domingo, 15 de janeiro de 2017

Opinião do dia - Karl Marx

O concreto é concreto porque é a síntese de múltiplas determinações, portanto, unidade da diversidade. Por essa razão, o concreto aparece no pensamento como processo de síntese, como resultado, não como ponto de partida, não obstante seja o ponto de partida efetivo e, em consequência, também o ponto de partida da intuição e da representação. Na primeira via, a representação plena foi volatilizada em uma determinação abstrata; na segunda, as determinações abstratas levam à reprodução do concreto por meio do pensamento. Por isso, Hegel caiu na ilusão de conceber o real como resultado do pensamento que sintetiza-se em si, aprofunda-se em si e movimenta-se a partir de si mesmo, enquanto o método de ascender do abstrato ao concreto é somente o modo do pensamento de apropriar-se do concreto, de reproduzi-lo como um concreto mental. Mas de forma alguma é o processo de gênese do próprio concreto.
------------------
Karl Marx (1816-1883), Grundrisse – Manuscritos econômicos de 1857-1858. p. 54. Editorial Boitempo, 2011.

A descentralização do poder

• Para reforçar a Federação e evitar que governadores e prefeitos precisem 'passar o pires' em Brasília, o País tem de rediscutir as fatias da União, dos Estados e dos municípios no bolo tributário

José Fucs - O Estado de S. Paulo

No atual cenário de crise no setor público, poucas cenas revelam tanto do Brasil atual quanto a romaria diária de governadores e prefeitos a Brasília. Sem recursos para pagar suas contas ou prestes a entrar na UTI, eles buscam apoio do governo federal para tentar evitar um desastre de proporções incontroláveis. Embora também esteja no vermelho, em decorrência da herança recebida da presidente cassada Dilma Rousseff, a União controla a Casa da Moeda e pode lançar títulos públicos na praça para reforçar o caixa – um privilégio hoje vetado aos Estados e municípios. Está, portanto, numa posição privilegiada na mesa de negociações, para submeter os demais entes da Federação ao jugo do Poder Central.

Para tentar repartir o ônus da derrocada com o governo federal, muitos governadores e prefeitos procuraram atribuir seus problemas à concentração dos recursos dos pagadores de impostos nas mãos da União. De repente, eles passaram a usar a crise fiscal como justificativa para impulsionar a ideia de um novo pacto federativo, cujo objetivo seria alterar as fatias da arrecadação destinadas à União, aos Estados e aos municípios, além de reavaliar as tarefas que cabem a cada esfera de governo, de acordo com a Constituição. A rigor, porém, tudo isso não passa de uma encenação, própria da política pedestre praticada no Brasil.

Em três anos, Brasil perde dois Paraguais em receitas

• Segundo economista, perda só não foi maior entre 2014 e 2016 por conta da entrada dos recursos da repatriação no ano passado

Adriana Fernandes e Idiana Tomazelli | O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A crise econômica fez com que a arrecadação brasileira encolhesse, nos últimos três anos, o equivalente a quase duas vezes o Produto Interno Bruto (PIB) do Paraguai. A perda de receita, em termos reais – ou seja, descontando-se a inflação do período – alcançou R$ 172 bilhões entre 2014 e 2016, agravando a crise fiscal do País.

Enquanto a receita líquida de 2016 foi estimada pelo governo, nos últimos dias de dezembro, em R$ 1,082 trilhão (o dado oficial só sai no fim deste mês), em 2013 essa arrecadação somou R$ 1,254 trilhão, em valores corrigidos pela inflação.

O recuo representa uma queda real de 13,7% no período. E o tombo teria sido maior, de 16,2%, se não fosse o dinheiro da repatriação de recursos não declarados no exterior, de acordo com cálculos do especialista em finanças públicas e economista da corretora Tullett Prebon, Fernando Montero. No ano passado, essa entrada extra de recursos foi de R$ 45 bilhões.

