,3 bilhões em recursos a serem obtidos com a venda de imóveis, de ações de estatais, concessões de serviços públicos, leilão da folha de pagamento e cobrança de dívidas.

Expectativas de recursos do gênero são recorrentes em estimativas orçamentárias, e os resultados concretos têm sido invariavelmente abaixo do previsto. Num cenário de recessão, as chances de sucesso na venda de patrimônio são ainda menores.

Outros R$ 11,2 bilhões viriam de aumento de tributos incidentes sobre artigos e operações tão diferentes quanto computadores e tablets, bebidas alcoólicas, direitos de imagem e financiamentos do BNDES.

São otimistas, ainda, as novas projeções da equipe econômica para os gastos com os juros da dívida pública –a despesa que cresce mais rapidamente neste ano.

Estimam-se encargos equivalentes a 7,2% do PIB em 2015 e 6,2% em 2016. No período de 12 meses encerrado em julho, a conta ficou em 7,9% do produto.

Proposta para o Orçamento assusta mercado

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O dólar bateu R$ 3,68 e a Bolsa chegou a cair 3,4% com a proposta de Orçamento prevendo deficit de R$ 30,5 bilhões para 2016. O receio dos investidores é que isso leve as agências de classificação de risco a retirar o chamado grau de investimento do Brasil, espécie de selo de bom pagador da dívida, ainda neste ano.

Segundo Newton Rosa, economista da SulAmerica Investimentos, a proposta não fazia parte do cenário esperado pelas agências. "Aumentou o risco de rebaixamento neste ano; mas se não for neste ano, será no próximo. O governo tem um problema estrutural de aumento de gastos muito acima das receitas", disse.

No final do dia, porém, o dólar à vista (referência no mercado) reduziu o ritmo da alta e terminou negociado a R$ 3,633, subindo 1,34%. Em agosto, a moeda teve alta de 6,21%, a maior para o mês desde 1999. O dólar comercial, usado no comércio exterior, fechou a R$ 3,629, com alta de 1,17% no dia e de 5,96% no mês.

Já a Bolsa caiu 1,12%, fechando o dia com 46.625 pontos. Em agosto, o Ibovespa recuou 8,33%, maior desvalorização mensal do índice desde dezembro de 2014.

Governo prevê aumento de gasto e alarma o mercado

Por Ribamar Oliveira, Edna Simão, Eduardo Campos, Lucas Marchesini e Leandra Peres

BRASÍLIA - O projeto de lei do Orçamento para 2016 chegou ao Congresso com déficit de 0,5% do PIB, ou R$ 30,5 bilhões, e elevação das despesas totais. Não houve corte de gastos e os aumentos de impostos concebidos na proposta, de R$ 11,2 bilhões, não são suficientes para financiar o rombo nas contas do governo.

As despesas obrigatórias crescem R$ 88,3 bilhões, ou 0,4% do PIB, na comparação com o previsto para este ano. As discricionárias (que o governo tem liberdade para cortar) aumentam R$ 16,5 bilhões, ou 0,8% em termos reais. Só o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) terá mais R$ 7,2 bilhões.

O governo vai rever a desoneração do PIS/Cofins de computadores, tablets e smartphones, elevar a tributação de bebidas quentes, como destilados e vinhos, e elevar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nos financiamentos do BNDES.

Esses tributos, porém, não são suficientes para financiar o gasto e o governo espera que deputados e senadores lhe deem um imposto provisório por um ano, já que Dilma desistiu de pedir a recriação da CPMF.

O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, informou que o governo vai encaminhar ao relator da Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) um pedido para que a meta fiscal do setor público para o próximo ano seja novamente revista, pela terceira vez, saindo de um superávit de 2% do PIB para 0,7% do PIB e, agora, para um déficit de 0,34% - resultado de 0,5% de déficit do governo central e de superávit de 0,16% de Estados e municípios.

A percepção de aumento do risco fiscal empurrou o dólar a novas máximas em 12 anos: fechou em alta de 1,18%, a R$ 3,6275, após chegar a R$ 3,6831. As taxas dos contratos de Depósito Interfinanceiro (DI) de longo prazo também testaram máximas nunca vistas e o risco-país medido pelo Credit Default Swap de cinco anos bateu 360 pontos-base, novo pico em mais de seis anos. O Ibovespa caiu 1,12%, a 46.625 pontos, com queda acumulada de 6,76% no ano.

Proposta de Orçamento para 2016 prevê alta de R$ 104,8 bi nas despesas
O governo encaminhou ontem a proposta orçamentária para 2016 com aumento de despesas e elevação de tributos. As despesas obrigatórias crescem R$ 88,3 bilhões, ou 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB), na comparação com o previsto para este ano. As discricionárias (aquelas que o governo tem liberdade para cortar) aumentam R$ 16,5 bilhões, ou 0,8% em termos reais, o que representa uma alta de R$ 104, 8 bilhões na despesa total. Somente o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) terá mais R$ 7,2 bilhões.

Para acomodar a elevação dos gastos, o governo informou que vai rever a desoneração do PIS/Cofins de computadores, tablets e smartphones, aumentar a tributação de bebidas quentes, como destilados e vinhos, e aumentar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nas operações de crédito do BNDES. Com essas novas medidas tributárias espera arrecadar mais R$ 11,2 bilhões no próximo ano.

O aumento da receita, no entanto, não será suficiente para tornar o Orçamento equilibrado. O Congresso recebeu uma proposta que prevê um déficit primário (ou seja, receitas menos despesas) de R$ 30,5 bilhões ou 0,5% do PIB. É a primeira vez que isso acontece na história contemporânea.

O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, informou que o governo vai encaminhar ao relator da Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) para 2016 um pedido para que a meta fiscal do setor público para o próximo ano seja novamente revista. Inicialmente fixada em superávit primário de 2% do PIB, ela foi reduzida em julho para um superávit 0,7% e agora para um déficit de 0,34% do PIB. "Esperamos que o déficit seja temporário", disse Barbosa. Na proposta do governo, o superávit primário será de 1,7% do PIB em 2017.

Como o déficit do governo central (que compreende o Tesouro, a Previdência e o Banco Central) será de 0,5% do PIB, os Estados e municípios farão, portanto, um superávit primário de 0,16% do PIB. Dependendo do resultado primário deste ano, a política fiscal em 2016 desenhada na proposta orçamentária poderá ser expansionista.

Algumas receitas previstas pelo governo colocam em dúvida a consistência da proposta orçamentária. Em primeiro lugar, há uma estimativa de receita de R$ 27,3 bilhões com a venda de ativos da União. Essa é uma arrecadação que não se realizou em anos anteriores. Para 2015, está previsto apenas R$ 3 bilhões e, mesmo assim, é provável que ela não aconteça. O governo anunciou que vai vender participações acionárias "não prioritárias da administração direta e indireta" e alienar imóveis e direitos de domínio da União.

Não há também previsão para a receita com a regularização dos recursos enviados ao exterior de forma ilegal por brasileiros. Essa receita estava prevista para este ano, mas nenhuma das Casas do Congresso sequer iniciou a votação da matéria, que, portanto, deverá ficar para 2016.

Outra variável que afeta a receita é o crescimento da economia. A área econômica havia anunciado que o governo passaria a trabalhar com os parâmetros macroeconômicos de mercado, informados no relatório Focus, editado pelo Banco Central. Para 2016, no entanto, isso não será observado, pois enquanto os analistas do mercado preveem uma retração da economia de 0,40%, a peça orçamentária foi elaborada com a projeção de crescimento de 0,2%.
Além disso, a comparação de aumento da arrecadação no próximo ano foi feita com base na previsão de receita para este ano que consta do relatório de avaliação do terceiro bimestre. A previsão, no entanto, já estaria superestimada. Assim, a projeção de crescimento da arrecadação no próximo ano pode ser maior do que consta da proposta orçamentária.

