domingo, 2 de abril de 2023

Opinião do dia - André Lara (disse tudo)*

André Lara Resende disse tudo na sua entrevista à repórter Míriam Leitão, quando tratou dos economistas que defendem a atrofia do Estado:

“Essa (é a) visão dominante entre os economistas do mercado financeiro. Quem aparece na grande mídia são 99% os economistas que trabalham no mercado financeiro. Eles falam consigo mesmo. E eles aparecem na mídia. E a grande mídia está completamente dominada por essa percepção, essa visão de mundo.”

*Coluna de Elio Gaspari, O Globo, 2 de Abril 2023

Dorrit Harazim - Nosso umbigo

O Globo

O momento atual parece excelente para também no Brasil o jornalismo profissional se repensar de ponta-cabeça

Na semana passada apoiadores do diário britânico The Guardian encontraram um comunicado incomum em suas caixas postais eletrônicas. Assinado pela editora-chefe Katharine Viner, o anúncio informava o resultado de uma investigação de dois anos encomendada a um plantel de eminentes acadêmicos do país. No relatório final, intitulado “Legado e escravização”, o grupo independente concluíra que, sim, o Manchester Guardian (nome original do jornal até 1951) dependera de trabalho escravo em seu nascedouro.

Para o jornal bicentenário, zeloso de sua independência editorial e financeira, foi uma questão de coerência moral ir até o fundo de suas raízes.

Como se sabe, o Guardian não é um matutino qualquer. Ocupa lugar bastante solitário entre as grandes mídias tradicionais de países democráticos. É regido há quase nove décadas por um truste sem fim lucrativo, criado em testamento pelo visionário C.P. Scott, seu mais longevo proprietário e editor. Cabe ao Scott Trust, formado por um conselho de oito integrantes (jornalistas, executivos e representantes externos), financiar o jornal — basicamente por meio dos dividendos gerados por seus investimentos. A ideia central do arranjo está em proteger o jornal de interferências políticas e comerciais. Apesar de sofrer prejuízos marcantes, como boa parte da mídia no mundo todo, o Guardian procura honrar esse compromisso. Isso envolve não só cobrir o presente e olhar para o futuro, como fuçar o próprio passado.

Merval Pereira - Caçando jabutis

O Globo

Arthur Lira vai ganhar força nas negociações do arcabouço, mas governo tenta, nos bastidores, minar seu poder

O governo Lula precipita-se na articulação de bastidores para minar o poder do presidente da Câmara, Arthur Lira, no mesmo momento em que precisa de seu apoio para aprovar o chamado arcabouço fiscal, que sinaliza seu compromisso com o equilíbrio das contas públicas.

Há uma contradição em termos na presunção de que o Congresso será capaz de cancelar desonerações e cortar subsídios, de criar novas instâncias de taxação de setores hoje blindados, exterminar os chamados “jabutis” de medidas provisórias. Como se sabe, Jabuti não sobe em árvore, e se vir um em algum galho, tenha certeza de que alguma mão o colocou lá.

Essas muitas mãos que colocaram múltiplos jabutis nas medidas provisórias, que deveriam ser todas anuladas porquanto os “jabutis” tratam sempre de temas que nada têm a ver com a medida provisória em si, o que é proibido por lei, são mãos com foro privilegiado e poder para inseri-los, e que agora terão como missão impossível retirá-los de lá.

Difícil acreditar nisso, já que o Congresso sempre é mais gastador, especialmente este, que ansiava pelo orçamento secreto, doce que lhe foi tirado da boca pelo presidente eleito Lula, em busca de recuperar o poder de barganha perdido por Bolsonaro. Lula conseguiu, mas nem tanto. Teve que fazer acordos, abrir mão de parcela do orçamento para cumprir compromissos já assumidos por Lira, aceitar negociações em posição de desvantagem.

Luiz Carlos Azedo - Lula precisa achar a passagem do meio

Correio Braziliense

“Quem está contra o novo arcabouço fiscal defende o corte de despesas do governo, que sempre é possível, mas tem alto custo social e político”

A mais bem-sucedida experiência desenvolvimentista pós II Guerra Mundial foi a dos chamados Tigres Asiáticos: Coreia do Sul, Hong Kong, Cingapura e Taiwan. Governos intervencionistas protagonizaram a transformação desses países de economias estagnadas em países dinâmicos e industrializados, cada qual ocupando um papel específico na nova divisão internacional do trabalho. Na sequência, vieram Malásia, Tailândia, Indonésia, com modelos semelhantes, e a China, que saiu do “comunismo de guerra” de Mao Tse Tung para o “capitalismo de Estado” de Deng Hsiao Ping. Hoje, é o Vietnã que envereda com sucesso por esse mesmo caminho.

