sexta-feira, 21 de maio de 2010

O BLOG NÃO SERÁ POSTADO AMANHÂ

Estou indo para S. Paulo (reunião do diretório nacional do PPS). Estarei de volta no domingo.
Abraços

Sujou a ficha:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

Está mais uma vez nas mãos do Judiciário o aperfeiçoamento de nosso sistema eleitoral, e desta vez a “judicialização” da política se dará por culpa expressa do corporativismo dos congressistas, que deturparam o projeto de lei da Ficha Limpa o mais que puderam, até o último minuto de votação no Senado

O “aperfeiçoamento” final ocorreu apenas no texto, a chamada emenda de redação, segundo a explicação oficial, mas na verdade representa uma tentativa derradeira de distorcer o espírito da lei.

Em busca de “harmonia estilística”, o senador Francisco Dornelles alterou os tempos verbais em alguns artigos da lei, de maneira que as novas regras, que seriam aplicadas aos políticos que “tenham sido condenados”, ficaram valendo apenas para aqueles “que forem condenados”.

Seria muita ingenuidade imaginar que o senador Dornelles, uma das últimas raposas políticas em atuação no Congresso, estivesse preocupado com o estilo legislativo do projeto.

A partir dessas mudanças verbais, abriu-se uma grande discussão jurídica que pode retardar a entrada em vigor da nova lei e, mais que isso, liberar os poucos “fichas-sujas” que eram alcançados por ela da maneira como foi aprovada na Câmara.

Segundo pesquisa da ONG Voto Consciente, apenas cerca de 10% dos atuais parlamentares estariam inelegíveis com a mudança do alcance da lei, de primeira para a segunda instância (condenação por colegiado).

Mesmo assim, já era considerada um avanço da cidadania em relação às disposições em vigor, que exigem condenação em última instância, o chamado “trânsito em julgado”, para tornar inelegível um candidato.

A repercussão da lei nos estados e municípios também seria outro benefício conseguido, com o impedimento de vários deputados, vereadores e prefeitos de disputar a reeleição, além de antigos políticos, que não poderiam retornar à vida pública.

A questão é mais grave por que, apesar da modificação no Senado, a lei não retornou à Câmara e foi diretamente para a sanção presidencial.

Esse procedimento, na visão do senador Demóstenes Torres, relator do projeto e favorável a ele, demonstra que não houve alteração de conteúdo no projeto que saiu da Câmara e, portanto, continuam inelegíveis todos aqueles que já estão condenados.

A questão é que essa interpretação jurídica do espírito da lei não resiste à “interpretação gramatical”, como já advertiu o presidente do TSE, ministro do Supremo Ricardo Lewandowski, para quem, pela simples leitura do projeto aprovado no Senado, as restrições só atingem os que forem condenados a partir da vigência da lei.

Essa é uma diferença que vale, por exemplo, a elegibilidade de um Paulo Maluf, para pegarmos um efeito simbólico da nova legislação.

Já há deputados, entre eles o líder do PSOL, Chico Alencar, que defendem que a Mesa da Câmara deve definir como nula a mudança realizada no Senado, fazendo retornar a redação original.

Mesmo aqueles políticos que admitem que a alteração na redação modificou também o sentido da legislação defendem que a lei não pode retroagir para prejudicar ninguém.

Além da interpretação de que a mudança prejudica, sim, a sociedade como um todo para defender a corporação política, existe um fato: o que se aprovou não é uma mudança na legislação atual, mas novas exigências para o acesso à legenda partidária para concorrer às eleições.

O que leva a outra questão em debate, sobre a vigência da lei. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, defende a imediata validade da legislação, já para esta eleição, embora o artigo 16 da Constituição diga que qualquer alteração nas regras do processo eleitoral tem que ser aprovada um ano antes do pleito.

Caberá ao TSE definir quando começa o “processo eleitoral”. Até hoje, toda legislação eleitoral tinha que ser aprovada até setembro do ano anterior à eleição, mas o Tribunal pode definir que o “processo eleitoral” só começa após o registro dos candidatos, cujo prazo final é o começo de julho.

Há também a possibilidade de a nova lei ser interpretada não como parte do processo eleitoral, mas uma “norma material”, o que permitiria sua aplicação ainda este ano, e não apenas a partir da eleição municipal de 2012, como querem muitos.

Todas essas manobras protelatórias só fazem tornar mais verdadeira a frase do deputado Edmar Moreira, hoje PR, que ficou conhecido como o “homem do castelo”, que tinha certeza de que seria absolvido por seus pares, como realmente foi, porque “o Parlamento sofre do vício insanável da amizade”.

Impossível não lembrar Tancredi em Il Gattopardo de Tomaso di Lampedusa: “É preciso mudar, para tudo continuar como está”.

O clima de vale-tudo está tomando conta da chamada pré-campanha eleitoral, e está se refletindo na propaganda gratuita de televisão dos partidos políticos.

