O QUE PENSA A MÍDIA
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Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
terça-feira, 22 de julho de 2008
DEU EM GRAMSCI E O BRASIL
O GRAMSCI DE AMERICANISMO E FORDISMO
Geraldo Augusto Pinto -
Antonio Gramsci. Americanismo e fordismo. Tradução de Gabriel Bogossian. Introdução de Ruy Braga. Revisão técnica e notas de Alvaro Bianchi. São Paulo: Hedra, 2008. 92p.
Haverá momento na história em que o ser humano deixará de chocar as futuras gerações com sua sempre infinita capacidade de transformação do mundo? Falo aqui de intelecção e ação sobre a natureza animada e inanimada. Do trabalho, no sentido do materialismo histórico. Por que não, então, deixar o essencialismo do termo “gerações” pela historicidade de “culturas” e, nesta perspectiva, indagar quantas delas ainda hão de ser metamorfoseadas pela atividade de outras e por quanto tempo ficarão inconscientes disso, até serem despertadas por obras outrora condenadas ao silêncio por um suposto anacronismo ou subversão?
Mais surpreendente, talvez, seja o perfil de algumas dessas obras: a sagacidade de um O príncipe, de Nicolau Maquiavel, ou a veemência de um Manifesto comunista, de Marx e Engels, nas poucas dezenas de páginas que contêm. Profundidade analítica, arrojo conceitual e poder de síntese, eis o perfil mais comum. Ou, em uma palavra, “simplicidade”, produto de uma erudição comprometida, de uma dedicação obsessiva, de um sonho prometéico. O texto Americanismo e fordismo, de Antonio Gramsci, sem dúvida é um desses raros exemplos.
Na carta de 19 março de 1927, Gramsci confidenciava, nos primeiros cinco meses dentro da prisão, à amiga e cunhada, Tatiana Schucht:
Estou atormentado [...] por esta idéia: de que é preciso fazer algo für ewig. [...] Em suma, segundo um plano preestabelecido, gostaria de me ocupar intensa e sistematicamente de alguns temas que me absorvessem e centralizassem minha vida interior (Cartas do cárcere. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005, v. 1, p. 128).
Tais palavras antecederam os vinte e nove “cadernos do cárcere”, manuscritos por Gramsci entre 1929 e 1935, e que, mais tarde, compuseram uma das mais impactantes obras de ciências sociais do século XX. Só esses fatos já tornam desnecessária uma breve apresentação aqui da vida e obra desse pensador. E talvez até mesmo redundante situá-lo entre os que com mais clareza resgataram o alcance teórico da obra de Marx em diversas frentes do conhecimento, reafirmando, aliás, contundentemente, a supremacia da filosofia como instrumento prático e revolucionário, em face do perigoso idealismo presente na suposta neutralidade axiológica com que se auto-afirma a ciência moderna.
O diferencial é que Gramsci, tal como o próprio Marx, foi de fato um pensador, e não apenas acadêmico de profissão ou intelectual por mera erudição. Ambos viveram à frente de arriscadas lutas sociais da classe trabalhadora, redigiram notáveis editoriais da imprensa combativa, disputaram o espaço literário com as lideranças intelectuais das classes dominantes, e, a seu modo e no seu contexto, cada um atuou diretamente sobre a estrutura política estabelecida, como chaves revolucionárias a abrir grilhões e ameaçar os pilares da dominação de classes. E, por isso mesmo, ambos foram, dentro e fora de seus países, incansavelmente perseguidos, difamados, silenciados quase à força.
Não é um acaso, portanto, que haja ainda outros pontos comuns entre estes dois pensadores. O texto Americanismo e fordismo de Gramsci reflete, por exemplo, as características marcantes de toda a sua obra, e esta, por sua vez, retoma um traço fundamental da própria obra de Marx, qual seja: uma investigação totalizante, que formula objetos de pesquisa partindo não somente de paradigmas científicos, mas da efetividade que assumem na história real. Uma investigação que não se esquiva, por meio dos sofismas da infinitude do real e dos limites da compreensão humana, de buscar as determinações fundadoras de cada momento histórico, decompondo a realidade, tal como a luz num prisma, em feixes de fenômenos que ganham sentido como partes de um todo explicativo. Enfim, uma investigação que rompe com a metafísica, ao sustentar-se na dialética e partir do real “efetivo”.
Gramsci não se perde em pormenorizar objetos de pesquisa. Nas poucas páginas de Americanismo e fordismo, esboça um plano de trabalho imenso, que, à primeira vista, tornaria todo o empreendimento inexeqüível nesse único espaço, não fosse o seu raro talento em cruzar as linhas gerais de múltiplos feixes de fenômenos para compor, de forma convincente, uma primeira tessitura explicativa, deixando ao mesmo tempo aberta e instigante a possibilidade da expansão da mesma trajetória de investigação em inúmeras escalas. A combinação entre genialidade, erudição e restrição carcerária, em Gramsci, fez dele mais do que um autor encerrado em respostas que dá às questões do seu tempo: fez dele um clássico da crítica contemporânea.
Assim, numa espécie de monólogo indagativo, conjugando memória e intuição dignas do exímio lingüista que foi, Gramsci realiza em Americanismo e fordismo uma análise que conecta as finanças e a propriedade monopolista de capital da indústria de massas aos estratagemas da organização do trabalho gerencial e operacional nas empresas; e também passa por temas, como a composição demográfica, geracional, etária, de gênero e religiosa das classes sociais na Europa e EUA, sobre a qual se formaram as suas principais instituições e modos de vida. As expressões “cultura”, “civilização” e mesmo “sexualidade” aparecem definindo-se neste texto em meio a termos basais do materialismo histórico, como produção, reprodução, trabalho, práxis, ideologia, educação e qualificação, Estado, controle social, entre tantos outros.
Enfim, Antonio Gramsci ocupa, entre os economistas políticos e filósofos críticos do capitalismo no século XX, um papel hegemônico (o que faz jus a um dos seus conceitos inovadores, o de hegemonia). E a introdução de Ruy Braga, docente da Universidade de São Paulo (USP), nesta edição (a primeira no Brasil que traz apenas esse texto em um só livro), tem o predicado de mostrá-lo bem. Ou seja, como todo texto clássico, Americanismo e fordismo continuará a nos surpreender e ensinar, a cada releitura.
