À margem das negociações políticas formais que se desenvolvem no Congresso
para montar acordos nas principais votações, como a do novo Código Florestal,
ou até mesmo para a composição das bancadas na CPI do Cachoeira, há movimentos
de mais longo prazo nos bastidores partidários que indicam a possibilidade de
fusão de partidos, ou até mesmo a criação de novo partido que agrupe políticos
hoje dispersos por diversas siglas mas com proximidades forjadas no dia a dia
da política.
O senador Randolfe Rodrigues, do PSOL do Amapá, por exemplo, será um dos
membros da CPI em uma vaga que deveria ser ocupada pelo PSDB. Antes de aceitar,
ele procurara o PT pedindo a vaga, mas o pleito foi negado.
Também ao senador do PDT de Mato Grosso Pedro Taques foi oferecida uma vaga
da oposição, mas ele deve ser o representante de seu partido.
Essas aproximações têm menos a ver com afinidades partidárias e mais com
relações pessoais e objetivos políticos que se refletem na atuação dentro do
Congresso.
A preparação para a eleição presidencial de 2014 faz também um pano de fundo
importante para esses potenciais alinhamentos políticos.
Os dois senadores citados, por exemplo, são próximos do líder tucano Aécio
Neves, candidato potencial do PSDB à Presidência da República, e os três
costumam trocar ideias no plenário do Senado com mais facilidade entre si do
que com alguns membros de suas próprias siglas.
Exemplo típico dessa relação suprapartidária é a aproximação do PSD do
prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, com o PSB do governador de Pernambuco,
Eduardo Campos.
Embora a ligação formal mais evidente do PSB seja com o PT, os planos pessoais
do governador pernambucano em direção ao Palácio do Planalto não passam, no
médio prazo, pelo apoio do PT, mas sim pelo do PSD, e mesmo do PSDB, onde
Campos mantém forte relação com o mesmo Aécio Neves.
Se o novo partido tiver problemas com a Justiça Eleitoral na divisão do
horário de televisão, o mais provável é que se funda com o PSB antes que sofra
uma debandada de seus integrantes.
Em colunas recentes, onde se discutiu as dificuldades de relacionamento
entre o Executivo e o Legislativo, um dos pontos nevrálgicos detectados foi a
fragmentação partidária.
As possibilidades reais de fusões partidárias num número menor e mais
consistente de siglas estão condicionadas a três fatores: a proximidade
ideológica e programática dos políticos que integram os diferentes partidos; os
possíveis ganhos de competitividade e ocupação do poder com essas fusões e,
naturalmente, a convergência de seu comportamento em diferentes dimensões.
Desde o ano passado, o Instituto FSB Pesquisa faz rodadas praticamente
mensais de entrevistas com amostras representativas da Câmara dos Deputados.
Em sete dessas pesquisas, com 91% dos deputados, foi perguntado aos
deputados federais qual era o outro partido político com o qual tinha melhor
relacionamento.
Para Vladimir Gramacho, da FSB Pesquisas, o resultado dessa análise mostra
que são reduzidos os incentivos para que os atuais congressistas promovam uma
reorganização partidária que diminua o número de partidos.
Sem mudanças nas atuais circunstâncias e regras eleitorais, só a própria
dinâmica da competição partidária poderá reduzir o número de legendas, à medida
que os êxitos eleitorais de alguns impliquem derrotas e extinção de outros,
analisa Gramacho.
O retrato que emerge desses dados revela uma heterogênea possibilidade de
fusões. Na base governista, PMDB, PT e PSB são os partidos com maior número de
conexões na Câmara.
Articulações e a construção de maiorias nas votações legislativas neste
momento passam necessariamente por essa trinca.
No entanto, os projetos políticos para o futuro imediato afastam PSB e PMDB,
pois uma possibilidade é que Eduardo Campos queira ser o vice na chapa de Dilma
Rousseff à reeleição, se a situação política não for favorável a que se lance
candidato ainda em 2014.
E poderão afastar o PSB do PT se Campos se aproximar do PSDB para apoiar a
candidatura de Aécio Neves ou tentar sua própria candidatura.
Na oposição, o PSDB é claramente o ponto focal de acordo com as pesquisas da
FSB. Juntos, os quatro partidos também protagonizam, neste momento, a maior parte
das negociações para as disputas municipais.
As citações mais frequentes de cada partido formam três grandes blocos que
guardam alguma coerência ideológica e até histórica entre si:
PT-PSB-PDT-PCdoB: partidos de esquerda, com frequência coligados em disputas
importantes.
PMDB-PP-PR-PTB: partidos de centro-direita, com algum grau de coordenação e
complementariedade eleitoral.
PSDB-DEM: partidos que deram sustentação ao governo FHC durante quase oito
anos e que, desde 2003, vêm liderando a oposição ao PT.
No primeiro bloco, há, em todos os casos, graus moderados de adesão. Entre
50% e 70% dos membros de cada um dos partidos que formam o bloco citam outro
partido do bloco como o que tem melhor relacionamento.
Os maiores desvios estão no PT, onde 35% citam o bloco do PMDB e
especificamente o partido. Algo natural dada a coligação eleitoral formada
pelas duas legendas.
O caso de menor adesão registrado na pesquisa é o do PSB que, apesar disso,
não tem conexões fortes com outro grupo.
A conexão do PSB com o PSD é de cúpula partidária, não de suas respectivas
bases, o que dificultou a tentativa inicial de fusão das duas siglas.
No segundo bloco, os graus de adesão são muito mais reduzidos: vão de 15% a
46%. São partidos que podem ser chamados de transversais, pois têm relações
muito difusas, esclarece Gramacho.
O PMDB se percebe mais conectado ao PT - do primeiro bloco - do que aos
partidos desse potencial agrupamento.
O PP é o mais convergente mas, ainda assim, não chega a 50% o percentual de
deputados que citam os demais partidos do potencial bloco.
No PR, à deriva entre o governo e a oposição, nenhuma corrente chega a ter
30%. Já o PTB tem comportamento semelhante ao PMDB, preferindo o PT ao próprio
bloco, ainda que em menor medida.
Finalmente, mais clara é a aliança entre PSDB e DEM que, se decidir
fundir-se a outro partido, tem tudo para fazê-lo com o PSDB, como dizem seus
deputados.
FONTE: O GLOBO