O QUE PENSA A MÍDIA
EDITORIAIS DOS PRINCIPAIS JORNAIS DO BRASIL
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Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
sexta-feira, 1 de agosto de 2008
DEU NO JORNAL DO BRASIL
A PASSEATA DOS SEM-VOTO
Villas-Bôas Corrêa
Como ainda teremos a ventura de acompanhar e, em casos mais raros, participar da campanha municipal para a eleição de prefeitos e vereadores nos dois meses e cinco dias de patriótico fervor democrático até as urnas de 5 de outubro, é possível que queime a língua com a precipitação do singelo registro de que nunca assisti a tão chocha e desenxabida caça ao voto esquivo da maioria absoluta do eleitorado, que não está nem aí para o espetáculo das passeatas dos que se oferecem para o sacrifício de salvar a pátria.
As pesquisas ainda escassas não autorizam afirmações categóricas. Mas salta aos olhos que o escasso interesse pelas tendências do eleitorado pega carona nas especulações sobre as eleições para valer de 2010 para presidente da República, governadores, senadores e deputados federais. E ainda assim, nem a perspectiva de uma polarização entre governo e oposição que esquente a gelada indiferença da população parece provável a esta distância, com tempo de sobra para cambalhotas que virem as tendências ou fustiguem a disparada dos favoritos.
Cada cidade vive o seu momento de expectativa. E é evidente que as rivalidades municipais dos que são a favor ou contra o prefeito retocam os quadros com a intensidade das paixões locais.
Não é este o foco das análises dos especialistas do ramo, de militantes a curiosos ou os teóricos que se debruçam sobre a decadência ética de uma atividade cada vez mais atraente com a disparada dos subsídios parlamentares em todos os níveis, confeitados com as mordomias, as vantagens, as verbas indenizatórias, os gabinetes individuais com dezenas de assessores de livre nomeação do titular, das passagens para o fim de semana na base, no aconchego da família e na ronda aos eleitores que garantem mais um mandato para um dos melhores empregos do mundo.
Do vereador, que já foi um dignificante exercício da cidadania, com todas as honras e sem remuneração, ao senador – mesmo dos senadores de garupa, sem um único voto, arrastados pelo galope do titular – o mandato ao mesmo tempo em que perde prestígio e o respeito da sociedade, incha com a atração de um emprego, que precisa ser confirmado em cada eleição, mas que enriquece a quem sabe aproveitar o vento a favor para garantir o alto nível de vida até a eternidade.
É desalentadora a seca e isenta constatação de evidências. E da abúlica indiferença de partidos que não têm nada a propor ou idéias a defender, do Congresso e do governo que têm sempre a intenção de propor ao debate uma reforma política que não reforme nada e deixe as coisas correrem na cadência da tapeação.
O eleitor ainda pode despertar para a importância do seu voto, que é a sua arma para participar de uma batalha que de algum modo influirá no seu destino e no de todos nós.
O voto nulo é uma tolice que não leva a coisa nenhuma. Só uma mobilização nacional que reúna multidões nas ruas e praças para defender o protesto do voto nulo, poderia mexer na indiferença dos donos do poder.
Depois, francamente, é uma frustrante birra o eleitor perder um domingo, enfrentar fila para fingir que vota com o voto nulo. A cartilha do eleitor consciente aconselha outras formas mais lúcidas de protesto. Repito a receita: mantenha acesa a chama da raiva, da indignação, do protesto. E decida por um dos atalhos da encruzilhada: ou vote no candidato da sua cuidadosa escolha pessoal ou, para começo de faxina, vote no novo, no estreante que demonstre a disposição e assuma o compromisso público de lutar pela reforma política.
A reforma moral, a varredura do lixo, a limpeza do entulho que tresanda à distância.
Villas-Bôas Corrêa
Como ainda teremos a ventura de acompanhar e, em casos mais raros, participar da campanha municipal para a eleição de prefeitos e vereadores nos dois meses e cinco dias de patriótico fervor democrático até as urnas de 5 de outubro, é possível que queime a língua com a precipitação do singelo registro de que nunca assisti a tão chocha e desenxabida caça ao voto esquivo da maioria absoluta do eleitorado, que não está nem aí para o espetáculo das passeatas dos que se oferecem para o sacrifício de salvar a pátria.
As pesquisas ainda escassas não autorizam afirmações categóricas. Mas salta aos olhos que o escasso interesse pelas tendências do eleitorado pega carona nas especulações sobre as eleições para valer de 2010 para presidente da República, governadores, senadores e deputados federais. E ainda assim, nem a perspectiva de uma polarização entre governo e oposição que esquente a gelada indiferença da população parece provável a esta distância, com tempo de sobra para cambalhotas que virem as tendências ou fustiguem a disparada dos favoritos.
Cada cidade vive o seu momento de expectativa. E é evidente que as rivalidades municipais dos que são a favor ou contra o prefeito retocam os quadros com a intensidade das paixões locais.
Não é este o foco das análises dos especialistas do ramo, de militantes a curiosos ou os teóricos que se debruçam sobre a decadência ética de uma atividade cada vez mais atraente com a disparada dos subsídios parlamentares em todos os níveis, confeitados com as mordomias, as vantagens, as verbas indenizatórias, os gabinetes individuais com dezenas de assessores de livre nomeação do titular, das passagens para o fim de semana na base, no aconchego da família e na ronda aos eleitores que garantem mais um mandato para um dos melhores empregos do mundo.
Do vereador, que já foi um dignificante exercício da cidadania, com todas as honras e sem remuneração, ao senador – mesmo dos senadores de garupa, sem um único voto, arrastados pelo galope do titular – o mandato ao mesmo tempo em que perde prestígio e o respeito da sociedade, incha com a atração de um emprego, que precisa ser confirmado em cada eleição, mas que enriquece a quem sabe aproveitar o vento a favor para garantir o alto nível de vida até a eternidade.
É desalentadora a seca e isenta constatação de evidências. E da abúlica indiferença de partidos que não têm nada a propor ou idéias a defender, do Congresso e do governo que têm sempre a intenção de propor ao debate uma reforma política que não reforme nada e deixe as coisas correrem na cadência da tapeação.
O eleitor ainda pode despertar para a importância do seu voto, que é a sua arma para participar de uma batalha que de algum modo influirá no seu destino e no de todos nós.
O voto nulo é uma tolice que não leva a coisa nenhuma. Só uma mobilização nacional que reúna multidões nas ruas e praças para defender o protesto do voto nulo, poderia mexer na indiferença dos donos do poder.
Depois, francamente, é uma frustrante birra o eleitor perder um domingo, enfrentar fila para fingir que vota com o voto nulo. A cartilha do eleitor consciente aconselha outras formas mais lúcidas de protesto. Repito a receita: mantenha acesa a chama da raiva, da indignação, do protesto. E decida por um dos atalhos da encruzilhada: ou vote no candidato da sua cuidadosa escolha pessoal ou, para começo de faxina, vote no novo, no estreante que demonstre a disposição e assuma o compromisso público de lutar pela reforma política.
A reforma moral, a varredura do lixo, a limpeza do entulho que tresanda à distância.
DEU EM O GLOBO
A CARTA RACIAL
Merval Pereira
Merval Pereira
NOVA YORK. Tudo indica que a campanha eleitoral americana enveredou para uma fase mais agressiva a partir da entrada em cena da discussão de um tema tabu que estava implícito durante a fase anterior: a raça. A partir do momento em que a campanha de John McCain acusou Barack Obama de politizar o tema racial, foi como se a pressão contida de um debate delicado viesse à tona com toda sua força reprimida.
Numa sociedade em que, como revelou uma recente pesquisa do "New York Times", mais de 80% dos eleitores negros e apenas cerca de 30% dos eleitores brancos disseram ter uma opinião favorável a respeito de Obama, e onde aproximadamente 60% dos negros entrevistados disseram que as relações raciais são geralmente ruins, em comparação a 34% dos brancos, este é um tema que continua explosivo, ainda mais diante da possibilidade de um candidato negro vir a ser eleito presidente. Enquanto 40% dos negros dizem que não houve progresso na eliminação da discriminação racial nos últimos anos, apenas menos 20% dos brancos afirmam o mesmo.
O fato é que, ao repetir como acusação, em Springfield, no Estado de Missouri, uma brincadeira que fizera na abertura de seu histórico discurso de Berlim, o candidato democrata Barack Obama abriu uma discussão racial que tomou conta da campanha.
Obama afirmou que os republicanos fariam uma campanha de medo contra ele, acusando-o, por exemplo, de ser diferente dos demais presidentes americanos anteriores. Foi a mesma coisa que disse, em tom de pilhéria, para os mais de 200 mil alemães que foram ouvi-lo em Berlim.
Foi o sinal para que a campanha de McCain o acusasse de estar usando o tema racial para se fazer de vítima. A reação, porém, não foi unânime a favor do republicano. Também houve quem acusasse a campanha de McCain de ter se utilizado sutilmente do tema ao comparar Obama com duas celebridades louras, a cantora Britney Spears e a socialite Paris Hilton.
A propaganda em que os democratas tratam Obama como uma celebridade sem condições de governar o país, por si só, já representava um polêmico aprofundamento da campanha de desconstrução de imagem do adversário.