Ontem foi a campanha do DEM que foi retirada do ar por fazer propaganda da candidatura do tucano José Serra, o que prenuncia novos atritos com as campanhas do PSDB e do PPS nos próximos dias, a exemplo do que acontec eu com apropaganda partidária do PT, punida pela Justiça Eleitoral.

A propaganda antecipada da candidata Dilma Rousseff também foi alvo de parecer da vice-procuradoraeleitoral Sandra Cureau, que está pedindo uma multa maior para o presidente Lula, para a candidata oficial e para vários dirigentes sindicais por terem feito propaganda eleitoral proibida em ato do sindicato de São Bernardo do Campo.

O jogo eleitoral está parecendo aquelas partidas de futebol em que o juiz não se impõe no início do jogo, deixando faltas sérias se sucederem, e depois não consegue mais controlar os jogadores.

Nesses casos, alguns juízes tentam organizar a bagunça expulsando jogadores.

Ordem do presidente :: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O cálculo de custo-benefício do programa partidário do PT em figurino francamente eleitoral exibido no dia 13 de maio enquanto o Tribunal Superior Eleitoral se preparava para julgar infração semelhante cometida cinco meses antes foi um ato da responsabilidade exclusiva do presidente Luiz Inácio da Silva.

Um detalhe permanece obscuro: como Lula sabia que o tribunal atrasaria o julgamento, intuição?

Sua decisão teve o apoio de parte do comando político da campanha de Dilma Rousseff, mas não a aprovação prévia da equipe de advogados à qual sequer foi submetido, como é de costume, o conteúdo do programa.

Não é apenas da oposição a avaliação de que naqueles dez minutos houve antecipação do horário eleitoral, cujo início está marcado para 17 de agosto próximo.

Nas internas da campanha do PT se reconhece essa realidade, embora não haja unanimidade quanto à necessidade de se recorrer à prática de infração tão flagrante.

Como as razões de Lula não se discutem, o máximo que se faz nessa altura é justificá-las: ele precisava o quanto antes produzir fatos capazes de fazer Dilma Rousseff subir nas pesquisas para uma situação de empate com o adversário José Serra.

No ponto de vista geral, para empatar o jogo e tentar reiniciar do zero a zero. Sob o aspecto interno da aliança com o PMDB, quanto mais forte Dilma aparecer nas pesquisas menos alta fica a fatura cobrada pelo parceiro.

Um programa sozinho de 10 minutos teria todo esse poder? Não. Mas somado ao pronunciamento de Lula no 1.º de Maio em rede nacional de rádio e televisão, mais as inserções do PT de 30 segundos em canais de televisão aberta nos horários nobres em dias de semana, o efeito final valeu o risco calculado.

Ocorre que nem tudo é benefício nessa vida. Por isso há um grupo no comando da campanha preocupado com os possíveis prejuízos à frente e defensor da tese de que já chega de transgressões.

Com o seguinte raciocínio: se Dilma está bem nas pesquisas, se a campanha deu uma boa aprumada, para que acumular condenações que possam vir a ensejar após o registro das candidaturas uma ação por abuso de poder político?

O ministro Marco Aurélio Mello deixou no ar esse aviso em plena sessão do TSE. Os mais prudentes entenderam que insistir no que até agora deu certo pode não ser mais um risco calculado. Mas um erro de cálculo.

Risco do rito. O ministro dos Esportes, Orlando Silva, alega que a medida provisória com as novas regras para as obras nos aeroportos "simplifica o rito" das licitações previsto na Lei 8.666.

Bom, desde que não facilite a falta de cerimônia no manejo dos recursos. Notadamente os públicos.

Nos Jogos Pan-americanos de 2007 houve monumentais atrasos nos prazos, colossais liberações de verbas, e o custo previsto para R$ 390 milhões ficou em R$ 3,5 bilhões.

O cenário outra vez não tem boa aparência.

O Brasil foi escolhido como sede da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016 com antecedência suficiente. Além disso, o Planalto teve no governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, um porta-voz insistente nos últimos quatro anos da urgência de uma solução para os aeroportos.

Chegou a anunciar que o Planalto iniciaria o processo de privatização para ser desautorizado pelos fatos.

Perdido em seu processo indecisório, o governo agora apresenta como saída de emergência o afrouxamento das exigências nas obras por meio de MP.

Com isso dá margem a desconfiança. Uma, a Infraero foi freguesa da malha fina do Tribunal de Contas. Outra porque o governo manifestou em mais de uma ocasião seu desagrado com o rigor da Lei de Licitações 8.666, agora posta de lado.

Cigana. O ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, obrigado pela Justiça a devolver ao erário R$ 164,7 mil e condenado à perda dos direitos políticos por oito anos, terá de esperar mais um pouco antes de ver confirmada a previsão de que as denúncias contra ele virariam "piadas de salão".

Impasse :: Eliane Cantanhêde

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Enquanto o Brasil bate de frente com os EUA, uma sensação se consolida mundo afora: com ou sem o acordo mediado pelo Brasil, com ou sem as sanções engendradas pelos EUA, o regime da dupla Kamenei-Ahmadinejad vai acabar fabricando a bomba atômica. E seja o que Deus quiser.