Geraldo Augusto Pinto é docente do Centro de Educação e Letras da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, campus de Foz do Iguaçu.
Geraldo Augusto Pinto -
Antonio Gramsci. Americanismo e fordismo. Tradução de Gabriel Bogossian. Introdução de Ruy Braga. Revisão técnica e notas de Alvaro Bianchi. São Paulo: Hedra, 2008. 92p.
Haverá momento na história em que o ser humano deixará de chocar as futuras gerações com sua sempre infinita capacidade de transformação do mundo? Falo aqui de intelecção e ação sobre a natureza animada e inanimada. Do trabalho, no sentido do materialismo histórico. Por que não, então, deixar o essencialismo do termo “gerações” pela historicidade de “culturas” e, nesta perspectiva, indagar quantas delas ainda hão de ser metamorfoseadas pela atividade de outras e por quanto tempo ficarão inconscientes disso, até serem despertadas por obras outrora condenadas ao silêncio por um suposto anacronismo ou subversão?
Mais surpreendente, talvez, seja o perfil de algumas dessas obras: a sagacidade de um O príncipe, de Nicolau Maquiavel, ou a veemência de um Manifesto comunista, de Marx e Engels, nas poucas dezenas de páginas que contêm. Profundidade analítica, arrojo conceitual e poder de síntese, eis o perfil mais comum. Ou, em uma palavra, “simplicidade”, produto de uma erudição comprometida, de uma dedicação obsessiva, de um sonho prometéico. O texto Americanismo e fordismo, de Antonio Gramsci, sem dúvida é um desses raros exemplos.
Na carta de 19 março de 1927, Gramsci confidenciava, nos primeiros cinco meses dentro da prisão, à amiga e cunhada, Tatiana Schucht:
Estou atormentado [...] por esta idéia: de que é preciso fazer algo für ewig. [...] Em suma, segundo um plano preestabelecido, gostaria de me ocupar intensa e sistematicamente de alguns temas que me absorvessem e centralizassem minha vida interior (Cartas do cárcere. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005, v. 1, p. 128).
Tais palavras antecederam os vinte e nove “cadernos do cárcere”, manuscritos por Gramsci entre 1929 e 1935, e que, mais tarde, compuseram uma das mais impactantes obras de ciências sociais do século XX. Só esses fatos já tornam desnecessária uma breve apresentação aqui da vida e obra desse pensador. E talvez até mesmo redundante situá-lo entre os que com mais clareza resgataram o alcance teórico da obra de Marx em diversas frentes do conhecimento, reafirmando, aliás, contundentemente, a supremacia da filosofia como instrumento prático e revolucionário, em face do perigoso idealismo presente na suposta neutralidade axiológica com que se auto-afirma a ciência moderna.
O diferencial é que Gramsci, tal como o próprio Marx, foi de fato um pensador, e não apenas acadêmico de profissão ou intelectual por mera erudição. Ambos viveram à frente de arriscadas lutas sociais da classe trabalhadora, redigiram notáveis editoriais da imprensa combativa, disputaram o espaço literário com as lideranças intelectuais das classes dominantes, e, a seu modo e no seu contexto, cada um atuou diretamente sobre a estrutura política estabelecida, como chaves revolucionárias a abrir grilhões e ameaçar os pilares da dominação de classes. E, por isso mesmo, ambos foram, dentro e fora de seus países, incansavelmente perseguidos, difamados, silenciados quase à força.
Não é um acaso, portanto, que haja ainda outros pontos comuns entre estes dois pensadores. O texto Americanismo e fordismo de Gramsci reflete, por exemplo, as características marcantes de toda a sua obra, e esta, por sua vez, retoma um traço fundamental da própria obra de Marx, qual seja: uma investigação totalizante, que formula objetos de pesquisa partindo não somente de paradigmas científicos, mas da efetividade que assumem na história real. Uma investigação que não se esquiva, por meio dos sofismas da infinitude do real e dos limites da compreensão humana, de buscar as determinações fundadoras de cada momento histórico, decompondo a realidade, tal como a luz num prisma, em feixes de fenômenos que ganham sentido como partes de um todo explicativo. Enfim, uma investigação que rompe com a metafísica, ao sustentar-se na dialética e partir do real “efetivo”.
Gramsci não se perde em pormenorizar objetos de pesquisa. Nas poucas páginas de Americanismo e fordismo, esboça um plano de trabalho imenso, que, à primeira vista, tornaria todo o empreendimento inexeqüível nesse único espaço, não fosse o seu raro talento em cruzar as linhas gerais de múltiplos feixes de fenômenos para compor, de forma convincente, uma primeira tessitura explicativa, deixando ao mesmo tempo aberta e instigante a possibilidade da expansão da mesma trajetória de investigação em inúmeras escalas. A combinação entre genialidade, erudição e restrição carcerária, em Gramsci, fez dele mais do que um autor encerrado em respostas que dá às questões do seu tempo: fez dele um clássico da crítica contemporânea.
Assim, numa espécie de monólogo indagativo, conjugando memória e intuição dignas do exímio lingüista que foi, Gramsci realiza em Americanismo e fordismo uma análise que conecta as finanças e a propriedade monopolista de capital da indústria de massas aos estratagemas da organização do trabalho gerencial e operacional nas empresas; e também passa por temas, como a composição demográfica, geracional, etária, de gênero e religiosa das classes sociais na Europa e EUA, sobre a qual se formaram as suas principais instituições e modos de vida. As expressões “cultura”, “civilização” e mesmo “sexualidade” aparecem definindo-se neste texto em meio a termos basais do materialismo histórico, como produção, reprodução, trabalho, práxis, ideologia, educação e qualificação, Estado, controle social, entre tantos outros.
Enfim, Antonio Gramsci ocupa, entre os economistas políticos e filósofos críticos do capitalismo no século XX, um papel hegemônico (o que faz jus a um dos seus conceitos inovadores, o de hegemonia). E a introdução de Ruy Braga, docente da Universidade de São Paulo (USP), nesta edição (a primeira no Brasil que traz apenas esse texto em um só livro), tem o predicado de mostrá-lo bem. Ou seja, como todo texto clássico, Americanismo e fordismo continuará a nos surpreender e ensinar, a cada releitura.
Geraldo Augusto Pinto é docente do Centro de Educação e Letras da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, campus de Foz do Iguaçu.
