Alvo de críticas por parte de petistas, pela doação de R$ 8,2 milhões ao diretório do PSDB em 2010, e investigado no mensalão do DEM depois de ter sido filmado entregando pacotes de dinheiro a um ex-secretário do governo do Distrito Federal, José Celso Gontijo, dono de empresas imobiliárias e de call center em Brasília, doou R$ 600 mil ao PT em 2011.
Gontijo doou como pessoa física, mas o grosso dos recursos arrecadados pelo PT no ano passado veio de empresas. Dos R$ 54,6 milhões doados por pessoas jurídicas para 29 partidos em 2011, o PT ficou com 89,5%. Empreiteiras, fornecedores da Petrobras, agronegócio, petroquímicas e setor financeiro foram, nesta ordem, os setores que mais contribuíram para o PT quitar dívidas da campanha de 2010. Foi a maior arrecadação petista em ano sem eleição.
PT arrecada 89,5% das doações de empresas em 2011
Por Raphael Di Cunto
Dos R$ 54,6 milhões dados por empresas para os 29 partidos políticos registrados na justiça eleitoral em 2011, o PT ficou com 89,5%. Naquele ano, o partido recebeu R$ 50,1 milhões de 75 doadores, segundo prestação de contas entregue a Tribunal Superior Eleitoral (TSE). As doações declaradas cumpriram as exigências da lei.
Com uma dívida de R$ 53,9 milhões que só aumentava desde a campanha eleitoral de 2002, o PT recorreu aos tradicionais doadores para quitar os débitos e entrar na eleição municipal deste ano com um caixa mais folgado. Apelou para empreiteiras, bancos, empresas do setor alimentício e petroquímico e até para um empresário envolvido no mensalão do DEM no Distrito Federal.
Seu principal adversário, o PSDB, recebeu apenas R$ 2,35 milhões - equivalente a 4,3% do total. O PMDB, segundo que mais arrecadou, ficou com 5,2% dos recursos distribuídos por empresas para financiar os partidos. A maioria das legendas sequer arrecadou recursos privados em 2011, ano em que não ocorreu eleição e em que o orçamento das siglas dependeu majoritariamente do fundo partidário.
O setor que mais contribuiu com o PT foram as empreiteiras, responsáveis por 45% dos R$ 48,9 milhões que o partido recebeu da iniciativa privada, segundo levantamento do Valor no balanço da legenda. Esse também foi o setor com maior número de doadoras, 21, e com a líder em contribuição: a Andrade Gutierrez, com R$ 4,6 milhões.
Fornecedoras de serviços e equipamentos para a Petrobras ficaram em segundo lugar, com 10,8% das doações, seguidas pelo agronegócio, com 10,3%. O setor petroquímico deu 9,9% dos recursos, com R$ 4 milhões da Braskem, que tem a Petrobras entre as suas acionistas. Já o setor financeiro, que teve o Bradesco e BMG como doadores, responde por 7,9% das colaborações.
A Braskem disse, em nota, que "contribui com partidos que demonstrem alinhamento com os compromissos da companhia em relação ao desenvolvimento nacional, regional e do setor químico e petroquímico". O Bradesco não comentou e o BMG disse que doa para vários partidos.
Na lista, há companhias com contratos vultuosos com o governo federal. A cingapuriana Jurong Shipyard nem começou a construir seu estaleiro em Aracruz, no Espírito Santo, mas já deu R$ 1 milhão para o PT. A empresa pretende atuar no setor de petróleo e gás, com a construção de navios e sondas de perfuração, produtos que tem como principal cliente a Petrobras. Procuradas, ambas preferiram não se pronunciar.
Em alguns casos, o governo tem até participação na empresas, como a JBS, em que o BNDESPar, braço de investimentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), tem 30,4%. Quinta maior doadora petista, a companhia disse, através de sua assessoria, que faz doações para todas as legendas. "O BNDES é um investidor da JBS, assim como em outras empresas", respondeu.
O BNDES disse, em nota, que "realizou 986 mil operações de crédito para empresas de todos os portes, então é natural que clientes do banco estejam entre as companhias que realizam doações a quaisquer partidos políticos".
De fato, a legislação permite que essas empresas doem tanto para candidatos quanto para partidos. As únicas restrições são os valores, que não podem ultrapassar 2% do faturamento do ano anterior, e que as doadoras não sejam concessionárias de serviços públicos. Esta regra, porém, tem alcance limitado, já que esses serviços costumam ser prestados por consórcios com outro CNPJ, o que permite à empresa doar em seu próprio CNPJ.
Entre as empresas que doaram estão ainda a Agropecuária Santa Bárbara, controlada pelo Grupo Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas, e a Ensin - Empresa Nacional de Sinalização e Eletrificação, de propriedade de Jorge Marques Moura e Labib Faour Auad, donos também da Consladel. Reportagem de 2009 do "Fantástico", da TV Globo, mostrou um funcionário da Consladel negociando pagamento de propina para instalação de radares.