Na Ásia, burocracias muito fortes comandaram um processo no qual a iniciativa privada foi preservada, com o Estado investindo fortemente em ramos estratégicos e na inovação tecnologia. Grandes investimentos na educação proporcionaram a mão de obra qualificada necessária para os novos setores da economia, na transição do agrário para o urbano. Em 1950, o PIB per capita da Coreia do Sul era metade do PIB do Brasil; em 1990 era o dobro, em 2005, três vezes maior. No ano passado, era quatro vezes.

Bernardo Mello Franco - Lula precisa se ajudar

O Globo

Governo aposta em ofensiva publicitária, mas presidente é aconselhado a evitar novos conflitos

Na semana passada, um velho aliado entregou uma carta a Lula. Em tom de alerta, o texto enumerava tropeços no início do governo. E sugeria que o destinatário maneirasse para evitar novos conflitos e esfriar a temperatura política no país.

Para o conselheiro, o presidente erra ao alimentar a polarização em vez de combatê-la. Isso daria fôlego ao bolsonarismo e produziria efeitos negativos sobre a popularidade dele.

O novo Datafolha confirma que Lula começou pior do que em seus dois mandatos anteriores. Às vésperas de completar cem dias no cargo, o petista é aprovado por 38% e reprovado por 29% dos brasileiros. Em abril de 2003, ele tinha 43% de bom e ótimo e apenas 10% de ruim e péssimo. Em 2007, após a reeleição, os índices eram de 48% e 14%.

Todos sabiam que a nova largada seria mais difícil. O presidente venceu uma eleição muito apertada, que refletiu a divisão do país. E enfrenta uma oposição barulhenta e radicalizada, sem paralelo com a dos tucanos de duas décadas atrás.

Ainda assim, Lula teve a chance de virar a página e criar um clima de união nacional após os atos golpistas de 8 de janeiro. Ele acertou na reação imediata aos ataques, mas depois se atrapalhou com a própria incontinência verbal.

Elio Gaspari - Precatórios e aeroportos

O Globo

A empresa espanhola Aena pretende pagar 50% (R$ 1,16 bilhão) da outorga da concessão do aeroporto de Congonhas com precatórios. Esse é o nome dado a dívidas da Viúva, reconhecidas pela Justiça e caloteadas pelos governos.

A lei permite que esses espetos sejam usados em transações com o poder público. O caso expõe o preço da voracidade dos governos e a balbúrdia jurídica de Pindorama. Enquanto precatórios servem para quitar a outorga de um aeroporto, vale a pena ir a outro, o do Galeão.

Na década de 1940, durante a ditadura do Estado Novo, o governo de Getúlio Vargas resolveu construir um novo aeroporto no Rio de Janeiro. Oficiais foram à ilha do Governador e escolheram a área. Com uma canetada ela foi desapropriada e os proprietários das terras foram tungados.

Começou uma batalha jurídica. Os lesados tiveram seu direito reconhecido em 1951 e assim surgiu a figura do “precatório do Galeão”. O governo devia, não pagava, e os papéis —desvalorizados— iam de mão em mão.

Celso Rocha de Barros - Nem Dilma nem Palocci

Folha de S. Paulo

Equipe econômica até lembra aliança PT/PSDB sonhada por Palocci, mas circunstâncias políticas são piores do que as enfrentadas por Dilma

O novo arcabouço fiscal mostrou que Lula-3 não é nem Lula-1 nem Dilma-1. É um governo que reconhece a necessidade de equilibrar as contas, mas vai tentar fazer isso gradualmente. Pode dar certo, pode dar errado, mas não há nada de maluco sendo proposto.

A boa notícia é que, pelos cálculos do economista Felipe Salto, ex-presidente da Instituição Fiscal Independente, a nova regra terá um efeito importante na evolução da relação dívida/PIB nos próximos anos.

Em uma entrevista para o site Brazil Journal, Salto afirmou que, em suas projeções anteriores, a relação dívida/PIB tinha tendência crescente chegando a 95,3% em 2032. Se a nova regra for aplicada, a projeção mostra esse número se estabilizando já em 2026-7.

Isto é, a nova regra, se for aplicada direito, deve evitar que a dívida pública brasileira saia de controle. Em condições normais, isso fará os juros caírem.

Bruno Boghossian - O estoque de popularidade de Lula

Folha de S. Paulo

Petista dá tiro curto para reforçar conexão com sua base, mas não acumula estoque de popularidade

Lula decidiu abrir o terceiro mandato com um investimento de retorno rápido. Nos meses inaugurais, o petista apostou no contraste com Jair Bolsonaro, resgatou programas demolidos pelo antecessor, relançou marcas de gestões passadas e buscou reforçar uma conexão com o núcleo de seu eleitorado.