A queda na arrecadação tem relação direta com a marcha à ré na atividade econômica. Com produção e vendas menores, as empresas recolhem menos impostos. Ao mesmo tempo, as despesas do governo foram crescendo, o que resultou nos rombos sucessivos e crescentes do governo federal: foi de R$ 17,2 bilhões em 2014 para cerca de R$ 170 bilhões no ano passado (o número oficial ainda não foi informado).

Números inflados. Para este ano, a receita líquida prevista na Lei Orçamentária, sancionada na semana passada pelo presidente Michel Temer, é de R$ 1,187 trilhão. Mas essa projeção, segundo analistas, foi inflada por receitas extraordinárias e por uma estimativa irrealista de crescimento de PIB de 1,6%. Um aumento dessa magnitude já não é considerado possível nem mesmo nos cenários mais otimistas. A expectativa dos analistas é de que o PIB do Brasil cresça apenas 0,5% este ano.

Segundo Montero, o PIB menor vai acabar levando a uma situação em que as despesas terão de crescer num nível abaixo do teto de gastos, para acompanhar o cenário de receitas menores e garantir o cumprimento da meta fiscal, que prevê déficit de R$ 139 bilhões. Isso, no ano de estreia do teto – a regra que determina que, nos próximos 20 anos, as despesas não poderão crescer acima da inflação.

Foi o relator do Orçamento de 2017, o senador Eduardo Braga (PMDB-AM), que insistiu em manter a estimativa de 1,6% para o PIB. Ele explicou ao Estado que o comitê de avaliação de receitas do Congresso Nacional não se pronunciou e, por isso, a estimativa de arrecadação permaneceu inalterada. “Como eles não se manifestaram, eu não tinha como reduzir receita. Eu acho que o governo vai contingenciar, mas isso não está mais na esfera do Congresso”, disse o senador. A explicação dos analistas, no entanto, é de que a manutenção de um valor superestimado de receitas foi uma manobra para acomodar despesas maiores desejadas pelos parlamentares.

A grande expectativa ainda reside na arrecadação com a nova edição do programa de repatriação, mas o projeto de reabertura do prazo ainda precisa passar pela Câmara dos Deputados.

Além disso, a inflação mais baixa que a estimada para este ano, embora positiva para a economia, porque abriu espaço para a queda dos juros, vai trabalhar contra a arrecadação, exigindo despesas ainda menores do que o teto para que a meta seja cumprida. “Não haverá receitas para cobrir as despesas com ou sem teto. Nada é fácil numa economia que recuou quase oito pontos de PIB em três anos, precisava desinflacionar seis pontos de IPCA e perdeu dois Paraguais em receitas federais”, avaliou Montero.

A Lei Orçamentária prevê uma alta nominal de 9,7% e real de 4,7% na receita líquida em 2017. Pelas estimativas do especialista, cada ponto porcentual de aumento frustrado na receita líquida do governo federal obrigará um contingenciamento equivalente de R$ 11 bilhões nos gastos.

Temer recorre a Gilmar para se aproximar de Cármen Lúcia

• Presidente busca elo entre Executivo e Judiciário e, segundo interlocutores, considera magistrada ‘indecifrável’

Isadora Peron e Beatriz Bulla | O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Diante da tentativa da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, de obter protagonismo em temas de relevância nacional, o presidente Michel Temer tem aproveitado a interlocução com o ministro da Corte e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, para tentar se aproximar dela.

Segundo interlocutores de Temer, o peemedebista considera a presidente do Supremo “indecifrável” e recorre a Gilmar em busca de um elo entre Executivo e Judiciário. Desde que assumiu a presidência do STF, Cármen ajudou a costurar uma solução para o impasse após o afastamento de Renan Calheiros (PMDB) da presidência do Senado e tenta assumir destaque na mediação das crises do sistema carcerário e a financeira dos Estados.

Projeção de Cármen Lúcia provoca ciúme no Planalto

Gustavo Uribe, Letícia Casado | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O protagonismo da presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Cármen Lúcia, na negociação da dívida do Rio de Janeiro e na crise dos presídios tem criado um desconforto tanto no governo Michel Temer como entre colegas dela do Judiciário.