DEU EM O GLOBO
COINCIDÊNCIAS
Merval Pereira
Merval Pereira
NOVA YORK. Dois personagens históricos da cidade, envolvidos com crimes de natureza semelhante aos que estão em discussão hoje no Brasil, ressurgiram no noticiário nos últimos dias. A falecida milionária com merecida fama de má Leona Helmsley, proprietária de uma cadeia de hotéis e empreendimentos imobiliários, e o investidor Michael Milken, considerado um dos mais brilhantes financistas de todos os tempos. Leona, condenada a 16 anos, ficou apenas 18 meses presa em 1989 por sonegação de impostos, e retornou do mundo dos mortos devido à polêmica herança de U$12 milhões que deixou para seu cachorro, significativamente chamado "Problema". Os responsáveis pelo inventário conseguiram convencer um juiz que era dinheiro excessivo, e a soma foi reduzida para U$2 milhões.
Já Michael Milken reapareceu no noticiário por estar pedindo clemência ao presidente Bush, assim como já o fizera oito anos atrás, sem sucesso, ao ex -presidente Clinton. Milken, que inventou o mercado dos "junk bonds", revolucionando o mundo acionário com uma maneira nova de investir em empresas falidas, recuperá-las e colocá-las novamente no mercado com lucros altíssimos, foi condenado a dez anos de prisão por vários crimes, entre os quais fraude, sonegação de impostos e informação privilegiada.
Ele cumpriu apenas 22 meses e está solto desde 1993, mas proibido de atuar no mercado financeiro. Mesmo assim, permanece como um dos homens mais ricos do mundo, com uma fortuna de cerca de U$2 bilhões, e continua ganhando dinheiro como investidor, agora no setor de educação.
Os dois têm frases famosas no seu currículo. Leona Helmsley, segundo uma empregada testemunhou na época e ela nega, se gabava de não pagar impostos: "Só pobre paga imposto". Michael Milken gostava de repetir a expressão "Greed is good" ("Ganância é bom", na tradução literal), que virou símbolo de uma geração de yuppies do mercado financeiro para quem ele era um ídolo.
Milken foi literalmente perseguido durante anos por um jovem promotor de Nova York chamado Rudolph Giuliani, que começou aí sua fama de durão que o levou até a candidato a candidato à Presidência dos Estados Unidos.
Os dois conseguiram reduções drásticas de suas penas graças à contratação de grandes escritórios de advocacia, que acabaram derrubando uma série de acusações.
Tanto o crime de Leona Helmsley quanto os de Michael Milken são assemelhados a dois casos rumorosos levados a cabo pela Polícia Federal do Brasil, a acusação de sonegação de impostos contra a loja de superluxo paulista Daslu e o processo contra o banqueiro Daniel Dantas.
Pelo que ficamos sabendo pela reportagem do GLOBO de domingo, o caso da Daslu e diversos outros estão parados por problemas técnicos nos inquéritos, aproveitados pelos advogados para virtualmente neutralizá-los.
Já temos experiências anteriores de ações feitas com estardalhaço que acabam por não dar em nada por falhas gritantes nos inquéritos. Tudo indica que o caso de Daniel Dantas caminha nessa direção, se depender do inquérito do delegado Protógenes Queiroz, aquele que se intitula "representante do povo" e acredita "que a vitória está com as pessoas de bem que lutam por um país melhor".
Um delegado que tem o desplante de afirmar em seu inquérito que "a fim de evitar o mal maior", estará de prontidão para agir contra (...) "corsários saqueadores das riquezas do nosso país" e se jacta de que a "organização criminosa de Daniel Dantas" teme apenas a Polícia Federal, ou melhor "a execução dos trabalhos pelo autor da presente", não pode ser levado a sério.
É de torcer para que a força-tarefa que será montada para analisar os documentos apreendidos na operação inspirada em Gandhi tenha mais técnica e menos palavrório para conseguir montar um caso sólido, que resista às brechas da lei.
O outro "herói" dessa história, o juiz De Sanctis, também está convencido de que a sociedade depende de sua atuação. Ele se dispõe a resgatar "a auto-estima" de um povo "feliz, mas muito injustiçado". E persegue, vejam só, a "pureza, honestidade e o amor dos nossos nativos".
O juiz, na sua messiânica missão, não tem dúvidas em afirmar que "um grande êxito advirá e as pessoas poderão se orgulhar e reconhecer novamente neste país uma terra limpa e abençoada".
Seria risível, se não fosse trágico, inclusive porque a posição voluntarista e messiânica desses representantes do poder público só ganha vida em um ambiente político completamente corrompido como o em que vivemos há algum tempo no país.
Corrompido por disputas políticas, corrompido por interesses de negócios. Em todos os escalões, estão envolvidas pessoas ligadas ao poder central. Em ambiente assim, juiz tem partido, delegado faz parte de facções, políticos vendem prestígio.
Se é possível fazer-se ilações de interesses escusos na privatização da telefonia brasileira, onde teria começado o poder destruidor de Daniel Dantas, é muito mais clara a ligação entre interesses pessoais e o grande negócio da fusão de telefônicas ao qual Dantas atribui o desencadeamento da operação policial contra ele.
Na época em que a Telemar alavancou com R$5 milhões um projeto do filho do presidente Lula, já havia uma disputa interna de ministros com sala no Palácio do Planalto a favor e contra Dantas, que, aliás, tentou chegar primeiro para financiar o projeto do Lulinha.
Dois anos depois, o governo alterar toda a legislação existente; forçar a barra na direção da Anatel, nomeando um diretor para desempatar a decisão a favor da fusão; permitir que bancos oficiais como o Banco do Brasil e o BNDES emprestem grandes somas de dinheiro para uma operação que é ilegal até o momento - tudo para permitir que a Telemar compre a Brasil Telecom -, é coincidência demais.
DEU EM O GLOBO
IDÉIAS CEPALINAS
Míriam Leitão
Míriam Leitão
A Cepal continua ainda, em vários aspectos, cepalina: defendendo a presença do Estado na economia e aceitando o controle de preços. Mas com algumas mudanças, como a inclusão da variável ambiental nas suas preocupações. Isso foi o que contou a nova secretária-executiva da Cepal, Alicia Bárcena, em entrevista exclusiva à coluna. Ela lembra que este será o quinto ano de crescimento do PIB per capita acima dos 3% na região e diz que, não fossem os baixos crescimentos de Brasil e México, o número seria bem melhor.