O toque racista levantado pelos dois lados adicionou um grau perigoso de acusações de racismo. O "New York Times", em um editorial divulgado na tarde de ontem mesmo pela internet, critica duramente McCain e faz duas acusações: a de que ele estaria utilizando a mesma tática que republicanos usaram na eleição de 2006 contra Harold Ford, um candidato negro ao Senado do Tennessee, comparado também com jovens brancas.
A outra suspeita lançada pelo "Times" se refere a uma expressão usada por um assessor de McCain para criticar Obama. Segundo esse assessor, a campanha democrata usou o tema racial "from the bottom of the desk", que significa uma trapaça em um jogo de cartas. A mesma expressão, segundo o "Times", foi utilizada pelo advogado do jogador negro O.J. Simpson para dizer que usara o tema racial para defender seu cliente, que acabou sendo absolvido da acusação de ter matado sua mulher, embora todas as evidências fossem contra ele.
A campanha de McCain está tentando combater a liderança de Obama nas pesquisas com acusações de que ele não tem experiência nem capacidade de governar os Estados Unidos, e também tentando criar uma imagem de presunçoso, que já estaria convencido de que será eleito em novembro.
Essa peja está tendo alguma receptividade, e já começam a aparecer programas humorísticos na televisão fazendo piada dessa suposta soberba de Barack Obama. Em seu programa, David Letterman, por exemplo, deu um decálogo de fatos que demonstrariam a auto-suficiência de Obama, que já estaria até mandando medir sua cabeça para uma escultura no Monte Rushmore, o memorial em Dakota do Sul que tem a cabeça dos presidentes Lincoln, George Washington, Thomas Jefferson e Theodore Roosevelt.
Obama continua à frente em todas as pesquisas, mas é bom relembrar que, no início de junho, uma pesquisa da "Newsweek" lhe dava 15 pontos de vantagem, que vem caindo em todas as pesquisas de lá para cá. Ontem, havia um consenso entre todos os institutos de que a viagem ao exterior produzira um efeito favorável a Obama que se desvaneceu com a mesma rapidez com que foi registrado.
Uma pesquisa divulgada ontem pelo Rasmussen Reports aponta que cerca de 30% dos eleitores democratas conservadores e cerca de 19% dos eleitores democratas brancos planejam votar em McCain.
O mês de agosto trará também para Obama um problema adicional. Uma editora de direita, a Regnery Publishing, publicará o amplamente divulgado livro "Um caso contra Barack Obama, a improvável ascensão e a não-examinada agenda do candidato favorito da mídia". Com vendas antecipadas sendo feitas pela Amazon na internet, o livro é de David Freddoso, um jornalista de direita da "National Review".
O livro acusa Obama de ter sido fabricado pela mídia e analisa suas relações com o pastor radical Jeremiah Wright, de quem Obama se afastou no meio da campanha, e com um líder radical da década de 60 do século passado, Bill Ayers, que é vizinho de Obama.
Tudo indica que a campanha eleitoral americana entrará em uma fase de agressividade que pode ter conseqüências imprevisíveis pelas características únicas desta eleição, em que, pela primeira vez na história do país, um candidato negro é favorito. Mas essa é uma tradição da política americana, da qual tratarei amanhã.
DEU EM GRAMSCI E O BRASIL
CHILE: ELEIÇÕES E FUTURO DA CONCERTAÇÃO
Fernando de la Cuadra
Comparativamente, a economia chilena está situada entre as mais sadias e fortes do continente. Entretanto, sempre é conveniente lembrar que os pontos fortes do país seguem baseando-se na produção e exportação de bens primários, ou seja, o Chile ainda tem uma economia fundamentalmente primário-exportadora (cobre, frutas, vinho, celulose, salmão) e está, portanto, sobreexposto a qualquer abalo do sistema econômico internacional.
A atual crise mundial, que atinge centralmente as economias mais desenvolvidas e repercute sem discriminação em todos os países do planeta, também tem afetado o Chile através do aumento do preço dos combustíveis e dos alimentos (especialmente grãos e lácteos). A inflação é o sintoma mais claro de uma crise que ameaça o conjunto dos países, e a receita tradicional — quase automática — para combatê-la é reduzir o gasto público e desestimular o consumo por meio do aumento dos juros.
O Chile não é uma exceção à regra. O país registra uma inflação de 6,7%, que supera em mais do dobro a projetada para o ano de 2008, algo inacreditável há muito pouco tempo, segundo a maioria dos economistas oficiais. Por isso mesmo, a “autoridade econômica”, ou seja, o Conselho do Banco Central, decidiu agir do modo mais previsível: aumentar a taxa anual de juros de 6,75 para 7,25%, o nível mais alto desde janeiro de 1999.
Com sua decisão, o Banco Central busca reduzir a demanda interna, a qual, segundo disse em comunicado, continua crescendo a taxas elevadas, sobretudo em termos de produtos importados. A medida, sem dúvida, aprofundará a desaceleração, que os créditos ao consumo já vinham mostrando, pela redução da oferta bancária e pela menor demanda das pessoas, em função do encarecimento dos empréstimos.
O diagnóstico da conjuntura nacional indica que o novo cenário da inflação responde a um fenômeno mundial, que provoca aumentos de preços dos bens energéticos (petróleo e seus derivados, gás e eletricidade) e dos alimentos. De fato, tanto na sua matriz energética quanto na segurança alimentar, o Chile possui vulnerabilidades difíceis de contornar a curto prazo. Quanto à disponibilidade de petróleo e gás natural, o país é altamente sensível às flutuações dos preços internacionais e, especificamente, no caso do gás natural, ele é muito dependente dos envios que possa realizar a vizinha Argentina. Já no que diz respeito a certos produtos da cesta alimentar, o Chile não possui auto-suficiência em determinados bens primordiais, como trigo, arroz e leite, entre outros.
Em resumo, o aumento de preço dos serviços e alimentos básicos, a inflação e o insuficiente reajuste do piso salarial (salário mínimo) têm gerado uma sensação de cansaço e descontentamento por parte da população chilena. Pelo menos isso é o que parece transparecer das pesquisas de opinião que foram realizadas neste último período.
Segundo dados divulgados recentemente pelo Centro de Estudos Públicos (CEP), 52% dos consultados desaprovam o desempenho econômico do governo, enquanto 48% reprovam os resultados em termos globais obtidos pela gestão do gabinete da Presidenta Michelle Bachelet.
Reagindo a estes resultados, o Ministro Secretário-Geral da Presidência (Casa Civil), José Antonio Viera-Gallo, declarou que, se não existisse a crise internacional, a aprovação do Executivo teria sido bem mais alta. De acordo com a autoridade, uma das razões mais evidentes desse desconforto deve-se às funestas conseqüências que representa o aumento dos juros sobre uma população que possui um alto endividamento, em grande parte devido a estímulos e facilidades de crédito para consumo. Nas palavras do Ministro: “Acredito que se produziria um aumento notável [do índice de aprovação], se não tivéssemos a crise internacional. A maior preocupação com a inflação e com os aumentos de preço, que golpeiam o bolso das famílias, é o que determina a má percepção dos eleitores”.
Ainda que aceitemos que a crise internacional tem inevitáveis impactos sobre o desempenho da economia nacional, uma explicação desse tipo para justificar a insatisfação da cidadania com a atual administração é visivelmente insuficiente. No nosso entender, estes problemas são meramente coadjuvantes ou agravantes de circunstâncias que, da mesma forma que a crise mundial, têm uma causal estrutural. Uma observação mais apurada sobre a situação em que se encontra a grande maioria das nações, e o Chile em particular, nos demonstra que quase todas elas convivem com deficiências endêmicas: pobreza humilhante, desigualdade, ausência de proteção social, vulnerabilidade, risco, insegurança urbana, descaso com o sistema de saúde, exploração excessiva e abusiva da força de trabalho, atividades predatórias das empresas, desrespeito pelos direitos das minorias, falta de perspectiva da juventude, etc.
Atribuímos, portanto, a queda de popularidade da atual administração a aspectos duradouros, relacionados com a forma como os diversos governos da Concertação têm lidado com a herança da ditadura e seu estigma neoliberal. A esta altura, está suficientemente demonstrado que os problemas da desigualdade no Chile explicam-se principalmente pelas condições estruturais da sociedade: a concentração da propriedade, a frágil organização social e sindical, a propagação de hábitos de consumo nas classes médias e altas próprias de países industrializados, os baixos níveis de educação e capacitação técnica, o atraso tecnológico.
Pode-se dizer que estamos ante aquilo que Antonio Gramsci considerava como a diferença entre o que é permanente e o que é “ocasional”, entre o que é “orgânico” e o que é contingente. Para ele, é fundamental estabelecer esta distinção na hora de efetuar uma análise da realidade social e ter claro o que é essencial na estrutura e o que só está lá por circunstância [1].
