domingo, 15 de maio de 2016

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna

• A resistência social ao governo Temer, representada pelo MST ou pela CUT, é um desafio para o presidente interino?

Uma coisa assustadora e terrificante é imaginar que tipo de governo esse tipo de esquerda que você menciona poderia compor um governo neste País. Imagine um ministério com o senador Roberto Requião (PMDB-PR) na Fazenda. As críticas vêm de pessoas que não se dão conta da natureza das coisas, dos processos novos que estão em curso no País e do mundo, que já não é mais o da Margareth Thatcher (primeira-ministra britânica de 1979 a 1990), mas o do Barack Obama (presidente dos EUA), do papa, da Angela Merkel (premiê alemã), da ONU. Essa esquerda que você citou ainda está no mundo de Ronald Reagan (presidente dos EUA de 1981 a 1989). O anacronismo é uma marca da cultura política brasileira, mas ela persiste porque a política foi usurpada da sociedade. O PT, que nasceu com vocação de simular a vida civil, associativa, da deliberação, do assembleísmo, tornou-se um partido de Estado, aparelhou e deseducou a sociedade.

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Luiz Werneck Vianna é sociólogo e professor PUC-Rio. Entrevista O Estado de S. Paulo, sábado, 14/5/2016.

PGR não tem mais dúvidas de que Lula comandou trama contra a Lava Jato

• Depoimento de Delcídio do Amaral, combinado a provas como mensagens eletrônicas e extratos telefônicos, reforçam a convicção dos investigadores de que o ex-presidente coordenou operação para comprar o silêncio de uma testemunha que poderia comprometê-lo

Por: Thiago Bronzatto - Veja

Em sua última aparição pública, na manhã de quinta-feira, Lula estava abatido. Cabelos desgrenhados, cabisbaixo, olhar vacilante, entristecido. Havia motivos mais que suficientes para justificar o comportamento distante. Afinal, Dilma Rousseff, a sucessora escolhida por ele para dar sequência ao projeto de poder petista, estava sendo apeada do cargo. O fracasso dela era o fracasso dele. Isso certamente fragilizou o ex-presidente, mas não só. Há dois anos, Lula vê sua biografia ser destruída capítulo a capítulo. Seu governo é considerado o mais corrupto da história. Seus amigos mais próximos estão presos. Seus antigos companheiros de sindicato cumprem pena no presídio.

Seus filhos são investigados pela polícia. Dilma, sua invenção, perdeu o cargo. O PT, sua maior criação, corre o risco de deixar de existir. E para ele, Lula, o futuro, tudo indica, ainda reserva o pior dos pesadelos. O outrora presidente mais popular da história corre o risco real de também se tornar o primeiro presidente a ser preso por cometer um crime.

VEJA teve acesso a documentos que embasam uma denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República contra o ex-presidente. São mensagens eletrônicas, extratos bancários e telefônicos que mostram, segundo os investigadores, a participação de Lula numa ousada trama para subornar uma testemunha e, com isso, tentar impedir o depoimento dela, que iria envolver a ele, a presidente Dilma e outros petistas no escândalo de corrupção na Petrobras. Se comprovada a acusação, o ex-presidente terá cometido crime de obstrução da Justiça, que prevê uma pena de até oito anos de prisão. Além disso, Lula é acusado de integrar uma organização criminosa. Há dois meses, para proteger o ex-presidente de um pedido de prisão que estava nas mãos do juiz Sergio Moro, responsável pela Operação Lava-Jato, a presidente Dilma nomeou Lula ministro de Estado, o que lhe garantiu foro privilegiado. Na semana passada, exonerado do governo, a proteção acabou.

Há várias investigações sobre o ex-¬presidente. De tráfico de influência a lavagem de dinheiro. Em todas elas, apesar das sólidas evidências, os investigadores ainda estão em busca de provas. Como Al Capone, o mafioso que sucumbiu à Justiça por um deslize no imposto de renda, Lula pode ser apanhado por um crime menor. Após analisar quebras de sigilo bancário e telefônico e cruzar essas informações com dados de companhias aéreas, além de depoimentos de delatores da Lava-Jato, o procurador-geral Rodrigo Janot concluiu que Lula exerceu papel de mando numa quadrilha cujo objetivo principal era minar o avanço das investigações do petrolão. Diz o procurador-geral: 

"Ocupando papel central, determinando e dirigindo a atividade criminosa praticada por Delcídio do Amaral, André Santos Esteves, Edson de Siqueira Ribeiro, Diogo Ferreira Rodrigues, José Carlos Costa Marques Bumlai e Maurício de Barros Bumlai (...), Luiz Inácio Lula da Silva impediu e/ou embaraçou a investigação criminal que envolve organização criminosa".

O mito das três Dilmas que nunca existiram

• A “gerentona”, a “faxineira” e, agora, a “vítima”. O marketing oficial tentou criar várias personagens para a presidente, mas nenhuma resistiu aos fatos

Por: Daniel Pereira - Veja

Eufórico, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva desfiava seu rosário de palavrões prediletos para comemorar o sucesso de um leilão de concessão de rodovias, que, segundo a oposição, seria um fracasso.

Era 2007, o primeiro ano de seu segundo mandato. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), sua principal bandeira de marketing, já estava nas ruas. E o encantamento com a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, celebrada como a responsável pelo resultado do leilão, só aumentava. Aos olhos do presidente, Dilma enquadrava a burocracia, tirava projetos do papel, destravava investimentos, fazia o governo acontecer. Era a novidade. A melhor novidade. Por isso, anos mais tarde, com nomes históricos do PT abatidos pelo mensalão, Dilma, "a mãe do PAC", "a mulher do Lula", "a gerentona", foi escolhida para ser a candidata à Presidência. O plano era ambicioso: em mandatos sucessivos, Lula e Dilma garantiriam ao partido pelo menos vinte anos no poder, curiosamente o mesmo número cabalístico que os tucanos pretendiam ficar no governo depois que Fernando Henrique Cardoso foi reeleito. O foco de Dilma, uma vez eleita, seria melhorar a infraestrutura do país, sem inventar moda na política ou na economia. Uma meta simples. Nada podia dar errado. Mas, como se sabe, tudo deu errado.

Eleita com 55,8 milhões de votos em 2010, Dilma estreou como presidente promovendo a defunta "faxina ética". Em apenas um ano, demitiu seis ministros suspeitos de tráfico de influência, corrupção e desvio de verbas públicas. A comparação com Lula, defensor obstinado de companheiros encrencados, era inevitável e lhe rendia dividendos.

Setores tradicionalmente refratários ao PT estendiam o tapete vermelho para ela. Lula acompanhava esses movimentos com um pingo de desconfiança. A petistas ressabiados, dizia que Dilma, ao usá-lo como escada, engambelava setores conservadores da sociedade, conquistava a simpatia da mídia e se fortalecia. Além de competente, seria esperta. Em 2012, surgiram os primeiros ruídos entre os dois.

Agindo de modo republicano, Dilma desprezou a ideia de Lula de usar uma CPI do Congresso para intimidar a imprensa e o Ministério Público. O contraponto com o antecessor, de novo, era inevitável.

Em março de 2013, a presidente bateu recorde de popularidade. E justamente aí começou sua derrocada. Mandona, centralizadora e irritadiça, Dilma tornou-se imperial. Enviava projetos ao Congresso para aprovação - sem direito a debate, afago ou cafezinho com os parlamentares. Na economia, recorreu à batuta do intervencionismo e determinou a redução, na marra, das taxas de juros e da conta de luz, e ainda tentou tabelar o lucro de empresários, emperrando uma série de projetos. A inflação já dava seus primeiros galopes. Apreensivo, Lula passou a mandar recados à sucessora.

Os porta-vozes do petista ecoavam as queixas do empresariado contra a mão pesada da presidente e defendiam uma troca de comando no Ministério da Fazenda. Dilma, cuja dificuldade para reconhecer os próprios erros tem contornos patológicos, ignorava olimpicamente as advertências. Foi assim até as históricas manifestações de rua de junho de 2013, que dinamitaram sua popularidade. Do centro do ringue, Dilma foi jogada às cordas. Aproveitando essa fragilidade, petistas e empresários, como Marcelo Odebrecht, preso pela Operação Lava-Jato, lançaram um movimento para trocar Dilma por Lula como candidato à Presidência em 2014. Alegavam que Dilma estava tirando a economia dos trilhos. A presidente, tratada agora como incompetente e amadora, resistiu à pressão, manteve-se no jogo e, cumprindo sua própria profecia, fez o diabo para conquistar um novo mandato.

De olho na reeleição, Dilma cometeu três pecados capitais. Abandonou de vez a faxina ética, rendeu-se gostosamente ao toma lá da cá e formou uma aliança eleitoral com os principais expoentes do fisiologismo nacional. Demitidos em 2011, os ex-ministros Carlos Lupi (PDT) e Alfredo Nascimento (PR) recuperaram as credenciais para mandar e desmandar em seus feudos no governo. A presidente também gastou muito mais do que podia e arruinou as finanças do país a fim de impulsionar programas carreadores de voto, como o Bolsa Família.

Antes e depois da reeleição, usou bancos públicos para custear despesas do Tesouro Nacional. A prática, conhecida como pedalada fiscal, embasou o pedido de impeachment.