Alicia Bárcena é a primeira mulher a assumir o cargo; um avanço para uma região tão machista. Antes de ocupar o posto, ela foi diretora da Divisão de Meio Ambiente; outra notícia interessante. Este ano, a Cepal completou 60 anos, e seguindo a ONU, sua holding, agora começa a concentrar esforços na questão ambiental. Nas várias respostas que nos deu, Alicia fez questão de frisar essa nova variável.
Apesar de os tempos serem outros, a Cepal mantém a visão de que o Estado é peça importante no bom caminhar da economia, mas com a participação do setor privado.
- Sem Estado, não existe desenvolvimento eqüitativo nem sustentável; sem setor privado, não existe investimento. Mas o Estado não pode dirigir sozinho uma economia. Ele tem um papel imprescindível na provisão de bens públicos e para assegurar um desenvolvimento ambientalmente sustentável - afirma Alicia.
Ela reconhece que há ainda muitos problemas na região quando se trata de políticas de combate à mudança climática. Segundo Alicia, é preciso desenvolver ações mais coordenadas entre os países:
- A América Latina é a região do mundo que mais contribui para as emissões de gases de efeito estufa por causa do desmatamento; em maior parte, na Amazônia. E a redução de emissões custa muito menos que outras alternativas de mitigação.
Alícia elogia o sistema de monitoramento brasileiro da Floresta Amazônica, mas diz que é preciso ter noção clara de que "existem forças que operam no sentido contrário, como a alta dos preços mundial dos produtos agrícolas".
Perguntamos a ela sobre um outro tema crucial para a região: a energia. Como em todas as respostas, a nova secretária-executiva da Cepal começou elogiando os avanços para, logo em seguida, dizer sin embargo, e aí aparecerem todos os problemas de que temos conhecimento.
Assim sendo, fez elogios aos avanços, como os gasodutos, no entanto afirmou que "ainda falta muito para se alcançar um mercado comum de energia". E complementou que, ainda que tenham ocorrido importantes avanços nos países andinos, que eles foram muito menores nos países do Mercosul.
Muitos anos se passaram, porém, em diversos aspectos, a Cepal continua intervencionista como em outros tempos. Indagada sobre as opções de alguns países - leiam-se Argentina, Venezuela e mesmo México - pelo controle de preços, Alicia Bárcena afirmou que a Comissão não é contra o controle de preços ou do câmbio per se, mas que, neste momento, com uma inflação que considera de origem totalmente importada, essas políticas teriam efeito escasso ou nulo.
"Principalmente em países onde a demanda de alimentos depende principalmente das importações." Ela não citou, mas esse é o caso da Venezuela.
- Tais políticas poderiam fazer parte de um programa antiinflacionário, mas, para que tenham viabilidade, devem ser aplicadas dentro de uma disciplina que permita manter os equilíbrios macroeconômicos. Um controle de preços, por exemplo, num contexto de desequilíbrio das contas públicas, ainda que tenha sucesso para conter o impulso inflacionário, pode dar lugar a um problema de abastecimento.
No atual cenário, acredita ela, seria melhor agir através de subsídios ao campo, para expandir a produção. Contudo, nem todos os países têm recursos fiscais para esse tipo de política. (E, de nossa parte, é bom lembrar que políticas assim tendem sempre a beneficiar setores que são historicamente os grande beneficiados.)
Alicia discorda da idéia de que existem dois modelos econômicos diferentes na América do Sul, que separariam Brasil, Peru e Colômbia de Argentina, Venezuela e Equador. Ela afirma, de forma veemente, que o mercado funciona em todos eles, com responsabilidade fiscal e equilíbrio macroeconômico. Difícil concordar. A secretária-executiva diz que a região já aprendeu que não é razoável opor os investimentos nacionais aos estrangeiros. "Com nossos níveis de poupança, precisamos do aporte do investimento estrangeiro." Seu raciocínio é de que é preciso tirar melhor proveito desses investimentos - através, por exemplo, da absorção e troca de tecnologia.
À pergunta que não quer calar, por que a região cresce menos que o resto do mundo, Alicia trouxe um ponto interessante. Nos últimos anos, enquanto os gigantes asiáticos puxaram o crescimento da Ásia, os dois gigantes daqui - Brasil e México - fizeram o oposto. Dessa forma, se ambos fossem excluídos da conta, nos anos recentes, pelo menos, a região teria índice semelhante ao das demais do planeta. Culpa nossa.
Mas, claro, o principal da explicação para termos perdido o passo está nos fatores estruturais: baixo investimento em educação, inovação, ciência e tecnologia, ainda mais quando comparado com a Ásia. A conseqüência: baixa produtividade.
- Os futuros trabalhadores da Argentina e do Brasil precisam, ao menos, do ensino médio completo para ter boas opções de acesso a empregos qualificados, com um salário que lhes permita estar fora da pobreza. O ensino médio completo é o mínimo - conclui Alicia.
Autor: RUTH VASCONCELOS
Editora: EDUFAL
Assista a entrevista, da Professora Ruth Vasconcelos no programa "Alagoas Arte e Cultura" exibido na TV Assembléia, Alagoas. É só acessar neste link
DEU NO JORNAL DO BRASIL
O PRIMEIRO MUNDO FECHA A PORTA
Marcelo Medeiros
Os imigrantes representam uma das principais preocupações dos europeus e dos americanos.
Todos os dias, centenas deles deixam seus países, com a esperança de fugirem da miséria ou dos conflitos armados, para aventurarem uma vida ilegal, mas promissora, em algum país desenvolvido.
O bloco dos 27 países da União Européia, em contrapartida, aumenta o controle de suas fronteiras e procura manter os estrangeiros cada vez mais afastados. Nos Estados Unidos, cujo maior problema são os imigrantes mexicanos, está sendo construído um muro na fronteira com o México.
A realidade que os imigrantes vêm encontrando tem sido cada vez mais penosa. Medidas coercitivas estão sendo adotadas: maior controle sobre a entrada de estrangeiros; punições mais severas para empresários que empregam imigrantes em situação irregular; programas de retorno voluntário aos seus países de origem ou simplesmente a expulsão.