Pelo acordo, o Irã enriquece levemente uma parte do seu urânio, envia para a Turquia e recebe de volta para uso civil. Isso significa que o Irã decidiu parar de enriquecer o resto de seu urânio e de se habilitar a ter a bomba? Improvável.

Já as sanções articuladas no Conselho de Segurança da ONU pelos EUA preveem controle de financiamentos e transações bancárias, além de venda e trânsito de armas.

E daí? É suficiente para amedrontar os iranianos? Ou, ao contrário, só irá justificar um aprofundamento das pesquisas nucleares?

Ao entrar e ir tão fundo nas negociações com o Irã, o Brasil busca um (abstrato) protagonismo internacional e uma (concreta) cadeira permanente no Conselho de Segurança, ora tateando, ora extrapolando limites. O resultado é que o país está no foco da tensão internacional -e se contrapondo à maior potência. Os EUA ficaram de um lado, o Brasil, do outro.

Aliás, não deixa de ser curiosa a pressa dos americanos. O acordo foi num dia e, já no dia seguinte, os EUA lideravam a reunião do Conselho pró-sanções. Soou como uma certa "dor de cotovelo" pela capacidade de ação brasileira, junto com um: "Ponha-se no seu lugar!".

O desequilíbrio é enorme. Segundo balanço da França, só 3 dos 15 países do Conselho (com assentos permanentes ou rotativos) são contra as sanções: Brasil, Turquia e Líbano. Todos os demais fecharam com os EUA, pró-sanções, enquanto o Irã parece dar de ombros.

O Brasil, pois, ganha tanto os holofotes como o risco de perder feio.Ao tentar evitar o isolamento do Irã, pode estar se isolando junto com ele. Típico abraço de afogados.

Sujismundos:: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - Nos anos 70, o regime militar criou um personagem chamado Sujismundo.

Era uma espécie de antigaroto-propaganda que fazia muito sucesso. Conforme seguíamos na TV as peripécias do porcalhão, o locutor ia narrando em tom cívico e professoral: "Eis de novo o Sujismundo. Está longe de ser um exemplo de limpeza. Não se importa com o bem-estar dos companheiros"... Os filmetes terminavam invariavelmente com o slogan: "Povo desenvolvido é povo limpo!".

A lembrança extemporânea vem a propósito da aprovação do projeto Ficha Limpa. Os políticos se tornaram os Sujismundos do Brasil atual.

O clamor popular por decência não é, a rigor, nenhuma novidade. De tempos em tempos, a pauta moralizante anima a sociedade. Às vezes, serve ao populismo conservador; em outras, se confunde com golpes de marketing -basta lembrar do "varre, varre, vassourinha" ou do "caçador de marajás".

Mas seria injusto negar, por isso, méritos à iniciativa do Ficha Limpa. Sobretudo num país que empilha escândalos em série e cultiva a impunidade, no qual a cultura do patrimonialismo ainda organiza em larga escala o jogo da política.

Romero Jucá (PMDB), líder do governo no Senado, chegou a dizer que o Ficha Limpa era prioritário para a sociedade, mas não para o governo. Seus colegas perceberam a tempo que, neste caso, a desconexão com os anseios do país poderia custar caro -é um ano eleitoral.

Deu-se, então, um jeito de aprovar um projeto, mas de eficácia quase simbólica. Sacia-se o eleitor iludindo a sua boa-fé -eis a mágica. Desidratada cirurgicamente, a lei valerá só para condenações futuras em segunda instância e, segundo consta, não alcança nenhum dos mais notórios Sujismundos em circulação no país. Se depender dela, até Justo Veríssimo está feito.

É bom, portanto, comemorar com moderação. Quando, no ano que vem, o PMDB estiver negociando seu apoio ao governo (qualquer um), lembremos de Sujismundo: povo desenvolvido é povo limpo!

Faltou o depoimento de Serra:: Maria Cristina Fernandes

DEU NO VALOR ECONÔMICO

"O Serra ainda não deu o depoimento dele porque, por incrível que pareça, está mais ocupado agora do que quando era governador". O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso comentava a exposição que acabara de inaugurar sobre o Plano Real na sede da fundação que leva seu nome.

Numa das salas, uma dúzia de nomes simetricamente expostos com botão e fone de ouvido oferecem depoimentos sobre os primórdios do plano de estabilização da moeda.

Uma grande parte dos depoentes era plateia de FHC naquela manhã de segunda-feira - Gustavo Franco, Pérsio Arida, Edmar Bacha. José Serra, de fato, estava ausente da lista.Muito cumprimentada ao entrar, a jornalista Miriam Leitão, protagonista de entrevero recente com o pré-candidato tucano sobre a autonomia do Banco Central, logo arrumaria lugar para sentar num auditório que, lotado, já oferecia aos sobressalentes um telão do lado de fora.

Entre os presentes, poucos colaboradores de Serra, como Andrea Matarazzo, que acabou de assumir a Secretaria de Cultura do Estado e não palpita nos seus planos para a economia brasileira.