Assessores de Temer, por exemplo, destacam o perfil centralizador e de gestão executiva que a ministra tem adotado desde que assumiu o comando do Supremo, em setembro passado.

A presidente do STF tem evitado declarações públicas e entrevistas, optando por convocar reuniões com autoridades para tratar de assuntos de grande repercussão.

Na última terça (10) –em meio à crise no sistema prisional–, ela telefonou para o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, chamando-o para uma reunião em seu gabinete. A pedido dela, o encontro também contou com a participação do diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello.

Planalto não tem câmeras de segurança desde 2009

• Ministro diz acreditar que medida foi tomada para evitar registros

- O Globo

-BRASÍLIA- O ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Sérgio Etchegoyen, revelou que o Palácio do Planalto está sem câmeras de segurança desde 2009, quando os equipamentos foram retirados durante reforma feita no prédio pelo governo Lula. Ele disse acreditar que a medida foi tomada para evitar registros do que ocorria na sede da Presidência da República, o que caracterizaria obstrução da Justiça.

Segundo Etchegoyen, em entrevista à revista “Veja”, o Palácio vem negando pedidos da Justiça para ter acesso a imagens, porque não havia câmeras nos últimos anos. O general disse que “o Palácio passou anos em que, convenientemente, não se registrou nada”. O GLOBO confirmou a ausência de câmeras com o GSI. Em 2011, houve tentativa de se fazer licitação para reinstalar sistema de segurança, mas o governo não disponibilizou recursos. Segundo integrantes do GSI, houve uma segunda tentativa, mas a concorrência acabou sendo contestada por uma das empresas participantes.

Em dezembro de 2015 foi aberta uma nova licitação, que já resultou na instalação de sistema de controle de acesso no Planalto, mas as câmeras ainda dependem de nova compra, o que deve ocorrer até o fim deste ano.

Ao G1, o Instituto Lula não informou o motivo de as câmeras terem sido retiradas e disse que a agenda do ex-presidente era pública e acompanhada pela imprensa. Já Dilma, por meio de sua assessoria, não explicou a razão de os equipamentos não terem sido reinstalados.

Eleição na Câmara polariza base de Temer

• Maia garante apoio de partidos, enquanto Jovair busca deputados; PT discute apoio por vaga na Mesa

Isabel Braga | O Globo

-BRASÍLIA- A 17 dias da volta do Congresso aos trabalhos, a eleição presidencial na Câmara se polariza entre dois candidatos da base aliada do governo Michel Temer: o atual presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que o Palácio do Planalto deixa claro ser seu nome preferido, e o líder do PTB, Jovair Arantes (GO), integrante do centrão, que se lançou na última semana em evento com discursos de independência em relação ao Executivo.

Até o momento, outras duas candidaturas estão postas, uma da base aliada — o líder do PSD, Rogério Rosso (DF), com dificuldades de apoio até mesmo em sua própria bancada —e o nome de oposição, André Figueiredo (PDT-CE), que ainda luta por apoio de outros partidos oposicionistas.

A disputa é marcada, ainda, pela dúvida sobre a possibilidade de reeleição de Maia. Seus adversários atacam e até já questionaram o Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar barrar a iniciativa, sem sucesso até o momento. Maia, por sua vez, recorreu a pareceres para tentar tranquilizar os partidos que estão dispostos a apoiá-lo. O debate é se a norma constitucional que proíbe a reeleição dos dirigentes da Câmara eleitos no início das legislaturas se aplica a ele, eleito para um mandato tampão no ano passado, após a renúncia de Eduardo Cunha.

Brasil tenta resgatar credibilidade em Davos

• Equipe econômica vai destacar a investidores aprovação do teto de gastos e encaminhamento de reformas

Martha Beck | O Globo

BRASÍLIA - Pela primeira vez em dois anos, o governo brasileiro vai levar ao Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, um time reforçado, visando ao resgate da credibilidade do país, perdida com o desequilíbrio fiscal, a grave e prolongada recessão e os escândalos de corrupção. Vão desembarcar nos Alpes nesta semana os ministros da Fazenda, Henrique Meirelles, do Desenvolvimento, Marcos Pereira, e de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Esta é a semana de debates sobre os rumos e desafios da economia mundial que que reúne a elite global.