A União Européia aprovou, no mês passado, uma lei que permite que os imigrantes fiquem detidos por até 18 meses sem qualquer acusação legal. Em outro artigo proíbe os estrangeiros expulsos de retornarem por cinco anos.
Esta política contrapõe-se às previsões das Nações Unidas, que calculou num estudo, feito em 2000, que o continente europeu deveria acolher 150 milhões de imigrantes até 2025 para compensar a queda da natalidade e manter sua atividade econômica.
Segundo o mesmo relatório, na última década, os estrangeiros foram responsáveis por 89% do crescimento demográfico na Europa. Sem eles, a população do continente teria sido reduzida em 4,4 milhões de indivíduos.
Na Espanha, a crise econômica, com alta taxa de desemprego (9,6%), levou o primeiro-ministro Zapatero a adotar medidas mais rígidas e criar um ministério da Imigração. Neste ano, até agora, 69 imigrantes morreram no mar ao tentarem atingir a costa mediterrânea da Espanha.
O chefe do governo espanhol cobrou dos países ricos, o cumprimento da promessa de destinarem 0,7% do PIB para o combate à pobreza. "Estamos em uma situação alarmante; ou ajudamos a África a lutar contra a pobreza extrema, ou o nosso Estado social estará em perigo".
O presidente francês que assumiu, neste mês, a presidência da União Européia (UE), quer fazer da imigração a sua grande bandeira. "A França ou a Europa não vão aceitar toda a miséria do mundo", afirmou Sarkozy. Ele propõe um "pacto europeu sobre imigração e asilo", que consiste, objetivamente, em fechar as portas do continente.
Na França, atualmente vivem 5 milhões de imigrantes (8% da população). Estimam-se os imigrantes ilegais entre 300 e 400 mil.
Nos cinco primeiros meses deste ano, aumentou em 80% o percentual de imigrantes ilegais expulsos do território francês.
Na Inglaterra, uma recente pesquisa de opinião revelou que seis entre 10 ingleses, defendem mais rigor no controle da imigração.
A população imigrante regular em Portugal se aproxima de meio milhão de pessoas. O que corresponde a 5% da população do país. A comunidade brasileira é a maior.
Quando os países do primeiro mundo têm desenvolvimento acelerado e querem mão-de-obra barata, aceitam imigrantes. Em épocas de crise econômica, desemprego e pré-estagnação, como a que estão vivendo os europeus e americanos, a tendência é a de não receberem imigrantes.
Marcelo Medeiros
Os imigrantes representam uma das principais preocupações dos europeus e dos americanos.
Todos os dias, centenas deles deixam seus países, com a esperança de fugirem da miséria ou dos conflitos armados, para aventurarem uma vida ilegal, mas promissora, em algum país desenvolvido.
O bloco dos 27 países da União Européia, em contrapartida, aumenta o controle de suas fronteiras e procura manter os estrangeiros cada vez mais afastados. Nos Estados Unidos, cujo maior problema são os imigrantes mexicanos, está sendo construído um muro na fronteira com o México.
A realidade que os imigrantes vêm encontrando tem sido cada vez mais penosa. Medidas coercitivas estão sendo adotadas: maior controle sobre a entrada de estrangeiros; punições mais severas para empresários que empregam imigrantes em situação irregular; programas de retorno voluntário aos seus países de origem ou simplesmente a expulsão.
A União Européia aprovou, no mês passado, uma lei que permite que os imigrantes fiquem detidos por até 18 meses sem qualquer acusação legal. Em outro artigo proíbe os estrangeiros expulsos de retornarem por cinco anos.
Esta política contrapõe-se às previsões das Nações Unidas, que calculou num estudo, feito em 2000, que o continente europeu deveria acolher 150 milhões de imigrantes até 2025 para compensar a queda da natalidade e manter sua atividade econômica.
Segundo o mesmo relatório, na última década, os estrangeiros foram responsáveis por 89% do crescimento demográfico na Europa. Sem eles, a população do continente teria sido reduzida em 4,4 milhões de indivíduos.
Na Espanha, a crise econômica, com alta taxa de desemprego (9,6%), levou o primeiro-ministro Zapatero a adotar medidas mais rígidas e criar um ministério da Imigração. Neste ano, até agora, 69 imigrantes morreram no mar ao tentarem atingir a costa mediterrânea da Espanha.
O chefe do governo espanhol cobrou dos países ricos, o cumprimento da promessa de destinarem 0,7% do PIB para o combate à pobreza. "Estamos em uma situação alarmante; ou ajudamos a África a lutar contra a pobreza extrema, ou o nosso Estado social estará em perigo".
O presidente francês que assumiu, neste mês, a presidência da União Européia (UE), quer fazer da imigração a sua grande bandeira. "A França ou a Europa não vão aceitar toda a miséria do mundo", afirmou Sarkozy. Ele propõe um "pacto europeu sobre imigração e asilo", que consiste, objetivamente, em fechar as portas do continente.
Na França, atualmente vivem 5 milhões de imigrantes (8% da população). Estimam-se os imigrantes ilegais entre 300 e 400 mil.
Nos cinco primeiros meses deste ano, aumentou em 80% o percentual de imigrantes ilegais expulsos do território francês.
Na Inglaterra, uma recente pesquisa de opinião revelou que seis entre 10 ingleses, defendem mais rigor no controle da imigração.
A população imigrante regular em Portugal se aproxima de meio milhão de pessoas. O que corresponde a 5% da população do país. A comunidade brasileira é a maior.
Quando os países do primeiro mundo têm desenvolvimento acelerado e querem mão-de-obra barata, aceitam imigrantes. Em épocas de crise econômica, desemprego e pré-estagnação, como a que estão vivendo os europeus e americanos, a tendência é a de não receberem imigrantes.
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
TANTO ESFORÇO PARA ISSO?
Eliane Cantanhêde
Eliane Cantanhêde
BRASÍLIA - Você já ouviu falar em Jô Moraes? Nem eu. Mas ela é deputada federal e está em primeiro lugar nas pesquisas para a Prefeitura de Belo Horizonte, contra tudo, contra todos e muito particularmente contra o governador Aécio Neves, do PSDB, e o prefeito da capital, Fernando Pimentel, do PT.