Reeleita, Dilma enfrentou pela primeira vez uma oposição implacável, que não lhe deu nenhuma chance de governar. Diante disso, a presidente cometeu novos e graves erros. Adotou a política econômica do adversário, selando um brutal estelionato eleitoral. Sob a batuta do marqueteiro João Santana, também preso na Lava-Jato, Dilma prometera calmaria na economia, quando, na verdade, semeara as bases para a maior recessão dos últimos trinta anos.

Dilma foi reeleita com 54,5 milhões de votos em 2014. No segundo mandato, a faxineira ética deu lugar à balconista de negócios. A gerentona, em vez das obras redentoras do PAC, entregou inflação na casa dos dois dígitos e desemprego crescente, que castiga 11 milhões de brasileiros. Entrou em cena a terceira versão de Dilma - a "vítima".

Desde o início da Lava-Jato, Lula cobrava da sucessora empenho para deter o avanço das investigações. A presidente, dando ouvidos ao ministro Aloizio Mercadante, aliado fiel, preferiu achar que o petrolão abateria cabeças coroadas do PT e do Congresso, mas não chegaria a ela. A estratégia de distanciamento durou até a prisão de Marcelo Odebrecht, em junho passado.

Dilma foi lembrada de que a Odebrecht pagara pelos serviços do marqueteiro João Santana. Ou ela reagia ou seria tragada pelas denúncias. Na surdina, a "vítima" passou a criar embaraços às investigações. Na mais evidente, condicionou a indicação de um ministro do Superior Tribunal de Justiça ao seu compromisso de libertar Marcelo Odebrecht, cujos segredos poderiam implodir a República. Como se ficou sabendo na gravação de uma conversa de Mercadante, o governo temia que delações premiadas viessem a "desestabilizá-lo". Dilma ainda nomeou Lula para o cargo de ministro, de modo a salvá-lo da prisão. A isenção de Dilma se tornara uma muleta retórica.

Executivos das empreiteiras Andrade Gutierrez, UTC e Engevix afirmaram que foram pressionados a fazer doações para a reeleição de Dilma, sob pena de perderem seus contratos com a Petrobras. Dilma, até onde se sabe, não embolsou propina nem recebeu favores pessoais de corruptores, mas se beneficiou do esquema em termos eleitorais, tal como Michel Temer. Seu afastamento do cargo foi precedido pela decisão da Procuradoria-Geral da República de pedir autorização para investigá-la por obstrução da Justiça. Em conversas reservadas, Lula continua a desfiar seu rosário de palavrões prediletos - agora dirigidos também à presidente afastada, como se ele nada tivesse a ver com as Dilmas que nunca existiram.

Temer presidente: o Brasil tem pressa

• Michel Temer assume a Presidência com a missão de resgatar a confiança do País, retomar os investimentos e promover um pacto nacional. O tempo joga contra ele

Mário Simas Filho, Sérgio Pardellas e Pedro Marcondes de Moura - IstoÈ

A elevada temperatura da canjica servida na ampla varanda do Palácio do Jaburu, na terça-feira 10, denunciava a certeza de que Michel Temer (PMDB-SP) viria a se tornar o 37º presidente do Brasil, 48 horas depois. Nos códigos brasilienses, é sabido que em gabinetes de quem tem poder ou a expectativa dele, as refeições e o cafezinho são servidos bem quentes. No mesmo dia, o café oferecido no Palácio do Planalto, ainda ocupado por Dilma Rousseff, estava frio. “Vamos conversar enquanto a canjica esfria”, dizia Temer, às voltas com o quebra-cabeça da montagem da equipe ministerial.

Naquele momento, as peças ainda não estavam todas encaixadas, mas o novo presidente traduzia a convicção de que havia trilhado o caminho correto ao decidir, depois de muito vai e vem, reduzir para 24 o número de ministérios, a despeito de ter de enfrentar as pressões oriundas de partidos aliados. 

Até o ano passado, a administração do PT ostentava nada menos do que 39 pastas. “Não é fácil diminuir o número de ministros e ao mesmo tempo escalar uma equipe que atenda aos interesses dos partidos”, disse Temer. “Mas decidi que meu primeiro compromisso é com a sociedade e as ruas estão pedindo isso.” Na quinta-feira 12, veio a confirmação da extinção de nove ministérios. Uma redução a transcender a economia com salários. É um gesto simbólico. Sinaliza que o Executivo, ao contrário do que ocorreu durante a gestão petista, está disposto a cortar na própria carne neste momento de crise. 

Dentro do mesmo contexto, Temer iniciou também a demissão de parte dos 30 mil servidores comissionados usados como cabides de empregos na gestão petista. O presidente está absolutamente consciente de que dispõe de legitimidade constitucional e política, mas que ainda lhe falta a chancela popular. “Não posso cometer os mesmos erros daqueles que estão saindo. Ignoraram os recados que vêm desde as manifestações de 2013”, afirmou.

A aliados, o presidente promete ir além da reforma administrativa. A ideia de Temer é adotar um modelo de meritocracia inspirado na iniciativa privada. Funcionários públicos ganharão bônus caso alcancem metas preestabelecidas. No novo formato, as direções de estatais e agências reguladoras deixarão de ser ocupadas por apadrinhados políticos. Seguiriam critérios técnicos. 

O programa Ponte para o Futuro, espécie de plano de governo do PMDB, defende a criação de leis para estabelecer o modelo de recrutamento para as diretorias de empresas públicas – uma medida que, em vigor, poderia ter evitado o Petrolão. Aprová-la, no entanto, exigirá muito jogo de cintura político. Principalmente, dentro de casa. Desde a redemocratização, o PMDB de Temer é uma legenda insaciável por postos estratégicos no poder – o caso das estatais, empresas, em geral, com verba, caneta e tinta para dar e vender. Espera-se que o novo presidente mantenha até o fim à disposição de comprar brigas em nome da governança.

De nada adiantarão as propostas de aprimoramento da máquina pública se Temer ceder ao fisiológico toma lá, dá cá de cargos. As ofertas sem critérios para postos federais em troca de apoio político ensejaram os principais escândalos de corrupção da história recente, como o mensalão e o Petrolão. Por isso, é imperativo mudar essa lógica. É evidente que um governo precisa de alianças e base parlamentar para aprovar projetos no Congresso. Não à toa, Temer montou o chamado ministério de expressão parlamentar. Dos escolhidos, 13 são deputados ou senadores. Mas os acordos têm de ocorrer de modo republicano. As siglas precisam apresentar nomes qualificados que aceitem se submeter a uma orientação programática. Foi dessa forma que Temer selou a união com o PSDB. Sem dúvida, se levada mesmo a cabo, será uma importante mudança na maneira de lidar com os partidos.

O presidente também quer impor uma nova sintonia para a relação entre os Poderes. À ISTOÉ, com a canjica já em uma temperatura agradável para ser digerida, Temer disse nutrir a expectativa de ficar marcado como o responsável pelo que chama de “reinstitucionalização” do Brasil. Quer dizer, não pretende governar com Medidas Provisórias, de maneira alguma irá subjugar o Congresso e muito menos fazer pressões sobre o Judiciário. “A manutenção da democracia passa necessariamente pela independência e harmonia entre os poderes. 

As gestões do PT tutelaram o Legislativo e o próprio parlamento deixou espaço para que o Judiciário muitas vezes tomasse decisões por falta de regulamentações”, disse. Quando provocado a respeito de uma reforma política que, por exemplo, acabe com a reeleição, o presidente, ao menos nesse primeiro momento, mostra coerência entre o discurso e a prática. “Não serei candidato em 2018, mas a questão da reeleição é um tema que cabe ao Legislativo e não ao Executivo. Se vier um projeto assim do Congresso, ele terá meu apoio, mas a tarefa é dos deputados e dos senadores.” Claro: para o relacionamento com o Legislativo fluir com mel, Temer sabe que precisa de nomes de peso político capazes, sobretudo, de fazer a ponte com os parlamentares. Sofrerá, caso contrário, da mesma paralisia dos governos Dilma.

Na terça-feira 10, Temer passou praticamente quase todo o dia ao lado de seus quadros mais qualificados – ao menos do ponto de vista político. Com a chegada do sol do fim de tarde, o presidente entabulou uma conversa em um sofá bem próximo de um buffet onde o novo secretário de governo, Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), conversava com líderes partidários. Tão logo se aproximou, Temer foi interrompido por uma chamada no celular. Do outro lado da linha, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), novo ministro do Planejamento e um dos principais artífices do governo recém-empossado, informava sobre a sessão do Senado que havia sacramentado a cassação de Delcídio do Amaral. Em menos de um minuto Temer desligou o telefone e demonstrou admiração pelo interlocutor: “É impressionante como o Jucá conhece o Orçamento e como é rápido no raciocínio político”.

Ato contínuo, a conversa se voltou para a operação Lava Jato. Em harmonia com o discurso que faria dois dias depois, Temer prometeu ali não criar embaraços às investigações. “Um presidente não pode interferir em uma investigação policial e nem mesmo em processos judiciais. A apuração do Petrolão é uma questão do Judiciário”. Temer sabe que a sociedade não admitirá ingerência na independência funcional da Polícia Federal. Nem aceitará cortes de verbas que impeçam o órgão de avançar contra os malfeitos. É possível que as apurações desemboquem em correligionários dele. Dois de seus ministros são investigados e outros citados no Petrolão. Qualquer movimento do novo presidente em relação ao tema será observado de muito perto. A marcação será cerrada, não há sombra de dúvidas. Os brasileiros que foram as ruas pelo impeachment exigem que o Brasil continue a ser passado a limpo. Um novo momento político exige novas práticas.