Na proposta orçamentária, o governo estimou que o valor do salário mínimo a partir de janeiro de 2016 será de R$ 865,50, um aumento de 9,83%. Os salários dos servidores do Executivo serão reajustados em 5,5%. Os funcionários do Judiciário e o Ministério Público da União terão aumento maior para os seus salários, resultante de acordo entre o governo e o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski.

Mesmo com a redução da desoneração da folha de pagamento das empresas, aprovada neste ano pelo Congresso, a expectativa do governo é que o déficit da Previdência chegue a R$ 124,9 bilhões em 2016 - alta de 40,5% em relação à última projeção para este ano, de R$ 88,9 bilhões. A previsão para o déficit do regime próprio dos servidores federais é de R$ 70 bilhões em 2016, ante os R$ 68,4 bilhões esperados em 2015.

Apesar das mudanças nas regras do seguro-desemprego e do abono salarial, as despesas do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) crescerão 20,1%, atingindo R$ 55 bilhões, ante R$ 45,8 bilhões previsto para este ano.

Barbosa afirmou que a proposta orçamentária para 2016 é "realista" e que o governo fez "um sério esforço de contenção de despesas obrigatórias, dentro do que permite a lei". Segundo ele, o principal desafio fiscal agora é "conter o crescimento das despesas obrigatórias" da União. Ele e o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, anunciaram que o governo quer, por meio do diálogo e da negociação, "construir propostas para um ajuste fiscal de longo prazo".

Até que essas mudanças estruturais do gasto aconteçam, pois dependem de medidas legislativas, Levy disse que é necessário "construir uma ponte segura", que dê ao governo "as receitas, mesmo que sejam ações temporárias ou provisórias", dando a entender que o governo poderá aceitar a elevação de tributos por tempo determinado. Para o ministro da Fazenda, se "houver ambiguidade" com relação à necessidade de sustentabilidade fiscal, "fica mais difícil garantir o crescimento"


Dilma transfere para o Congresso a gestão das finanças públicas

Por Claudia Safatle - Valor Econômico

BRASÍLIA - Sem aceitar cortes e sem apoio político para aumentar as receitas, a presidente Dilma Rousseff transferiu para o Congresso Nacional a responsabilidade precípua do Executivo de comandar a gestão das finanças públicas.

Ontem, os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, entregaram o projeto de lei do Orçamento para 2016 ao presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), com um "buraco" de 0,5% do PIB - equivalente a R$ 30,5 bilhões - para que deputados e senadores decidam o que fazer.

Dilma nem tentou cortar as despesas. Na proposta, fechada no domingo, as despesas tanto obrigatórias quanto discricionárias crescem; as receitas caem. O Orçamento foi elaborado pressupondo crescimento de 0,2% da atividade econômica e inflação de 5,4%. As expectativas do mercado indicam continuidade da recessão para o próximo ano e o Banco Central prevê inflação de 4,5% no fim do exercício.

Depois de desistir, na sexta feira, da recriação da CPMF, ontem surgiu a ideia de discutir com os parlamentares a criação de um imposto emergencial, com prazo de vigência de um ano. Proposta semelhante foi feita pelo ex-ministro Delfim Netto, como uma transição para que o governo tenha tempo para cortar seus gastos. Mesmo Delfim, porém, acha que assim como a CPMF, é uma alternativa que não passa no Congresso.

A questão da CPMF, aliás, foi um capítulo à parte que deixou em delicada situação tanto o vice-presidente, Michel Temer, quanto o ministro da Fazenda. Por desconhecer as intenções do Palácio do Planalto, Temer atribuiu a "burburinhos" as informações publicadas nos jornais, na semana passada, de que o Orçamento previa a volta da CPMF.

Levy, que era contra essa alternativa, acabou por justifica-la e defendê-la, em evento da BM&F, em Campos de Jordão, quando o governo já anunciava a desistência de propor o retorno do imposto do cheque. Ali o ministro da Fazenda falou, também, de um programa econômico mais amplo e, na política fiscal, do necessário foco na "racionalização do gasto obrigatório e discricionário, sem ambiguidades".

Agora, com o primeiro Orçamento deficitário da história contemporânea do país, Levy disse que pretende construir, com o Legislativo, medidas legais para financiar o "rombo" nas próximas semanas e meses. A intenção é mexer nos gastos obrigatórios, sobretudo com uma reforma da previdência com a fixação da idade mínima.

Para políticos de partidos aliados, Dilma era e continua sendo a ministra da economia e, como tal, comanda a política fiscal e o Orçamento da União com "voluntarismo". Foi assim na gestão de Guido Mantega na Fazenda e continua assim hoje, segundo esses observadores atentos do modo de governar da presidente da República.

Para economistas do setor privado, a presidente Dilma está montando "o seu próprio precipício". Isso porque ela está mostrando que não pretende controlar a trajetória da dívida pública como proporção do PIB.

Sem atribuir a devida importância ao principal indicador de solvência - a dívida/PIB - a presidente está consolidando as condições para uma piora do risco país, para a elevação da taxa de juros do mercado e mais desvalorização do câmbio. O CDS (Credit Default Swap), que mede o risco país, ontem era de 263 para a Turquia, que não é "grau de investimento", e de 350 para o Brasil.

Nos prognósticos desses economistas, a retração da atividade este ano pode chegar a 3% e se estender para 2016, com a repetição de PIB negativo da ordem de 1%. Se isso se confirmar, o país poderá ter a taxa de desemprego de até 12% no primeiro trimestre de 2016.

Depois de uma retração de 1,9% do PIB no segundo trimestre deste ano, a expectativa é que no terceiro trimestre a contração chegue a 2,5% em comparação com o período imediatamente anterior.

Governo eleva impostos, mas não evita rombo

• Proposta de Orçamento para 2016 prevê buraco de R$ 30,5 bi

Temer diz que situação é ‘ extremamente preocupante’ e que não há estratégia; aliados elogiam o que chamam de transparência, e oposição fala até em devolver ao Executivo o texto enviado ontem ao Congresso

Pela primeira vez na História, o governo enviou ontem ao Congresso uma proposta de Orçamento em que prevê gastar mais do que deve arrecadar no ano que vem, deixando um déficit de R$ 30,5 bilhões. O texto propõe aumento de impostos sobre eletrônicos, bebidas e operações do BNDES. Para o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, será necessário “enfrentar” os gastos obrigatórios, como Previdência e salários do funcionalismo. O vice- presidente Michel Temer disse que não há estratégia para conseguir receita. O relator- geral do Orçamento, deputado Ricardo Barros ( PP), propôs reavaliar o reajuste dos servidores no próximo ano. A presidente Dilma se reuniu com líderes aliados na Câmara e disse que está disposta a ir ao Congresso para explicar o Orçamento. Parlamentares governistas elogiaram o que chamaram de transparência na proposta orçamentária, enquanto a oposição estuda tentar devolver o texto ao Executivo.

A conta ainda não fecha

• Nem com estimativa de elevação de impostos governo consegue tirar rombo em orçamento

Martha Beck, Cristiane Jungblut, Bárbara Nascimento, Catarina Alencastro, Júnia Gama e Washington Luiz - O Globo

- BRASÍLIA- A solução para o rombo das contas públicas em 2016 virá de mais aumento de impostos ( além dos R$ 11, 2 bilhões previstos no texto do orçamento) e exigirá corte de gastos obrigatórios do governo, como despesas com Previdência e funcionalismo, entre outros. Essa foi a indicação dada ontem pela equipe econômica ao encaminhar ao Congresso um projeto de lei orçamentária que prevê um déficit primário de R$ 30,5 bilhões, ou 0,5% do Produto Interno Bruto ( PIB, soma de bens e serviços produzidos no país), para o ano que vem.