A primeira pesquisa do Datafolha sobre a popularidade do governo dá sinais do alcance dessas escolhas. Lula 3 colheu resultados de curto prazo em grupos ávidos pela recuperação de políticas públicas, mas também vê as limitações de uma plataforma concentrada em sua própria base.

A retomada de ações ambientais, o socorro aos yanomamis, a recriação do Ministério da Cultura e a volta do Bolsa Família reforçaram o vínculo com segmentos fiéis da coalizão petista. Entre os mais pobres, 45% dizem que o governo é ótimo ou bom.

Ruy Castro - Nunca aos domingos

Folha de S. Paulo

Com duas exceções, tudo de realmente importante no Brasil aconteceu num dia de semana

Sempre desconfiei de que nada de muito importante aconteceu no Brasil aos domingos —importante no sentido de mudar a história. Fui checar, usando uma tabela de conversão num antigo Almanaque Capivarol, e vi que estava certo. Só em duas ocasiões tivemos fatos decisivos num domingo.

execução de Tiradentes, em 21 de abril de 1792, não foi um deles —caiu num sábado. Nem o Dia do Fico, 9 de janeiro de 1822, uma quarta-feira. Nem o da Independência, 7 de setembro, um sábado. A Guerra do Paraguai começou numa sexta, 13 de dezembro de 1864; em outra, 15 de novembro de 1889, proclamou-se a República; e em ainda outra, 3 de outubro de 1930, caiu a Primeira República.

Muniz Sodré* - Escorregando na linguagem

Folha de S. Paulo

Disse Rumi, poeta persa: 'Já que todos somos um, falemos de outro modo'

"Ninguém fala para si mesmo em voz alta. Já que todos somos um, falemos de outro modo."

Essa exortação atualíssima parte de Rumi, poeta e teólogo sufi persa do século 13, um místico cuja importância transcende fronteiras.

São palavras adequadas aos ouvidos de Lula, sobrecheios de desconfortos passados e presentes, capazes de perturbar consciência e linguagem.

O poeta recomenda: "Eleve suas palavras, não sua voz / É a chuva que faz florescer, não o trovão".

Isso vem a propósito de reprováveis tropeços verbais do presidente no espaço público. Ainda que esse espaço esteja contaminado pela efemeridade das redes e sua aversão à civilidade, espera-se de alguém eleito pelo voto de renormalização institucional um esforço de continência de atitude e de linguagem.

Eliane Cantanhêde - Centrão x Centrão

O Estado de S. Paulo

O problema não é PT nem mercado, é o centro, ou melhor, o Centrão do Congresso

O presidente Lula aproveitou a broncopneumonia para calar a boca, parar de falar besteira e dar a largada no plano fiscal, recebido bem à direita, pelo mercado, e à esquerda, pelo PT. O problema é com o centro e o Centrão e, se o pior momento de Lula pode ter passado, o plano vai chegar ao Congresso com a Câmara, o Senado e os partidos em chamas.

A B3 voltou a subir acima dos 100 mil pontos, o dólar caiu e, agora, o mercado está como Roberto Campos Neto, do BC: aguardando o texto protocolado no Congresso, com todos os detalhes, principalmente sobre a mágica para aumentar a arrecadação, espinha dorsal e grande dúvida do pacote.

O PT, dentro e fora do governo, botou a boca no trombone durante a elaboração do plano, mas com o compromisso de calar depois do anúncio. E, se o mercado acha o conjunto de ideias engenhoso e que a questão fiscal está bem tratada, o PT de Gleisi Hoffmann e Rui Costa se dá por satisfeito com o tratamento para programas sociais, Educação e Saúde.

A preocupação está no centro, ou melhor, no Centrão do Congresso. As cúpulas, com Arthur Lira na Câmara e Rodrigo Pacheco/Davi Alcolumbre no Senado, estão em sintonia com Fernando Haddad e reagiram bem ao plano. Mas, além da crise entre as duas Casas por causa das MPs, está pegando fogo dentro das próprias Casas.