Sobrecarregada por estes déficits “orgânicos”, a atual gestão da Presidenta Bachelet está defraudando as enormes expectativas que existiam no início do seu mandato: governo cidadão, combate às desigualdades e à histórica discriminação das mulheres, mudança cultural e substituição das antigas elites. Por exemplo, a crise provocada pela implementação de um novo sistema de transporte público na capital — Transantiago — tornou-se mais virulenta, porque o desenho e a execução do programa realizaram-se sem a participação da sociedade civil. E não é trivial que isto tenha acontecido precisamente sob um governo fundado, enfaticamente, num discurso que salienta sua empatia e aproximação com os cidadãos.
Em definitivo, parece que a promessa de avanço em matéria de proteção social, como a grande meta desta administração, ainda está para ser cumprida. A idéia da mudança cultural associou-se ao primeiro governo presidido por uma mulher no Chile, o que, justamente, alentou muitas expectativas entre as minorias. O fato de haver uma mulher na Presidência simbolizava o ingresso dos excluídos secularmente na administração dos assuntos políticos.
Além disso, os temas relativos aos direitos das mulheres e à superação da moralidade conservadora têm sido crescentemente polêmicos no Chile pós-ditadura (por exemplo, a lei do divórcio e o uso dos métodos contraceptivos). Muito poucos duvidavam de que, durante o governo da Presidenta Bachelet, se produziria uma expansão dos direitos civis, e, sem dúvida, seriam as mulheres as principais beneficiárias. Hoje, vigora o desencanto com esta possibilidade. Somada à dificuldade de responder aos novos conflitos e impasses que emergem na sociedade, deve-se ter em conta a erosão de legitimidade que representa não possibilitar a discussão de temas considerados perturbadores para a estabilidade nacional.
Nuvens cinzentas no horizonte eleitoral
Junto a estes problemas internos e às restrições impostas pela atual “conjuntura” econômica mundial, verifica-se uma situação inédita que está colocando em risco a continuidade da aliança entre os partidos que formam a base do governo. É que, nas eleições municipais de outubro próximo, dois partidos da coalizão (Partido pela Democracia e Partido Radical Socialdemocrata) decidiram unilateralmente concorrer com listas separadas de vereadores. Isto poderia significar a fratura definitiva da coalizão — que vai cumprir 20 anos no fim do atual período —, no caso de estes mesmos partidos decidirem apresentar candidato próprio na contenda eleitoral de 2009.
A cisão também pode vir pelo lado da Democracia Cristã, que já anunciou não abrir mão de apresentar um candidato partidário, considerando que os últimos dois presidentes representaram a ala socialista. Para a DC, não respeitar a alternância de partidos significa desconhecer os acordos mínimos que se definiram antes da formação do bloco.
Parece evidente que, com a divisão desta aliança, o triunfo eleitoral é muito improvável, considerando que nas últimas três eleições a Concertação só conseguiu vencer em segunda rodada (balotage) graças ao apoio dos partidos do bloco Juntos Podemos (comunistas e humanistas), e mesmo assim com uma porcentagem não muito expressiva. Enquanto se mantiver o fracionamento da intenção de voto numa direita com remanescentes pinochetistas e houver uma opção democrática de centro-esquerda, os partidos da aliança de governo devem manter a vantagem demonstrada até hoje. Se este último setor se dividir, as possibilidades de sucesso eleitoral serão realmente mínimas. Mas será que, no horizonte concertacionista, interessa somente ter sucesso eleitoral para impedir que a direita assuma as rédeas do governo nos próximos anos?
Neste ponto, é válido fazer também a pergunta a respeito do que pode oferecer hoje a Concertação, para continuar liderando os destinos do país. Ou, em outras palavras, o que diferenciaria este novo projeto daquele já realizado pela coalizão em quase 20 anos de gestão?
Parece-me prioritário, nesta etapa, consolidar e renovar alguns aspectos programáticos que surgem de uma autocrítica no interior da aliança governista. Nesse sentido, seria preciso repor uma lógica política coerente com o projeto democrático que dá sentido a esta coalizão. Para isso, é fundamental fortalecer uma equipe dotada de mandato claro e de todas as faculdades necessárias para cumprir uma agenda que, entre suas tarefas prioritárias, contemple o desafio de ampliar o campo democrático e a participação efetiva da cidadania, a superação dos entraves estruturais da desigualdade e o fortalecimento da proteção social (emprego e salários dignos, educação de qualidade e sem fins de lucro, segurança alimentar, saúde pública universal, previdência solidária, moradia social digna, reforma tributária com carga progressiva).
Ao mesmo tempo, é fundamental recuperar a mística que caracterizou este pacto na época da sua formação, quando foi pensado para lutar pela recuperação da democracia na chamada Concertação de partidos pelo Não, organizada para concorrer no plebiscito que pretendia dar continuidade à ditadura militar.
Tal espírito e mística foram perdendo força com o transcorrer dos anos. Isto fez com que tanto militantes quanto funcionários dos governos concertacionistas abdicassem da dimensão ética em sua prática quotidiana, chegando a exercer as formas mais corrosivas da ação política. Por isso mesmo, nos últimos tempos é moeda freqüente presenciar atos de falta de probidade, corrupção, mau uso dos recursos fiscais e outras modalidades de decomposição da função pública. Em suma — tal como salienta o cientista político Antonio Cortés Terzi —, é preciso reorganizar um novo ethos e um novo projeto histórico concertacionista, fundado na recuperação de uma cultura de centro-esquerda.
Daqui surge uma nova pergunta. Poderão os setores mais progressistas do Partido Socialista conciliar e negociar esta agenda de mudanças substantivas, em diversos âmbitos, com os setores defensores do status quo, seja na Democracia Cristã, seja em outros partidos da aliança?
Difícil é ter uma resposta precisa a esta pergunta, mas temos certeza de que uma renovação do projeto da coalizão deve sustentar-se principalmente naqueles aspectos que representam o que de mais progressista existe nela, quer dizer, o compromisso em torno de um programa de governo que se proponha superar as restrições “orgânicas” que impedem construir uma sociedade mais eqüitativa e democrática.
Em síntese, os partidos da Concertação não só devem conseguir capturar o entusiasmo e adesão da maioria dos chilenos como há 20 anos, mas também precisam convocar os cidadãos para a construção de um projeto para o futuro, reencantando especialmente os jovens, que até agora não acharam seu lugar num imaginário nacional capaz de conceber o Chile como uma comunidade de destino em que todos podem ser incluídos. Pensamos que estes são os requisitos mínimos que permitirão assegurar a continuidade do governo; do contrário, certamente, o êxito do próximo desafio eleitoral estará seriamente comprometido.
Fernando de la Cuadra é sociólogo chileno e membro da Rede Universitária de Pesquisas sobre América Latina (Rupal).
Notas
Fernando de la Cuadra
Comparativamente, a economia chilena está situada entre as mais sadias e fortes do continente. Entretanto, sempre é conveniente lembrar que os pontos fortes do país seguem baseando-se na produção e exportação de bens primários, ou seja, o Chile ainda tem uma economia fundamentalmente primário-exportadora (cobre, frutas, vinho, celulose, salmão) e está, portanto, sobreexposto a qualquer abalo do sistema econômico internacional.
A atual crise mundial, que atinge centralmente as economias mais desenvolvidas e repercute sem discriminação em todos os países do planeta, também tem afetado o Chile através do aumento do preço dos combustíveis e dos alimentos (especialmente grãos e lácteos). A inflação é o sintoma mais claro de uma crise que ameaça o conjunto dos países, e a receita tradicional — quase automática — para combatê-la é reduzir o gasto público e desestimular o consumo por meio do aumento dos juros.
O Chile não é uma exceção à regra. O país registra uma inflação de 6,7%, que supera em mais do dobro a projetada para o ano de 2008, algo inacreditável há muito pouco tempo, segundo a maioria dos economistas oficiais. Por isso mesmo, a “autoridade econômica”, ou seja, o Conselho do Banco Central, decidiu agir do modo mais previsível: aumentar a taxa anual de juros de 6,75 para 7,25%, o nível mais alto desde janeiro de 1999.
Com sua decisão, o Banco Central busca reduzir a demanda interna, a qual, segundo disse em comunicado, continua crescendo a taxas elevadas, sobretudo em termos de produtos importados. A medida, sem dúvida, aprofundará a desaceleração, que os créditos ao consumo já vinham mostrando, pela redução da oferta bancária e pela menor demanda das pessoas, em função do encarecimento dos empréstimos.
O diagnóstico da conjuntura nacional indica que o novo cenário da inflação responde a um fenômeno mundial, que provoca aumentos de preços dos bens energéticos (petróleo e seus derivados, gás e eletricidade) e dos alimentos. De fato, tanto na sua matriz energética quanto na segurança alimentar, o Chile possui vulnerabilidades difíceis de contornar a curto prazo. Quanto à disponibilidade de petróleo e gás natural, o país é altamente sensível às flutuações dos preços internacionais e, especificamente, no caso do gás natural, ele é muito dependente dos envios que possa realizar a vizinha Argentina. Já no que diz respeito a certos produtos da cesta alimentar, o Chile não possui auto-suficiência em determinados bens primordiais, como trigo, arroz e leite, entre outros.
Em resumo, o aumento de preço dos serviços e alimentos básicos, a inflação e o insuficiente reajuste do piso salarial (salário mínimo) têm gerado uma sensação de cansaço e descontentamento por parte da população chilena. Pelo menos isso é o que parece transparecer das pesquisas de opinião que foram realizadas neste último período.