Nas semanas que antecederam ao impeachment, Temer tentou, dentro das possibilidades, submergir. Não queria parecer um articulador do afastamento, a despeito da romaria de políticos que o procuravam. Dedicou parte deste tempo a mergulhar na leitura de biografias sobre líderes políticos. Buscava inspiração para uma eventual gestão. Uma história, em especial, voltou a despertar a sua atenção: a de Franklin Roosevelt, responsável por retirar os Estados Unidos da grande depressão de 1929. A aliados, analisou que, assim como ocorreu com Roosevelt, assumiria uma nação devastada. 

A economia nacional recua 3% ao ano. O desemprego cresceu de 6,4 para% 10,2% em dois anos. O poder de compra despencou. A autoestima da população entrou numa crise sem precedentes e a descrença com a política se ampliou. Precisava de um receituário ambicioso, pensou. Usando o exemplo do ex-chefe de estado americano, Temer propõe um “new deal” à brasileira. Na prática, unir a sociedade em torno de uma agenda de transformações. Para acontecer, o peemedebista terá de se dispor a arriscar sua biografia para promover reformas econômicas, mesmo que elas se mostrem impopulares em um primeiro momento. Um líder comprometido com a democracia, que respeite a autonomia das outras instituições e apoie o combate à corrupção até quando as investigações atinjam pessoas próximas. E, principalmente, capaz de pacificar um País conflagrado, deixando interesses partidários de lado.

Foi com esse tom de conciliação nacional que Temer inaugurou a sua gestão. No primeiro discurso, na quinta-feira 12, não recorreu a palanques ou claques partidárias. Tampouco criticou diretamente Dilma Rousseff. A cerimônia foi frugal como a situação exigia. Ocorreu no menor salão de eventos do Palácio do Planalto. Depois de empossar os ministros, Temer discursou à nação por cerca de meia-hora. Fez questão, neste momento de crise, de usar a palavra confiança para iniciar a sua fala. 

Conclamou, em seguida: “Partidos, lideranças, entidades organizadas e o povo brasileiro hão de emprestar sua colaboração para tirar o país desta crise.” “O diálogo é o primeiro passo para enfrentarmos os desafios”, afirmou. O primeiro deles, como lembrou Temer, é reconhecer os limites do Estado na economia. A equação das gestões petistas de subsídios, intervencionismo e desrespeito a contratos quebrou o País. “Teremos que incentivar, de maneira significativa, as parcerias público-privadas, na medida em que esse instrumento poderá gerar emprego no País”, disse. “Sabemos que o Estado não pode tudo fazer”, acrescentou. 

O discurso do novo presidente, que chegou a ser interrompido por uma constrangedora rouquidão, solucionada por uma pastilha entregue por um auxiliar, soou como sinfonia de Bach a empresários, investidores, integrantes da classe média e até aos menos favorecidos, aliviados com a promessa de manutenção dos programas de transferência de renda.

Um novo ciclo de crescimento e emprego depende da atração do investimento privado, principalmente para as obras de infraestrutura. Para tanto, o Brasil precisa resgatar a confiança dos empresários. A troca de presidente e a volta de Henrique Meirelles à equipe econômica garantem uma lua de mel temporária com o mercado. Mas, para manter o romance, o governo terá de agir com rapidez para promover reformas e melhorar os fundamentos econômicos enquanto o café ainda está quente. 

O Brasil tem pressa. De olho no relógio, na sexta-feira 13, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, se antecipou. Defendeu a adoção de medidas duras para mudar os rumos da economia e um ajuste fiscal com metas plausíveis que mostre a vontade real do País em gastar de acordo com a sua realidade. Não tornando sua dívida impagável em décadas. Para isto, porém, será preciso retirar subsídios e renúncias fiscais que comprometeram o caixa público. Sindicatos e partidos políticos favoráveis ao governo ainda resistem às alterações mais impopulares. O próprio (e necessário) ajuste fiscal ainda é um tema delicado à maioria. São em situações com esta que o novo presidente terá definido o seu lugar na história. Caso ceda, será mais um entre tantos nomes. Se for em frente, arriscando o capital político, poderá ingressar no seleto rol dos estadistas.

Os homens do presidente

• Michel Temer fala a ÉPOCA sobre como pretende consertar a economia e conseguir maioria no Congresso

Diego Escosteguy - Trecho da reportagem de capa de ÉPOCA desta semana

Nascia seca e azul aquela manhã de abril em Brasília, e a balbúrdia da política habitava o normalmente silencioso Palácio do Jaburu. Da cozinha da residência oficial da Vice-Presidência da República, contígua à pequena sala de jantar da casa, vazavam o tilintar de pratos preparados em série e os vozeirões desencontrados de cozinheiros apressados. Parecia o som de um restaurante popular a quilo. Na sala de jantar, definida pela elegância aristocrática e austera dos palácios de Brasília, o café da manhã frugal estava à mesa. Pães, ovos mexidos, café coado. Divisava-¬se, à janela, como de hábito, a estranha companhia de todos aqueles que moraram ali: as emas, bichos que circulam livremente pelos gramados bem cuidados do Jaburu, indiferentes a jardineiros e chefes políticos. Estávamos às vésperas da votação do impeachment de Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados. Michel Temer, sempre empertigado, sentou-¬se à mesa. Pela primeira vez em anos, estava sem paletó. Resolvera trabalhar para assumir a Presidência da República.

Durante meses, conforme as crises política e econômica se agravavam, conforme a Lava Jato destruía o PT e o governo de Dilma Rousseff, ficava cada vez mais evidente, para aqueles que mandam em Brasília, que Temer seria presidente em pouco tempo. Temer, o mais hesitante dos políticos da capital, demorava a agir – ou, para os mais ladinos, esperava a hora certa para agir. Ele se preparava havia meses para o momento em que Dilma tivesse errado o suficiente para se permitir ser apeada pelo astuto Eduardo Cunha, que comandava o impeachment na Câmara.

Temer, que sempre ouviu muito antes de decidir, por gesto (para conquistar o interlocutor) e por inteligência (para não errar), esperara até aquela hora, em que o poder se deslocava naturalmente para ele, fugindo de Dilma. O poder estava na sala ao lado, sentado em sofás, operando a queda de Dilma – homens próximos e de confiança, deputados e senadores de quase todos os partidos. “Tenho de agir com discrição, por respeito à presidente, mas não é fácil. O país tem pressa e o poder não admite vácuo”, disse Temer, enquanto comia lentamente uma pequena porção de ovos mexidos.


O vice-presidente deixara-se ser cuidadosamente atropelado pelos fatos para, como aprendeu, ser ungido ao posto que, na verdade, já sabia ser seu havia muito. O impeachment era uma realidade, e não havia nada mais que ele pudesse fazer – a não ser ceder aos apelos daqueles que estavam do outro lado da sala, apelos para ratificar os últimos acordos com os deputados que derrubariam Dilma. O impeachment se transformara numa eleição entre Dilma e Temer. Quem prometesse mais espaço político (cargos, naturalmente), e tivesse condições de cumprir as promessas, seria eleito. Dilma, desmoralizada havia muito pela incapacidade de entregar o que prometia, não precisava de muito para ser superada no leilão. Bastava a palavra de Temer. A de Dilma não tinha mais valor no mercado de Brasília. Após o desjejum, Temer dirigiu-se aos sofás do Jaburu, onde distribuiria alguns dos últimos apertos de mão para derrubar Dilma. Dias depois, a Câmara aprovou o impeachment da petista, liquidando-a. Nesta semanaa, o Senado terminou o serviço.

Ao cair da tarde do dia seguinte, na quinta-feira, dia 12, Michel Temer assomou, puro Michel Temer, com terno escuro abotoado, gravata verde, no salão leste do Palácio do Planalto. Horas antes, ali mesmo, Dilma o havia enxovalhado mais uma vez como golpista e usurpador – em essência, o cavaleiro do apocalipse da democracia. Temer estava sem dormir direito – acordara com a notícia de que o Senado aprovara o afastamento de Dilma. O cansaço se exibia em seu semblante. O salão estava abafado. O pequeno palco, apinhado com os novos ministros – todos homens, todos brancos. A maioria deles resultado dos apertos de mão no Jaburu, que asseguraram o apoio do Congresso no impeachment e, ao menos no curto prazo, também nas medidas que o novo governo pretende encaminhar à Câmara e ao Senado.

Temer falou por quase 30 minutos. Mui pausadamente. Não quis abrir espaço para improvisos ou gafes. “Eu pretendia que esta cerimônia fosse extremamente sóbria e discreta, como convém ao momento que vivemos”, iniciou Temer.

Tarde demais. Ouviam-se fogos de artifício na Esplanada. Simpatizantes do novo governo faziam selfies. Cinegrafistas berravam para que os convidados se sentassem e a imagem do poder recém-¬empossado fosse capturada em sua íntegra. Quando o silêncio finalmente foi possível, pôde-se ouvir ao fundo, conforme Temer dizia que sua primeira palavra aos brasileiros seria “confiança”, um grito de “Amém!”. Mais tarde, Temer confirmou que o lema de sua gestão será “Ordem e Progresso”. O tom de sua condução do país estava estabelecido.