O presidente Michel Temer também planejava ir, mas acabou desistindo para acompanhar de perto a reta final das eleições para o comando da Câmara dos Deputados. Ele também foi aconselhado a não correr o risco de ter que responder a algum questionamento sobre a legitimidade de seu governo depois do impeachment de Dilma Rousseff.

Operação Condor tentou atuar na Europa

• Documentos dos EUA mostram planos para perseguir opositores e líderes de direitos humanos exilados

Janaína Figueiredo | O Globo

BUENOS AIRES - A chamada Operação Condor, o sinistro plano de ação conjunta entre as ditaduras do Cone Sul, planejou, se preparou e esteve muito perto de perseguir, com o objetivo de eliminar, opositores dos regimes militares de Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile e Bolívia exilados na Europa. O que sempre foi uma suspeita confirmou-se, pela primeira vez, em documentos liberados pelo governo dos Estados Unidos em meados de dezembro, cumprindo à risca a promessa feita pelo presidente Barack Obama em sua visita a Buenos Aires, em março passado. Foi a segunda entrega de material sobre o último governo da ditadura argentina (1976-1983) — a primeira foi em agosto de 2016 —, enviada pela Casa Branca ao presidente Mauricio Macri e nela, segundo disse ao GLOBO Carlos Osorio, diretor do projeto de documentação do Cone Sul do Arquivo Nacional de Segurança (NSA, na sigla em inglês), “estão memorandos inéditos das agências de Inteligência americanas, que mostram, como nunca antes se viu, história, funcionamento, metas e táticas da Operação Condor”.

O legado de Mário Soares - Luiz Sérgio Henriques*

- O Estado de S. Paulo

• O homem da social-democracia numa de suas florações magníficas

Se o século 20 foi breve, começando com a conflagração de 1914 e terminando sob os escombros do Muro de Berlim ou com a dissolução da URSS, seus temas e personagens às vezes só lentamente se despedem de nós, voltando inesperadamente de um relativo esquecimento para nos assombrar com a atualidade de gestos individuais e dramas coletivos que marcaram mais de uma geração. A morte de Mário Soares, figura emblemática do Portugal moderno, propicia um desses retornos: com ela vêm à memória o país anacrônico do fascismo e as promessas da nova democracia, o colonialismo tardio e os capitães de Abril, os rumos pós-revolucionários separados entre a Europa social-democrata e a do “socialismo real”, uma fórmula defensiva que então parecia ainda capaz de emocionar corações e mentes.

Para Portugal naquele momento se dirigiram as atenções de tantos que viam na derrubada do fascismo a possibilidade de uma revolução social à moda antiga, com seu receituário testado no Leste Europeu: a nacionalização ou a estatização da economia, a afirmação inevitavelmente autoritária de um partido sobre o Estado e a sociedade, o poder assentado na aliança entre o povo e os militares progressistas, num movimento que varreria o fascismo e abriria um flanco no Ocidente univocamente regressivo e imperialista.

Guterres na ONU - Celso Lafer*

- O Estado de S. Paulo

• O Acnur deu-lhe a experiência do exercício de importante função pública internacional

António Guterres acaba de assumir as responsabilidades de secretário-geral da ONU. É o primeiro escolhido para o cargo com o lastro de inédita avaliação, conduzida na forma de audiência pública no âmbito da Assembleia-Geral.

No correr desse processo, quase todos os representantes dos 193 Estados que integram a ONU o consideraram o mais apto para exercer a função. Foi pela qualidade do desempenho que ele se diferenciou dos demais 13 postulantes, e foi o respaldo generalizado dessa avaliação que pesou na juridicamente indispensável recomendação do Conselho de Segurança à Assembleia-Geral que levou à sua designação. No conselho Guterres não era, no início, a escolha preferencial dos EUA e da Rússia, que detêm poder de veto.