Dos palestrantes, ouviriam que era chegada a hora de se resgatar o sistema financeiro mundial para sua função primeira de fomento da produção (Felipe González, ex-primeiro-ministro espanhol); que a crise punha em xeque o padrão-dólar (Ricardo Lagos, ex-presidente chileno); e que não se poderia sair do fundamentalismo de mercado para a utopia regressiva de controle total do Estado (FHC).

A sucessão brasileira não estava em pauta, mas os estrangeiros não conseguiram passar ao largo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. González saudou os esforços da diplomacia brasileira no Irã, país que definiu como o epicentro da nova desordem internacional; e Julio Maria Sanguinetti (ex-presidente do Uruguai) a resistência de Lula, em contraste com as manobras de Álvaro Uribe (Colômbia), à tentação de buscar uma mudança constitucional pelo terceiro mandato.

Os quatro ex-presidentes cruzariam a pé o Vale do Anhangabaú para a segunda parte do encontro, almoço oferecido pela BMF&Bovespa, patrocinadora da exposição do Plano Real.

Lá todos seriam apresentados à mais encorpada investida da instituição para o próximo mandato presidencial: fazer deslanchar o Brasil Investimentos & Negócios (Brain), nome novo que arrumaram para o conjunto de iniciativas que ficara conhecido como Plano Ômega.

Pelas conjeturas que gera ao lançar o Brasil como polo da indústria financeira internacional num momento em que a ordem está de ponta cabeça, seus organizadores principiam pelo que não se pretende fazer do país: paraíso fiscal (Bahamas), centro offshore (Suíça), zona franca para finanças (Dubai), conversibilidade total da moeda (Inglaterra), economia dolarizada (Panamá), economia superexposta a finanças (Islândia) e sociedade excessivamente alavancada (EUA).

Para viabilizar o modelo que começou a ser gestado quando o país alcançou o grau de investimento, em 2008, há requisitos como "aprimoramentos do sistema tributário", "liberdade a fluxos de capitais com baixos obstáculos e custos" e "simplificação de forma gradativa e prudente da burocracia de entrada e saída de capitais".

Ao final do encontro, Paulo de Souza Oliveira Jr., executivo contratado para dirigir o projeto, resume as ambições do projeto: "Não é uma política de governo, mas de Estado".

Diz que a Brain será levada a debate na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado e já está na pauta de discussão com os candidatos. A conversa está mais avançada com a candidata do PT, Dilma Rousseff, convidada da Bolsa para um seminário hoje com investidores estrangeiros em Nova York.

Serra ficou para outro encontro que a Bolsa deve promover em Londres. A Brain acha que o Banco Central é a Santa Sé? O diretor da Brain mede as palavras e despista: "Foi apenas uma declaração. A liberdade do BC de fato tem sido suficiente. A de direito é uma agenda de governo, não é nossa, mas o que aconteceu até agora tem sido muito benéfico para o país. A política de metas de inflação é indispensável".

Parece haver poucas dúvidas de que a Brain está em comunhão com a plateia do IFHC. A notícia de que Antonio Palocci não vai tentar a reeleição à Câmara também emite um sinal eloquente de que o petista mais afeiçoado aos tucanos do Real deverá ter sua dedicação integral à campanha de Dilma retribuída à altura.

Resta compatibilizar as manifestas insatisfações de Serra em relação ao Banco Central com os objetivos de um projeto que, além da própria autoridade monetária brasileira e da Bovespa, tem o envolvimento da Febraban, da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

Dadas as dificuldades de o pré-candidato do PSDB responder serenamente sobre como compatibilizar o crescimento vigoroso de longo prazo que pretende e a manutenção do regime de metas de inflação, um calhamaço ("Política Monetária, bancos centrais e metas de inflação", FGV, 2009) escrito por gente que vê ruídos nesse dueto oferece algumas pistas.

O livro tem prefácio de Yoshiaki Nakano e artigos assinados por mais de duas dezenas de economistas, entre eles Luiz Carlos Bresser Pereira, tucano que sempre se perfilou ao lado de Serra durante o reinado de Pedro Malan.

Lá estão levantadas propostas como a ampliação do colegiado que hoje compõe o Conselho Monetário Nacional; a adoção de um horizonte mais flexível para o cumprimento da meta de inflação; e a instituição de controle de capitais.

Parecem claras as divergências entre os autores desse livro e a plateia do IFHC sobre a influência das políticas monetária e fiscal no crescimento. No discurso que fará hoje em Nova York, Dilma pode sinalizar o quão domesticada foi sobre o tema. Serra ainda terá sua oportunidade. Talvez os investidores estrangeiros tenham mais sorte que os jornalistas.