Segundo dados divulgados recentemente pelo Centro de Estudos Públicos (CEP), 52% dos consultados desaprovam o desempenho econômico do governo, enquanto 48% reprovam os resultados em termos globais obtidos pela gestão do gabinete da Presidenta Michelle Bachelet.
Reagindo a estes resultados, o Ministro Secretário-Geral da Presidência (Casa Civil), José Antonio Viera-Gallo, declarou que, se não existisse a crise internacional, a aprovação do Executivo teria sido bem mais alta. De acordo com a autoridade, uma das razões mais evidentes desse desconforto deve-se às funestas conseqüências que representa o aumento dos juros sobre uma população que possui um alto endividamento, em grande parte devido a estímulos e facilidades de crédito para consumo. Nas palavras do Ministro: “Acredito que se produziria um aumento notável [do índice de aprovação], se não tivéssemos a crise internacional. A maior preocupação com a inflação e com os aumentos de preço, que golpeiam o bolso das famílias, é o que determina a má percepção dos eleitores”.
Ainda que aceitemos que a crise internacional tem inevitáveis impactos sobre o desempenho da economia nacional, uma explicação desse tipo para justificar a insatisfação da cidadania com a atual administração é visivelmente insuficiente. No nosso entender, estes problemas são meramente coadjuvantes ou agravantes de circunstâncias que, da mesma forma que a crise mundial, têm uma causal estrutural. Uma observação mais apurada sobre a situação em que se encontra a grande maioria das nações, e o Chile em particular, nos demonstra que quase todas elas convivem com deficiências endêmicas: pobreza humilhante, desigualdade, ausência de proteção social, vulnerabilidade, risco, insegurança urbana, descaso com o sistema de saúde, exploração excessiva e abusiva da força de trabalho, atividades predatórias das empresas, desrespeito pelos direitos das minorias, falta de perspectiva da juventude, etc.
Atribuímos, portanto, a queda de popularidade da atual administração a aspectos duradouros, relacionados com a forma como os diversos governos da Concertação têm lidado com a herança da ditadura e seu estigma neoliberal. A esta altura, está suficientemente demonstrado que os problemas da desigualdade no Chile explicam-se principalmente pelas condições estruturais da sociedade: a concentração da propriedade, a frágil organização social e sindical, a propagação de hábitos de consumo nas classes médias e altas próprias de países industrializados, os baixos níveis de educação e capacitação técnica, o atraso tecnológico.
Pode-se dizer que estamos ante aquilo que Antonio Gramsci considerava como a diferença entre o que é permanente e o que é “ocasional”, entre o que é “orgânico” e o que é contingente. Para ele, é fundamental estabelecer esta distinção na hora de efetuar uma análise da realidade social e ter claro o que é essencial na estrutura e o que só está lá por circunstância [1].
Sobrecarregada por estes déficits “orgânicos”, a atual gestão da Presidenta Bachelet está defraudando as enormes expectativas que existiam no início do seu mandato: governo cidadão, combate às desigualdades e à histórica discriminação das mulheres, mudança cultural e substituição das antigas elites. Por exemplo, a crise provocada pela implementação de um novo sistema de transporte público na capital — Transantiago — tornou-se mais virulenta, porque o desenho e a execução do programa realizaram-se sem a participação da sociedade civil. E não é trivial que isto tenha acontecido precisamente sob um governo fundado, enfaticamente, num discurso que salienta sua empatia e aproximação com os cidadãos.
Em definitivo, parece que a promessa de avanço em matéria de proteção social, como a grande meta desta administração, ainda está para ser cumprida. A idéia da mudança cultural associou-se ao primeiro governo presidido por uma mulher no Chile, o que, justamente, alentou muitas expectativas entre as minorias. O fato de haver uma mulher na Presidência simbolizava o ingresso dos excluídos secularmente na administração dos assuntos políticos.
Além disso, os temas relativos aos direitos das mulheres e à superação da moralidade conservadora têm sido crescentemente polêmicos no Chile pós-ditadura (por exemplo, a lei do divórcio e o uso dos métodos contraceptivos). Muito poucos duvidavam de que, durante o governo da Presidenta Bachelet, se produziria uma expansão dos direitos civis, e, sem dúvida, seriam as mulheres as principais beneficiárias. Hoje, vigora o desencanto com esta possibilidade. Somada à dificuldade de responder aos novos conflitos e impasses que emergem na sociedade, deve-se ter em conta a erosão de legitimidade que representa não possibilitar a discussão de temas considerados perturbadores para a estabilidade nacional.
Nuvens cinzentas no horizonte eleitoral
Junto a estes problemas internos e às restrições impostas pela atual “conjuntura” econômica mundial, verifica-se uma situação inédita que está colocando em risco a continuidade da aliança entre os partidos que formam a base do governo. É que, nas eleições municipais de outubro próximo, dois partidos da coalizão (Partido pela Democracia e Partido Radical Socialdemocrata) decidiram unilateralmente concorrer com listas separadas de vereadores. Isto poderia significar a fratura definitiva da coalizão — que vai cumprir 20 anos no fim do atual período —, no caso de estes mesmos partidos decidirem apresentar candidato próprio na contenda eleitoral de 2009.
A cisão também pode vir pelo lado da Democracia Cristã, que já anunciou não abrir mão de apresentar um candidato partidário, considerando que os últimos dois presidentes representaram a ala socialista. Para a DC, não respeitar a alternância de partidos significa desconhecer os acordos mínimos que se definiram antes da formação do bloco.
Parece evidente que, com a divisão desta aliança, o triunfo eleitoral é muito improvável, considerando que nas últimas três eleições a Concertação só conseguiu vencer em segunda rodada (balotage) graças ao apoio dos partidos do bloco Juntos Podemos (comunistas e humanistas), e mesmo assim com uma porcentagem não muito expressiva. Enquanto se mantiver o fracionamento da intenção de voto numa direita com remanescentes pinochetistas e houver uma opção democrática de centro-esquerda, os partidos da aliança de governo devem manter a vantagem demonstrada até hoje. Se este último setor se dividir, as possibilidades de sucesso eleitoral serão realmente mínimas. Mas será que, no horizonte concertacionista, interessa somente ter sucesso eleitoral para impedir que a direita assuma as rédeas do governo nos próximos anos?
Neste ponto, é válido fazer também a pergunta a respeito do que pode oferecer hoje a Concertação, para continuar liderando os destinos do país. Ou, em outras palavras, o que diferenciaria este novo projeto daquele já realizado pela coalizão em quase 20 anos de gestão?
Parece-me prioritário, nesta etapa, consolidar e renovar alguns aspectos programáticos que surgem de uma autocrítica no interior da aliança governista. Nesse sentido, seria preciso repor uma lógica política coerente com o projeto democrático que dá sentido a esta coalizão. Para isso, é fundamental fortalecer uma equipe dotada de mandato claro e de todas as faculdades necessárias para cumprir uma agenda que, entre suas tarefas prioritárias, contemple o desafio de ampliar o campo democrático e a participação efetiva da cidadania, a superação dos entraves estruturais da desigualdade e o fortalecimento da proteção social (emprego e salários dignos, educação de qualidade e sem fins de lucro, segurança alimentar, saúde pública universal, previdência solidária, moradia social digna, reforma tributária com carga progressiva).
Ao mesmo tempo, é fundamental recuperar a mística que caracterizou este pacto na época da sua formação, quando foi pensado para lutar pela recuperação da democracia na chamada Concertação de partidos pelo Não, organizada para concorrer no plebiscito que pretendia dar continuidade à ditadura militar.
Tal espírito e mística foram perdendo força com o transcorrer dos anos. Isto fez com que tanto militantes quanto funcionários dos governos concertacionistas abdicassem da dimensão ética em sua prática quotidiana, chegando a exercer as formas mais corrosivas da ação política. Por isso mesmo, nos últimos tempos é moeda freqüente presenciar atos de falta de probidade, corrupção, mau uso dos recursos fiscais e outras modalidades de decomposição da função pública. Em suma — tal como salienta o cientista político Antonio Cortés Terzi —, é preciso reorganizar um novo ethos e um novo projeto histórico concertacionista, fundado na recuperação de uma cultura de centro-esquerda.
Daqui surge uma nova pergunta. Poderão os setores mais progressistas do Partido Socialista conciliar e negociar esta agenda de mudanças substantivas, em diversos âmbitos, com os setores defensores do status quo, seja na Democracia Cristã, seja em outros partidos da aliança?
Difícil é ter uma resposta precisa a esta pergunta, mas temos certeza de que uma renovação do projeto da coalizão deve sustentar-se principalmente naqueles aspectos que representam o que de mais progressista existe nela, quer dizer, o compromisso em torno de um programa de governo que se proponha superar as restrições “orgânicas” que impedem construir uma sociedade mais eqüitativa e democrática.