O Valor procurou os diretores da Consladel e da Ensin desde terça-feira, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição. O secretário nacional de Finanças, João Vaccari Neto, afirmou, em nota, que as doações são legais. "O PT não é responsável pela conduta e pelos problemas fiscais das empresas doadoras. O PT cumpre rigorosamente o que determina a legislação atual com relação às doações partidárias", disse.
As doações de pessoas físicas representaram apenas 1,5% do total arrecadado. O percentual só não foi menor, porém, devido à contribuição de três grandes empresários: José Celso Gontijo, que é investigado no mensalão do DEM (leia abaixo) e deu R$ 600 mil; Ronaldo de Carvalho, que é um dos donos da Drogaria São Paulo e contribuiu com R$ 100 mil; e Benjamin Nazário Fernandes Filho, acionista majoritário da Benafer, uma das maiores distribuidoras de aço plano do país.
Vice-presidente da Associação Comercial do Rio de Janeiro, Fernandes Filho disse que acompanha a política faz tempo e que doou R$ 1 milhão como pessoa física. "O PT enfrentava problemas financeiros por causa da campanha. Alguns amigos meus, que são do partido, pediram ajuda", conta o empresário, que diz ter doado também para a reeleição do governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB). "Era logo no começo do governo Dilma, e eu achava que ela estava tomando medidas muito efetivas. Queria que continuasse assim, por isso resolvi doar", diz.
A campanha que elegeu Dilma Rousseff (PT) presidente deixou uma dívida de R$ 26,7 milhões em 2010. Essa conta foi absorvida pelo diretório nacional do PT, que estabeleceu o prazo interno de um ano para quitá-la, segundo Vaccari. O pedido para os empresários surtiu efeito e o partido teve uma receita extraordinária para um ano não eleitoral, de R$ 109,9 milhões.
O valor é uma vez e meia maior do que o arrecadado em 2009, quando a receita do diretório nacional petista atingiu R$ 44,8 milhões, e está bem acima do que as outras legendas arrecadaram no ano passado - segundo maior orçamento, o PMDB recebeu R$ 44,5 milhões, contra R$ 38,5 milhões do PSDB.
Parte do crescimento na receita deve-se ao aumento no fundo partidário - o PT, como o partido mais votado para a Câmara dos Deputados em 2010, tem direito à maior parcela, de R$ 51 milhões. Outra parte, mais significativa, veio das doações. "O PT arrecadou tanto porque a vida do partido continua normal. Os outros partidos não existem fora dos anos eleitorais. O PT existe, faz eventos, palestras, manifestações", diz Vacari.
Embora tenha reduzido a dívida do partido em 72% em comparação com 2010, o dinheiro, porém, ainda não foi suficiente para dizimá-la. No fim do ano passado ainda havia débito de R$ 15,1 milhões, referente a contas e impostos não pagos ao Ministério da Fazenda, INSS, Prefeitura de São Paulo, a empresa TV a satélite Sky, agências de viagem e pequenos fornecedores.
O maior credor ainda é a Coteminas, do ex-vice-presidente José Alencar (morto em 2011). A empresa renegociou a dívida - de R$ 5,7 milhões no fim de 2011- e recebe R$ 300 mil por mês do PT. A dívida refere-se à confecção de 2,75 milhões de camisetas para a campanha de 2004, serviço que foi investigado pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Correios sob a suspeita de que viesse de caixa dois, o que foi negado pelos envolvidos.
Outro investigado pelas relações com o PT, o BMG teve a dívida de R$ 1,9 milhão quitada pelo partido em 2011. Ao mesmo tempo, doou R$ 1 milhão para a legenda no ano passado. O banco foi investigado por supostamente ter participado do mensalão ao forjar empréstimos para o PT como forma de lavar dinheiro público desviado. A investigação não foi suficiente para que o PT voltasse a registrar empréstimo do banco.
A assessoria do BMG afirmou que "nenhum de seus dirigentes faz parte da ação penal que se denominou de mensalão" - eles respondem a outra ação, referente a suposta fraude no empréstimo, e que está separada da análise do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF). O Banco Rural, outro investigado, também teve a dívida de R$ 1,87 milhão paga, mas não doou para o partido em 2011.
A receita extra também não foi suficiente para tirar o patrimônio líquido da sigla do vermelho. O passivo a descoberto, que era de R$ 44,5 milhões em 2010, depois de ajustes feitos no ano passado, caiu para R$ 6,4 milhões em 2011. Entretanto, o resultado ainda mostra que a soma de bens e recebíveis do PT é insuficiente para cobrir todas as suas dívidas.
FONTE: VALOR ECONÔMICO