• Reajuste da Light em novembro pode chegar a 15%, que levaria a alta de 70% em 2 anos
Bruno Rosa, Ramona Ordoñez - O Globo
Quem acha que a conta de luz já subiu muito deve se preparar: haverá mais um aumento este ano para quem mora no Rio. De acordo com consultorias ouvidas pelo GLOBO, a Light deve elevar o preço da energia em até 15% em novembro, quando é feito o reajuste anual da concessionária presente em 31 municípios do Estado do Rio. Esse aumento vai se somar à adoção do sistema de bandeiras tarifárias, em janeiro, e à revisão extraordinária, em março. Com o novo reajuste — o quarto no período de um ano —, a conta de luz residencial do carioca pode somar alta de 73,8% desde o fim de 2013, quando a crise no setor energético começou a se agravar.
Essa alta, dizem os especialistas, reflete o uso intensivo das usinas térmicas, que geram eletricidade mais cara que a das hidrelétricas — cujos reservatórios estão em nível baixo. Pesam ainda o atraso no cronograma das obras de projetos de geração e a valorização do dólar, que já está perto dos R$ 4. O câmbio influi na tarifa da Usina de Itaipu, cuja energia gerada é fixada em dólar e comprada pelas distribuidoras, como as do Sudeste.
As tarifas também vêm sendo influenciadas por repasses referentes aos aportes e empréstimos de quase R$ 59 bilhões tomados pelas distribuidoras para cobrir os gastos extras com a compra de energia no mercado livre. Além disso, onera a fatura de todos os brasileiros o sistema de bandeiras tarifárias. Criado em janeiro, ele indica, por meio das cores verde, amarela e vermelha, a condição da geração elétrica. Desde então o país está no “vermelho”, situação que deve se manter até o ano que vem e que encarece a energia.
E os cariocas já sentem isso no bolso. David dos Santos, que mora e tem um salão de beleza no Catete, viu as contas de luz praticamente dobrarem este ano. Apesar de ele e sua mulher se esforçarem para não desperdiçar energia, a fatura de casa passou de R$ 63 no fim do ano passado para R$ 125 hoje. Já no salão, onde é difícil reduzir o consumo, a conta pulou de R$ 1.100 para mais de R$ 1.800.
— A gente não tem mais onde cortar. Antes da reeleição, o governo prometeu baixar as tarifas, mas depois aumentou. O problema não é só a falta de chuvas, é a má administração, e quem paga sempre são os consumidores — reclamou Santos.
Reajuste vai contribuir para IPCA maior
A energia, junto com os alimentos, será um dos vilões deste ano no orçamento doméstico. De janeiro a julho, ela acumula alta de 47,95% pelo IPCA, índice oficial de inflação. Segundo Luiz Roberto Cunha, da PUC- RJ, o reajuste da Light deve ser o principal fator para o avanço estimado para a energia em novembro, de 1,2% — o que deve levar o IPCA do mês a 0,66%.
— As projeções de inflação para o ano já levam em conta o aumento da Light, sempre em novembro. Se não houvesse alta, o IPCA de novembro ficaria em 0,61%. Apesar de a previsão de alta da Light ser de cerca de 10% em novembro, o efeito só é sentido em parte, já que o índice não capta todo o efeito desse aumento — disse Cunha.
Segundo Mikio Kawai, da Safira Energia, a expectativa é de aumento na tarifa residencial ( e geral) da Light entre 5% e 12%. Considerando- se o teto máximo da previsão, o preço vai acumular uma alta de 73,8% desde o fim de 2013. É uma média semelhante à do país. Segundo a consultoria, com base em dados da Agência Nacional de Energia Elétrica ( Aneel), o preço da tarifa residencial no Rio, já com os impostos, deve chegar a R$ 0,805 por quilowatt-hora (kWh) no fim deste ano. Em dezembro de 2013, o kWh estava em R$ 0,463 e, no fim do ano passado, em R$ 0,529. Segundo Kawai, no caso da Ampla, o aumento entre o fim de 2013 e setembro deste ano acumula avanço de 40,8%, já que seu reajuste anual é feito em março.
Já a Thymos prevê que o reajuste de novembro da Light fique entre 10% e 15%. Ricardo Savoia, diretor de Regulação e Gestão da empresa, lembrou que, sem água nos reservatórios, as distribuidoras continuam recorrendo ao mercado livre para comprar energia e honrar contratos. O problema é que o valor da energia nesse mercado ficou no teto ( de R$ 381 o megawatt/ hora) entre janeiro e o início de junho, e ainda há o impacto da disparada do dólar.
— Na Light, também entra no cálculo a variação do dólar entre novembro e outubro, com a energia comprada em Itaipu — destacou. — Ainda há muitas incertezas para os próximos anos, por conta dos repasses ao consumidor dos empréstimos tomados no ano passado.
Nivalde de Castro, do Grupo de Estudos do Setor Elétrico ( Gesel) da Universidade Federal do Rio de Janeiro ( UFRJ), afirmou que o que vai pesar mais no próximo reajuste da Light será o custo dolarizado de Itaipu, pois 17% do que a concessionária compra vêm de lá. De acordo com a Light, a energia de Itaipu representa 15,9% do que compra. A empresa explicou que todas as variações de custos que não estiverem refletidas nas tarifas serão repassadas na ocasião do reajuste anual. “Em casos de grandes variações, como agora, há forte impacto no fluxo de caixa da distribuidora”, admitiu a Light.
Do reajuste acumulado pela Light, a concessionária explicou que ficou com apenas 0,58% do total. Segundo a companhia, a maior parte dos recursos foi destinada a cobrir os gastos com as térmicas. A Light afirmou que não ficou com nenhuma parte das altas de janeiro e março, e ressaltou que é a Aneel que define o percentual de reajuste. A empresa disse ainda que o reajuste nas tarifas acumulado desde novembro do ano passado chega a 60%.
Já a Ampla disse que o reajuste das tarifas este ano cobre, principalmente, os custos com a compra de energia dos geradores, “em função da situação hidrológica desfavorável do país”. Reflete também, disse, o aumento das despesas com a Conta de Desenvolvimento Energético ( CDE, fundo administrado pelo governo para custear alguns subsídios às tarifas), que passaram a ser cobradas integralmente na tarifa dos brasileiros. “Os recursos arrecadados pela Ampla referentes aos itens acima são integralmente repassados aos geradores e à CDE”, disse a empresa.
ICMS no Rio é um dos maiores do país
Para os cariocas, pesa ainda o fato de o estado ter uma das maiores cobranças de ICMS sobre energia no país. A alíquota varia de acordo com o volume de consumo, podendo chegar a 29%.
Castro, do Gesel/ UFRJ, acredita que a partir de 2016 o governo usará as bandeiras tarifárias para fazer os repasses ao longo dos meses. A ideia é evitar um único aumento anual muito elevado, como vinha acontecendo. Somente em fevereiro, o governo concedeu reajuste extraordinário para 58 concessionárias, cuja média foi de 23,4%.