A desinflação chegou – Samuel Pessôa

- Folha de S. Paulo

Esta é uma coluna aborrecida sobre um tema muito importante, especialmente para nós, brasileiros. Peço paciência ao leitor.

Na quarta-feira da semana passada (11), o IBGE divulgou a inflação do mês de dezembro, medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo). O mês fechou com inflação de 0,3%, 0,04 ponto percentual abaixo da expectativa de mercado. O ano fechou com inflação de 6,29%, pouco abaixo de 6,5%, limite superior da banda de tolerância em torno da meta de 4,5%.

Para termos dimensão do processo desinflacionário, basta lembrar que a inflação em 2015 foi de 10,67%. A redução da inflação foi de 4,38 pontos percentuais. A queda da inflação foi liderada pela desaceleração dos preços administrados, que rodaram em 2015 a 18,06% e a 5,50% em 2016 –recuo, portanto, de 12,56 pontos percentuais.

Sucesso parcial - Merval Pereira

- O Globo

A consultoria Macroplan, do economista Claudio Porto, especializada em análises prospectivas, considerando que o governo de Michel Temer iniciou um ciclo de reformas e ajustes importantes, mas carrega recordes de impopularidade, apesar de manter força dentro do Congresso, montou quatro cenários para os próximos dois anos, que dão maior probabilidade de haver um sucesso parcial do governo. Eis os cenários:

Final antecipado: Temer não conclui o seu mandato, sofre impeachment — em face a provas avassaladoras da Lava-Jato e perde sustentação política — ou é cassado pelo TSE e/ ou é “atropelado” por uma escalada de violência e/ou simplesmente renuncia. Este cenário, já mapeado nesta coluna com base nas análises dos cientistas políticos Octavio Amorim e Carlos Pereira, antecipa um ambiente de imediata paralisia decisória com deterioração das expectativas econômicas e agravamento das tensões políticas. Há chances de emergir um quadro de ingovernabilidade, que coexistirá com fortes movimentos especulativos no mercado em meio a “surtos” de pânico e forte instabilidade no curto prazo. Tem 20% de probabilidade.

Liga pro meu celular - Luiz Carlos Azedo

- Correio Braziliense

Oswaldo Alves Pereira, o Noca da Portela, é um daqueles sambistas que tiram leite das pedras do cotidiano para alegrar as pessoas, ainda que isso lhe cause eventuais contratempos domésticos. O maior deles foi com seu primeiro samba de sucesso: “É preciso muito amor/ Para suportar essa mulher /Tudo que ela vê numa vitrine ela quer /Tudo que ela quer /Tenho que dar sem reclamar /Porque senão ela chora /E diz que vai embora/Oh, diz que vai embora!”. É preciso muito amor, descreve o marido submisso aos caprichos da esposa: “Pra satisfazer essa mulher/Eu faço das tripas coração/ Pra ela sempre digo “sim”/ Pra ela nunca digo “não” /Porque senão ela chora /E diz que vai embora/ Oh, diz que vai embora!”

Luz e trevas - Míriam Leitão

- O Globo

O presidente Barack Obama reverteu a crise econômica aguda em que o país estava quando assumiu e deixa os Estados Unidos crescendo e com baixo desemprego. O presidente Donald Trump não tem apenas ideias extremadas, mas um comportamento totalmente fora do padrão. A troca na Casa Branca esta semana será entre um líder que evitou polêmicas pessoais por outro que busca o conflito em bases diárias.

Aabissal distância entre os dois ficou nítida na última semana. Obama fez seu discurso de despedida exaltando os valores da democracia, entre eles o da alternância no poder. Trump investiu furioso contra o repórter da CNN na primeira entrevista coletiva. Obama publicou um artigo na “Science” sobre o avanço da energia limpa. Trump, no Twitter, fez propaganda de uma loja de varejo cuja acionista o apoiou.