Jô Moraes parece ter tudo contra. Mulher e paraibana num Estado machista e bairrista, é filiada ao PC do B, partido pequeno e um tanto extemporâneo, e enfrenta dois Golias. Mesmo que acabe perdendo a eleição-o que parece muito mais natural até onde a vista alcança-, ela já fez uma proeza.
E uma proeza sobretudo por chacoalhar a espetacular aliança tucano-petista, construída à revelia da cúpula nacional do PT e dos ministros Patrus Ananias (Desenvolvimento Social) e Luiz Dulci (Secretaria Geral da Presidência). Ilustres desconhecidos no cenário nacional, os dois são bastante influentes em Minas, onde tentam ocupar o vácuo de liderança, essa, sim, efetiva e forte, do ex-prefeito Célio de Castro, afastado da política por um derrame em 2001 e morto no domingo.
Aécio e Pimentel enfrentaram todas as resistências, mantiveram a união e lançaram o nome de Márcio Lacerda, do PSB, para ser "imbatível". Mas ele está em... terceiro lugar! Em resumo, fizeram das tripas coração para chegar a uma vitória acachapante e cheia de significado sobre a conturbada relação atual e as possibilidade futuras entre PSDB e PT, mas não contavam com isso: a força deletéria da divisão petista sobre o ânimo do eleitorado e a emergência de Jô Moraes.
E o vice José Alencar? Dizem que também está com ela. Minas, portanto, continua produzindo os melhores momentos desta eleição. A espetacular costura PT-PSDB, o ciúme dos ministros mineiros, a surpresa da líder das pesquisas. É difícil Aécio e Pimentel perderem essa. Mas, se perderem, vai ser um vexame histórico.
DEU NO VALOR ECONÔMICO
GOVERNO MANTÉM APOSTA NA SUPERTELE
Raymundo Costa
No cálculo do governo, a menos que apareça uma irregularidade concreta capaz de desmanchar a operação, a criação da supertele de capital nacional, resultado do acordo da Oi com a BrT, está assegurada. Basta a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) concluir a consulta pública que convocou para discutir a revisão do Plano Geral de Outorgas (PGO), enviar suas sugestões ao Ministério das Comunicações e o presidente da República baixar o decreto com alterações nas regras estabelecidas à época da privatização do sistema Telebras, no ano da graça de 1998.
Pode ser, mas o inquérito aberto pela Polícia Federal contra o banqueiro Daniel Dantas, dono do Opportunity, elevou muito a desconfiança sobre o sucesso da empreitada, que tem a chancela e a torcida entusiasmada do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Entre os que auxiliaram Daniel Dantas a se desfazer de sua posição acionária na BrT - minoritária, mas um entrave sem tamanho para a realização do negócio - nem sequer há duvida: a prisão do banqueiro e a divulgação de grampos telefônicos envolvendo personagens palacianos foram uma espécie de última tentativa de melar esse acordo.
Dantas e seu grupo detectaram a investigação da PF bem antes da publicação da reportagem da jornalista Andrea Michael na "Folha de S. Paulo", em fins de abril. À época, já com o acordo para que Dantas se desfizesse de suas ações em fase bastante adiantada, alguns do grupo concluíram que estava em curso uma operação para invalidar o negócio.
O grupo bem que tentou, mas não conseguiu confirmar nem a existência da investigação nem saber quem estava no encalço do banqueiro. Fechado o acordo e com a Anatel a caminho de lançar as âncoras legais para o negócio, a Operação Satiagraha jogou incertezas sobre o final da operação. Resta saber quais seriam os interessados em melar um acordo cujo interesse o governo não escondeu antes, durante e nem agora, depois que ele foi fechado e a Operação Satiagraha pode ameaçar sua conclusão.
Num PT dividido e em vácuo de poder, os suspeitos são muitos. Mas por enquanto não passam disso mesmo, suspeitos de especulações políticas que vão do razoável à paranóia. Há até quem ache que o delegado Protógenes Queiroz, numa caçada fundamentalista a Dantas atirou no que viu e acertou no que não viu. Difícil é provar. No crivo do Palácio do Planalto, até agora, não se viu nada até agora que possa levar ao cancelamento do acordo.
Operação da PF é ameaça ao projeto BrT-Oi
A convicção do governo na formalização da supertele é que nenhum ilícito foi detectado na ação de agentes públicos. O que há no Palácio do Planalto é o que auxiliares do presidente chamam de "desconforto" com as "ações de boa vontade" ou de " lobby" terem exposto pessoas como o chefe de gabinete do presidente, Gilberto Carvalho, flagrado numa conversa telefônica com Luiz Eduardo Greenhalgh, ex-deputado e advogado de Dantas na disputa societária.
Quem sabe das coisas no Planalto não desconhecia quem era o cliente de Greenhalgh. O advogado convenceu o Planalto que Dantas queria sair das teles; o Planalto entendeu que, sem Dantas, poderia levar adiante a supertele de capital nacional, projeto que considera estratégico na medida dos serviços de telecomunicações que podem ser agregados à telefonia fixa.
Elo entre Dantas e o Planalto, Greenhalgh está abatido. "Trabalhei um ano, seis meses dos quais levantando processos, convencendo o cara que o melhor era vender as ações, fazer o acordo", tem se queixado o ex-deputado em conversas privadas. "Terminou o acordo eu saí dessa história. Não tenho mais nada a ver com isso".
"Trabalhei um ano nesse assunto, e acho que fiz um bem para o país: ajudei a resolver o maior conflito societário do capitalismo moderno no Brasil", diz. Segundo acredita o advogado, "não havia a menor chance de ter uma supertele no Brasil com Daniel Dantas participando.
Agora Greenhalgh acha que está sendo crucificado por tudo o que Daniel Dantas faz ou fez "como se eu tivesse com ele nos últimos 40 anos". Teme estar entrando na mesma linha que julga trilhar José Dirceu. "O cara que é responsável por tudo, vai apanhar por tudo e vai pagar por tudo".
Raymundo Costa
No cálculo do governo, a menos que apareça uma irregularidade concreta capaz de desmanchar a operação, a criação da supertele de capital nacional, resultado do acordo da Oi com a BrT, está assegurada. Basta a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) concluir a consulta pública que convocou para discutir a revisão do Plano Geral de Outorgas (PGO), enviar suas sugestões ao Ministério das Comunicações e o presidente da República baixar o decreto com alterações nas regras estabelecidas à época da privatização do sistema Telebras, no ano da graça de 1998.