Em síntese, os partidos da Concertação não só devem conseguir capturar o entusiasmo e adesão da maioria dos chilenos como há 20 anos, mas também precisam convocar os cidadãos para a construção de um projeto para o futuro, reencantando especialmente os jovens, que até agora não acharam seu lugar num imaginário nacional capaz de conceber o Chile como uma comunidade de destino em que todos podem ser incluídos. Pensamos que estes são os requisitos mínimos que permitirão assegurar a continuidade do governo; do contrário, certamente, o êxito do próximo desafio eleitoral estará seriamente comprometido.
Fernando de la Cuadra é sociólogo chileno e membro da Rede Universitária de Pesquisas sobre América Latina (Rupal).
Notas
[1] “[...] no estudo de uma estrutura, devem-se distinguir os movimentos orgânicos (relativamente permanentes) dos movimentos que podem ser chamados de conjuntura (e que se apresentam como ocasionais, imediatos, quase acidentais). Também os fenômenos de conjuntura dependem, certamente, de movimentos orgânicos, mas seu significado não tem um amplo alcance histórico” (A. Gramsci. Cadernos do cárcere. Introdução ao estudo da filosofia. A filosofia de Benedetto Croce. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1999, p. 36-7).
Fonte: Especial para Gramsci e o Brasil.
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
PRIMEIROS ACORDES
Dora Kramer
Dora Kramer
A saia-justa dos tucanos com o início de pé esquerdo do prefeito Gilberto Kassab em São Paulo, a largada pífia do afilhado de dois mitos da popularidade em Belo Horizonte e a interdição do direito de ir e vir pelo crime e as milícias no Rio indicam que daqui para a frente tudo deverá ser muito diferente em comparação às modorrentas campanhas municipais anteriores, que só despertavam interesse às vésperas da eleição.
Nas três principais capitais, representantes dos maiores colégios eleitorais do País, candidatos e partidos precisaram reordenar suas estratégias assim que os primeiros acordes se revelaram bem mais fortes que o esperado. E até o inesperado entrou em cena.
Por exemplo, em São Paulo, Marta Suplicy, pelo histórico e temperamento, seria a candidata mais propensa à movimentação errática. Pois quem enfiou os pés pelas mãos foi justamente o disciplinado Gilberto Kassab, atento à conduta desde que a explosão de ira para com um cidadão durante visita a posto de saúde quase inviabiliza sua candidatura.
Em poucos dias, Kassab produziu duas grandes tolices: o envio de um e-mail recomendando “ação” do secretariado na área onde o instituto Datafolha faria pesquisa de opinião e a distribuição de panfletos aproveitando a divulgação da lista dos “fichas-sujas” para constranger a candidata do PT.
O prefeito ao mesmo tempo entregou prova material do uso da máquina administrativa, demonstrou uma confiança pueril em uma equipe formada por tucanos e integrada por uma boa fornada remanescente de petistas, e ainda deu mostras de desatenção, de falta de assessoria ao se esquecer de que, ficha por ficha, a dele também carrega a mácula de um processo ainda em aberto onde é co-réu em processo contra o ex-prefeito Celso Pitta de quem foi secretário de Planejamento.
Logo ele que havia conseguido apagar essa parte do passado que, quando da escolha do candidato a vice de José Serra para prefeito, em 2004, provocou protestos generalizados, incluídos aí os do próprio Serra.
Além disso, não se mexeu nas pesquisas - a não ser um pouco para baixo - e inibiu o tucanato, até então seu aliado, a pôr as mangas de fora. Na realidade, na prefeitura o clima anda mais para barbas de molho, com medo de Kassab não passar de uma intenção.
Em Belo Horizonte, a expectativa era a de que Márcio Lacerda, candidato da popular e dinâmica dupla Aécio Neves-Fernando Pimentel, fizesse jus desde o início ao esforço dos padrinhos que se atiraram numa jogada arriscada - tanto pode ser de mestre, quanto revelar-se um desastre ou, pior, uma irrelevância.
É cedo para antecipar resultados, inclusive porque os atuais 6% são até razoáveis para alguém que se passar às 3 da tarde pela avenida Afonso Penna ninguém reconhece.
Mas é certo que Márcio Lacerda não poderá contar apenas com o fator transferência de votos. Terá de mostrar desempenho. Ou, então, corre o risco de levar o governador de Minas e o prefeito de Belo Horizonte a um vexame oceânico.
Resta o Rio. Bem, o Rio é o que está se vendo. Os protagonistas não são os candidatos. É o crime e a rendição do Estado aos seus ditames. Uma coisa esquisita, pois a segurança não diz respeito ao prefeito, mas os candidatos a prefeito serão cobrados a tratar do assunto sem poder dizer que está fora de sua alçada. Sob pena de pagar a conta por covardia ou cumplicidade.
Antiga musa
Apresentada e abandonada em 2004, sob bombardeio intenso, a idéia de controlar, fiscalizar e regulamentar o trabalho da imprensa foi retomada pelo governo.
Há quatro anos, a pedido da Federação Nacional dos Jornalistas, o governo propôs ao Congresso a criação do Conselho Federal de Jornalismo.
Recuou, mas agora, por solicitação também da Fenaj, o Ministério do Trabalho criou um grupo de trabalho para “estudar” a questão. Discretamente.
Tradução
O governador de São Paulo, José Serra, saiu do encontro com o presidente Lula na quarta-feira dizendo que a ministra Dilma Rousseff é uma pessoa “preparada” para disputar a eleição presidencial de 2010.
Só deixou de completar - e jamais o fará em público - o pensamento: que Dilma está preparadíssima para perder.
Aero-milonga
As agruras sofridas por brasileiros retidos semana passada nas mãos da Aerolíneas Argentinas não são fruto de crise circunstancial nem um caso isolado. É prática usual.
Há oito anos, duas brasileiras foram a Buenos Aires. Compraram passagens na classe executiva, de ida e volta. Na ida, uma delas viajou na econômica, enquanto as poltronas da executiva eram ocupadas por funcionários da empresa.
Na volta, ambas foram despachadas para a econômica. Sem nenhuma explicação nem oferta de compensação.
DEU NO VALOR ECONÔMICO
ELEIÇÃO SE DEFINE LOGO NA PARTIDA
Alberto Carlos Almeida
O segundo turno é uma nova eleição? Não. Entre 1990 e 2006, ocorreram 69 segundos turnos nas eleições para governos estaduais. Em 71% das vezes, o candidato que chegou na frente no primeiro turno acabou vencendo a eleição no segundo. Em 29% das eleições, houve virada, com o segundo colocado no turno anterior passando a vencedor. Nas eleições com virada, a distância entre o primeiro e o segundo colocados no primeiro turno foi menor do que nas eleições sem virada. Nas 20 eleições nas quais o segundo colocado da primeira rodada venceu na segunda rodada, a distância média em votos válidos foi de 7,15%. Nas eleições sem virada, a distância média foi de quase 10 p.p. - exatos 9,67% dos votos válidos.
A eleição de 2008 não é para governador, é para prefeito. Aquela tendência se verifica? Quando se consideram as eleições de prefeito que foram para o segundo turno, em cidades que não são capitais, a virada é tão rara quanto para as eleições de governador: 29%.
Nas eleições para prefeitos de capitais, a dificuldade de virar de um turno para outro é muito maior. Em três eleições, entre 1996 e 2004, nada menos do que 40 eleições para prefeitos de capitais foram para o segundo turno. Destas, em 88% dos casos, ou 35 eleições, não houve virada. Somente em cinco eleições - ou 12% do total - o vencedor do primeiro turno perdeu no segundo. Foram elas: Campo Grande, em 1996; Recife e Rio de Janeiro, em 2000; Fortaleza e Porto Alegre, em 2004. Nas três primeiras, Campo Grande, Recife e Rio, a distância final entre vencedor e derrotado foi mínima - menos de 1% dos votos válidos. Aqueles que viraram ficaram a uma distância média menor do primeiro colocado no primeiro turno do que aqueles que não viraram: 9,38% e 11,15% dos votos válidos, respectivamente.
Alguns fatos chamam a atenção nesses dados:
1 - Não há duas eleições completamente diferentes, mas apenas uma eleição que é disputada em duas rodadas.
2 - Quando a eleição é em dois turnos, é preciso se empenhar muito para chegar na frente já no primeiro turno. Isso aumenta sobremaneira as chances de vitória no segundo turno.
3 - Quanto maior a vantagem que o candidato que vence o primeiro turno abre sobre o segundo colocado, maiores as chances de que vença a eleição também no segundo turno.
Resumindo: a probabilidade de vitória será maior para quem chegar na frente já no primeiro turno, e com uma vantagem grande.
Esse resultado sintetiza o que aconteceu em 172 eleições ocorridas no Brasil entre 1990 e 2006. Trata-se, portanto, de um resultado que não deixa dúvidas quando analisado sob quaisquer pontos de vista, inclusive o estatístico.
O que mais importa, assim, é compreender as razões desse fato.
A primeira coisa que chama a atenção é a maior dificuldade de virar o resultado eleitoral nas cidades que são capitais, comparando-as com os estados e com as demais cidades grandes que não são capitais. O que provavelmente acontece é que o eleitor de capital é submetido a uma maior quantidade de informação. Isso faz com que ele decida mais rapidamente em quem votar. Isto é, ele não precisa de mais 20 dias de campanha, ou algo assim, para mudar de voto. Sabe-se que a escolaridade média nas capitais é mais elevada do que nos estados, mas isso não é verdade quando essas cidades são comparadas a cidades como Campinas ou São José dos Campos. Também há, contudo, muitas cidades grandes com perfil bastante diferente dessas duas. Isso se verifica nas grandes cidades- dormitório das regiões metropolitanas, com destaque para Rio e São Paulo.