Maria Cristina Fernandes é editora de Política. Escreve às sextas-feiras

Demônios Da Garoa & Fundo De Quintal - Trem Das Onze

Marina defende política de privatizações do governo FHC

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Ex-senadora diz que contrariou a venda da telefonia às empresas estrageiras, mas que hoje ve que 'o princípio foi correto e a mudança positiva'

Lucas de Abreu Maia

SÃO PAULO - Pré-candidata à Presidência pelo PV, a senadora Marina Silva (AC) saiu em defesa da privatização da telefonia no governo de Fernando Henrique Cardoso. "Fui contra a privatização das telecomunicações, mas hoje vejo que o princípio foi correto e a mudança positiva", disse em entrevista ao jornalista João Doria Jr.

A senadora se declarou a favor das parcerias público-privadas e disse que a sociedade "está mais atenta" quando o assunto é privatização. "Por isso, estão puxando o freio", analisou.

A entrevista - que foi gravada na segunda-feira, 17 - vai ao ar nesta sexta-feira, 21, pela Rede Bandeirantes, no programa Show Business. Na conversa, Marina se disse "portadora de um novo projeto". Indagada sobre qual estratégia adotará para vencer as eleições, ela reconheceu as dificuldades políticas de sua candidatura - o PV não tem aliança com nenhuma legenda -, mas afirmou que pretende "mobilizar os corações e mentes dos brasileiros". "Nosso tempo de campanha será menor, obviamente, do que o dos outros partidos", admitiu a senadora, acrescentando que a internet e as redes sociais deverão funcionar como ferramentas de campanha.

A senadora defendeu a pré-candidatura de seu vice, Guilherme Leal, que é presidente do Conselho da Natura. Questionada por Doria se estaria seguindo os passos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva - cujo vice, José Alencar, foi escolhido para acalmar o setor empresarial -, Marina negou: "É uma coincidência. Leal é um empresário de sucesso, com boas práticas empresariais e comprometimento com o meio ambiente, por isso foi indicado ao cargo."

Militância de MG quer chapa Serra-Aécio, diz tucano

Agência Estado

EDUARDO KATTAH

O secretário-geral do PSDB-MG, deputado estadual Lafayette de Andrada, disse hoje que existe "um grande desejo" da militância do partido e dos "mineiros de um modo geral" para que o ex-governador de Minas Gerais, Aécio Neves, aceite compor como vice numa chapa encabeçada pelo pré-candidato tucano à Presidência, o ex-governador paulista José Serra. Pela primeira vez, um dirigente tucano mineiro tratou abertamente da hipótese de uma chapa puro-sangue.

Andrada, contudo, ponderou que Aécio tem reiteradamente afirmado que será candidato ao Senado e somente quando voltar a Minas poderá "desvendar esse mistério". O ex-governador está em viagem ao exterior e deverá desembarcar em Belo Horizonte no fim de semana.

"Existe um grande desejo da militância do PSDB, enfim, dos mineiros de um modo geral, de que o ex-governador Aécio Neves seja o vice do (ex) governador José Serra, candidato a presidente da República", disse o deputado, em entrevista à rádio Itatiaia.

Para o secretário-geral do PSDB-MG, a opinião generalizada é que a presença do tucano mineiro na chapa seria um "grande reforço" e teria potencial de alavancar a candidatura Serra. "São avaliações que devem ser feitas", observou.

"Temos de aguardar a chegada do Aécio Neves e ele é que vai dizer o que pretende fazer."

Aécio deverá retomar as viagens com o governador e pré-candidato tucano pelo interior do Estado no dia 28 com uma visita a Ipatinga. Anastasia ressaltou que o ex-governador terá um "peso decisivo" na sua campanha no segundo semestre. "É um grande nome não só em Minas, mas no Brasil", destacou.

PPS quer aprovar plebiscito que obriga reforma política na próxima legislatura

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

da Reportagem Local

O deputado Raul Jugmann (PPS-PE) diz que conseguiu o número assinaturas necessárias para dar urgência ao plebiscito da reforma política.

A ideia do deputado é que o Congresso aprove um plebiscito para acontecer durante as eleições deste ano, que decidirá sobre a obrigação de uma reforma política na próxima legislatura.

O pedido de urgência, com 280 assinaturas de deputados, será entregue amanhã, segundo o deputado.

"Se ficarmos esperando uma iniciativa do Congresso a reforma política não sairá nunca", afirma Jugmann. Para ele, a iniciativa seria uma nova resposta depois da aprovação do projeto "ficha limpa".

O deputado diz que o projeto tem apoio dos presidentes da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e do STF (Supremo Tribunal Federal), além do secretário-geral da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).

Ministro do TSE suspende propaganda partidária do DEM

DEU NA FOLHA DE S. PAULO
FELIPE SELIGMAN
da Sucursal de Brasília

O corregedor-geral do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Aldir Passarinho, decidiu nesta quinta-feira suspender os direitos de veiculação das inserções de rádio e televisão do DEM em São Paulo que iriam ao ar hoje e nos dias 22 e 25 de maio.

Passarinho entendeu que a inserção do DEM veiculada na última terça-feira faz propaganda eleitoral antecipada em favor do pré-candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra.