O texto já prevê aumento da tributação para bebidas quentes ( como destilados e vinhos), do Imposto sobre Operações Financeiras ( IOF) para operações de crédito do BNDES, do Imposto de Renda ( IR) sobre direito de imagem e uma revisão da desoneração do PIS/ Cofins para computadores, tablets e smartphones. Isso deve render aos cofres públicos uma receita adicional de R$ 11,2 bilhões em 2016. No entanto, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, disse que para cobrir o rombo será preciso propor mudanças na legislação que permitam cortar despesas obrigatórias, como as com saúde, educação e Previdência, esta última o maior gasto do governo.

— Existem várias formas de reduzir esse déficit ao longo do ano, mas isso envolve principalmente uma atuação sobre os chamados gastos obrigatórios da União. Qualquer atuação sobre um gasto obrigatório necessita de uma proposta legal, uma proposta de lei, uma PEC. Ou seja, precisa ser construído com a sociedade, principalmente com o Congresso — defendeu Barbosa.

Já o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, disse que é preciso fazer sacrifícios e indicou que pode ser necessário adotar medidas adicionais temporárias para solucionar o atual quadro fiscal. Até sábado o governo estudava recriar a CPMF por um período de quatro anos.

— A gente vai precisar de uma ponte segura de estabilidade fiscal para chegar lá. Com receita para cobrir as despesas nesse curto prazo. Podem ser ações temporárias. Esta é a discussão que esse orçamento provoca — afirmou Levy.

O relator- geral do Orçamento de 2016, deputado Ricardo Barros ( PP- PR), irá propor que seja “reavaliado” o reajuste dos servidores no próximo ano. Segundo o relator disse ao GLOBO, a estimativa é que o reajuste consuma R$ 15 bilhões do Orçamento, quase a metade do déficit previsto pelo governo.

— A iniciativa privada está cortando muito, demitindo muito, e o setor público não pode demitir. Só com isso ( reavaliação do reajuste), já resolveria metade do problema. É uma questão de não disponibilizarmos esse recurso no Orçamento. O governo não pode dar o reajuste se não tiver previsão no Orçamento — disse.

Barros diz que será preciso negociar o tema com os líderes parlamentares e que a decisão final sobre isso não dependeria do governo. O deputado irá se reunir na manhã de hoje com Nelson Barbosa para debater as alternativas de corte.

No fim da tarde, a presidente Dilma Rousseff se reuniu com os líderes da base aliada na Câmara e disse aos deputados que estaria disposta a ir ao Congresso para explicar a proposta orçamentária. Dilma conversou com os parlamentares para tentar garantir apoio na aprovação da proposta e do plano plurianual 2016- 2019, também entregue ontem. Dilma ainda aproveitou a reunião para pedir que o Congresso não derrube os vetos presidenciais a reajustes de servidores e ao fim do fator previdenciário. Eles serão analisados pelo Congresso na próxima quarta- feira. Dilma alegou que os vetos não podem ser derrubados porque isso “desestruturaria de vez” o Brasil.

A presidente também afirmou ser impossível dar neste momento os aumentos que as categorias de servidores estão reivindicando. Após recuar sobre a recriação da CPMF, Dilma teria descartado, segundo relatos, aumento de impostos. Disse aos líderes que está aberta a sugestões de incremento das receitas não tributárias, mas que não incluíssem vendas de ativos de “setores estratégicos”, como a Petrobras.

O Orçamento da União de 2016 prevê ainda um salário mínimo de R$ 865,50 e uma inflação de 5,4% ao ano. A meta fiscal de 2016 já havia sido revisada em julho para 0,7% do PIB, mas diante da dificuldade em cortar gastos e da queda nas receitas, o governo teve que rever o número, que agora é deficitário. Na proposta encaminhada ao Legislativo, o governo também reviu para baixo a estimativa de crescimento do ano que vem: de 0,5% para 0,2% — ainda assim acima das estimativas do mercado, de uma retração de 0,4%.

No Congresso, a avaliação é que o governo aposta em algumas ações para tentar reduzir o rombo, principalmente a aprovação do projeto de repatriação de recursos do exterior e a venda de ativos de empresas estatais, sem a perda do controle acionário. Participantes das negociações apontaram essa alternativa. Barbosa disse que a proposta entregue ontem inaugura um “novo ciclo orçamentário”:

O ministro do Planejamento afirmou que a Lei de Responsabilidade Fiscal ( LRF) estabelece que o governo tem que enviar o Orçamento com uma meta fiscal, e não importa se ela é positiva ou negativa. Segundo ele, o fato de o governo encaminhar uma proposta que prevê déficit não significa que o Brasil vá perder o chamado grau de investimento.

Déficit é resultado de uma combinação de equívocos

• Política falha de desonerações e subsídios, desatenção com gastos públicos, falta de reformas e contabilidade criativa provocaram o estouro da bomba fiscal

Martha Beck - O Globo

BRASÍLIA - O movimento inédito de entregar ao Congresso Nacional uma proposta orçamentária prevendo déficit nas contas públicas em 2016 não chega a surpreender quem acompanhou de perto a política fiscal do governo Dilma Rousseff nos últimos anos. O quadro atual foi resultado de uma combinação de equívocos.

De um lado, o governo tentou estimular a economia com desonerações e subsídios que, na prática, só conseguiram derrubar a arrecadação tributária. De outro, não atacou os gastos públicos e nem tocou em reformas cruciais, como a da Previdência Social. Para piorar, corroeu a credibilidade da economia abusando da chamada contabilidade criativa e do artificialismo nas tarifas administradas.

Com isso, em quatro anos, foi construída uma bomba fiscal que, agora, estoura nas mãos da equipe econômica no pior momento possível, em que a presidente está fragilizada e enfrenta uma crise política aguda.

O recolhimento de impostos continua em queda livre e, como a economia está em recessão, não há uma melhora possível para esse quadro no curto prazo. Só resta ao governo rever toda a política de incentivos que foi adotada no passado e propor aumento de tributos.

Do lado dos gastos, é preciso lidar com um Orçamento em que as despesas obrigatórias respondem por nada menos que 79,3% do total. Segundo o projeto encaminhado ontem ao Legislativo, os gastos da União terminarão 2016 em R$ 1,210 trilhão, sendo que, deste total, R$ 960,2 bilhões são obrigatórios, o que inclui a Previdência Social e a folha de pessoal.

No caso da Previdência, em particular, a recessão econômica ainda levou a uma combinação perversa. De um lado, queda na arrecadação da contribuição previdenciária e, de outro, a exigência legal de reajustar a maior parte dos benefícios dos aposentados e pensionistas pela correção do salário mínimo.

Isso, no entanto, não quer dizer que o governo esteja completamente refém do Congresso Nacional para conseguir fazer reduções significativas nos gastos. Há espaço para enxugar a máquina pública, o que tem um efeito simbólico sobre as expectativas.

Se a equipe econômica simplesmente transferir para o Legislativo a responsabilidade de equilibrar o Orçamento, vai criar mais instabilidade.

Quem conhece o Congresso sabe que medidas muito impopulares, como não reajustar o salário do funcionalismo ou aumentar impostos, dificilmente sairão do papel nesse quadro de crise política, o que só tende a aumentar a desconfiança do mercado financeiro sobre o Brasil.

Ministros em descompasso

• Ao falarem sobre o Orçamento, Levy e Barbosa revelam suas diferenças: o primeiro diz que governo tem desafio de cortar gastos, o segundo afirma que reduções adicionais cabem ao Congresso

Simone Iglesias, Fernanda Krakovics e Martha Beck - O Globo

BRASÍLIA - Com o país em recessão, o ministro Joaquim Levy ( Fazenda) disse que o governo tem de ser firme ao cortar gastos, mas Nelson Barbosa ( Planejamento) alegou que agora cabe ao Congresso decidir sobre eventuais cortes. Aentrevista para divulgar a proposta orçamentária de 2016 foi o retrato da falta de sintonia na equipe econômica. Os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, já chegaram para o encontro com os jornalistas com cara de poucos amigos e demonstrando claro desconforto entre eles.