Ainda assim, o argumento permanece válido. Nas capitais de estado há mais informação. Há maior circulação de jornais, mais interesses organizados etc. Isso intensifica o debate e permite que o eleitor adeqüe de forma mais veloz o voto às preferências mais fortemente estabelecidas e que não variam muito no decorrer da campanha eleitoral - por exemplo, a avaliação do governo ou a lembrança ("recall") dos candidatos. É nas capitais que os candidatos precisam se esforçar mais para saírem vencedores já no primeiro turno. Isso não significa que o eleitor de capital de estado seja mais "cabeça feita" do que os demais eleitores, mas sim, apenas, que ele é mais exposto ao bombardeio de informação. Quando a eleição vai para o segundo turno, ele tem menos razão para mudar de voto ou abandonar aquele que considerava ser a sua segunda escolha caso seu candidato não passasse para a segunda rodada.
São raros os casos de virada de candidatos que vão para o segundo turno com rejeição muito elevada. Ou seja, a vitória de Mário Covas sobre Paulo Maluf em 1998 é um ponto fora da curva quando se considera a lógica de uma virada eleitoral. O que faz que ocorra uma virada, na maioria dos casos, é a maior quantidade de informação que chega ao eleitor quando somados o primeiro e o segundo turnos. Naquela eleição, o que permitiu a virada tucana foi a rejeição de Maluf. O ex-prefeito de São Paulo aumentou pouco sua fatia de votos entre um turno e outro, passando de 32,2 para 44,6% dos votos válidos. A margem de vitória de Mário Covas foi, portanto, mais folgada do que são as vitórias quando a eleição é vencida de virada.
Seja qual for a eleição, de prefeito de capital ou de cidades que não são capitais, falar de segundo turno é o mesmo que falar de primeiro turno. O candidato que desejar minimizar os riscos de perder terá que fazer de tudo para ser o vitorioso já no primeiro turno, preferencialmente com uma margem folgada face ao segundo colocado. Assim, a análise das eleições passadas no Brasil sugere uma recomendação baseada nos fatos: concentre todos os seus investimentos, os melhores e mais vultosos, já no primeiro turno. Tal como acontece no futebol, virar o placar é algo difícil, bem mais improvável do que simplesmente manter-se na frente.
Abertas as urnas e contados os votos do primeiro turno, caso sua candidatura fique em segundo lugar, prepare-se para viver fortes emoções caso você vire a disputa. Não será uma vitória folgada. No caso de prefeito de capital, das cinco eleições nas quais houve virada, em três a margem do vitorioso ficou abaixo de 1% dos votos válidos. Isso ocorre também nas cidades que não são capitais e nos governos estaduais. É preciso, portanto, ter sangue frio para vencer de virada. E, depois, sangue frio e paciência para acompanhar a apuração dos votos.
Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de "A Cabeça do Brasileiro" (Record).
Alberto Carlos Almeida
O segundo turno é uma nova eleição? Não. Entre 1990 e 2006, ocorreram 69 segundos turnos nas eleições para governos estaduais. Em 71% das vezes, o candidato que chegou na frente no primeiro turno acabou vencendo a eleição no segundo. Em 29% das eleições, houve virada, com o segundo colocado no turno anterior passando a vencedor. Nas eleições com virada, a distância entre o primeiro e o segundo colocados no primeiro turno foi menor do que nas eleições sem virada. Nas 20 eleições nas quais o segundo colocado da primeira rodada venceu na segunda rodada, a distância média em votos válidos foi de 7,15%. Nas eleições sem virada, a distância média foi de quase 10 p.p. - exatos 9,67% dos votos válidos.
A eleição de 2008 não é para governador, é para prefeito. Aquela tendência se verifica? Quando se consideram as eleições de prefeito que foram para o segundo turno, em cidades que não são capitais, a virada é tão rara quanto para as eleições de governador: 29%.
Nas eleições para prefeitos de capitais, a dificuldade de virar de um turno para outro é muito maior. Em três eleições, entre 1996 e 2004, nada menos do que 40 eleições para prefeitos de capitais foram para o segundo turno. Destas, em 88% dos casos, ou 35 eleições, não houve virada. Somente em cinco eleições - ou 12% do total - o vencedor do primeiro turno perdeu no segundo. Foram elas: Campo Grande, em 1996; Recife e Rio de Janeiro, em 2000; Fortaleza e Porto Alegre, em 2004. Nas três primeiras, Campo Grande, Recife e Rio, a distância final entre vencedor e derrotado foi mínima - menos de 1% dos votos válidos. Aqueles que viraram ficaram a uma distância média menor do primeiro colocado no primeiro turno do que aqueles que não viraram: 9,38% e 11,15% dos votos válidos, respectivamente.
Alguns fatos chamam a atenção nesses dados:
1 - Não há duas eleições completamente diferentes, mas apenas uma eleição que é disputada em duas rodadas.
2 - Quando a eleição é em dois turnos, é preciso se empenhar muito para chegar na frente já no primeiro turno. Isso aumenta sobremaneira as chances de vitória no segundo turno.
3 - Quanto maior a vantagem que o candidato que vence o primeiro turno abre sobre o segundo colocado, maiores as chances de que vença a eleição também no segundo turno.
Resumindo: a probabilidade de vitória será maior para quem chegar na frente já no primeiro turno, e com uma vantagem grande.
Esse resultado sintetiza o que aconteceu em 172 eleições ocorridas no Brasil entre 1990 e 2006. Trata-se, portanto, de um resultado que não deixa dúvidas quando analisado sob quaisquer pontos de vista, inclusive o estatístico.
O que mais importa, assim, é compreender as razões desse fato.
A primeira coisa que chama a atenção é a maior dificuldade de virar o resultado eleitoral nas cidades que são capitais, comparando-as com os estados e com as demais cidades grandes que não são capitais. O que provavelmente acontece é que o eleitor de capital é submetido a uma maior quantidade de informação. Isso faz com que ele decida mais rapidamente em quem votar. Isto é, ele não precisa de mais 20 dias de campanha, ou algo assim, para mudar de voto. Sabe-se que a escolaridade média nas capitais é mais elevada do que nos estados, mas isso não é verdade quando essas cidades são comparadas a cidades como Campinas ou São José dos Campos. Também há, contudo, muitas cidades grandes com perfil bastante diferente dessas duas. Isso se verifica nas grandes cidades- dormitório das regiões metropolitanas, com destaque para Rio e São Paulo.
Ainda assim, o argumento permanece válido. Nas capitais de estado há mais informação. Há maior circulação de jornais, mais interesses organizados etc. Isso intensifica o debate e permite que o eleitor adeqüe de forma mais veloz o voto às preferências mais fortemente estabelecidas e que não variam muito no decorrer da campanha eleitoral - por exemplo, a avaliação do governo ou a lembrança ("recall") dos candidatos. É nas capitais que os candidatos precisam se esforçar mais para saírem vencedores já no primeiro turno. Isso não significa que o eleitor de capital de estado seja mais "cabeça feita" do que os demais eleitores, mas sim, apenas, que ele é mais exposto ao bombardeio de informação. Quando a eleição vai para o segundo turno, ele tem menos razão para mudar de voto ou abandonar aquele que considerava ser a sua segunda escolha caso seu candidato não passasse para a segunda rodada.
São raros os casos de virada de candidatos que vão para o segundo turno com rejeição muito elevada. Ou seja, a vitória de Mário Covas sobre Paulo Maluf em 1998 é um ponto fora da curva quando se considera a lógica de uma virada eleitoral. O que faz que ocorra uma virada, na maioria dos casos, é a maior quantidade de informação que chega ao eleitor quando somados o primeiro e o segundo turnos. Naquela eleição, o que permitiu a virada tucana foi a rejeição de Maluf. O ex-prefeito de São Paulo aumentou pouco sua fatia de votos entre um turno e outro, passando de 32,2 para 44,6% dos votos válidos. A margem de vitória de Mário Covas foi, portanto, mais folgada do que são as vitórias quando a eleição é vencida de virada.
Seja qual for a eleição, de prefeito de capital ou de cidades que não são capitais, falar de segundo turno é o mesmo que falar de primeiro turno. O candidato que desejar minimizar os riscos de perder terá que fazer de tudo para ser o vitorioso já no primeiro turno, preferencialmente com uma margem folgada face ao segundo colocado. Assim, a análise das eleições passadas no Brasil sugere uma recomendação baseada nos fatos: concentre todos os seus investimentos, os melhores e mais vultosos, já no primeiro turno. Tal como acontece no futebol, virar o placar é algo difícil, bem mais improvável do que simplesmente manter-se na frente.