PMDB adota tom conciliador, e PT promete não dar trégua

• Governo quer pacificar país com promessa de manter programas sociais

Isabel Braga e Leticia Fernandes – O Globo

Na semana em que Dilma Rousseff foi afastada da Presidência e o vice Michel Temer assumiu interinamente o comando do país, os dois lados adotaram falas diametralmente opostas. No poder, o PMDB se apressou em lançar um discurso conciliador, comprometendo-se a buscar o diálogo. Por sua vez, o PT, de volta à oposição após 13 anos, prometeu não dar trégua à gestão Temer.

O novo governo minimiza o poder de fogo do PT. Para eles, com a postura de diálogo adotada por Temer e o compromisso de manter os programas sociais, o discurso petista não deverá contaminar as classes mais baixas, tradicionalmente mais ligadas ao PT.

Coordenador de infraestrutura do governo e amigo íntimo do presidente interino, Moreira Franco disse que Temer tem que dar o exemplo e não responder a provocações que estimulem a desunião do país. E mostrar que respeita a opinião dos adversários:

— O presidente irascível gera irascibilidade. Tem que ter serenidade, tolerância, gosto pelo diálogo.

Moreira avalia que a sociedade saiu dividida na eleição de 2014, o quadro se acirrou com a crise econômica, e o governo Dilma Rousseff usou a divisão para desconstruir os adversários. Mesmo assim, ele diz que a polarização é da luta política e que mesmo o uso das expressões “coxinhas” e “mortadelas” faz parte do jogo. Ele minimiza a ameaça do PT de propagar que o governo é ilegítimo:

— Discurso político tem que ter fundamento. Não se sustenta em cima de mentira. Não há golpe.

Alberto Cantalice, vice-presidente do PT, disse que é “falácia” Temer pregar unidade nacional quando foi um dos protagonistas do que considera ser um “golpe”:

— Ele acaba de insuflar um golpe, dividindo claramente a opinião pública e quer falar em unidade nacional? Isso é falácia. Se ele quisesse união, não teria dado o golpe, e ele foi um dos principais conspiradores. Não vemos legitimidade nele para propor qualquer diálogo que seja.

O senador Humberto Costa (PT-PE), líder do governo Dilma no Senado, negou que o PT tenha construído o discurso de divisão do país, apostando na dicotomia do “nós” e “eles”. Para Costa, a esquerda mostrou que há uma elite no Brasil contrária a mudanças como a redução da desigualdade social.

— Nós nunca fizemos discurso de querer dividir o Brasil, colocamos apenas que de fato isso existe, que há uma elite no país que não quer reduzir a desigualdade social, que não aceita a inclusão de milhões de pessoas, e essas ideias vamos continuar defendendo. Nosso partido criou-se para isso, nosso projeto é esse. Nossa forma vai continuar resistindo.

Consultor da Arko Advice e próximo de Temer, o cientista político Murillo de Aragão diz que o discurso de que a sociedade está dividida é hiperinflacionado. Para ele, o PT, no governo Dilma, perdeu as ruas e tem hoje só o apoio de militantes de esquerda.

— A divisão já existia desde a eleição. A diferença agora é que muda de lado, o PT vai para a oposição e costuma crescer na oposição. Podem obstruir as votações, é papel da oposição. Mas não podem partir para a violência nas ruas porque isso vai jogar a população contra eles. Se radicalizarem perdem ainda mais densidade eleitoral.

Professor de História, ex-petista e deputado federal no quarto mandato, Chico Alencar (PSOL-RJ) diz que Lula não inventou a divisão de classes no Brasil, e que se fez programas voltados para os mais pobres, também não deixou de fazer políticas que agradaram os bancos. Alencar avalia que a divisão na sociedade continuará forte e que o governo de Temer será muito questionado.

— Temer vai realizar o programa do Aécio Neves, que não ganhou a eleição. Há um certo cansaço com as forças partidárias que polarizaram, mas independente de PT, PSDB, PMDB, vai haver conflito social, sem dúvida. Não conseguirá grande harmonia social. Foi uma mudança pelo alto, feita por um Congresso pouco representativo. O governo começa menos desgastado que o da Dilma, mas com crise latente — disse Alencar.

O tucano Jutahy Magalhães (BA) é mais otimista. Para ele, a radicalização tende a diminuir, mantendo-se no debate mais duro no Congresso:

— Há uma tensão artificial, criada pelo PT sobre a faixa de apoio e com afirmações de que o governo acabaria com os programas sociais. Na hora que isso não ocorrer, desmistificará o discurso. Temer irá enfrentar os de sempre, MST, UNE, como no passado. Não tem sociedade radicalizada, mas indignada com a corrupção. Queriam a saída do PT e agora querem que o novo governo dê certo.

Indagado se a decisão de Temer de indicar para os ministérios pessoas investigadas na Lava-Jato não levará a reação de parte da sociedade, o tucano afirmou:

— As pessoas querem olhar para frente, querem um novo governo para sair do buraco.

‘Tenho certeza de que Lula vai contribuir’, diz Geddel Vieira

Entrevista. Geddel Vieira Lima

• Ministro afirma que ex-presidente poderá ser procurado para ajudar a ‘distensionar’ cenário em meio à crise econômica

Erich Decat - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Responsável pela articulação política do governo Temer, o ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), considera que, apesar de um possível ressentimento e acusações de golpe, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá ser procurado para ajudar na busca por alternativas para sair da atual crise política e econômica. “Não tenho nenhuma dificuldades de diálogo com o ex-presidente Lula e tenho certeza de que, passado esse momento de emoção, o Lula, na condição de ex-presidente, haverá de dar sua contribuição para o distensionamento”, afirmou o ministro ao Estado.

O peemedebista minimizou o fato de Temer ter chegado ao comando do País sem o respaldo social. “Na medida que a economia embique para cima, tenho absoluta certeza de que a sociedade como um todo e os movimentos sociais vão apoiar o governo”, disse.

• Apesar da mudança de governo, a crise econômica não dá sinais de trégua. Quais propostas vocês pretendem enviar nesta primeira semana ao Congresso?

O presidente Temer no seu discurso deixou sinalizado com clareza que a confiabilidade, previsibilidade e diálogo serão as bases das propostas que precisam ser feitas para que a economia tenha confiança no governo, para que a sociedade volte a ter confiança no governo. Creio que o ministro Meirelles (Henrique, da Fazenda) tem deixado bastante claro que tratará de medidas como a desvinculação orçamentária e limites de crescimento da dívida. Haverá também uma absoluta prioridade na questão das PPPs (parcerias público-privadas), das concessões, de forma que se tenha a iniciativa privada como parceira dos investimentos do Estado. Queremos sobretudo gerar confiança e que as medidas, metas e parâmetros que forem estabelecidas sejam cumpridas.

• Mas já há um cronograma de envio de propostas ao Congresso?

Estamos recebendo um governo que não houve transição. Para se ter uma noção, na Secretaria de Governo foi deixada, de forma até desatenciosa, apenas uma apostila, nenhum dado a mais. A equipe técnica vai trabalhar para recuperar dados para que possamos tocar nossas atividades. Você imagina a questão da Fazenda. O Meirelles vai chegar, vai montar a equipe dele e evidentemente discutir a formatação dessas medidas para que elas possam ser apresentadas com a maior brevidade.

• Então, não será nesta primeira semana?

Não necessariamente. Vamos tentar fazer com a urgência necessária que a economia precisa, que a sociedade quer, mas com a cautela exigida para que não sejam cometidos erros. Nós queremos fazer as coisas depois de dialogar, depois de mostrar à base aliada, depois de ouvir.

• Meirelles será o responsável por negociar diretamente as novas propostas com o Congresso?

Sou um homem do Parlamento, sei das angústias e dificuldades e estarei aberto para fazer essa ponte.

• Mas objetivamente, Meirelles vai para dentro do Congresso negociar com as lideranças?

Se for preciso, vai. Se for preciso, vamos juntos. Não vai ter sobreposição de atividades. Não vai ter ciúmes. Vamos todos estar irmanados pelo mesmo objetivo. Essa é uma orientação do Temer.

• O presidente Temer chega ao poder sem uma base social. Dificulta para enfrentar a crise?

A Secretaria de Governo tem muito essa responsabilidade de dialogar com as entidades da sociedade civil, como os movimentos sociais. Então, vamos abrir as portas, ouvir, dialogar, assumir compromissos e cumprir naquilo que pudermos cumprir. Na medida em que a economia embique para cima, tenho absoluta certeza que a sociedade como um todo e os movimentos sociais vão apoiar o governo.

• O governo Temer espera ter uma trégua do mercado financeiro e dos movimentos sociais?

Temos a expectativa de que a sociedade compreenda que é preciso de um tempo mínimo para se organizar e começar a dar as respostas. Mas estamos prontos e preparados para o desafio que vem pela frente.

• O calendário é bem apertado. Haverá o recesso de julho, Jogos Olímpicos e eleições municipais. Dá tempo para arrumar a ‘casa’?

O recesso de julho não haverá mais. A Olimpíada vamos trabalhar para ser um sucesso, apesar das dificuldades que estão aí, de crise econômica, aumento da violência e inflação. Temos que buscar resgatar isso com brevidades. As eleições fazem parte do calendário democrático do País.

• O governo Temer não corre o risco de vender uma ilusão da saída da crise?