A falta de entendimento também ficou clara no discurso proferido por cada um. Para falar sobre a necessidade de cortar ainda mais os gastos públicos, tese que defendeu até o último minuto no debate sobre o Orçamento de 2016, Levy destacou que há riscos em ter um discurso ambíguo e que é preciso ter cuidado para não se promover um relaxamento fiscal.

— Eu acredito firmemente na necessidade da sustentabilidade fiscal e que se deva encontrar os meios para tanto. Eu acho que se houver ambiguidade em relação a isso fica mais difícil a gente garantir o crescimento. Se a gente não quer mero corte de despesas, tem que ser acompanhado com um programa sério de aumento de eficiência do gasto. É um trabalho bastante forte que tem que ser feito. É desafio do governo. Desafio da sociedade.

Já Barbosa fez questão de ressaltar várias vezes que corte de gastos mais significativo não está nas mãos apenas do governo, mas do Congresso:

— Sim, é possível diminuir gastos públicos. Nós estamos empenhados nisso. Nós estamos com gastos nominais inferiores aos de dois anos atrás. Se nós levarmos em conta a inflação, esse gasto de R$ 250 bilhões propostos para 2016, ele é inferior ao verificado em 2012. Isso dá uma dimensão do esforço de contenção de gastos discricionários que o governo está fazendo. Reduções adicionais dependem de mudanças de lei.

De fiador do 2 º mandato de Dilma, Levy se transformou num mal ainda necessário. Com a credibilidade arranhada no Congresso, no mercado e no governo, ele segue no comando porque pior agora seria substitui- lo. Integrantes do governo relataram ao GLOBO que, internamente, há decepção com o desempenho de Levy. Esperava- se que o ministro conseguisse “blindar” o governo da avaliação ruim das agências de risco e emplacar medidas austeras com mais habilidade.

Levy iria a São Paulo ontem. Pela manhã, durante a reunião da coordenação política, foi decidido que deveria ficar em Brasília. Mas a entrevista foi dada num local “neutro”, o Planalto, e não no Planejamento, como de costume.

— Levy e Barbosa juntos é a fotografia que interessa ao governo — disse um auxiliar presidencial.

Depois de sua terceira derrota, aliados afirmam que Levy precisa “reconhecer a realidade” e levar em conta as variáveis políticas, e não só as econômicas.

— Levy não está perdendo a queda de braço, ele está precisando é reconhecer a realidade. O Orçamento tem que ser verdadeiro, a situação é de aperto, senão ninguém se engaja na solução — disse o senador Romero Jucá ( PMDB- RR).

Além da previsão de déficit no Orçamento de 2016, Levy já havia sido derrotado na redução da meta fiscal e no tamanho dos cortes no Orçamento deste ano, que foram menores do que defendia. Levy preferia cortes mais profundos no Orçamento de 2016, em vez da previsão de déficit.

— Ele ia fazer o quê? Acabar o Bolsa Família? Não pagar aposentado? — questionou um aliado.

Integrantes do governo minimizam a insatisfação de Levy. Dizem que, na previsão de déficit no Orçamento, ele marca posição contrária para não ser responsabilizado em caso de perda do grau de investimento. Parlamentares reclamam que Levy é “mais realista do que o rei” e não compreende que o governo vive crise de governabilidade.

— Daqui a pouco, ele está que nem o ( Guido) Mantega ( ex- ministro da Fazenda), que falava e ninguém acreditava — disse um parlamentar.

Comissão mista exigirá que governo aponte cortes

• Deputados e senadores se negam a aprovar aumento de impostos

Cristiane Jungblut, Júnia Gama e Maria Lima - O Globo

- BRASÍLIA- Integrantes da Comissão Mista de Orçamento ( CMO) se negam a assumir o desgaste de aumentar impostos e vão cobrar que o governo admita a responsabilidade de indicar quais programas deverão sofrer cortes antes da votação, até dezembro, da proposta orçamentária para 2016. O relator do Orçamento, deputado Ricardo Barros ( PPPR), disse que o Congresso tentará adotar medidas para reverter o déficit de R$ 30,5 bilhões previsto, mas defendeu que as emendas parlamentares sejam preservadas.

— As emendas parlamentares atendem às prioridades dos municípios. São ações que têm impacto, que geram recursos no interior. É melhor cortar juros. Até porque juro é nada, é vapor. O Congresso, discutindo com a sociedade, vai tentar equilibrar a conta até o final do ano — argumentou Barros.

Alternativas são sugeridas
O deputado Paulo Pimenta ( PT- RS), um dos quatro petistas que integram a CMO como membros titulares, disse que uma das alternativas seria o governo simplesmente não fazer cortes e emitir títulos da dívida para cobrir o déficit. O deputado frisou que a discussão ainda é prematura e que o Congresso tem até dezembro para definir o que será feito.

— Há uma gama muito grande de possibilidades para a busca de receitas alternativas, não é só corte que resolve. Por exemplo, ampliar o percentual de endividamento, como Fernando Henrique Cardoso fez, emitindo títulos. Se nada for feito, será o caminho natural. É uma estratégia de desenvolvimento — disse Pimenta.

O deputado Giuseppe Vecci ( PSDB- GO), que também faz parte da CMO, apontou as receitas “não tributárias” como forma de cobrir o déficit. O deputado defende que o governo desestatize ativos para conseguir fechar as contas.

— Nessa situação de crise, a receita tributária cai, mas existem receitas que não são tributárias. É necessário ter coragem para resgatar isso. A margem de manobra do governo é pequena. Reduzir ministérios é algum esforço, mas o governo vai ter que trabalhar na recuperação de dívida, na venda de ativos e ações, desestatizar um pouco — defendeu o deputado.

A CMO deve se reunir hoje para avaliar a proposta do governo e alternativas apresentadas pelos deputados e senadores que a integram.

O senador Walter Pinheiro ( PT- BA), integrante da CMO, disse que ninguém sabe ainda o que fazer, mas afirmou que o governo agrava a crise ao jogar para o Congresso a responsabilidade de cobrir o buraco orçamentário. Ele disse que cobrará que o Planalto assuma a redução do PIS/ Cofins e unificação do ICMS.

Líder do PP e também integrante da CMO, o senador Benedito de Lira ( AL) afirmou que aumentar impostos está fora de cogitação:

— O caminho é desativar programas que têm pouca visibilidade, que só atendem a interesses corporativistas.

Mercado eleva previsão de queda do PIB neste ano e em 2016

• De acordo com boletim Focus, retração de 2015 deve chegar a 2,26%

Gabriela Valente, Martha Beck - O Globo

- BRASÍLIA- Depois de o IBGE confirmar que o Brasil está em recessão, os analistas do mercado financeiro aumentaram a dose de pessimismo para o desempenho da economia neste ano e no próximo. Na pesquisa semanal Focus, divulgada pelo Banco Central, a previsão de queda do Produto Interno Bruto ( PIB) aumentou de 2,06% para 2,26%. Para o ano que vem, a previsão de recessão passou de 0,24% para 0,4%.

— Se até 2017 a gente não tiver um cenário de volta cíclica, vai ser complicado. E nem estou falando de crescimento sustentável. Estou só falando de inflação em queda, câmbio estabilizado e volta do crescimento. Essa sinalização ajudaria a manter o grau de investimento dado pelas agências de risco, se é que isso é possível — avaliou Zeina Latif, economistachefe da XP Investimentos.