No programa, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), elogia o atual momento do país, mas diz que o Brasil "pode muito mais", fazendo referência ao, até agora, principal slogan da pré-campanha de Serra. Também diz que contou com o apoio do ex-governador paulista para as obras realizadas no município.

O corregedor julgou um pedido do PT, que chegou ontem ao tribunal. Em sua decisão, Passarinho concede ao DEM a opção de substituir as inserções suspensas por outras que "observem, rigorosamente, o previsto no artigo 45 da Lei dos Partidos Políticos".

Esse artigo estabelece que a propaganda partidária gratuita deve ser realizada somente para difundir os programas partidários; transmitir mensagens aos filiados sobre a execução do programa partidário, dos eventos e das atividades congressuais do partido; divulgar a posição do partido em relação a temas político-comunitários e promover e difundir a participação política feminina, dedicando às mulheres o tempo que será fixado pelo órgão nacional de direção partidária, observado o mínimo de 10%.

O ministro do TSE abriu um prazo de cinco dias para que o DEM apresente sua defesa. O caso será julgado pelo plenário do tribunal, formado por sete ministros.

O DEM afirma que irá cumprir a ordem judicial e substituir os programas. A legenda lembra que a decisão só vale para a propaganda exibida no Estado de São Paulo.

Propaganda na Bahia

O ministro, no entanto, negou pedido do PT para suspender inserção do DEM na Bahia. Os petistas acusavam o comercial de fazer propaganda negativa do governador Jacques Wagner (PT).

Para o ministro, a propaganda está dentro do limite da lei. O slogan da campanha é "o governo não faz nada".

com DANIEL RONCAGLIA, da Reportagem Local

PMDB gaúcho adere à campanha de Serra, diz deputado

Reuters/Brasil Online

Sinara Sandri

PORTO ALEGRE (Reuters) - O pré-candidato à Presidência da República pelo PSDB, José Serra, selou, em viagem a Porto Alegre, o apoio dos deputados estaduais do PMDB gaúcho à candidatura tucana, informou um deputado da legenda. Serra também atuou em acordo com o PP para a eleição no Rio Grande do Sul.

O ex-governador negou que o encontro com o PMDB desta quinta-feira faça parte de uma estratégia de buscar a base peemedebista descontente com a tendência do partido de apoiar Dilma Rousseff (PT).

"É natural que, em campanha política, procure ficar próximo de quem gosta e de quem tem afinidade", disse Serra a jornalistas, após o encontro.

Não houve um pronunciamento oficial sobre o resultado da reunião e o candidato tucano se limitou a dizer que, apesar de seu propósito não ter sido de "angariar apoios", teria ouvido "manifestações de simpatia" à sua candidatura.

Segundo um parlamentar que participou do almoço, dos nove deputados estaduais que formam a bancada do partido, sete estavam na reunião e seis teriam declarado publicamente apoio a Serra.

"Quando o PMDB gaúcho abre o voto, significa que vai para a campanha", disse o parlamentar à Reuters, sob o compromisso do anonimato.

Apesar de um quadro partidário indefinido e algumas lideranças locais simpáticas à aliança com o PT, o alinhamento do PMDB a Serra não foi visto com surpresa. O propósito do encontro teria sido um gesto simbólico e uma tentativa de fazer um contraponto ao anúncio do presidente do partido, deputado Michel Temer (SP), como vice de Dilma Rousseff.

"O Serra vai fazer disto um contraponto ao Temer. Vai mostrar para o Brasil que os históricos do PMDB, os autênticos, estão com ele", disse o mesmo parlamentar.

O PMDB paulista e o pernambucano também devem aderir a Serra.

Apesar do alinhamento com Serra, os peemedebistas gaúchos ainda não desistiram de apresentar a proposta de candidatura própria a presidente na convenção do partido, mas a iniciativa estaria "perdendo força".

Para o parlamentar, a decisão da bancada terá forte influência no diretório regional e a tendência é o isolamento das lideranças locais simpáticas a Dilma e um efeito em cascata com a adesão de prefeitos e vereadores à candidatura tucana.

PSDB E PP JUNTOS

A visita de Serra em Porto Alegre incluiu uma reunião com a direção estadual do PP.

Os tucanos gaúchos formalizaram uma proposta para a formação da coligação local que pretende reeleger a governadora Yeda Crusius (PSDB).

Pela proposta, os progressistas ficam com a indicação do candidato a vice-governador e de uma vaga no Senado. A aliança estava sendo dificultada pela resistência do PSDB em firmar uma coligação nas candidaturas proporcionais.

O impasse foi resolvido com o acordo de que só haverá coligação na eleição para deputado federal. Para o deputado Jeronimo Goergen (PP), a coligação deve ser anunciada na segunda-feira.

"A visita de Serra mostrou boa vontade. O PSDB não tinha como aceitar a coligação na estadual. Era uma questão de sobrevivência", disse o deputado.