Abertas as urnas e contados os votos do primeiro turno, caso sua candidatura fique em segundo lugar, prepare-se para viver fortes emoções caso você vire a disputa. Não será uma vitória folgada. No caso de prefeito de capital, das cinco eleições nas quais houve virada, em três a margem do vitorioso ficou abaixo de 1% dos votos válidos. Isso ocorre também nas cidades que não são capitais e nos governos estaduais. É preciso, portanto, ter sangue frio para vencer de virada. E, depois, sangue frio e paciência para acompanhar a apuração dos votos.
Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de "A Cabeça do Brasileiro" (Record).
DEU NO VALOR ECONÔMICO
GARANTIA DO VOTO A COMUNIDADES POBRES
Editorial/Valor Econômico
Ao todo, o Estado do Rio tem 171 comunidades dominadas por milícias - policiais civis e militares e bombeiros que controlam localidades de população pobre, vendem segurança, monopolizam a distribuição de gás, vendem "gatos" de TV a cabo, julgam-se com poder de vida e morte sobre os moradores e exercem esse poder com o uso ilegal de armas. São esses milicianos que, da mesma forma que seus "rivais" traficantes, estão impondo às populações candidatos a prefeitos e vereadores. É a versão urbana dos antigos currais eleitorais, onde "coronéis", donos de fazenda, tinham controle sobre cada voto de empregados de sua propriedade e não apenas se beneficiava com eles, mas fazia disso sua moeda de troca na política regional e nacional.
Segundo o jornal O Estado de S. Paulo ("Relatório aponta 171 comunidades dominadas por milícias no Estado", 30/07), um relatório confidencial da Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do Rio, enviada à CPI das Milícias da Assembléia Legislativa, aponta 521 pessoas envolvidas com as milícias, entre eles o deputado estadual Natalino José Guimarães (DEM), seu irmão, o vereador Jerônimo Guimarães Filho (PMDB), ambos presos por comandar as milícias de Campo Grande e Paciência; o vereador Josinaldo da Cruz, o Nadinho de Rio das Pedras (DEM); mais três vereadores, dois deles de Duque de Caxias; 156 policiais militares (entre eles, sete oficiais, dois majores e cinco capitães); 18 policiais civis (um deles delegado da Baixada Fluminense); 11 integrantes do Corpo de Bombeiros; três agentes penitenciários; e três militares. Na capital do Estado, as milícias dominam 125 comunidades em duas regiões: na Zona Oeste, estão em 94 localidades - é onde atua a Liga da Justiça, comandada pelos irmãos Natalino e "Jerominho"; na Zona Norte, em 31. Além do Rio, outros nove municípios têm lugares sob comando de milícias.
Em geral, as milícias chegam expulsando o tráfico; depois, passam a cobrar pela segurança. Todavia, segundo o relatório, a maioria esmagadora das comunidades - 119 em 171 - dominadas por milicianos não estava antes sob o jugo de nenhuma facção criminosa.
No momento em que oficialmente começa a campanha para as eleições municipais, emergem as denúncias das pressões que estão sendo feitas sobre comunidades inteiras para garantir os votos de "currais" dos milicianos e do tráfico de drogas a seus candidatos. É mais ou menos essa a situação da população pobre do Rio: ou são submetidos politicamente às facções criminosas, ou àqueles que teoricamente teriam de defender os diretos dos cidadãos que moram nas comunidades menos abastadas do Estado. Ao contrário do que ocorria na Velha República, todavia, hoje a lei eleitoral é suficientemente rígida para punir e coibir esse tipo de ação, que impede o livre exercício do voto.
Foi com esse objetivo que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Caros Ayres Britto, reuniu o presidente do TRE do Rio, Roberto Wider, o ministro da Justiça, Tarso Genro e o superintendente da Polícia Federal (PF), Luiz Fernando Corrêa, para definir ações que garantam a livre escolha eleitoral das comunidades que estão sob o domínio das milícias e do tráfico. A Justiça Eleitoral pode, pela lei, requisitar força federal para garantir a eleição. Todavia, a preocupação do presidente do TRE com o uso de força federal, que fez o TSE adiar por algum tempo a requisição da Força Nacional, é compreensível. Nos últimos anos, a intervenção do Exército e da Força Federal em áreas de favela, na cidade do Rio, acabou sendo uma ação contra os favelados - não chegou a ter repercussão no desmantelamento dos grupos criminosos que são donos de populações inteiras. É preciso, sim, garantir a eleição, mas de forma que não apenas a liberdade do voto seja respeitada, mas também a vida do eleitor. No momento, atuam na área de inteligência a Polícia Federal, a Polícia Militar e a Polícia Civil, de forma a identificar nas comunidades quem ameaça a liberdade do voto. A lei eleitoral pune com prisão, cassação de candidatura e perda de mandato os beneficiados politicamente com a coação ao eleitor. Mas, para além disso, o problema dessa população não se reduz apenas ao exercício do voto. Eles são submetidos permanentemente a verdadeiras ditaduras locais.
Editorial/Valor Econômico
Ao todo, o Estado do Rio tem 171 comunidades dominadas por milícias - policiais civis e militares e bombeiros que controlam localidades de população pobre, vendem segurança, monopolizam a distribuição de gás, vendem "gatos" de TV a cabo, julgam-se com poder de vida e morte sobre os moradores e exercem esse poder com o uso ilegal de armas. São esses milicianos que, da mesma forma que seus "rivais" traficantes, estão impondo às populações candidatos a prefeitos e vereadores. É a versão urbana dos antigos currais eleitorais, onde "coronéis", donos de fazenda, tinham controle sobre cada voto de empregados de sua propriedade e não apenas se beneficiava com eles, mas fazia disso sua moeda de troca na política regional e nacional.
Segundo o jornal O Estado de S. Paulo ("Relatório aponta 171 comunidades dominadas por milícias no Estado", 30/07), um relatório confidencial da Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do Rio, enviada à CPI das Milícias da Assembléia Legislativa, aponta 521 pessoas envolvidas com as milícias, entre eles o deputado estadual Natalino José Guimarães (DEM), seu irmão, o vereador Jerônimo Guimarães Filho (PMDB), ambos presos por comandar as milícias de Campo Grande e Paciência; o vereador Josinaldo da Cruz, o Nadinho de Rio das Pedras (DEM); mais três vereadores, dois deles de Duque de Caxias; 156 policiais militares (entre eles, sete oficiais, dois majores e cinco capitães); 18 policiais civis (um deles delegado da Baixada Fluminense); 11 integrantes do Corpo de Bombeiros; três agentes penitenciários; e três militares. Na capital do Estado, as milícias dominam 125 comunidades em duas regiões: na Zona Oeste, estão em 94 localidades - é onde atua a Liga da Justiça, comandada pelos irmãos Natalino e "Jerominho"; na Zona Norte, em 31. Além do Rio, outros nove municípios têm lugares sob comando de milícias.
Em geral, as milícias chegam expulsando o tráfico; depois, passam a cobrar pela segurança. Todavia, segundo o relatório, a maioria esmagadora das comunidades - 119 em 171 - dominadas por milicianos não estava antes sob o jugo de nenhuma facção criminosa.
No momento em que oficialmente começa a campanha para as eleições municipais, emergem as denúncias das pressões que estão sendo feitas sobre comunidades inteiras para garantir os votos de "currais" dos milicianos e do tráfico de drogas a seus candidatos. É mais ou menos essa a situação da população pobre do Rio: ou são submetidos politicamente às facções criminosas, ou àqueles que teoricamente teriam de defender os diretos dos cidadãos que moram nas comunidades menos abastadas do Estado. Ao contrário do que ocorria na Velha República, todavia, hoje a lei eleitoral é suficientemente rígida para punir e coibir esse tipo de ação, que impede o livre exercício do voto.
Foi com esse objetivo que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Caros Ayres Britto, reuniu o presidente do TRE do Rio, Roberto Wider, o ministro da Justiça, Tarso Genro e o superintendente da Polícia Federal (PF), Luiz Fernando Corrêa, para definir ações que garantam a livre escolha eleitoral das comunidades que estão sob o domínio das milícias e do tráfico. A Justiça Eleitoral pode, pela lei, requisitar força federal para garantir a eleição. Todavia, a preocupação do presidente do TRE com o uso de força federal, que fez o TSE adiar por algum tempo a requisição da Força Nacional, é compreensível. Nos últimos anos, a intervenção do Exército e da Força Federal em áreas de favela, na cidade do Rio, acabou sendo uma ação contra os favelados - não chegou a ter repercussão no desmantelamento dos grupos criminosos que são donos de populações inteiras. É preciso, sim, garantir a eleição, mas de forma que não apenas a liberdade do voto seja respeitada, mas também a vida do eleitor. No momento, atuam na área de inteligência a Polícia Federal, a Polícia Militar e a Polícia Civil, de forma a identificar nas comunidades quem ameaça a liberdade do voto. A lei eleitoral pune com prisão, cassação de candidatura e perda de mandato os beneficiados politicamente com a coação ao eleitor. Mas, para além disso, o problema dessa população não se reduz apenas ao exercício do voto. Eles são submetidos permanentemente a verdadeiras ditaduras locais.
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
CURRAIS DO CRIME
Editorial/Folha de S. Paulo
Editorial/Folha de S. Paulo
Com omissão das cúpulas partidárias, domínio de traficantes e milícias ameaça direito do eleitor no pleito de 2008
CURRAIS eleitorais, como o próprio termo sugere, compunham uma realidade típica dos tempos em que o poder político não passava de uma extensão, mais ou menos automática, do predomínio das oligarquias rurais sobre a vida brasileira.