José Roberto Batochio* - Sem o devido processo legal não há democracia

O Estado de S. Paulo

Aos que chancelam atual estado de coisas, havendo-o por mal necessário e reação legítima da ‘democracia militante’, não se deve juntar a voz legalista da advocacia

“Quem quiser garantir a própria liberdade deve preservar até seu inimigo da opressão; pois, se infringir esse dever, estabelece um precedente que atingirá a si próprio” (Thomas Paine, em Dissertação sobre os primeiros princípios do governo)

Com autoridade de coadjutor das libertárias revoluções americana, em 1776, e francesa, em 1792, o inglês Thomas Paine legou-nos preciosa obra política e influenciou a consolidação dos Estados constitucionais. Sua militância revolucionária não o poupou da prisão em Paris, no período do Terror jacobino, escapando, porém, da guilhotina de Maximilien de Robespierre, sob cuja lâmina implacável a também revolucionária Manon Roland pronunciou a célebre frase: “Ó, liberdade, quantos crimes se cometem em teu nome!”.

Na quadra atual, em que o Brasil vivencia as mais longas e duradouras liberdades democráticas de sua história, ressurge certa dogmática jurídica fortemente rechaçada na obra de Thomas Paine. Ela se fundamentaria no princípio da terapia homeopática similia similibus curantur: semelhante pelo semelhante se cura. A quem viola a lei também se pode punir com violações à lei – ideia sedutora em conjuntura política de afrontas a valores essenciais do Estado Democrático de Direito, pisoteados por grupos radicais de extrema direita.

Devido processo legal? Liberdade de opinião e expressão? Vedação de censura? Imunidade parlamentar? Direito de não ser preso senão em flagrante delito inafiançável ou por imutável sentença judicial? Eis valores democráticos sagrados, mas preteridos, paradoxalmente em nome de sua preservação, quando se recorre à multicitada máxima de Ovídio de que os fins justificam os meios.

Substancialidade das democracias, o devido processo legal veda ao Estado-sancionador, garante da legalidade e repressor dos delitos, atribuição para sumariamente investigar, acusar e infligir penas antecipadas a acusado protegido pelo princípio magno da presunção de inocência.

José Roberto Mendonça de Barros - Finalmente, chegou a proposta

O Estado de S. Paulo

O arcabouço proposto é bastante razoável. Porém, ele terá de ser aprimorado

Finalmente, chegou a proposta de arcabouço fiscal. Antes de tudo, ela significa que o governo poderá ter um rumo que busque conciliar sustentabilidade e melhoria social. E não uma guerra de posições que apenas resulte na aceleração do processo inflacionário e em estagnação.

Não será simples nem fácil. Mas a proposta foi relativamente bem recebida se medida pela queda do valor do dólar, pelo efeito no sistema político e pela avaliação de parte dos analistas. Todos concordam, corretamente, que faltam os detalhes que só aparecerão no projeto da lei complementar. É possível que a divulgação antecipada de um quadro geral tenha sido pensada para facilitar a compreensão do público e permitir que certas críticas sejam, eventualmente, incorporadas ao projeto, o que não seria ruim.

Míriam Leitão - As chances da nova regra fiscal

O Globo

Fortalecido, em três meses Haddad venceu a desconfiança do mercado, superou batalhas internas e convenceu o governo a ter um limite de gastos

A grande pergunta que ronda a economia agora neste começo de abril é se vai dar certo o arcabouço fiscal. É preciso esperar o desenho final que sairá do Congresso, mas certas críticas vêm com um travo de saudosismo em relação ao último modelo de disciplina fiscal, aquele que fracassou. O teto de gastos dizia que a despesa pública não iria crescer em termos reais e, portanto, cairia como proporção do PIB. O teto foi derrubado pelo governo que alegava ser liberal e querer um estado menor. O arcabouço diz que a despesa vai subir em termos reais, mas dentro de uma disciplina. Andará sempre um passo atrás das receitas e ficará dentro de um intervalo que limite a alta nos tempos de prosperidade, e amorteça a queda em momentos de dificuldade.

O ministro da Fazenda foi costurando apoio em círculos. Primeiro, o dos ministérios da área econômica. Depois, o da área política. Em seguida, os presidentes das duas Casas. Por fim, os líderes. Dar bem o passo da apresentação é importante, mas não suficiente. A vantagem é que o próprio ministro avisou que não é bala de prata, mas o começo da jornada.

Vinicius Torres Freire - Um teto para gregos e troianos

Folha de S. Paulo

Longe de ideal ou necessário, plano pode convencer BC, dinheiro grosso, PT e Congresso

Luiz Inácio Lula da Silva é "ótimo/bom" para 38%, conta o Datafolha. Dadas as circunstâncias, é um resultado favorável.

Lula também acaba de divulgar uma prévia do seu teto de gastos, o "arcabouço fiscal". Ainda tem buracos, é preciso cobrar mais imposto para a coisa funcionar, e a restrição de despesa é frouxa. Mas o plano Lula-Haddad tira a perspectiva de desastre do caminho.