Pode ser, mas o inquérito aberto pela Polícia Federal contra o banqueiro Daniel Dantas, dono do Opportunity, elevou muito a desconfiança sobre o sucesso da empreitada, que tem a chancela e a torcida entusiasmada do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Entre os que auxiliaram Daniel Dantas a se desfazer de sua posição acionária na BrT - minoritária, mas um entrave sem tamanho para a realização do negócio - nem sequer há duvida: a prisão do banqueiro e a divulgação de grampos telefônicos envolvendo personagens palacianos foram uma espécie de última tentativa de melar esse acordo.
Dantas e seu grupo detectaram a investigação da PF bem antes da publicação da reportagem da jornalista Andrea Michael na "Folha de S. Paulo", em fins de abril. À época, já com o acordo para que Dantas se desfizesse de suas ações em fase bastante adiantada, alguns do grupo concluíram que estava em curso uma operação para invalidar o negócio.
O grupo bem que tentou, mas não conseguiu confirmar nem a existência da investigação nem saber quem estava no encalço do banqueiro. Fechado o acordo e com a Anatel a caminho de lançar as âncoras legais para o negócio, a Operação Satiagraha jogou incertezas sobre o final da operação. Resta saber quais seriam os interessados em melar um acordo cujo interesse o governo não escondeu antes, durante e nem agora, depois que ele foi fechado e a Operação Satiagraha pode ameaçar sua conclusão.
Num PT dividido e em vácuo de poder, os suspeitos são muitos. Mas por enquanto não passam disso mesmo, suspeitos de especulações políticas que vão do razoável à paranóia. Há até quem ache que o delegado Protógenes Queiroz, numa caçada fundamentalista a Dantas atirou no que viu e acertou no que não viu. Difícil é provar. No crivo do Palácio do Planalto, até agora, não se viu nada até agora que possa levar ao cancelamento do acordo.
Operação da PF é ameaça ao projeto BrT-Oi
A convicção do governo na formalização da supertele é que nenhum ilícito foi detectado na ação de agentes públicos. O que há no Palácio do Planalto é o que auxiliares do presidente chamam de "desconforto" com as "ações de boa vontade" ou de " lobby" terem exposto pessoas como o chefe de gabinete do presidente, Gilberto Carvalho, flagrado numa conversa telefônica com Luiz Eduardo Greenhalgh, ex-deputado e advogado de Dantas na disputa societária.
Quem sabe das coisas no Planalto não desconhecia quem era o cliente de Greenhalgh. O advogado convenceu o Planalto que Dantas queria sair das teles; o Planalto entendeu que, sem Dantas, poderia levar adiante a supertele de capital nacional, projeto que considera estratégico na medida dos serviços de telecomunicações que podem ser agregados à telefonia fixa.
Elo entre Dantas e o Planalto, Greenhalgh está abatido. "Trabalhei um ano, seis meses dos quais levantando processos, convencendo o cara que o melhor era vender as ações, fazer o acordo", tem se queixado o ex-deputado em conversas privadas. "Terminou o acordo eu saí dessa história. Não tenho mais nada a ver com isso".
"Trabalhei um ano nesse assunto, e acho que fiz um bem para o país: ajudei a resolver o maior conflito societário do capitalismo moderno no Brasil", diz. Segundo acredita o advogado, "não havia a menor chance de ter uma supertele no Brasil com Daniel Dantas participando.
Agora Greenhalgh acha que está sendo crucificado por tudo o que Daniel Dantas faz ou fez "como se eu tivesse com ele nos últimos 40 anos". Teme estar entrando na mesma linha que julga trilhar José Dirceu. "O cara que é responsável por tudo, vai apanhar por tudo e vai pagar por tudo".
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras
DEU NO VALOR ECONÔMICO
DECLARAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS, 60 ANOS DEPOIS
Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo
"Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os homens gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do homem comum. Considerando essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo Estado de Direito, para que o homem não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra tirania e a opressão."
Declaração Universal dos Direitos Humanos, 17 de dezembro de 1948.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos completa 60 anos. As décadas de 20 e 30 do século passado, os mais velhos sabem, testemunharam o massacre humano generalizado e a tragédia do Holocausto. A experiência do inumano não deixou outro caminho aos sobreviventes senão o da reafirmação e atualização da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão promulgada em 1789. Descontadas as manobras humanitárias da IV Frota, hoje, os princípios exarados nas declarações estão em franco declínio, a despeito da retórica democrática, como bem observou Luciano Cânfora.
Selecionei para uma exposição livre os artigos XI, XII, XIX, XXV, XXVI da Declaração de 1948. Lá vai. Toda a pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público, no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa. Ninguém poderá ser inculpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituam delito perante o direito nacional ou internacional. Tampouco será imposta pena mais forte do que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso.
É considerada intolerável a interferência na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, (e atenção!) e o desrespeito à sua honra e reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques. O cidadão (note o leitor, o cidadão) tem direito à liberdade de opinião e de expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações por quaisquer meios e independente de fronteiras.
Na impossibilidade de encontrar meios adequados para conter a violência e a onda criminosa, a sociedade civil apela para medidas extremas
Todos têm direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistências especiais. Todas as crianças nascidas dentro ou fora do matrimônio gozarão da mesma proteção social. A instrução é um direito de todos e ela será gratuita pelo menos nos graus elementares e fundamentais. Termino com o artigo XVII, especialmente dedicado a Bush filho: "Toda pessoa terá direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados".
Tenho a impressão que, transcorridos 60 anos da promulgação desse cardápio de boas intenções, a opinião da maioria continua desconfiada do respeito às formalidades da lei. Exige uma solução mais rápida e drástica para a realização da justiça, ainda que à custa de tropelias ilegais. (Quanto aos direitos sociais e econômicos, sofrem o ataque sistemático da aliança plutocrático-midiática)
Vou me valer de um texto de Paul Veyne sobre Michel Foucault, um dos estudiosos das formas históricas assumidas pelas instituições encarregadas de vigiar e punir.
As metamorfoses do direito penal ao longo da história, diz Foucault, revelam que não é suficiente dizer que sob o Antigo Regime as punições atrozes refletiam a "rudeza dos costumes". Nos suplícios terríveis dessa época, a soberania real se abatia com toda a sua força sobre indivíduo rebelde. As cerimônias cruéis tinham o propósito de mostrar a todos a desproporção de forças entre o rebelde e o rei.