STF julga e é julgado - Eliane Cantanhêde

- O Estado de S. Paulo

• No rastro da importância crescente do STF, Cármen Lúcia é destaque em 2017

Neste 2017 tão tumultuado desde o primeiro dia, um personagem se meteu em praticamente tudo o que acontecia e teve destaque na vida nacional: a ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal e, por consequência, do Conselho Nacional de Justiça. Mas esse destaque é da Cármen Lúcia? Ou é do presidente do STF, não importa se é Cármen, João, Maria ou José, nesses tempos quentes na política, na economia, em tudo?

Nos primeiros 15 dias do ano, ela foi a Manaus para se informar sobre os presídios, tomou um longo café com o presidente Michel Temer, se encontrou duas vezes com o ministro da Justiça, uma com o da Fazenda, outra com o das Comunicações, presidiu reunião de presidentes de tribunais de Justiça de todo o País, desbloqueou recursos federais para o Rio e manteve o bloqueio para Minas – seu Estado.

Cármen Lúcia, presidente – Elio Gaspari

- O Globo

Havia um vazio em Brasília e ele foi ocupado pela ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal. Pudera, está no Planalto o vice de uma governante deposta, cujo futuro depende de um julgamento do TSE. Do outro lado da praça, há um Senado presidido por Renan Calheiros e uma Câmara até bem pouco tempo comandada por Eduardo Cunha.

Na teoria, a posição da ministra deriva de um rodízio gregoriano. Na prática, a mineira miúda e frugal sentou-se na cadeira com disposição para iniciativas audaciosas, cenografias batidas (depois do massacre do Compaj foi a Manaus e criou um grupo de trabalho), retórica bíblica (“Quem tem fome de justiça tem pressa”) e atitudes angelicais (no dia da Criança recebeu um grupo de meninos e meninas carentes).

Em apenas cinco meses Cármen Lúcia deu nova dimensão à presidência do tribunal. Ora com frases retumbantes: “Onde um juiz for destratado, eu também sou”. Ora com raciocínios cortantes: a questão não é se devemos bloquear celulares nos presídios, eles não podem é entrar.

Sua linguagem direta serviu para expôr privilégios salariais de magistrados: “Além do teto, tem cobertura, puxadinho e sei lá mais o quê”. Piorando o estilo com pitadas de juridiquês, também disse o contrário:

“Confundir problemas, inclusive os remuneratórios, que dispõem de meios de serem resolvidos, com o abatimento da condição legítima do juiz, é atuar contra a democracia, contra a cidadania que demanda justiça, contra o Brasil que lutamos por construir”.

Em outubro a ministra recusouse a participar de uma reunião com Temer no Planalto. Em janeiro Temer foi à sua casa para discutir encrencas. O maior sinal de que Cármen Lúcia ocupou um poder vacante esteve no caso da falência do Rio de Janeiro e no bloqueio de suas contas pelo governo federal. A decisão do ministro Henrique Meirelles estava amparada na santidade dos contratos. A ministra, no plantão do recesso, concedeu uma liminar suspendendo o bloqueio e tirando a bola de ferro do tornozelo do governador Pezão. Criado o impasse, Meirelles topou sentar para conversar e, aos poucos, os dois lados vêm cedendo. Podiam ter feito isso antes.

O desembaraço e a exposição conseguidos pela ministra seriam apenas um asterisco se o nome dela não estivesse na lista de prováveis candidatos a presidente da República. Numa eventual eleição indireta para substituir Temer, com certeza. Na disputa de 2018, talvez.

O trabalho em mutação - Celso Ming

- O Estado de S. Paulo

O protecionismo econômico apenas raramente não foi um erro. O defendido agora por tantos dirigentes mundiais está ainda mais errado porque se baseia no pressuposto de que uma indústria superprotegida garante os empregos que tendem a migrar para outros países.

É o que prega, por exemplo, o presidente eleito dos Estados Unidos. Ele pressiona as montadoras de veículos a não se transferirem para o México e imagina que, se intimar a Apple a transferir para os Estados Unidos subsidiárias que mantém na Irlanda, também abrirá postos de trabalho para trabalhadores americanos: “Serei o maior criador de empregos que Deus já criou” – declarou Donald Trump dia 11, em sua primeira entrevista à imprensa depois de eleito.

