“Não obstante elementos da cultura política do PCB persistirem no imaginário e na práxis de muitos atores, tanto o projeto político como a propositura de uma nova formação política – formulados por herdeiros seus que tomaram consciência da necessidade de ´recomeçar´ -- não tiveram seguimento e condições para se concretizarem ou, quando absorvidas, formam-no em aspectos muito parciais e seletivos.
Pode-se dizer que o ´marxismo político” pecebista emanando da Declaração de Março de 1958 seria, de fato, um divisor de águas histórico da esquerda brasileira. Quase todas as correntes e partidos, grupos e seitas, sejam eles comunistas, católicos de esquerda, socialistas, socialdemocratas etc., colocaram-se contra tais concepções, ou, ao menos, manifestaram desconfiança em relação a elas. Isso foi manifestado por muitos agrupamentos nascidos das divisões do PCB, como o PCdoB, a ALN, o PCBR, ou à parte de sua tradição, como é o caso do PT – o móbil primordial das cizânias ou dissensões foi, invariavelmente, a questão democrática; nenhum deles tinha muito, ou nenhum apreço aos valores, institutos e práxis democráticas. Alguns irão, tardiamente, incorporar seletivamente aspectos e elementos daquela práxis política.
Nas atuais circunstâncias históricas, adversas e prenhe de incertezas, protagonismo capital poderá vir a ter, no processo político reconstituinte, uma esquerda democrática com práxis renovadora e com projeto reformista vigoroso, capaz de superar concepções e práticas antidemocráticas e excludentes, opressoras e iníquas. O desafio está posto, à espera de agentes que possam remover entraves e dar curso progressivo à dinâmica democrática, criando pressupostos necessários para que suas prerrogativas sejam efetivamente socializáveis e de desfrute coletivo.”
*Cf. Uma política para a democracia. In: As esquerdas e a democracia, coletânea organizada por José A. Segatto, M. Lahuerta e R. Santos. Brasília: Verbena Editora/FAP, dezembro de 2018.
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