Os povos indígenas, incluindo os bravos
Yanomami, estão definitivamente avassalados perante o Estado brasileiro, a
sociedade brasileira, a civilização ocidental, enfim a história da humanidade
tal como é controlada em suas percepções e narrativas pelos poderes centrais do
mundo. Não obstante tal constatação, não parece irreal reconhecer que há uma
predisposição na cultura e na sociedade brasileiras para considerar o índio
como parte da nação, uma parte importante, como já dissemos, do próprio âmago
da nossa identidade. Os sinais para isso podem ser constatados facilmente, e o
principal é o legado de reconhecimento das terras indígenas.
Raramente se vê tais sentimentos e atitudes em
outras partes do mundo em relação a minorias anteriormente desprezadas. As
encenações façanheiras e politiqueiras que se fazem, cada vez que algo de ruim
acontece com algum povo indígena, apontam para algo convulsionado e indefinido,
um misto de hipocrisia e malandragem acoplados a uma genuína curiosidade e
apreensão que atingem a quase todo mundo. É dentro desta nação, afinal, com uma extensa história de
desigualdades e injustiças perpetradas por sua elite e classes médias, que as
vertentes culturais e políticas se engalfinham entre si, às vezes desesperada e
desavergonhadamente, para conquistar o poder e predominar sobre o seu destino.
Que as opiniões sobre o tema indígena
divirjam, no dia a dia, entre pessoas de procedência cultural, social e
política diferentes, e mesmo no interior das classes sociais, estilos de vida,
urbanidade e rusticidade social, contando profissionais liberais e militares, é
razoavelmente previsível em uma tal sociedade multifacetada e conflituosa como
a nossa, tal como estamos vivenciando neste exato momento em fevereiro de 2023.
Previsível, mas não aceitável. Tempos atrás, dir-se-ia, nenhuma vertente
política parecia ter qualquer interesse em reconhecer os povos indígenas por
suas próprias virtudes – culturais, experimentais, pedagógicas, sociais e
psicológicas -, muito menos conceder-lhe um espaço na arena social do país e lutar
ao seu lado por direitos aos quais eles fazem jus. A não ser de um modo
condescendente ou do alto de uma pretensa superioridade moral.