Na condição de empresário, Trump deve saber que, especialmente nos Estados Unidos, a retomada da atividade econômica se fará com enorme dispensa de mão de obra. Não são os chineses que estão roubando postos de trabalho em todo o mundo. A dispensa de mão de obra é consequência da nova arrumação do sistema produtivo. Não acontece apenas porque a indústria está se robotizando. Acontece, também, porque a tecnologia de quarta geração é altamente poupadora de mão de obra.

Parceiros – Fábio Zanini

- Folha de S. Paulo

"Tá resolvido. Vc tá pensando que eu sou esses ministros que vc indicou?, mandou Geddel Vieira Lima, então vice da Caixa, a Eduardo Cunha em mensagem de texto de 2012, descortinada pela Operação Cui Bono? na última sexta (13). "Ok, rsrsrs", foi a resposta do hoje ex-deputado. Falavam sobre a liberação de um financiamento para a gigante J&F.

Vazamentos de conversas privadas são sempre divertidos. Aqui temos duas raposas do PMDB se comportando como adolescentes que compartilham uma fofoca da turma.

Um "kkkkkk", indicando gargalhadas, talvez tivesse sido mais apropriado, em vez do contido "rsrsrs". Afinal, a maneira como os dois "parças" encararam a administração pública durante décadas, indicando nomes e criando feudos em diversos governos de diferentes partidos, é mesmo motivo de escracho.

‘Mañana’ - Fernando Gabeira

- O Globo

No noroeste fluminense, com o termômetro marcando 44 graus, relembro as conversas de rua, depois que voltei de Manaus. Um homem me disse sobre a crise do sistema carcerário: — A conta está chegando. — Outras contas também vão chegar — respondi.

No caso do sistema penitenciário, o governo Temer decidiu tomar algumas medidas de emergência e certamente vai empurrar o problema com a barriga, como fizeram todos os presidentes. Mañana. Uma das contas que sempre chegam no verão é a dengue. Desta vez, o vírus da chicungunha vem escrito na fatura. Tenho razões para temê-lo. Falei com muitas pessoas no bairro Industrial de Aracaju, infestado pela chicungunha. Os relatos eram terríveis: dores nas articulações que se prolongam por meses.

Como a crise no sistema penitenciário, fomos empurrando o mosquito com a barriga e agora nos parece também um problema insolúvel. Mañana. Navego pelo Rio Pomba e o calor é tão intenso que às vezes desejo que o barco vire. Em 2008 estive aqui numa grande enchente que arrasou um hospital de Santo Antônio de Pádua. Doentes que dependiam de hemodiálise, por exemplo, tiveram que ser retirados para Minas, de helicóptero.

Um suspiro da economia – Editorial | O Estado de S. Paulo

Sinais vitais da economia brasileira melhoraram em novembro. Com isso, junta-se mais uma notícia positiva aos bons sinais acumulados neste início de ano – perspectiva de uma boa safra de grãos, inflação em queda e um novo e mais vigoroso corte dos juros básicos pelo Banco Central (BC). No entanto, seria precipitado interpretar o aumento da atividade, naquele mês, como um começo de retomada. Não se pode esquecer o fraco movimento do comércio em dezembro, num cenário de severo desemprego e de consumo ainda muito retraído. Faltam dados para uma avaliação mais segura da tendência recente. Mas o alento, ou suspiro, percebido quase no fim do ano parece mostrar pelo menos uma preciosa reserva de energia. Não é algo desprezível, depois de dois anos de funda e penosa recessão.

A novidade mais importante sobre os negócios veio de fonte oficial. Em novembro, o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), também conhecido como prévia do Produto Interno Bruto (PIB), foi 0,2% superior ao de outubro. Esse aumento compensou com minúscula folga o recuo de 0,15% na passagem de setembro para outubro.