Tanto o mercado quanto o governo esperam uma retomada do crescimento da economia daqui dois anos. Os analistas apostam em alta de 1,5%, e a equipe econômica prevê 1,7%. Mas há um longo caminho até lá. O Banco Central terá de lidar com a inflação de duas vezes o percentual fixado como meta.

O objetivo do governo era fazer o Índice de Preços ao Consumidor Amplo ( IPCA) ficar em 4,5%, mas a taxa de deve chegar a nada menos que 9,28% neste ano. Para 2016, a aposta é de 5,51%. São previsões que ficaram praticamente estáveis em relação ao levantamento da semana passada.

Efeito da crise política
A deterioração das expectativas de atividade vem a reboque da crise política. Como em outras vezes neste ano, as projeções pioraram depois de semanas turbulentas. Foi o caso dos dias que antecederam a pesquisa do BC, feita na sextafeira. Além do dado oficial de recessão, o governo deixou vazar que recriaria a CPMF, o antigo imposto do cheque, num sinal de que não vê como levantar mais receitas, já que a economia está em crise. Já o anúncio de que o Orçamento foi encaminhado ao Congresso com déficit ainda não foi captado na pesquisa.

Para os integrantes da equipe econômica, a recessão de 2015 era esperada e se deve à combinação do fim da política fiscal expansionista com a operação Lava- Jato, que bateu em cheio nos investimentos na infraestrutura. Entre os técnicos, a avaliação é que o crescimento dos últimos anos foi muito dependente do gasto público.

— Luz no fim do túnel só quando a crise política arrefecer— admitiu um técnico.
Para o economista- chefe da corretora Gradual, André Perfeito, o mercado financeiro está “assustadíssimo” com o quadro político e pode piorar as estimativas. Ele diz que o desafio do governo agora é provar que o Brasil é capaz de voltar a crescer para atrair investimentos, porque a nova equipe econômica já provou que é capaz de fazer ajustes e não compactua com a maquiagem do passado.

— Tem de mostrar que a gente pode crescer. A gente está com uma casa que tem um buraco no teto e as pessoas estão discutindo a posição dos móveis. Não tem cabimento — criticou o analista.

Freire: Proposta de Orçamento com déficit afronta a lei e deveria ser devolvida pelo Congresso

Presidente do PPS afirma que decisão de Dilma indica 'grave crise de governabilidade'

Por: Assessoria do Parlamentar

A decisão de Dilma Rousseff de encaminhar ao Congresso Nacional uma proposta de Orçamento da União para 2016 com uma previsão de déficit é uma “irresponsabilidade” e gera grande preocupação em todo o país. A avaliação é do deputado federal Roberto Freire (SP), presidente nacional do PPS, que criticou a medida nesta segunda-feira (31).

“O ineditismo do governo Dilma, ao enviar para o Congresso um orçamento com déficit, causa preocupação aos parlamentares e brasileiros em geral. Isso indica a grave crise de governabilidade que assola o país e a irresponsabilidade da presidente da República ao não observar a exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal, que trata da obrigatoriedade de envio de um orçamento equilibrado”, afirmou o parlamentar.

“Arrisco a dizer que o Congresso Nacional deveria devolver [o projeto] com déficit para que o próprio Executivo exerça aquilo que é sua responsabilidade: fazer os cortes e ajustes que se impõem para o equilíbrio orçamentário.”

Depois de desistir da criação de um imposto sobre transações financeiras nos moldes da antiga CPMF, o governo petista teria optado por enviar um “orçamento realista e transparente”, em decisão informada pela própria Dilma em reunião com líderes aliados.

“A incapacidade que o governo teve de definir os cortes necessários para fazer um Orçamento equilibrado, tentando colocar no colo do Congresso a responsabilidade por equilibrar o Orçamento, me parece algo que fere a Lei de Responsabilidade Fiscal. Isso precisa ser mais bem analisado pelo Parlamento brasileiro”, prosseguiu Freire.

“Vou além: quem sabe, Dilma não está superando as pedaladas fiscais que circulam no TCU e, de moto, enviando diretamente o crime de responsabilidade fiscal para o Congresso”, ironizou o presidente do PPS.

Para oposição, orçamento com deficit desrespeita lei e comprova crise

Débora Álvares, José Marques – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA,BELO HORIZONTE - Lideranças de oposição criticaram nesta segunda-feira (31) o envio do projeto do Orçamento 2016 com previsão de deficit. Com avaliações de que a peça desrespeita a Lei de Responsabilidade Fiscal, a avaliação é de que o governo jogou no colo do Congresso a responsabilidade de encontrar uma fonte de receita que suporte o rombo nas contas.

Nesta tarde, os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, entregaram o documento ao presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), com a previsão de deficit primário de R$ 30,5 bilhões, 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto).

O presidente nacional do PSDB Aécio Neves disse que a ação terá "consequências preocupantes" e pode resultar no rebaixamento da nota de crédito do Brasil.

O senador mineiro afirmou que o governo demonstra que não conseguiu fazer o "essencial": cortes na máquina pública.

"E o governo sequer consegue apresentar ao Congresso Nacional uma proposta de orçamento equilibrada", afirmou o senador. "A presidente da República quer dividir com o Congresso Nacional uma responsabilidade que seria exclusivamente dela: fazer os cortes, fazer os ajustes e equilibrar as contas."

Presidente do DEM, o senador José Agripino (RN) avalia que, ao assumir o deficit, o governo se mostra refém da dívida interna e das elevadas taxas de juros. "O governo é prisioneiro de dois monstros que ele próprio criou: dívida interna chegando em R$ 3 trilhões e taxa de juros passando dos 14%".

Na avaliação do democrata, a peça explicita crime contra a Lei de Responsabilidade Fiscal.

O líder do partido na Câmara, Mendonça Filho (PE), classificou a situação como a "consagração de um desastre econômico". "É uma irresponsabilidade fiscal que foi praticada com fins eleitorais e que hoje produz uma situação grave do ponto de vista do desequilíbrio nas contas públicas".

Para o deputado do DEM, o cenário demonstra uma aproximação cada vez maior da redução da nota de classificação de risco do Brasil.

Já o presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), defendeu que o Congresso devolva a peça orçamentária. "Arrisco a dizer que o Congresso Nacional deveria devolver [o projeto] com deficit para que o próprio Executivo exerça aquilo que é sua responsabilidade: fazer os cortes e ajustes que se impõem para o equilíbrio orçamentário."

Para Freire, a peça enviada "causa preocupação aos parlamentares e brasileiros em geral" e demonstra "a irresponsabilidade da presidente de não observar a exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal, que trata da obrigatoriedade de envio de um orçamento equilibrado".

O deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), líder da minoria na Câmara, disse que a iniciativa demonstra que o governo "fez qualquer coisa para vencer as eleições".

"Há uma grande possibilidade de perdermos, a qualquer momento, o grau de investimento. Isso significa impacto nas contas, mais juros e, seguramente, uma conta maior para o contribuinte pagar. Estamos pagando o preço de um governo que assumiu qualquer custo para vencer as eleições".

O tucano afirmou ainda que o governo deveria, pelo menos, ter enviado o Orçamento com a definição das fontes de corte. "O governo sempre inventou de administrar receitas. Agora que não tem mais espaço, joga para o Congresso a obrigação de cortar despesas", destacou o deputado

Araújo prevê que o governo vai pressionar os parlamentares a mostrarem que não há outra saída para as contas públicas a não ser aumento de tributos.

Déficit configura irresponsabilidade fiscal, diz oposição

• Para parlamentares, medida é desrespeito à LRF; presidente de PPS e Solidariedade querem que Renan devolva o projeto ao Executivo

Daiene Cardoso e Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Líderes da oposição no Congresso classificaram ontem de irresponsabilidade fiscal a decisão do governo de enviar o Orçamento de 2016 com uma previsão de déficit e já estudam barrar a iniciativa. Com o argumento de que a medida fere a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), os oposicionistas cogitam a possibilidade de recorrer ao Supremo Tribunal Federal ou fazer pressão ao presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), para devolver a proposta.