Ainda que não seja nem de longe o melhor plano, pode fazer a mágica de satisfazer, ao mesmo tempo, Banco Central, negociantes de dinheiro grosso, credores do governo, Congresso, PT etc. Vai ser uma satisfação medíocre, se funcionar. Mas é alguma coisa.

Sérgio C. Buarque* - Teto de gastos e novo arcabouço fiscal

Revista Será? (PE)

Ainda faltam alguns detalhes da proposta do governo, de novas regras fiscais, que substituirá o Teto de Gastos. Mas o que foi anunciado até agora pela equipe econômica do Governo, Fernando Haddad e Simone Tebet, transmite confiança numa trajetória consistente de equilíbrio fiscal. O Teto de Gastos definido em 2016 foi desfigurado por atalhos e exceções que, no fundo, desmoralizaram o instrumento de contenção das despesas primárias. Como era previsível, o Teto de Gastos não seria sustentável se não fossem realizadas reformas estruturais que, ao longo dos anos, reduzissem a inércia de crescimento das despesas primárias, principalmente das obrigatórias, que representam 90% delas. Com exceção da Reforma da Previdência, cujo resultado se alonga no tempo, nada mais foi feito para conter a expansão das despesas primárias. Mesmo sem a crise decorrente da pandemia, o teto de gastos seria insustentável sem as reformas, principalmente, a reforma administrativa. 

Cristovam Buarque* - Avançar, não revogar

Blog do Noblat / Metrópoles

Hora de propostas cirúrgicas revolucionárias para acabar com a divisão do sistema escolar entre “escolas senzala” e “escolas casa grande”

Em 1889, muitos republicanos denunciaram que a Abolição foi uma reforma tímida, por não dar terra aos ex-escravos, nem escola aos seus filhos; e lamentavam ter sido feita pela monarquia, por um governo do partido conservador. Mas nenhum defendeu a revogação da insuficiente Lei Áurea. Nabuco fez sua defesa enquanto lutava por reforma agrária e educação de base para todos.

Cento e trinta anos depois, o governo de Michel Temer, com o ministro Mendonça Filho, apresenta uma reforma do ensino médio insuficiente. Não vai colocar a educação brasileira entre as melhores do mundo, nem assegura que os filhos dos pobres tenham escola com a qualidade dos filhos dos ricos; e nem mobiliza os recursos necessários para que, mesmo tímida, a reforma seja executada. Mesmo assim, a reforma do ensino médio representa um avanço: sinaliza ampliação de escolas com horário integral, adoção da necessidade de formação profissionalizante, e traz liberdade para que os alunos possam escolher o que desejam estudar. Mas, desta vez, no lugar de defenderem os avanços desta reforma insuficiente e de lutarem por mais avanços e recursos para executá-la, alguns educadores defendem sua revogação.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Reforma do ensino médio precisa de ajuste para vingar

O Globo

Mas seria um retrocesso revogar a mudança que impõe o ensino integral e cria formações específicas

O debate sobre o novo ensino médio precisa se libertar da estreita camisa de força a que está preso. Dois grupos têm sobressaído. De um lado, os responsáveis pela lei de 2017 que determinou a ampliação da carga horária e a reformulação do currículo defendem que ela fique como está. No campo oposto, sindicatos e organizações estudantis, insufladas por partidos de extrema esquerda, defendem a revogação e fazem barulho nas redes sociais. Ambos estão errados.

A reforma determina que os alunos passem a ter um currículo dividido em dois blocos. O primeiro com matérias básicas, como português e matemática. O segundo, chamado itinerário formativo, com disciplinas de formação técnica, profissional ou programas interdisciplinares para aprofundar o conhecimento. Nos três anos, a formação básica ficou com uma carga máxima estipulada em 1.800 horas de aula.

Dois problemas surgiram quando a lei começou a ser implementada. Primeiro: com a expansão da carga horária, os itinerários formativos acabaram ficando em algumas escolas com uma grande proporção da carga horária. Preocupados com o vestibular, alunos têm protestado com razão. Segundo: ainda que bem-intencionada, a estrutura desses itinerários formativos ficou demasiadamente flexível, dando margem ao surgimento até de cursos para fazer brigadeiro.

A primeira mudança necessária é determinar que as 1.800 horas sejam o piso alocado para as disciplinas, não o teto, de modo que os alunos recebam a formação básica essencial. Nada disso pode ser feito sem mexer na lei, portanto não se trata apenas de uma dificuldade de implementação, como defende o primeiro grupo.

Poesia | O lutador, de Carlos Drummond de Andrade

 

Música | Adriana Calcanhotto - Devolva-me