Não vamos vender ilusões. Vamos apresentar propostas concretas e buscar a adesão. E trabalhar para que dê certo. Sabemos das dificuldades, mas o que nós vamos fazer é exatamente não vender ilusão. Vamos apresentar metas, projetos exequíveis e que sejam cumpridos. O que o mercado, o povo brasileiro e o mundo quer é um País previsível, com segurança jurídica, que desperte o apetite do investidor. E tendo um ministro da Fazenda com a capacidade do Meirelles acredito que vai dar certo.

• Deverá ainda haver resistência do presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão.

Vou conversar com o presidente da Câmara, com a Mesa da Câmara e com as lideranças. Tenham certeza de que chegaremos a um bom termo.

• Há alguma articulação para afastá-lo ou pressão para que ele peça licença do posto?

Vou trabalhar de forma pragmática. E para isso vou contar com a compreensão do Waldir Maranhão. O Brasil não quer dificuldades adicionais e o Congresso não haverá de sobrepor essas dificuldades com picuinhas políticas. Portanto, tenho certeza de que o deputado Maranhão vai colaborar.

• Como fica a relação com o ex-presidente Lula? Vocês vão procurá-lo?

Tenho apreço, muito carinho e respeito pelo ex-presidente Lula. Tivemos divergências nem tanto por conta dele, mas pela a falta de habilidade e aptidão da presidente Dilma. Portanto, não tenho nenhuma dificuldades de dialogo com ele e tenho certeza de que, passado esse momento de emoção, o Lula, na condição de ex-presidente, haverá de dar sua contribuição para o distensionamento. Não creio que alguém que presidiu o País possa querer que o Brasil afunde ainda mais nesta crise econômica.

• E o PT? Como lidar com a segunda maior bancada do Congresso, na oposição?

Espero que continuem fortes e aguerridos. Governo sem oposição não é bom, se acomoda. Vamos ter um governo pronto para o diálogo, mas também muito combativo.

• Na composição da nova base, o PSDB exigiu que Temer não se envolva na campanha municipal. Isso vai ser seguido?

Acho que não é uma exigência das lideranças, mas sim do bom senso. Presidente Temer tem um compromisso com o País. Eu como líder político na Bahia me envolverei, sem criar dificuldades, nas questões locais do meu Estado. Em outros, cada um vai cuidar da sua vida. Mas o presidente Temer e o governo não vão se envolver porque não queremos criar dificuldades além daquelas que já temos que enfrentar.

• Houve muita crítica na composição do ministério em razão da ausência de uma representante feminina. Foi um lapso?

Acho absolutamente natural. Nós fizemos alguns contatos com mulheres que não puderam aceitar. Outras mulheres ocuparam cargos importantes.

Cultura vira secretaria, e titular será mulher

• Governo Temer tenta dar resposta a críticas pelo fim do ministério e da falta de representação feminina

Renata Mariz e Maria Lima - O Globo

Em reação a críticas, Temer decide criar Secretaria de Cultura, sem status de ministério, com uma mulher no comando. Diante da revolta da classe artística e das críticas pela ausência de mulheres no primeiro escalão do governo, o presidente interino Michel Temer decidiu criar uma Secretaria Nacional de Cultura, ligada diretamente à Presidência da República, e avalia nomes de mulheres para ocupá-la. Interlocutores de Temer explicam, entretanto, que ele não está voltando atrás na disposição de enxugar o número de ministérios, já que a secretaria não terá status de ministério. Uma das cotadas para o cargo é a ex-secretária de Cultura do Estado do Rio de Janeiro no governo Sérgio Cabral, Adriana Rattes, ligada ao PMDB fluminense.

Extinto na quinta-feira, o Ministério da Cultura (MinC) foi aglutinado à pasta da Educação, sob o comando de Mendonça Filho, da cota do DEM. Mas uma reação fortíssima da classe artística fez Temer recuar da junção das duas áreas, já formalizada em medida provisória. O temor dos artistas e demais militantes do setor cultural é de que as políticas do setor fiquem em segundo plano na pasta da Educação.

Ministro foi hostilizado
Segundo o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, a nova secretaria não terá status de ministério, embora fique vinculada diretamente à Presidência. O ator Stepan Nercessian havia sido sondado para assumir a área, mas foi preterido pela necessidade do governo de mostrar uma Esplanada com representatividade feminina.

Um dos nomes ventilados, Adriana Rattes foi a secretária estadual de Cultura do Rio que ficou mais tempo no cargo, de 2007 a 2014. É uma das fundadoras do Grupo Estação, rede de cinemas de arte no Rio. Como secretária, enfrentou reações por defender as Organizações Sociais (OS) para gerir órgãos ligados à pasta.

Interlocutores do governo Temer argumentaram que o arranjo não é novo no Brasil, que Educação e Cultura estavam na mesma pasta até a criação do MinC. Não convenceram. O ministro Mendonça Filho foi hostilizado ao se apresentar aos servidores do ministério na sexta-feira. Manifestantes o chamaram de “golpista” e reivindicaram a recriação do ministério. A pressão também veio de artistas famosos. Uma carta aberta foi divulgada pela Associação Procure Saber, formada por músicos como Caetano Veloso, Chico Buarque, Djavan e Marisa Monte, e pelo Grupo de Ação Parlamentar Pró-Música (GAP), que reúne Sérgio Ricardo, Ivan Lins, Frejat, entre outros.

“Entre as grandes conquistas da identidade democrática brasileira está a criação do Ministério da Cultura, em março de 1985, pelo então presidente José Sarney”, diz o texto conjunto das duas associações.

Ao se apresentar aos servidores, na sexta-feira, sob vaias e gritos de protesto, Mendonça falou que as fundações ligadas à pasta extinta estariam preservadas. Ele citou-as nominalmente: Palmares, Funarte, Casa de Rui Barbosa, Biblioteca Nacional, Ancine, Iphan e Instituto Brasileiro de Museus (Ibram).

Dúvidas sobre secretarias
O novo ministro da Educação também havia dito que não seriam descontinuadas “as secretarias nacionais que cuidam das duas grandes grandes áreas de incentivo”, citando a Lei Rouanet e a Lei do Audiovisual. A declaração gerou desconfiança de que outras secretarias pudessem ser extintas.

Ao GLOBO, Mendonça afirmou que não havia nenhuma extinção de secretaria em estudo. Agora, as dúvidas sobre o futuro da política nacional na área cultural terão de ser respondidas pelo novo órgão que o governo vai criar.

O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Claudio Lamachia, criticou, neste sábado, o presidente interino Michel Temer por ter nomeado para seu Ministério investigados na Operação LavaJato. O GLOBO mostrou ontem que, entre os 23 novos ministros, há dois investigados — Henrique Alves (Turismo) e Romero Jucá (Planejamento) — e sete citados na força-tarefa da operação. “Faço o alerta de que a nomeação de investigados contraria os anseios da sociedade e não deveria ser feita”, disse Lamachia.

Temer deu aval a repúdio a países ‘bolivarianos’

• Diplomacia. Presidente em exercício Michel Temer aprovou a decisão de Serra e ajudou a redigir o parágrafo de uma das duas notas do Itamaraty em reação às críticas ao impeachment

Vera Rosa, Julia Lindner, Lígia Formenti e Iuri Pitta - O Estado de S. Paulo

Michel Temer aprovou a decisão do ministro das Relações Exteriores, José Serra, de manifestar repúdio às críticas feitas por Venezuela e países aliados e pelo secretário-geral da União das Nações Sul-Americanas (Unasul), Ernesto Samper, ao processo que afastou Dilma Rousseff do cargo. Ele não só avalizou duas notas emitidas anteontem pelo Itamaraty como ajudou a redigir o parágrafo de uma delas, com o objetivo de deixar claro que o rito estabelecido na Constituição para o impeachment foi “seguido rigorosamente”.

O governo brasileiro aguarda agora os desdobramentos da reação do presidente da Venezuela, Nicolas Maduro, que chamou para uma conversa o embaixador do país no Brasil, Alberto Castellar. Nos bastidores, porém, o comentário ontem no Palácio do Planalto era de que o governo não poderia ficar em silêncio diante das críticas feitas por Venezuela, Bolívia, Cuba, Equador e Nicarágua em relação ao afastamento de Dilma, no primeiro sinal de mudança de tom na política externa brasileira.

Além disso, o Itamaraty enviou na sexta-feira a todos os Ministérios de Relações Exteriores de países com os quais mantém relações uma nota para informar que Dilma foi afastada em um processo que segue a lei e a Constituição. A preocupação do governo Temer é desconstruir a versão de que houve um “golpe de Estado” no Brasil, divulgada por Dilma, por seus aliados e pelos petistas.

O embaixador da Venezuela em Brasília é o primeiro de uma lista de 15 diplomatas que ainda devem apresentar suas credenciais ao governo brasileiro. Diante desse impasse, não se sabe se Castellar entregará suas credenciais a Temer.

As notas do Itamaraty sob a gestão Serra são o primeiro gesto de mudança na diplomacia brasileira. O embaixador Sérgio Amaral, ex-porta-voz e ex-ministro do Desenvolvimento no governo Fernando Henrique Cardoso, participou de reuniões com o novo titular de Relações Exteriores ontem e anteontem, para “ajudar na transição” do novo governo. Ele não participou da redação das notas divulgadas na sexta-feira e minimizou a atitude de Maduro.

