Por Matías M. Molina – Valor Econômico / Eu & Fim de Semana
• "No mundo contemporâneo, a política depende da mídia, quem não puder lidar com a mídia está perdido", disse FHC em evento
SÃO PAULO - No primeiro volume de seus "Diários da Presidência", o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso se mostrou um amargo e persistente crítico da imprensa. No segundo volume, aumenta a intensidade de sua irritação.
Se o tom dos "Diários" mudou, foi talvez porque as circunstâncias mudaram. O primeiro volume cobre os dois primeiros anos, 1995-96, do primeiro mandato de FHC, quando ele estava descobrindo as alavancas do poder e contava com a expectativa e a boa vontade da sociedade que lhe tinha dado um mandato para reformar o país. Não faltaram problemas, mas o momento era de otimismo.
Em 1997-98, o panorama era outro. Surgiram novos problemas, talvez mais complexos, e a sociedade se tornou, aparentemente, mais exigente. Além disso, como ele mesmo diz, o exercício do poder provoca um desgaste nas instituições e nos próprios atores, que é visível nos "Diários".
Nesse período, ele enfrentou questões como a reeleição e as privatizações, sofreu um desgaste com acusações como a compra de votos no Congresso, o falso "dossiê Cayman", as escutas telefônicas no BNDES e foi surpreendido por uma crise financeira global. Na área política teve que pagar um preço pelo apoio de partidos como o PMDB e o PFL, atual DEM. Dentro do governo precisou contornar a agressividade e a indiscrição de ministros díscolos como Sérgio Motta e José Serra.
Mas nunca deixa de transmitir uma enorme autoconfiança. Diz que, "talvez a minha vaidade seja tão grande, eu tenha tanta confiança em mim mesmo, que não ligue para as aparências disso ou daquilo". Mas, ao longo dos "Diários", ele precisou reconhecer os limites de seu poder.
FHC pinta um quadro pouco lisonjeiro do país e da sociedade que presidia, com observações crescentemente amargas. "Ao redor do que se supõe ser o poder (...) há uma luta feroz, fratricida e inútil." Ele tem a sensação de que a elite brasileira não sabe de sua responsabilidade; o povo sabe menos ainda, mas acha natural que reaja emocionalmente. Não acha natural que os chamados "homens do poder" sejam tão pouco conscientes dos seus próprios interesses.