Por Danilo Thomaz | Eu & Fim de Semana / Valor Econômico
RIO - Para o cientista político Yascha Mounk, professor da Universidade Johns Hopkins, a democracia liberal perde força no mundo e corre perigo. Autor do livro "O Povo Contra a Democracia", ele disse ao Valor que líderes populistas promovem o confronto com instituições nacionais, como o Judiciário, e internacionais, como a ONU, como estratégia para atiçar as massas. "Devemos ser honestos, a revolta contra as instituições, em parte, corresponde a um real ressentimento popular."
Embora a motivação possa ser legítima, isso não significa que os populistas "vão devolver o poder às pessoas", diz. Mounk vê riscos para o Brasil. "É presumível que Jair Bolsonaro tentará expandir seu poder, mas vai falhar nisso porque não tem o controle completo do Congresso.
A ameaça autoritária
Para o cientista político alemão, "é necessário limpar o sistema político e dar às pessoas a ideia de que um futuro melhor é possível"
A década que sucedeu à crise econômica de 2008 foi marcada por movimentos, à direita e à esquerda, que opuseram forças populares, instituições e sistemas políticos estabelecidos. Foram os anos do Tea Party, movimento conservador de 2009 que pretendia resgatar o ideal da velha república americana, e do Occupy Wall Street, que se opunha ao establishment do mercado financeiro. Foram também os anos dos indignados da Espanha, dos separatistas catalães, do Brexit, da Primavera Árabe e da luta por liberdade em Hong Kong. E de uma série de movimentos de diferentes tonalidades políticas no Brasil: desde o Movimento Passe Livre (à esquerda), que iniciou as Jornadas de Junho de 2013, até militantes bolsonaristas, em confronto com o Congresso e o Supremo Tribunal Federal.
O conflito entre a massa de cidadãos insatisfeitos e o sistema que compõe a democracia liberal é o cerne do livro de Yascha Mounk, "O Povo Contra a Democracia" (Companhia das Letras, trad.: Débora Landsberg e Cássio de Arantes Leite, 443 páginas, R$ 79,90), que acaba de ser lançado no Brasil.
Dividido em três partes, o livro analisa a crise da democracia liberal, suas origens e propõe soluções em diferentes âmbitos da vida nacional para combater o fenômeno do populismo e da democracia iliberal, sistema que se dispõe a desmontar as ideias, valores, regras, pactos e instituições que compõem a democracia liberal, em âmbito nacional e internacional, como a conhecemos. "A definição do populista é alguém que diz 'eu represento o povo e quem discordar de mim ou confrontar meu poder é ilegítimo", afirma o autor, cientista político e professor da Universidade Johns Hopkins (EUA), em entrevista ao Valor. "Acho que devemos ser honestos que isso [a revolta contra as instituições], em parte, corresponde a um real ressentimento popular."
Além do descontentamento com a estagnação econômica e do uso das redes sociais, o medo das pessoas e as incertezas em relação ao futuro afetam a relação com a democracia.
No entanto, segundo o cientista político de 36 anos, é preciso tomar cuidado. Embora a motivação possa ser legítima, segundo afirma, isso não significa que os populistas "vão devolver o poder às pessoas". O confronto aberto com instituições nacionais, como o Judiciário, e internacionais, como a ONU, antes de significar uma forma de democratização do sistema político, seria mais uma maneira de atiçar as massas, o que não significa que não possa ter consequências.
"Muitos estragos acontecem lentamente, de maneira paulatina. Grandes democracias estão sendo comandadas por populistas que são céticos perante as instituições internacionais. Eles podem ser bem-sucedidos em abolir algumas instituições", afirma.