“O embaixador sequer está nas funções, pois não apresentou as credenciais. O importante é sinalizar a mudança”, disse Amaral. Para ele, não seria necessário convocar o embaixador brasileiro em Caracas de volta ao País em resposta a Maduro.

Congresso. Esse novo posicionamento do Itamaraty obteve respaldo de parlamentares próximos do governo interino e críticas dos petistas. “Recomendo que José Serra tome muito suco de maracujá, acalme-se, porque as reações devem se proliferar por todo o mundo”, disse o senador Lindbergh Farias (PT-RJ). Ontem, ele estava em Portugal, para participar de um encontro entre o Parlamento Europeu e o Latino-Americano, que tem início amanhã. “Vamos denunciar o golpe ocorrido no País. O Brasil está sendo comparado a uma republiqueta de bananas.”

Para o ex-presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado Ricardo Ferraço (PSDB-ES), que esteve em junho na Venezuela para pressionar pela libertação de presos da oposição, a reação de Maduro era esperada. “Ele está incomodado porque perdeu um parceiro conivente”, afirmou. “O governo da presidente Dilma Rousseff foi absolutamente omisso às violações cometidas na Venezuela.”

Na Câmara, a divisão seguiu a mesma linha da do Senado. “Precisamos acabar com essa palhaçada diplomática criada pelo ex-presidente Lula e continuada por Dilma. Vamos defender os países democráticos contra o populismo, o bolivarianismo, o chavismo”, disse o vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores, Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR). “Eles cuidem da vida deles e nós das nossas.”

“A nota (do Itamaraty) não muda a realidade”, afirmou o deputado Henrique Fontana (PT-RS), integrante da comissão. Para ele, é uma visão “bastante simplificadora da política externa” tratar a questão como “bolivarianismo”.

“O(jornal The) New York Times não me parece ser considerado um jornal bolivarianismo e eles fizeram um editorial recentemente criticando o impeachment. A realidade é complexa.”

O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) considerou o tom da nota contra os países inadequado. “Evidentemente que vai dificultar relações no mundo diplomático”, avaliou. O tucano Pedro Vilela (AL) rebateu. “A relação (com a Venezuela), da forma como estava, é que prejudica o País.”

‘Enormes chances de fraudes’, diz Gilmar sobre eleições/16

• Novo presidente do Tribunal Superior Eleitoral prevê 'salto no escuro' no pleito municipal que, pela primeira vez, exclui subsídio empresarial e admite apenas contribuição privada individual

Por Fausto Macedo e Julia Affonso – O Estado de S. Paulo

O ministro Gilmar Mendes, novo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), vê ‘enormes chances de fraudes’ nas eleições municipais 2016. Para ele, o pleito será um ‘verdadeiro salto no escuro’.

As eleições de outubro serão as primeiras sem o financiamento de pessoas jurídicas. Apenas pessoas físicas poderão contribuir com políticos que, desta vez, busca.

“Longa será a caminhada e árdua será a peleja, é certo, a começar pelo inusitado embaraço de equacionar complexas eleições municipais à luz da abrupta alteração no padrão de financiamento das campanhas”, alerta o ministro.

Gilmar Mendes, que também integra o Supremo Tribunal Federal (STF), tomou posse na Corte eleitoral na quinta, 12, mesmo dia da posse do presidente em exercício Michel Temer. Na solenidade, o ministro estava sentado entre o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, e de Temer.

Em seu pronunciamento, inicialmente ele apontou claramente para a gestão da presidente Dilma Rousseff, afastada do Palácio do Planalto por 180 dias por suspeita de crime de responsabilidade. 

“Entre perplexo e indignado, o Brasil de hoje é um país tomado por sobressaltos. É como se, a cada manhã, os brasileiros se pusessem a postos para esperar o escândalo da hora. Vexames se sucedem em tal velocidade que até a já habitual demanda de manchetes sensacionalistas resulta estrangulada. 

Olhando-se o mal-engendrado conjunto formado por esse impressionante ciclo de descalabros, de afrontas à nossa ordem constitucional, tão duramente conquistada, e de ofensas à honra pessoal de cada cidadão, tem-se a viva impressão de que nossa combalida República parece ter sido tomada de assalto por empedernida trupe de insensatos.”

“As tramas bem-urdidas desse enorme emaranhado de falcatruas e de ignomínias se esvanecem no ar, deixando, em seu rastro, sentimentos que vão do desânimo à repulsa”, disse o ministro.

Depois, o ministro revelou suas preocupações com relação às eleições. “A bem da verdade, trata-se de verdadeiro salto no escuro, já que tal mudança se deu sem qualquer transição, passando-se diretamente do subsídio empresarial à contribuição privada individual, e tudo sem nenhuma modificação nos trâmites e padrões eleitorais.”

Gilmar destaca que ‘muito ao contrário, mantiveram-se as perspectivas inerentes às campanhas de altíssimos custos demandadas por eleições com listas abertas, nas quais cada candidato disputa com outro concorrente do mesmo partido’.

“Nessas circunstâncias, é bastante plausível antever, sem o concurso de maiores elucubrações, enormes chances de fraudes, à mercê de subterfúgios tão deploráveis e ultrajantes quanto o uso de caixa dois, quase sempre ligado, de uma forma ou de outra, a organizações criminosas cujo único objetivo é o locupletamento próprio às custas de verbas públicas que deveriam servir unicamente a financiar o bem comum.”

O ministro faz uma previsão pessimista. “A Justiça Eleitoral terá de testar, neste, que será o maior dos sufrágios, modelo que, assentado em bases frágeis e pouco realistas, não parece fadado ao sucesso.”

Mas afirma que ‘se muitos são os desafios, todavia imensa é a disposição de enfrentá-los’.

“Para tanto, a Justiça Eleitoral encontra-se apta a vencer, um a um, todos os entraves – a exemplo do despropósito que levou ao corte orçamentário de um terço da verba destinada justamente à realização do evento de maior afirmação democrática pátria.”

E mandou um recado direto aos políticos que planejam insistir ainda em práticas rotineiras. “Este Tribunal não compactuará com qualquer tipo de astúcia que conduza à mínima assimetria capaz de deslegitimar o processo eleitoral, a exemplo dos abusos econômicos e políticos que tanto macularam as últimas disputas, agora objeto de detida e rigorosa análise judicial.”

Aí voltou a apontar para o governo Dilma e para o do antecessor, Lula – embora não tenha citado os nomes dos petistas. “Neste ponto, até que fique definitivamente esclarecido e introjetado, vale repisar que o Estado Democrático brasileiro há de ser sempre mais forte que o desatino dos poucos que patrocinaram o desconcerto atual. O vigor e a consistência do nosso aparato institucional, aliados ao trabalho competente e determinado, potencializados pela vontade de mudança e pela crença dos brasileiros no bem e na verdade haverão de sedimentar, com o resistente amálgama da esperança, caminho para futuro mais honrado e promissor.”

Mirou, então, o modelo político-eleitoral e os mais de trinta partidos. “Nada obstante, passa da hora de, escrutinando nossos erros, mirarmos soluções efetivas, a começar pelo desenlace da abissal crise política que engessa a Administração Pública. Tão assombrosa conflagração conjuntural demonstra que o modelo político-eleitoral de há muito já se esgotou, não sendo produtivo nem razoável que continuemos nos pautando por decisões equivocadas que acabaram por conduzir à falência do sistema eleitoral. Basta usar a lógica do senso comum para facilmente concluir que não há como prosperar modelo que, admitindo mais de trinta agremiações partidárias, mereceu, dos próprios partícipes, a desonrosa alcunha de ‘Presidencialismo de Cooptação’.”

Adiante, ao defender a reforma política, denunciou as ‘coligações ilegítimas’ e o que chamou de ‘sinistras negociatas’.

Não perdeu a oportunidade para, uma vez mais, fustigar a era PT no Planalto, a quem atribui a multidão de cidadãos sem renda salarial.

“Somem-se ao disparate da criação em série de partidos – à feição dos currais eleitorais que já tanto criticamos – as coligações ilegítimas, vinculadas e dirigidas não por afinidades programáticas, mas por sinistras negociatas. Esses conchavos, longe de assegurar apoio ou sobrevivência política a qualquer dos atores, corroem a legitimidade da representatividade popular, estimulam abertamente crimes como a corrupção desenfreada – inclusive como modo de governança –, a falsidade ideológica, a lavagem de dinheiro e a formação de quadrilha, entre outros tantos delitos, ademais de satanizar desbragadamente a atividade política – dano intergeracional mais grave e com mais consequências do que os equívocos econômicos que levaram onze milhões de brasileiros à sofrida vala do desemprego.”

Esquerda retoma ideia de Constituinte da reforma política

Thais Arbex – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - No debate sobre qual bandeira erguerá neste períodoapós abertura do processo de impeachment, a esquerda pretende retomar o projeto de convocação de um plebiscito sobre a formação de uma Assembleia Constituinte exclusiva do sistema político.

Capitaneada por movimentos sociais ligados ao PT, como MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), CMP (Central de Movimentos Populares), Consulta Popular e Levante Popular da Juventude, além da CUT (Central Única dos Trabalhadores), a proposta deve estar na pauta das reuniões da Executiva e do Diretório Nacional do PT, marcadas para acontecer em Brasília, neste início de semana.