Desde a Idade das Luzes, a punição, inflingida por um aparato administrativo especializado, torna-se preventiva e corretiva. A prisão é uma técnica coercitiva para reeducar o cidadão que desrespeitou a lei. Michel Focault procura mostrar, em sua investigação arqueológica, que não se trata apenas de um progresso humanitário, mas de uma mudança radical do discurso sobre os padrões de convivência entre os humanos.
O Estado, enquanto detentor do monopólio da violência, está permanentemente dilacerado entre o dever de impor tempestivamente a sanção legal aos transgressores da lei e a missão de impedir que a sociedade seja submetida à tirania do soberano absolutista e à crueldade de seu métodos punitivos. Paradoxalmente, como diz o preâmbulo da Declaração, a inobservância do princípio da legalidade processual está prestes a reinstaurar a guerra privada e o favorecer o aparecimento de alguma forma de despotismo extralegal.
Na impossibilidade de encontrar os meios adequados para conter a violência e a onda criminosa, o temor hobbessiano da destruição e da morte engendram a fuga para as campanhas de opinião que apelam para medidas extremas. São manifestações de impotência, travestidas de ações da sociedade civil, em cujos becos e desvãos escuros se acumulam os miasmas que intoxicam a vida social com os venenos da suspeita generalizada e do medo.
O problema, hoje, não está rudeza dos costumes, digna da inteligência de chimpanzés, ou coisa pior. Graves são a desagregação do aparelho de Estado, a autonomização e a falta de transparência das burocracias encarregadas de vigiar e punir, e sua aliança ameaçadora com o poder repressivo "privado" das grandes corporações da mídia. Essa mixórdia institucional reflete as angústias que transtornam a alma da sociedade.
Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, e professor titular do Instituto de Economia da Unicamp, escreve mensalmente às terças-feiras.
Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo
"Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os homens gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do homem comum. Considerando essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo Estado de Direito, para que o homem não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra tirania e a opressão."
Declaração Universal dos Direitos Humanos, 17 de dezembro de 1948.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos completa 60 anos. As décadas de 20 e 30 do século passado, os mais velhos sabem, testemunharam o massacre humano generalizado e a tragédia do Holocausto. A experiência do inumano não deixou outro caminho aos sobreviventes senão o da reafirmação e atualização da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão promulgada em 1789. Descontadas as manobras humanitárias da IV Frota, hoje, os princípios exarados nas declarações estão em franco declínio, a despeito da retórica democrática, como bem observou Luciano Cânfora.
Selecionei para uma exposição livre os artigos XI, XII, XIX, XXV, XXVI da Declaração de 1948. Lá vai. Toda a pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público, no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa. Ninguém poderá ser inculpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituam delito perante o direito nacional ou internacional. Tampouco será imposta pena mais forte do que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso.
É considerada intolerável a interferência na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, (e atenção!) e o desrespeito à sua honra e reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques. O cidadão (note o leitor, o cidadão) tem direito à liberdade de opinião e de expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações por quaisquer meios e independente de fronteiras.
Na impossibilidade de encontrar meios adequados para conter a violência e a onda criminosa, a sociedade civil apela para medidas extremas
Todos têm direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistências especiais. Todas as crianças nascidas dentro ou fora do matrimônio gozarão da mesma proteção social. A instrução é um direito de todos e ela será gratuita pelo menos nos graus elementares e fundamentais. Termino com o artigo XVII, especialmente dedicado a Bush filho: "Toda pessoa terá direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados".
Tenho a impressão que, transcorridos 60 anos da promulgação desse cardápio de boas intenções, a opinião da maioria continua desconfiada do respeito às formalidades da lei. Exige uma solução mais rápida e drástica para a realização da justiça, ainda que à custa de tropelias ilegais. (Quanto aos direitos sociais e econômicos, sofrem o ataque sistemático da aliança plutocrático-midiática)
Vou me valer de um texto de Paul Veyne sobre Michel Foucault, um dos estudiosos das formas históricas assumidas pelas instituições encarregadas de vigiar e punir.
As metamorfoses do direito penal ao longo da história, diz Foucault, revelam que não é suficiente dizer que sob o Antigo Regime as punições atrozes refletiam a "rudeza dos costumes". Nos suplícios terríveis dessa época, a soberania real se abatia com toda a sua força sobre indivíduo rebelde. As cerimônias cruéis tinham o propósito de mostrar a todos a desproporção de forças entre o rebelde e o rei.
Desde a Idade das Luzes, a punição, inflingida por um aparato administrativo especializado, torna-se preventiva e corretiva. A prisão é uma técnica coercitiva para reeducar o cidadão que desrespeitou a lei. Michel Focault procura mostrar, em sua investigação arqueológica, que não se trata apenas de um progresso humanitário, mas de uma mudança radical do discurso sobre os padrões de convivência entre os humanos.
O Estado, enquanto detentor do monopólio da violência, está permanentemente dilacerado entre o dever de impor tempestivamente a sanção legal aos transgressores da lei e a missão de impedir que a sociedade seja submetida à tirania do soberano absolutista e à crueldade de seu métodos punitivos. Paradoxalmente, como diz o preâmbulo da Declaração, a inobservância do princípio da legalidade processual está prestes a reinstaurar a guerra privada e o favorecer o aparecimento de alguma forma de despotismo extralegal.
Na impossibilidade de encontrar os meios adequados para conter a violência e a onda criminosa, o temor hobbessiano da destruição e da morte engendram a fuga para as campanhas de opinião que apelam para medidas extremas. São manifestações de impotência, travestidas de ações da sociedade civil, em cujos becos e desvãos escuros se acumulam os miasmas que intoxicam a vida social com os venenos da suspeita generalizada e do medo.
O problema, hoje, não está rudeza dos costumes, digna da inteligência de chimpanzés, ou coisa pior. Graves são a desagregação do aparelho de Estado, a autonomização e a falta de transparência das burocracias encarregadas de vigiar e punir, e sua aliança ameaçadora com o poder repressivo "privado" das grandes corporações da mídia. Essa mixórdia institucional reflete as angústias que transtornam a alma da sociedade.
Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, e professor titular do Instituto de Economia da Unicamp, escreve mensalmente às terças-feiras.
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