O presidente do DEM, senador Agripino Maia (RN), pediu uma avaliação de sua assessoria jurídica para saber se a decisão do Executivo desrespeita a LRF. “O inédito Orçamento deficitário explicita crime contra a Lei de Responsabilidade Fiscal. O pior de tudo é que, ao invés de fazer o que os brasileiros estão fazendo, apertar o cinto, o governo insiste em passar para o povo a conta dos seus desmandos”, criticou Agripino.

Devolução. O presidente do PPS, deputado Roberto Freire (SP), e a bancada do Solidariedade na Câmara defendem que Renan devolva ao Executivo o projeto com déficit. Em março, Renan devolveu a medida provisória que acabava com a política de desonerações, uma das principais do ajuste fiscal.

“O Congresso deveria devolver (o projeto) para que o Executivo exerça aquilo que é sua responsabilidade: fazer os cortes e ajustes que se impõem para o equilíbrio orçamentário”, disse Freire. “O art. 4º da LRF prevê o equilíbrio entre receitas e despesas. Tal princípio é utilizado por todas as famílias brasileiras, ou seja, você planeja seus gastos a partir das receitas previstas”, disse o Solidariedade, em nota.

O líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), afirmou que a peça é a “consagração de um quadro de desastre econômico” e da “irresponsabilidade fiscal” do governo. O líder da oposição na Câmara, Bruno Araújo (PSDB-PE), lembrou que é a primeira vez que um governo envia um Orçamento “já prevendo um desfalque no seu caixa”. “O fato que torna mais grave essa nova investida da presidente contra as finanças nacionais é que ela traz embutida uma possível desobediência à Lei de Responsabilidade Fiscal por não haver equilíbrio entre receitas e despesas da União.”

‘Realidade’. O advogado-geral da União, ministro Luís Inácio Adams, rebateu a oposição e disse que não acredita em sucesso de eventual recurso ao STF para anular a proposta. “Não acredito porque não há ineditismo. O ineditismo está no fato de que estamos num período de frustração fiscal de ordem econômica e não econômica de não se atingir o que se deseja. O que é inédita é a realidade, não a admissão jurídica da possibilidade (de ocorrer o déficit)”, disse.

Adams afirmou ainda que os oposicionistas tentam politizar uma questão jurídica. “Existe uma politização que estão tentando desenvolver no ambiente jurídico, mas juridicamente não vejo essa inconstitucionalidade.”

Para a presidente da Comissão Mista de Orçamento, senadora Rose de Freitas (PMDB-ES), a proposta, pelo menos, não foi “maquiada” ou traz “números longe da realidade da crise do País”. “A peça não tem nenhum acréscimo para agradar esse ou aquele setor político, para ficar bem na foto”, afirmou a senadora após receber os ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento).

O senador Romero Jucá (PMDB-RR), que tem tido uma atuação independente, elogiou a transparência. “O governo chega ao fundo do poço e delimita o poço”, disse Jucá, que foi relator do Orçamento deste ano.

‘ Nem eu nem o governo temos uma estratégia’, diz Temer

• Vice considera déficit ‘ extremamente preocupante’, mas afirma ter certeza de que Dilma vai governar ‘ até o fim’

Thiago Herdy e Letícia Fernandes - O Globo

- RIO E SÃO PAULO- Em entrevista exclusiva ao GLOBO, o vice- presidente Michel Temer ( PMDB- SP) disse ontem ter “absoluta certeza” de que, mesmo com todo o desgaste a que é submetido o governo, a presidente Dilma Rousseff e ele vão governar “até o fim” do mandato. Antes, porém, em evento em São Paulo pela manhã, Temer reconheceu que o governo não tem “estratégia” para equacionar o déficit da proposta de Orçamento enviada ao Congresso, e que o envio do Orçamento com esse rombo é “extremamente preocupante”.

Temer disse que a elevação da carga tributária não é uma boa solução para o problema — “ninguém quer isso, ninguém suporta isso” —, e que, mesmo que as propostas “ainda estejam surgindo”, setores da sociedade e dos Poderes vêm apontando o “corte de despesas da máquina estatal” como a melhor forma de lidar com o problema, medida também defendida pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

— A primeira ideia é essa. Como nós vamos construir isso, confesso que nem eu nem o governo temos uma estratégia determinada — admitiu o vice- presidente em SP.

Ele, no entanto, defendeu a decisão do envio da proposta com déficit por considerá- la forma de garantir a “transparência absoluta das questões orçamentárias”, sem que tenha havido maquiagem:

— O Orçamento com déficit é coisa extremamente preocupante. Mas por que registrou o déficit? Primeiro, para registrar a transparência absoluta das questões orçamentárias. Ou seja, não há maquiagem nas contas.

Mais tarde, de passagem pelo Rio, onde gravou entrevista para um programa do Canal Brasil, Temer disse que tem “absoluta certeza de que a chapa vai até o fim ( do mandato)”:
— Não acho, não ( que Dilma corra perigo de não terminar o mandato). Acho que essas coisas são naturais na democracia, esses embates são rotineiros.

Temer evitou comentar a declaração do expresidente tucano Fernando Henrique Cardoso, que disse, no dia 17 de agosto, que Dilma deveria fazer uma mea- culpa ou renunciar. Para Temer, foi apenas uma “declaração política”. O vice- presidente voltou a afirmar que a petista conseguirá governar “com tranquilidade”, ainda que enfrente embaraços naturais em qualquer governo: — A presidente tem condições de continuar a governar com tranquilidade. É claro que haverá sempre embaraços no governo, isso é natural. Mas isso não deve nos assustar e não assusta a presidente. É uma declaração política, não faço comentários a respeito disso — afirmou.

Perguntado pelo GLOBO se concordava com a avaliação do Planalto de que o envio do Orçamento de 2016 ao Congresso, com déficit estimado em R$ 30,5 bilhões, teria um “efeito pedagógico” sobre os parlamentares — que poderiam colaborar para conter as pautas- bomba —, o peemedebista afirmou que a transparência do Orçamento será útil no Congresso, e causará o efeito esperado pelo governo.

— Acho que isso vai fazer com que todos colaborem exatamente para superar o déficit, é isso que vai acontecer. Acho que houve uma transparência que será útil causando esse efeito ( de segurar as pautas- bomba) — respondeu Temer, que apenas deu um sorriso ao ser questionado se será possível “segurar” o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ).

Para o peemedebista, é preciso construir uma solução conjunta para o problema econômico, que envolva principalmente o Congresso.

— O melhor era que a transparência se desse ( logo) e disséssemos: precisamos do apoio de todos os setores da economia brasileira. No particular, do Congresso. Temos que construir juntos uma solução para a crise econômica — disse Temer, mencionando o risco de rebaixamento da nota de investimento do país, em função da explicitação do rombo nas contas, como algo “péssimo para o Brasil”.

Risco de derrota “fragorosa”
Temer confirmou ainda ter dito a Dilma, no último sábado, que era contra a proposta de voltar a cobrar a CMPF ( Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), polêmico imposto para a Saúde extinto em 2007, como forma de elevação da arrecadação do governo. A ideia foi sepultada no fim de semana, devido a resistências à proposta. Para Temer, a ideia resultaria em uma “derrota fragorosa no Congresso Nacional”. O vice- presidente disse que ponderou, junto a Dilma, que não poderiam “se dar ao luxo” de sofrer tamanha derrota política.