"A única alternativa que consideramos possível, diante da crise vivemos, é a Constituinte exclusiva para o sistema político", diz João Paulo Rodrigues, coordenador nacional do MST.

Já há projetos sobre o tema no Congresso. O mais avançado está na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado à espera da apresentação do relatório do senador Humberto Costa (PT-PE).

Seu parecer favorável à proposta só será apresentado, no entanto, quando ela tiver sólido apoio dentro e fora da Casa.

Embora seja um tema caro ao PT e os senadores petistas Lindbergh Farias (RJ) e Paulo Paim (RS) também façam coro de apoio à Constituinte, ela ainda enfrenta resistência de parlamentares do próprio PT, do PC do B e do PSOL.

"Quem está nesta lógica de carreirismo político e mandato sai perdendo. Por isso têm posição mais conservadora em relação ao projeto", afirma Rodrigues.

Os movimentos apostam, no entanto, que com um possível agravamento da crise política no governo Temer o plebiscito para a reforma política ganhará força.

"A curto e médio prazo essa crise institucional não vai se resolver a não ser dando a palavra ao povo, com uma constituinte para reformar as instituições de alto a baixo neste país", diz Júlio Turra, diretor-executivo da CUT.

"Está mais atual do que nunca uma Constituinte para reformar o sistema político, porque a nação viu o circo dos horrores da votação de 17 de abril Câmara, afirma sobre a aprovação do pedido de impeachment.

A sustentação do projeto vem de 2014, quando esses mesmos movimentos organizaram um plebiscito popular que teve quase 8 milhões de votos favoráveis à ideia.

Em seu discurso de vitória, Dilma se comprometeu a deflagrar uma consulta popular para a reforma política, mas a ideia não foi levada adiante.

"Imaginávamos que Dilma ia dar algum passo nessa direção, entretanto,ela inaugura o seu segundo mandato com o plano Levy, que atacou logo de cara os direitos trabalhistas. Provocou uma perda de base social de seu governo e favoreceu a ofensiva da direita que já vinha contestando o resultado eleitoral", afirma Turra.

Os heróis que não temos - Luiz Sérgio Henriques*

- O Estado de S. Paulo

O heroísmo costuma aparecer em cena nos momentos de transição, associado, em geral, a homens de comportamento reto e nítido. Os que viveram o final do regime militar certamente têm na memória a figura de Ulysses Guimarães rompendo o cerco de cães e baionetas, em 1978, e bradando civicamente: “Respeitem o presidente da oposição!”. A transição já se anunciara, a anistia não tardaria e o País em breve iria reencontrar-se com sua vocação democrática, tal como inscrita no texto constitucional dez anos mais adiante.

Mas não só inteiriços heróis positivos surgem nas transições. Há outros mais ambíguos, feitos de luz e sombra, com um pé no passado, outro no futuro, como aqueles que Hans Magnus Enzensberger chamou, em 1989, de “heróis da retirada”.

A partir desse tipo, personificado, entre outros, em Gorbachev, Javier Cercas (Anatomia de um Instante, Globo, 2012) esmiuçou a ocupação violenta do Parlamento espanhol em fevereiro de 1981. Um desses “heróis da retirada”, Adolfo Suárez, ex-quadro franquista, manteve a altivez no instante do golpe, ao lado de dois outros deputados, um dos quais o então dirigente eurocomunista Santiago Carrillo.

E assim, com Enzensberger e Cercas, nos vemos lançados à atualidade brasileira, ainda que de modo paradoxal. O paradoxo inicial consiste no fato de que não chegamos a ter, desde 2003, um regime de poder inteiramente fora ou acima das leis, de modo que agora estivéssemos diante de um verdadeiro problema de transição, tal como Espanha e Brasil após as respectivas ditaduras. Bem verdade que a esquerda petista, pelo uso torto de velhas categorias ou por contaminação dos vizinhos populismos, ou ainda por mero oportunismo, aprendeu a enfrentar cada rodada eleitoral com recursos morais e materiais nem sempre de origem acima de qualquer suspeita.

Em todos estes anos, a mera perspectiva de perder eleições, fato trivial numa democracia, pareceu ao lulopetismo algo próximo de uma catástrofe: o inimigo, a “direita”, não podia deixar de encarnar, invariavelmente, um retrocesso civilizatório. A proclamada revolução social pacífica, empreendida pelo petismo, ao retirar milhões de pessoas da pobreza e diminuir as distâncias sociais, teria deixado em seu rastro uma classe média ressentida e temerosa. E neste pântano moral é que a “direita” iria buscar combustível para a intolerância e o ódio de classe, que não cabia admitir sob pena de faltar ao mandato da História.

A desmoralização do inimigo haveria de ser sustentada por dinheiro e recursos só possíveis a partir de uma estratégia de ocupação agressiva dos aparelhos de poder – e nisso residia, não por acaso, o risco de eventual consolidação de um regime “revolucionário institucional”, à moda mexicana. Da boca para fora, nosso arremedo de PRI defendia o financiamento público das ações partidárias; na prática, um inédito mecanismo vertical e centralizado de arrecadação legal e ilegal mudava os termos da competição eleitoral e da conformação do poder.

Desmontar tal mecanismo de apropriação do Estado e de suas empresas, levado a cabo por uma esquerda de inclinação autoritária e procedimentos velhíssimos, está entre as razões pelas quais quase se chega a imaginar como de transição o governo Temer. E o impeachment, traumático como é, mas plenamente constitucional, em circunstâncias menos irracionais poderia ser o momento inicial de regeneração de um PT menor e aggiornato. Para isso, aliás, servem as temporadas na oposição, que, mesmo duras e difíceis, não são nem devem ser vividas como uma estação no inferno.

Governa-se também a partir da oposição, contribui-se para mudar relações de força mesmo fora do poder, compreendendo melhor os limites postos pela sociedade a uma ação política que se mostrou voluntarista e, muitas vezes, além da legalidade.

Para tanto conviria a todos que, no PT ou em outros grupos de esquerda, se fizesse ouvir não o grito estridente e inócuo contra o “golpe constitucional” ou a ameaça de uma oposição do tipo terra arrasada que marcou negativamente a história daquele partido. Seria benéfico para a democracia que, a despeito de justificadas expectativas ruins, por lá surgissem os tais “heróis da retirada”, isto é, gente dotada de autocrítica e capaz de sugerir futuros cursos de ação distintos destes que aproximaram perigosamente o petismo dos populismos autoritários. Tais heróis, de fato, propõem-se a renovar a cultura de um partido e suas relações com os demais atores e instituições – e claramente não são recrutáveis em “exércitos” informais.

Em poucas situações como agora temos tanto direito ao pessimismo da inteligência. Mesmo acossado intelectual e politicamente, o petismo aferra-se a uma narrativa em que, como norma, detém a superioridade moral – e isso quando praticamente todo o grupo dirigente, a começar pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, se encontra às voltas com um vasto conjunto de acusações raras vezes visto em nossa vida política. E num contexto que põe em risco a quase totalidade do sistema partidário – o coração da democracia –, a tal ponto enredado em esquemas de cooptação que, salvo melhor juízo, nem sequer a sombra de herói positivo parece surgir de veneráveis partidos como o PMDB.

Alegar que se trata de ação concertada da (frágil) oposição, da imprensa monopolizada e até de setores do aparelho de Estado, mancomunados numa “nova forma de golpe”, pode tranquilizar consciências simples. Pior ainda, pode insuflar uma espécie de subversivismo elementar que paralise, na oposição, partidos ou frentes de esquerda sem capacidade efetiva de liderar um conjunto de forças e mesmo um país, numa perspectiva socialmente justa. Previsivelmente, tal alegação nem de longe reporá a esquerda política em posição dirigente nos próximos (muitos) anos, uma faceta nada desprezível da herança maldita que ora nos desorienta.

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*Luiz Sérgio Henriques é tradutor e ensaísta e é um dos organizadores das 'obras' de Gramsci no Brasil - site: www.gramsci.org

A desgraça dos salvadores – Fernando Gabeira

- O Globo

Passei dia e noite ouvindo discursos. O último nome de senador que ouvi foi o de Vicentinho, que viajava num carro negro para entregar a Dilma a notícia do fim de jogo. A longa sessão foi um pouco diferente da da Câmara. Mais discursos, menos gestos. Ainda assim, creio que já havia amanhecido, ouvi o senador Ivo Cassol dedicar quase toda sua fala à pílula do câncer. Para ele, Dilma estava caindo porque hesitou em colocar laboratórios oficiais produzindo a pílula. Foi a única saudação aberta ao obscurantismo. O dia já estava claro, e consultava a lista de oradores como nos desfiles de escola de samba, aqueles em que algumas aparecem já com dia claro.

Quando olho para trás, ainda meio tonto de cansaço, tento alinhar algumas ideias verdadeiramente sinistras, aquelas que levaram a esquerda brasileira a essa derrota histórica. Seduzir-se pelo chamado socialismo do século XXI é uma delas. Costumo comparála aos pedaços do Muro de Berlim, não os verdadeiros que foram vendidos logo após a queda. Com as fortes vendas, os camelôs de Berlim tiveram que falsificar pedaços do muro para atender à demanda.