A incoerência de Temer ao reajustar servidores – Editorial | O Globo

• O governo que aprova no Congresso o teto constitucional dos gastos é o mesmo que se compromete, por lei, a aumentar as despesas; terá de fazer opções em breve

Período de algum relaxamento, as viradas de ano podem ser usadas por governantes para tomar decisões que gostariam que não fossem notadas. Desta vez, a contagem regressiva para a chegada de 2017 coincidiu com a medida provisória 765, um presente de reajustes para oito categorias do funcionalismo público e, além de outros atos, a criação de um bônus de produtividade e eficiência para auditores fiscais e analistas tributários da Receita, extensivo a auditores do Ministério do Trabalho.

Nem parecia um país que encerrava 2016 ainda com preocupantes déficits fiscais: na faixa de 9% do PIB, considerando-se as despesas com juros — três vezes mais o admitido na União Europeia —,e 3 % sem elas, números a serem confirmados mais à frente. Pelo segundo ano consecutivo. Um contrassenso.

Reorientação radical – Editorial | Folha de S. Paulo

É vergonhoso que tenha sido necessário um massacre de quase cem detentos nos primeiros dias de 2017 para que autoridades judiciais voltassem a debater com seriedade e sentido de urgência o caráter medieval das prisões brasileiras.

A ministra Cármen Lúcia pediu que os presidentes dos Tribunais de Justiça informem até terça-feira (17) o número de processos penais não julgados em cada comarca e cobrou esforço concentrado nas varas criminais e de execução penal nos próximos 90 dias.

Cabe à ministra, como presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, coordenar o planejamento do Judiciário —e por isso Cármen Lúcia também insiste na realização de um censo penitenciário.

São iniciativas concretas e bem-vindas, mas a inexistência de estatísticas atualizadas revela o tamanho da indiferença do poder público. Os dados mais recentes compilados pelo Ministério da Justiça remetem a dezembro de 2014.

A dúvida existencial dos petistas – Editorial | O Estado de S. Paulo

Coerente com sua visão estatista do mundo, segundo a qual o governo é o Grande Provedor, inclusive de empregos diretos, ao longo de mais de 10 anos no poder o lulopetismo transformou a administração federal – bem como as estaduais e municipais sob seu comando – em generosa fonte de trabalho para sua devotada militância. Não há números precisos, até porque a ampla e complexa dinâmica das nomeações públicas não favorece a transparência, mas contam-se às dezenas de milhares os cargos e funções na administração pública direta e indireta que foram ocupados por petistas de carteirinha enquanto a bandeira da estrela vermelha tremulou no Palácio do Planalto.

Aí veio o impeachment de Dilma e o início do processo de “despetização” do governo federal. Pouco tempo depois ocorreu o desastre das eleições municipais, que reduziram de 630 para 256 (-60%) as prefeituras petistas. Nove legendas elegeram mais prefeitos do que o PT. Uma verdadeira catástrofe para o partido que transformara a prática habitual do aparelhamento do Estado, em todos os níveis, em método político como nunca antes na história deste País. Segundo o site Contas Abertas, com base em dados fornecidos pelo Ministério do Planejamento, em julho de 2015 o número de cargos de confiança na administração federal direta havia batido um recorde histórico ao superar a casa dos 100 mil, o equivalente a cerca de 16% dos 618 mil cargos providos por concurso, apenas no Poder Executivo. Somem-se a esses 100 mil os petistas comissionados em cargos e funções no Legislativo, no Judiciário e nas administrações petistas nos Estados – Acre, Bahia, Ceará, Minas Gerais e Piauí – e nos municípios, que eram 630 até 31 de dezembro de 2016.

Soneto oco – Carlos Pena Filho

Neste papel levanta-se um soneto,
de lembranças antigas sustentado,
pássaro de museu, bicho empalhado,
madeira apodrecida de coreto.

De tempo e tempo e tempo alimentado,
sendo em fraco metal, agora é preto.
E talvez seja apenas um soneto
de si mesmo nascido e organizado.

Mas ninguém o verá? Ninguém. Nem eu,
pois não sei como foi arquitetado
e nem me lembro quando apareceu.

Lembranças são lembranças, mesmo pobres,
olha pois este jogo de exilado
e vê se entre as lembranças te descobres.

Paulinho da Viola - Eu canto samba / Quando bate uma saudade