— Muitas vozes se levantaram contra, eu próprio fiz considerações à senhora presidenta, dizendo: “Eu acho que não pode ser feito dessa maneira”. Nós precisamos preparar o ambiente, que é como se faz em ambientes democráticos. Caso contrário, nós vamos ter uma derrota fragorosa no Congresso Nacional. A esta altura, não podemos nos dar ao luxo de ter derrotas fragorosas de natureza política no Congresso.

Temer defendeu o “trabalho em conjunto” e a busca da “harmonia social e entre Poderes” como forma de alcançar o equilíbrio político de que o país necessita:

— É evidente que não adianta agir de cima para baixo, é preciso muitas vezes que as coisas venham de baixo para cima. Esse direcionamento é que faz muitas vezes que os Poderes do Estado se mobilizem.

O vice- presidente disse que, “se a base política ( do governo) não fosse tão instável, não estaríamos passando por tantas dificuldades”, e defendeu o reconhecimento dos erros como forma de lidar com o problema.

— Devo registrar que o governo vem fazendo o possível. Pode ser que erre. E acho que a melhor coisa quando erra é confessar o erro. Você não pode errar e dizer que não errou. O governo tem agido dessa maneira, não tem escondido esses fatos — afirmou.

Temer ponderou ainda que, “em momentos de absoluta tranquilidade”, os dirigentes podem considerar a defesa dos interesses de um partido ou do governo como prioridade.

— Mas há momentos, mais dramáticos, onde o maior valor é o país. Ao interpretar politicamente o tema, sou obrigado a sustentar que todos temos que nos unir em torno de um valor maior, que é o país — disse o vice.

A presidente tem condições de continuar a governar com tranquilidade. É claro que haverá sempre embaraços no governo, isso é natural. Mas isso não deve nos assustar e não assusta a presidente Michel Temer
Vice- presidente

Abilio Diniz pede conversa entre vice, Lula e FH

• Ministro Cardozo quer gesto de grandeza de líderes políticos para enfrentar crise

Ronaldo D’Ercole e Silvia Amorim - O Globo

- SÃO PAULO- O empresário Abilio Diniz, presidente do Conselho de Administração da BRF, disse ontem que o país vive uma crise que, embora atinja a economia, tem origem na política. E que, por isso, os principais líderes políticos, como os expresidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, à frente de PSDB e PT, além do vice- presidente Michel Temer, como principal dirigente do PMDB, precisam sentar e conversar em busca de um entendimento para tirar o país da atual crise política, que só faz aprofundar as dificuldades econômicas.

— A crise que vivemos hoje é uma crise política. Não considero esta uma crise econômica. As dificuldades da economia são consequência da política — disse Diniz, falando a uma plateia de empresários durante o Fórum Exame 2015. — Está na hora de nossos políticos se entenderem e pensar menos neles e nos seus partidos. Têm que pensar no Brasil. Os três principais líderes ( Lula, FH e Temer) têm que se fechar numa sala, jogar a chave fora e só sair de lá com uma solução.

Para Diniz, o Brasil é “uma empresa extremamente viável”, e, como acontece no setor privado, o governo também precisa ser mais “produtivo”.

— Não é que o Brasil seja ingovernável; o Brasil é “ingerenciável”, é muito complexo — disse, ironizando o fato de a presidente Dilma ter de despachar com 39 ministros.

Para Diniz, o fato de Lula não falar com FH é “coisa de namorado”. E não adianta os empresários ficarem pedindo a saída do ministro Joaquim Levy.

— Levy está entre o fogo cruzado. E está tentando fazer as coisas. Temos que ter entendimento político — insistiu, tirando aplausos da plateia. — É preciso reorganizar o país, mas isso só vai acontecer se os políticos se entenderem.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, também fez uma defesa enfática de um pacto político entre oposição e governo. Usando a mesma expressão adotada pelo ex- presidente Fernando Henrique Cardoso este mês, Cardozo cobrou um gesto de grandeza dos líderes políticos no momento de crise.

— Se as pessoas públicas quiserem ser maiores do que seus horizontes pessoais e políticopartidários, e jogarem na defesa do país, terão que ter a grandeza de se desprender de certas disputas e buscar pactuações que sejam favoráveis ao interesse público — afirmou Cardozo.

O ministro disse que não estava mandando recado a algum político em especial:

— É uma crítica generalizada aos partidos, inclusive ao meu.

Cardozo comentou que a conversa proposta por Dilma ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha, é “necessária”, e que a presidente está fazendo um “gesto de harmonia”. Ainda se referindo a um possível encontro dos dois, ele disse que “as forças políticas devem ter senso de responsabilidade e estarem juntas, deixando as disputas para momentos certos”.

O Orçamento com déficit é uma sinalização, segundo Cardozo, de que o governo quer dialogar. Sobre a hostilização sofrida domingo na Avenida Paulista, o ministro comentou:

— Pouco me importa se me cercam numa manifestação dizendo que não pode existir um ministro do PT chefiando a Polícia Federal.

FHC promete a PSOL ajudar pequenos partidos em reforma política

Por Cristiane Agostine – Valor Econômico

SÃO PAULO - O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) prometeu ajudar o PSOL a articular no Senado a alteração da proposta que veta a participação de partidos pequenos em debates na televisão durante as eleições. A medida está em debate no projeto de reforma política e pode ser votada hoje. Ontem, FHC reuniu-se com a direção do PSOL em seu instituto, em São Paulo.

Segundo a ex-deputada Luciana Genro (PSOL), candidata presidencial derrotada em 2014, que participou do encontro, Fernando Henrique se comprometeu a falar com os 11 senadores do PSDB e com o relator da proposta no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), para fazer com que a medida passe a valer depois das eleições de 2018.

"Ele prometeu nos ajudar a aprovar uma emenda no Senado para fazer com que a medida não interfira nas próximas eleições", disse Luciana Genro, integrante do comando nacional do partido, depois da reunião que durou cerca de uma hora. Participaram também o presidente nacional do PSOL, Luiz Araujo, o deputado estadual Carlos Giannazi (SP) e outros dirigentes do partido.

Apesar das críticas contundentes do PSOL às duas gestões de FHC, Luciana disse que o encontro foi "muito bom" e que o ex-presidente foi "muito receptivo" e "prometeu ajudar".

De acordo com o texto já aprovado na Câmara e na comissão que analisa a reforma política no Senado, nas eleições de 2018 só poderão participar dos debates na televisão os candidatos de partidos que elegeram em 2014 bancada federal com no mínimo nove parlamentares - atualmente têm direito os postulantes de legendas com pelo menos um deputado federal. Além disso, a participação deverá ter apoio de pelo menos dois terços das demais candidaturas.

Com isso, 12 dos 28 partidos que têm deputados federais não poderão participar (42,8% do total), incluindo o PSOL e o PV.

O PSOL pediu ajuda para FHC não só para adiar o início da medida, mas também para reduzir de nove para cinco o número mínimo de deputados federais para ter direito a participar dos debates. Na eleição de 2014, a sigla elegeu uma bancada federal com cinco parlamentares. "Mas ele [FHC] demonstrou simpatia só sobre a proposta de a medida não valer para as próximas eleições", disse Luciana. "É mais democrático, para não mudar as regras no meio do jogo".

Hoje, o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) deve procurar os senadores do PSDB para tentar convencê-los a derrubar ou modificar a proposta. O partido vê a bancada tucana no Senado como o "fiel da balança".

Na votação na Câmara, o PSOL recebeu apoio do PT mas não conseguiu derrubar a proposta, patrocinada pelo presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O PMDB deve votar contra a participação dos partidos pequenos em debates. Caso a proposta seja aprovada no Congresso, o PSOL deve pedir a intervenção do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, para pedir à presidente Dilma Rousseff que vete a medida.