O socialismo do século XXI tornou-se atraente na América do Sul com a vitória do chavismo. A ideia era conquistar o governo pelo voto e, progressivamente, dominar as instituições autônomas: Congresso, Judiciário, Forças Armadas e, dentro das possibilidades, a imprensa. O modelo teve êxito na Venezuela, se podemos chamar de êxito um regime que empobreceu o país e cria enormes filas até para comprar papel higiênico. Lá foi possível dominar o Congresso, ganhar as principais disputas na Justiça e ter comandantes militares partidários do governo. A imprensa independente foi mantida sob intenso ataque.

No Brasil, essas expectativas começaram a falhar no mensalão. Para dominar o Congresso, era preciso injetar muito dinheiro nos partidos aliados. O escândalo acabou sendo descoberto, e um juiz indicado pelo governo do PT, Joaquim Barbosa, conduziu o inquérito com admirável lisura. Os militares brasileiros mantiveram-se distantes do choque partidário. A imprensa, cortejada pelo PT nos seus tempos de oposição, foi demonizada. Não porque tenha, através da investigação, descoberto os grandes lances da corrupção. Ela noticiou o resultado do trabalho de duas instituições também autônomas: Polícia Federal e Ministério Público, em sintonia com o juiz Sérgio Moro.

Uma outra ideia sinistra que sobreviveu na esquerda brasileira foi que os fins justificam os meios. No fundo, isso significa dizer: estou fazendo o bem, danem-se as regras democráticas. Para avançar nesse terreno contaminado, tornou-se necessário desenvolver uma nova língua e prosseguir com a tática já esboçada na campanha: culpabilizar os seus críticos.

Se na campanha eram chamados de preconceituosos os que tinham reservas sobre as ideias e atitudes de Lula, no governo tornaram-se, principalmente, reacionários a serviço das elites. Ao optar sempre pelo contraataque, o PT não percebia que a crise se aprofundava e o partido se afastava cada vez mais da única possibilidade de superá-la: um esforço de união nacional. O PMDB, como sócio menor, fez muitas coisas erradas em parceria com o PT.
Nunca embarcou, entretanto, no discurso nós contra eles, nem se refugiou numa suposta superioridade moral em relação aos seus críticos. A chance, ainda que precária, de realizar um tipo de união nacional, ideia sedutora em crises profundas, acabou levando as águas para os moinhos do PMDB. Era uma questão de tempo.

A troca não significa substituir um esquema corrupto por algo puro e imaculado. Mas é sempre possivel denunciar as falcatruas das raposas do PMDB sem que te acusem de estar a serviço das elites e afirmem sua superioridade moral como portadora de um projeto único de salvação.

Nesse sentido, o choque com o PMDB abre uma chance de recuperar um diálogo político, sem, necessariamente, se defender de estar a serviço das elites, colonizadores de olhos azuis, brancos, machos e heterossexuais. Esse processo de critica à esquerda para mim já está se encerrando, pois acredito que ela própria terá de refletir sobre os caminhos que a levaram a esse fracasso. O mais importante é olhar para a frente, inventariar o rombo deixado nas contas nacionais e a amplitude do processo de corrupção.

Não é preciso parar a reconstrução. Mas, se não tivermos todos os dados sobre nossa desgraça econômica, será difícil traçar um caminho realista para superá-la. Quanto ao processo de corrupção, nunca é demais esquecer que os governos Collor e Dilma caíram sob acusações semelhantes. E olha que tanto Collor como o PT, nos palanques das diretas, eram as estrelas do futuro. Caçador de marajás, Collor prometia combater a corrupção, e Lula defendia a ética na política. Hoje, ambos são acusados no escândalo do Petrolão. Nossa jovem democracia falhou nesse quesito.

Em vez de acreditar em salvadores, será preciso conhecer e discutir as condições básicas que levam os governos brasileiros à ruina moral, independentemente de suas propostas moralizadoras. Redentores caíram no mesmo buraco. São responsáveis por seus erros, mas também é preciso desmontar as armadilhas do caminho.

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Fernando Gabeira é jornalista

A importância da laicidade no século 21 - Celso Lafer*

- O Estado de S. Paulo

Neste século, cujo primeiro evento de repercussão mundial foram os ataques às torres gêmeas de Nova York, em 11 de setembro de 2001, assistimos ao ressurgimento do papel da religião na vida política. No cenário internacional, são notórios e dramáticos os fatos que complicam a geopolítica mundial, ocasionados por interpretações de caráter fundamentalista de religiões estabelecidas.

No Brasil, a presença da atividade política baseada e dirigida por princípios de fé nunca foi tão marcante. De acordo com o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), o pleito de 2014 elegeu uma bancada evangélica de 75 deputados federais; no seu apogeu, em 1962, o Partido Democrata Cristão, de inspiração católica, tinha 20 cadeiras na Câmara dos Deputados.

Nesse contexto, é oportuno retomar a questão da laicidade, seu papel na vida da democracia e dos direitos humanos, seus nexos com a secularização e a tolerância.

A secularização, termo que vem do latim saeculum, do mundo da vida terrena (não da vida religiosa), e a laicidade, do grego laos, povo, como leigo e laico, em contraposição ao clero no quadro de hierarquização da Igreja, foram consequências da dessacralização da sociedade, como aponta Weber.

O processo de diferenciação estrutural e funcional das instituições é a acepção que mais aproxima a laicização à secularização. Os atores sociais não só começaram a se distanciar da força avassaladora das tradições religiosas, mas as relações das religiões com o Estado se alteraram fundamentalmente no correr desse processo que remonta aos ideais do Iluminismo e da Revolução Francesa. Nesse contexto, surge o tema da laicidade do Estado.

Um Estado laico diferencia-se do teocrático, em que o poder religioso e o poder político se fundem, e também do confessional, em que há vínculos entre o poder político e uma religião.

No Brasil Império, a religião oficial era a católica, ainda que outras fossem permitidas e a liberdade de opinião, assegurada. Com a República, deu-se a separação da Igreja do Estado, que se tornou laico, ensejando a igualdade da liberdade dos cultos, a secularização dos cemitérios, o casamento civil e o registro civil para o nascimento e o falecimento de pessoas.

Rui Barbosa, autor da legislação que implantou a laicização do Estado brasileiro, consagrada na Constituição de 1891, explica que sua matriz inspiradora foi norte-americana. O Estado se dessolidarizou de toda a atividade religiosa em função, como diria Jefferson, da prevalência de um muro de separação entre a atividade religiosa e a ação estatal como preconizado pela Primeira Emenda da Constituição dos EUA. O Estado laico não implica que a sociedade civil seja laica. Com efeito, esta passou a se constituir como uma esfera autônoma e própria para o exercício da liberdade religiosa e de consciência, na qual o Estado não interfere. Abria-se desse modo espaço para o que Benjamin Constant denominou liberdade negativa, não submetida a regras externas provenientes do poder público.

A laicidade, aponta Abbagnano, é expressão do princípio da autonomia das/nas atividades humanas: elas podem se desenvolver segundo regras próprias, não impostas externamente por fins e interesses diversos daqueles que as inspiram e norteiam. É o caso da liberdade de pesquisa, que pressupõe o antidogmatismo e o exame crítico de temas e problemas.

Quando a polarização e as tensões se tornam mais agudas, é importante lembrar que a laicidade é uma das formas de tolerância, ou, mais exatamente, uma das maneiras de responder ao problema da intolerância.

Como ressalta Bobbio, o tema da tolerância surgiu com a desconcentração do poder ideológico (consequência da secularização), pois a tolerância em relação a distintas crenças e opiniões coloca o problema de como lidar com a compatibilidade/convivência de verdades contrapostas (laicidade metodológica, pluralismo, antidogmatismo) e, subsequentemente, com o “diferente” (estrangeiros, pessoas de diversas opções sexuais, etc...). Daí o nexo entre democracia e direitos humanos, pois a tutela da liberdade de crença, de opinião e de posições políticas integra as regras do jogo democrático, para as quais o Outro não é um inimigo a ser eliminado, mas integrante da mesma comunidade política.

Em relação ao “diferente”, lembro que a Constituição (artigo 3.º, IV) estabelece que um dos objetivos da República é “promover o bem de todos sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor e quaisquer outras formas de discriminação”.

Entre os componentes da dicotomia tolerância/intolerância está, no plano interno, a convivência/coexistência de verdades contrapostas (religiosas, políticas), no âmbito das regras do jogo democrático e da tutela dos direitos humanos; no plano externo, a aceitação da pluralidade dos Estados na sua heterogeneidade.

Por essa razão um Estado aconfessional como o brasileiro (artigo 19, I, da Constituição) não pode, por obra de dependência ou aliança com qualquer religião, sancionar juridicamente normas ético-religiosas próprias à fé de uma confissão. Por exemplo: no campo da família, o direito ao divórcio; no critério do início da vida, a descriminalização do aborto e a pesquisa científica com células-tronco.

Num Estado laico, as normas religiosas das diversas confissões são conselhos dirigidos aos fiéis, e não comandos para toda a sociedade. A finalidade da liberdade de religião e de pensamento é garantir ao cidadão uti singuli a máxima diferenciação no campo das ideologias, das religiões e da cultura – ou seja, a liberdade individual.

A finalidade pública da laicidade é criar, nesse contexto, para todos os cidadãos uma plataforma comum na qual possam encontrar-se enquanto membros de uma comunidade política. É essa finalidade que cabe resguardar, para conter o indevido transbordar da religião para o espaço público, que se tornou um dos desafios da agenda política contemporânea.

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*Celso Lafer é professor emérito da Universidade de São Paulo