PSDB de Minas vai protocolar nesta sexta medida judicial contra o PMDB e Hélio Costa

O Globo

RIO - O PSDB de Minas Gerais vai protocolar nesta sexta-feira, às 10h30, no Tribunal Regional Eleitoral, uma medida judicial contra o PMDB e o senador Hélio Costa. O objetivo é suspender, segundo o partido, os abusos que estão sendo praticados e que caracterizam campanha eleitoral extemporânea.

Relator do Ficha Limpa no Senado nega brecha em projeto aprovado

Agência Brasil

RIO - O relator do projeto Ficha Limpa no Senado, Demóstenes Torres (DEM-GO), negou que as modificações realizadas no texto tenham resultado em abrandamento para os políticos que já tenham ficha suja. A alteração no texto do projeto Ficha Limpa gerou polêmica, já que no trecho sobre a concessão do registro, a expressão "os que tenham sido condenados" foi substituída por "os que forem condenados". Com isso, a regra só vai ser aplicada aos casos de candidatos condenados depois da sanção pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Para o senador, a lei não pode ser retroativa, mas "não há dúvida alguma quanto à vigência para o futuro e quanto à vigência para o presente".

- (A lei) não apanha o passado porque a Constituição protege a coisa julgada, que é um dos pilares do regime democrático. No mundo inteiro é assim. Uma nova lei não pode apanhar um caso já julgado definitivamente no passado - explicou Torres.

Mesmo sendo defensor da modificação, o relator do projeto na CCJ disse que gostaria que a lei valesse para os candidatos que já foram condenados:

- Gostaria que essas pessoas não pudessem se candidatar, mas nós temos um parâmetro jurídico, de que a lei é feita para a frente e para os casos atuais.

Segundo o relator, as alterações foram feitas para facilitar os julgamentos. Das nove emendas feitas pela Câmara ao projeto, quatro traziam a expressão "os que forem condenados", quatro falavam em "os que tenham sido condenados" e uma não fazia menção ao tempo.

- Ia virar uma confusão na cabeça do legislador - comentou.

Os candidatos que renunciaram no passado para fugir da perda do mandato, com a nova lei, também cumprirão prazo de inelegibilidade. Políticos como o ex-senador Joaquim Roriz, se tivessem renunciado na vigência da nova lei, ficariam 16 anos sem poder se candidatar novamente: os oito anos do mandato de senador, mais os oito anos da inelegibilidade.

Quanto ao texto aprovado, o senador lembra que vai dar uma nova conotação às eleições. Práticas como caixa 2, compra de voto e crime eleitoral - que antes resultavam apenas em perda de mandato - agora geram inelegibilidade.

O impedimento de concorrer às eleições abrange candidatos condenados por órgão colegiado (quando a decisão é tomada por mais de juiz) e também com sentenças transitadas em julgado. O senador explicou ainda que, por isso, não adianta o candidato com condenação apenas em primeira instância desistir do recurso pensando que, assim, poderá concorrer.

- Não adianta ser espertinho. A lei atinge também decisões transitadas em julgado - disse.

Deputados questionam mudança no texto do Ficha Limpa

Entre os parlamentares, a modificação também provocou questionamentos. O relator da matéria na Câmara, José Eduardo Cardozo (PT-SP), criticou o fato da inelegibilidade não poder ser aplicada para os processos que estão em curso atualmente.

- A lei não pode atingir a coisa julgada, mas se desejava pegar as ações ainda em curso - disse Cardozo.

- Não gostei da modificação. Criou-se uma confusão jurídica que não precisava - completou.

O deputado considera que a alteração mudou o mérito do projeto, por isso, deveria retornar à Câmara para nova votação. Como o Senado considerou a emenda como de redação, o texto seguiu para sanção presidencial. Cardozo chegou a defender uma eventual anulação da votação do Senado apenas desses aspectos do projeto.

TSE começa a receber consultas

O deputado federal Jerônimo de Oliveira Reis (DEM-SE), por sua vez, apresentou nesta quinta-feira uma consulta no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para tirar dúvidas sobre a vigência de possíveis alterações na legislação eleitoral com a aprovação do texto pelo Senado.

O deputado questionou se o Ficha Limpa se aplicaria a processos já julgados, aos que estão em recurso, e também aos que estão tramitando, mas que tiveram início em pleitos anteriores. O parlamentar perguntou ainda se as disposições da nova lei poderiam trazer inelegibilidade antes do julgamento do processo.

Já o integrante da comissão que analisou na Câmara o projeto, deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), mesmo com a alteração do Senado, a aprovação do projeto foi um avanço.

- Não vou dizer que o Senado acabou com o projeto. É um avanço em relação ao sistema eleitoral. Foi um passo. Menor do que o que poderia ser dado, mas foi um passo - disse.

O autor da emenda, senador Francisco Dornelles (PP-RJ), disse apenas que pretendia uniformizar a redação, já que, em algumas partes, o projeto falava nos que já foram condenados e, em outras, nos que forem condenados.

- A emenda unificou a redação - resumiu.