O PSOL teme o impacto eleitoral da proibição de participar de debates na televisão. Na análise de Luciana, a medida irá "excluir" a legenda, porque o debate na televisão é o "único espaço onde os candidatos estão em uma situação igual, sem diferenças como o tempo de propaganda eleitoral ou recursos". "Tirar do debate é excluir a candidatura da disputa eleitoral".

Ao adiar para depois das eleições de 2018, Luciana disse que o partido poderá se preparar e mudar a estratégia eleitoral para tentar eleger uma bancada maior.

Integrantes do PSOL, como Luciana Genro, têm buscado uma aproximação com o ex-presidente tucano. Há poucos dias, a dirigente do partido reuniu-se com Fernando Henrique no instituto do tucano. Segundo Luciana, foi para gravar um depoimento para um documentário sobre a drogas.

Gilmar diz que despacho de Janot é 'infantil' e sugere atuação 'viciada' da PGR sobre Dilma

Entrevista. Gilmar Mendes, ministro do STF

• Em entrevista concedida em seu gabinete no Supremo Tribunal Federal (STF) ministro disse que a conduta da Procuradoria neste caso específico foi distinta da adotada em outras questões eleitorais

Beatriz Bulla e Talita Fernandes – O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O ministro Gilmar Mendes, vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), classificou como "ridículo" o despacho em que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, arquivou um pedido de investigação sobre a campanha que reelegeu a presidente Dilma Rousseff. O ministro disse que a fundamentação para o arquivamento "vai de infantil a pueril". Como revelou oEstado, no último dia 13, Janot decidiu arquivar uma notícia de fato que pedia a apuração de eventuais crimes cometidos na campanha eleitoral do PT em 2014, com relação a serviços prestados por uma gráfica.

Em entrevista concedida em seu gabinete no Supremo Tribunal Federal (STF) aoEstado, Gilmar Mendes disse que a conduta da Procuradoria neste caso específico foi distinta da adotada em outras questões eleitorais. "E aí vem com argumentos de pacificação social, até usando um voto meu. Ora, o Ministério Público a toda hora está pedindo cassação de mandato de vereadores, de prefeitos, de governadores, de senadores. Então isto (arquivamento) vale apenas para a campanha da presidente Dilma?", criticou.

Abaixo trechos da entrevista:

Estado: Como avalia o despacho do procurador-geral da República pelo arquivamento de uma das verificações para apurar trechos das contas de campanha da presidente?

Gilmar: Vem o despacho do procurador determinando o arquivamento, sintomaticamente no dia 13 de agosto, deve ser mera coincidência. E diz que não há o que investigar porque a campanha já se encerrou, quando nós não estamos falando de ilícitos eleitorais. Não tem nada a ver com este tema. O que nós estamos cogitando é de eventuais ilícitos criminais de ordem societária, falsidade e até estelionato contra a própria campanha. E vem com argumentos de pacificação social, até usando um voto meu. Ora, o Ministério Público a toda hora está pedindo cassação de mandato de vereadores, de prefeitos, de governadores, de senadores. Então isto vale apenas para a campanha da presidente Dilma?

Estado: Na sua avaliação, o critério adotado pelo procurador-geral para a investigação da presidente é diferente do usado em outros casos?

Gilmar: Por fatos muito menos graves, que nós conhecemos aqui no Supremo, muito menos evidentes, o procurador-geral tem aberto inquéritos. (…) O que surpreende é essa posição da procuradoria nesse caso específico. Porque se ela adotasse essa posição em todos os casos ela não poderia pedir a cassação de ninguém. Ela não poderia pedir a cassação de vereador, de prefeito, de senador, governador. Toda atuação da Procuradoria, no geral, não é no sentido de tirar a Justiça eleitoral do jogo político. Pelo contrário, é de provocá-la. Veja só estamos falando de investigação, ninguém está fazendo pré-julgamento. Pode ser até que em alguns casos desses a campanha tenha sido vítima. Desde logo não se pode oferecer uma blindagem, sobretudo em nome do prazo de 15 dias para impugnação.

Estado: Qual a avaliação da atuação da Procuradoria no processo de análise das contas da presidente?

Gilmar: A Procuradoria da República já atuou nesse processo de uma maneira bastante viciada. Quando o processo foi a mim distribuído, o procurador Eugênio Aragão (vice-procurador-geral eleitoral) entrou com agravo contra a distribuição juntamente com o PT. Tanto é que vocês vão ver na minha manifestação um claro repúdio, dizendo que isso seria em prol da candidata e que ele o fizesse publicamente, mas que fosse sentar na bancada de advogados e não na condição de procurador. Ele deu parece pela aprovação integral das contas, quando ele tinha outros critérios, já propôs a rejeição das contas de outros candidatos.

Estado: O fato de ter sido Janot e não Aragão que assinou o despacho sobre as contas da presidente faz alguma diferença?

Gilmar: Não tem o menor significado para nós. A Procuradoria que atue bem sob a pena de não ficar desmoralizada.

Estado: A PGR corre risco de ficar desmoralizada?
Gilmar: Ela tem que ter cuidados. Agora mesmo, o parecer é ridículo. Ele não tem sustentação jurídica. Recomendar ao eleitoral que aja de forma pacificada? Sabe o que isso representa? É como se a gente dissesse o seguinte: para resolver um conflito entre o sequestrador e a vítima a polícia não deveria intervir porque assim o sequestrador leva a vítima e com isso o assunto está resolvido.

Estado: O procurador-geral da República negou, em sabatina no Senado, qualquer tipo de"acordo político" nas investigações.

Gilmar: Não vou fazer psicografia de despacho. Não me cabe. Agora, que a fundamentação vai de infantil a pueril é evidente.

Estado: As investigações sobre a campanha da presidente continuam?

Gilmar: Em relação ao Tribunal isso vai continuar de uma maneira geral. Não haverá esse bloqueio de ações. Isso vai continuar sendo investigado pelos outros setores também. Veja, o Fisco de São Paulo está olhando, isso vai continuar sendo verificado.

Estado: O senhor cogita enviar mais informações sobre as contas para outros órgãos, após a decisão da PGR?

Gilmar: Não estou cogitando isso. Estamos em contato com a Polícia Federal e tudo mais. Agora, se a Procuradoria se tornar um órgão de advocacia partidária certamente nós temos que ser reflexivos.

Estado: A análise do TSE sobre as contas de campanha eleitoral se tornou mais rigorosa?

Gilmar:Até pouco tempo o exame das contas pela Justiça eleitoral era muito formal. Este exame formal muito provavelmente estimulava esse tipo de atitude (prática de irregularidades). "Ah, o TSE se contenta com um maço de papel" era a visão de todo mundo. Agora não. O propósito é de tão somente proceder o exame. Por isso acho temerário dar uma blidagem dessa. Dizer "ah, não houve ilícito. E se houvesse ja estaria prescrito". Vocês imaginam que se alguém tirasse dinheiro da campanha e mandasse matar alguém, a gente poderia dizer que o homicidio estava prescrito? E nem estou me lembrando de Celso Daniel (ex-prefeito de Santo André assassinado em 2002).

Estado: Qual a intenção de promover as investigações?

Gilmar: O que estamos querendo é constuir um modelo sério da justiça eleitoral. Tanto é que foi essa a minha preocupação. Estamos conversando com os parlamentares, discutindo o sistema. Estamos olhando o Brasil do futuro. (…) Qual foi meu argumento no caso da ação de impugnação de mandato? Os fatos são suficientemente graves e devem ser investigados. Só isso. Vai resultar em alguma coisa? Não é disso que se cuida. Veja, tem coisas graves sendo imputadas e seria bom até que se pudesse dizer que isso não houve na campanha. Exemplo: lavagem de dinheiro na campanha, doação de propinas que vieram da Petrobrás transformadas em doações legais. Seria bom que se pudesse dizer: "não, isso não houve", depois de uma investigação rigorosa.