Medo é que crise na Europa contamine recuperação mundial :: Miriam Leitão

DEU NA CBN

É o sexto dia seguido de quedas nos mercados. Ontem, estavam botando a culpa na Alemanha, que tomou a decisão de limitar as operações a descoberto para reduzir o grau de especulação. E ela tomou essa decisão sozinha. Mas hoje, Angela Merkel reclamou dos outros, dizendo que era frustante que os demais países não entrassem no mesmo esforço de regular os mercados. Com quem será que ela estava falando?

Como todo mundo olha para a Alemanha esperando que ela resolva os problemas, o país resolveu proteger o próprio mercado e quer que os outros entrem num acordo. O movimento da Alemanha foi de autodefesa, mas faz sentido também. Há muito tempo, uma regulação melhor nos mercados é necessária e, depois que passou o pior da crise dos bancos, já começaram a enrolar. Os Estados Unidos estão tentando aprovar no Congresso, mas ainda não têm uma nova regulação no mercado financeiro que evite os erros do passado.

A Alemanha também está querendo um imposto sobre as transações financeiras para criar um fundo de estabilização internacional que ajude a enfrentar possíveis crises financeiras. A Europa continua no dilema: como os países mais fracos vão enfrentar a crise de confiança e como o euro vai sobreviver a esse desequillíbrio dentro da zona monetária comum. Nos EUA, que estão em recuperação econômica, o temor é de que essa crise acabe reduzindo o ritmo da recuperação mundial.

A Europa não está conseguindo encontrar forma de negociar uma solução comum. As divisões apareceram nesse momento, as rivalidades e, daqui a pouco, os rancores. Eles precisam de uma coordenação. E a reunião do G-20 é um bom momento para se discutir isso.

O que a gente aprende com essa crise é que ninguém pode brincar com desequilíbrio nas contas públicas. Hoje em dia, os governos estão gastanto muito, botando na conta do Keynes. O limite do gasto, que está claro nesse caso da Europa, é inegociável.

Bach, J.S. - "Air" Orchestral Suite N° 3 in D Major_BWV 1068

Os Desaparecidos :: Affonso Romano de Sant'Anna


De repente, naqueles dias, começaram
a desaparecer pessoas. Estranhamente
desaparecia-se.Desaparecia-se muito
naqueles dias.
Ia-se colher a flor oferta
e se esvanecia.
Eclipsava-se entre um endereço e outro
ou no táxi que se ia.
Culpado ou não, sumia-se
ao regressar do escritório ou da orgia.
Entre um trago de conhaque
e um aceno de mão, o bebedor sumia.
Evaporava o pai
ao encontro da filha que não via.
Mães segurando filhos e compras,
gestantes com tricots ou grupos de estudantes
desapareciam.
Desapareciam amantes em pleno beijo
e médicos em meio à cirurgia.
Mecânicos se diluíam
mal ligavam o torno do dia.
Desaparecia. Desaparecia-se muito
naqueles dias.

Desparecia-se a olhos vistos
e não era miopia.Desparecia-se
até à primeira vista. Bastava
que alguém vissse um desaparecido
e o desaparecido desaparecia.
Desaparecia o mais conspícuo
e o mais obscuro sumia.
Até deputados e presidentes evanesciam.
Sacerdotes, igualmente, levitando
iam, aerefeitos, constatar no além
como os pecadores partiam.
.....................................................
Se fosse ao tempo da Bíblia,eu diria
que carros de fogo arrebatavam os mais puros
em mística euforia. Não era. É ironia.
E os que estavam perto,em pânico, fingiam
que não viam.Se abstraíam.
Continuavam seu baralho a conversar demências
com o ausente, como se ele estivesse ali sorrindo
com suas roupas e dentes.

Em toda família à mesa havia
uma cadeira vazia, a qual se dirigiam.
Servia-se comida fria ao extinguido parente
e isto alimentava ficções
-nas salas mentes
enquanto no palácio, remorsos vivos
boiavam
-na sopa do presidente.

As flores olhando a cena, não compreendiam.
Indagavam dos pássaros, que emudeciam.
As janelas das casas, mal podiam crer
-no que não viam.
As pedras, no entanto,
gravavam os nomes dos fantasmas,
pois sabiam que quando chegasse a hora
por serem pedras, falariam.

O desaparecido é como um rio:
- se tem nascente, tem foz.
Se teve corpo, tem ou terá voz.
Não há verme que em sua fome
roa totalmente um nome.O nome
habita as vísceras da fera
como a vítima corrói o algoz.

E surgiram sinais precisos
de que os desaparecidos, cansados
de desaparecerem vivos
iam aparecer mesmo mortos
florescendo com seus corpos
a primavera de ossos.
...........................
Desaparecia-se.Desaparecia-se muito
naqueles dias.
Os atores no palco
entre um gesto e outro e os da platéia
enquanto riam.
Não, não era fácil
ser poeta naqueles dias.
Porque os poetas, sobretudo,
-desapareciam.


* Este poema foi recitado na voz de Tônia Carrero no CD "Affonso Romano de Sant'Anna por Tônia Carrero" da Coleção "Poesia Falada".