A denominação sobreviveu, no plano da metáfora. Ressurge contudo, de modo literal e alarmante, no noticiário de 2008. Cabe perguntar se será apenas nas favelas do Rio de Janeiro, onde o fenômeno se manifesta com nitidez, que milícias e traficantes impõem sobre a população a exigência de votar nos candidatos com que estão mancomunados.
No Complexo do Alemão, situado na zona norte da capital fluminense, um candidato a vereador pelo DEM aparece como apadrinhado dos traficantes.
Proíbe-se qualquer outro de pisar naquele território. Entidades de moradores contestam a informação; espalharam faixas de boas-vindas a todos os que disputam o pleito, e houve quem bizarramente atribuísse a notícia à "perseguição" e ao "preconceito" contra favelados.
Em outra comunidade carioca, entretanto, indivíduos armados impediram que jornalistas circulassem livremente, enquanto acompanhavam a passagem de um candidato à prefeitura pelo local. Fotógrafos foram obrigados a apagar as imagens que traziam gravadas em suas câmeras.
É necessário, declarou o próprio candidato, senador Marcelo Crivella (PRB), "pedir autorização" para entrar em certos lugares. Tanto Crivella como a candidata do PC do B, Jandira Feghali, já se viram vigiados de perto por asseclas do tráfico em suas campanhas eleitorais.
O secretário da Segurança Pública do Estado, José Mariano Beltrame, calcula em dez mil homens o contingente necessário para assegurar o policiamento nos currais dominados por milícias e traficantes da cidade do Rio de Janeiro. Sua presença não teria por que restringir-se, de resto, ao período eleitoral: tanto quanto a liberdade dos candidatos, é a dos moradores que se vê cronicamente ameaçada.
Cumpre indagar qual o papel dos próprios partidos políticos, que admitem sem o menor problema candidatos com extensa ficha criminal e histórico notório de colaboração com o crime organizado. Não se espere que as microscópicas legendas de aluguel tomem providências contra essa infiltração.
Mas partidos de dimensão nacional, que na cúpula não deixam de procurar certa respeitabilidade, deixam-se igualmente vascularizar com a presença de candidatos que não passam de prepostos de um poder fora de controle, alheio e hostil ao próprio Estado.Suas direções se omitem; a campanha prossegue. "Será a eleição mais bonita da história do Rio de Janeiro", assegura o presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Estado. Em matéria de promessas, nenhum candidato faria melhor.
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
MUTIRÃO CONTRA AS MÁFIAS
Editorial/O Estado de S. Paulo
Foi prudente a decisão da Justiça Eleitoral e do Planalto de não recorrer de imediato à Força Nacional, muito menos ao Exército, para garantir o livre acesso dos candidatos às áreas do Rio de Janeiro dominadas pelo narcotráfico ou pelas chamadas milícias - quadrilhas constituídas, em boa medida, por policiais militares (PMs) e civis, que enfeudaram 125 comunidades cariocas (e 46 em outros 9 municípios do Estado). Dois episódios, na semana passada, chamaram a atenção para uma sombria realidade que, não sendo decerto nova, este ano se tornou clamorosa: a bandidagem estendendo ao voto o controle sobre os seus redutos, transformados em currais eleitorais.
O primeiro episódio foi a descoberta de que o chefão da droga na Favela da Rocinha, um certo Nem, ordenou aos capangas não só “todo o empenho” para eleger o seu candidato a vereador, o Claudinho da Academia, réu em 14 processos penais, mas ainda cortar o acesso aos seus domínios a “candidato de fora”. O segundo - sem precedentes nas circunstâncias - foi a ameaça sofrida por jornalistas que acompanhavam uma caminhada do candidato a prefeito Marcelo Crivella pela Vila Cruzeiro: um tipo com um fuzil ao ombro exigiu que apagassem de suas câmeras as fotos de dois homens escondendo o rosto quando o candidato se aproximava deles.
À parte a constatação de que o “ex-bispo” Crivella tem excepcional trânsito livre em bastiões do tráfico, ficou no ar a idéia do envio de tropas federais para liberar a campanha política nos territórios da segunda maior metrópole brasileira, onde o crime organizado notoriamente prevalece sobre o Estado. Em boa hora, porém, os presidentes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Carlos Ayres Britto, e do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Rio, Roberto Wider, além do ministro da Justiça, Tarso Genro, evitaram se precipitar. Eles aprovaram, por enquanto, a formação de um “mutirão de segurança”, integrado pela polícia fluminense, Polícias Federal (PF) e Rodoviária Federal, para enfrentar o poder das máfias no processo eleitoral no Rio.
“Se necessário”, disse Britto, “vamos acionar outros reforços.” O primeiro virá da Força Nacional, o contingente de 7.200 PMs de diversos Estados criado como alternativa ao engajamento das Forças Armadas em atividades tipicamente policiais. Britto não exclui de antemão a hipótese extrema, “se for o caso”, mas Wider é relutante. “Não adianta colocar o Exército na rua. Não estamos vivendo um estado de exceção”, argumenta. “O que precisamos é de Inteligência.” É a tarefa que tocará à PF no mutirão: mapear as ramificações criminosas nas áreas de risco à segurança eleitoral e propor ações para a sua desarticulação. Não é pouca coisa - para dizer o menos.
Relatório confidencial do setor de Inteligência do governo do Estado, divulgado quarta-feira por este jornal, traça um perfil alarmante da penetração dos grupos paramilitares nas comunidades carentes de uma dezena de bairros da capital. Passam de 500 os milicianos identificados, entre policiais, bombeiros, agentes penitenciários e civis propriamente ditos. Eles atuam também na Baixada Fluminense, no Grande Rio e na Região dos Lagos. Sempre se acreditou que as milícias se formaram para vender proteção contra os traficantes, desalojando facções criminosas como o Comando Vermelho e similares, extorquindo o comércio local ou se apossando dos melhores negócios.
A julgar pelo relatório, no entanto, o cenário de disputa com as quadrilhas da droga é antes fictício do que real: em 119 das 171 comunidades investigadas nem sequer havia tráfico quando os “vigilantes” começaram a dominá-las. Ou seja, não havia do que protegê-las. Pior ainda, segundo o secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, “já se percebe em alguns lugares” ligações de milicianos com traficantes. Nesse quadro de metástase, a coerção sobre os eleitores é um desdobramento previsível, que interessa a uns e outros, em busca de retaguarda política. Como escreveu ontem neste jornal a colunista Dora Kramer, “se o narcotráfico já se substituiu ao Estado nos territórios sem lei, se já capturou cumplicidades em todos os Poderes e se já contaminou boa parte das instituições, por que não pretenderia fazer o papel de Justiça Eleitoral?”
Editorial/O Estado de S. Paulo
Foi prudente a decisão da Justiça Eleitoral e do Planalto de não recorrer de imediato à Força Nacional, muito menos ao Exército, para garantir o livre acesso dos candidatos às áreas do Rio de Janeiro dominadas pelo narcotráfico ou pelas chamadas milícias - quadrilhas constituídas, em boa medida, por policiais militares (PMs) e civis, que enfeudaram 125 comunidades cariocas (e 46 em outros 9 municípios do Estado). Dois episódios, na semana passada, chamaram a atenção para uma sombria realidade que, não sendo decerto nova, este ano se tornou clamorosa: a bandidagem estendendo ao voto o controle sobre os seus redutos, transformados em currais eleitorais.
O primeiro episódio foi a descoberta de que o chefão da droga na Favela da Rocinha, um certo Nem, ordenou aos capangas não só “todo o empenho” para eleger o seu candidato a vereador, o Claudinho da Academia, réu em 14 processos penais, mas ainda cortar o acesso aos seus domínios a “candidato de fora”. O segundo - sem precedentes nas circunstâncias - foi a ameaça sofrida por jornalistas que acompanhavam uma caminhada do candidato a prefeito Marcelo Crivella pela Vila Cruzeiro: um tipo com um fuzil ao ombro exigiu que apagassem de suas câmeras as fotos de dois homens escondendo o rosto quando o candidato se aproximava deles.
À parte a constatação de que o “ex-bispo” Crivella tem excepcional trânsito livre em bastiões do tráfico, ficou no ar a idéia do envio de tropas federais para liberar a campanha política nos territórios da segunda maior metrópole brasileira, onde o crime organizado notoriamente prevalece sobre o Estado. Em boa hora, porém, os presidentes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Carlos Ayres Britto, e do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Rio, Roberto Wider, além do ministro da Justiça, Tarso Genro, evitaram se precipitar. Eles aprovaram, por enquanto, a formação de um “mutirão de segurança”, integrado pela polícia fluminense, Polícias Federal (PF) e Rodoviária Federal, para enfrentar o poder das máfias no processo eleitoral no Rio.
“Se necessário”, disse Britto, “vamos acionar outros reforços.” O primeiro virá da Força Nacional, o contingente de 7.200 PMs de diversos Estados criado como alternativa ao engajamento das Forças Armadas em atividades tipicamente policiais. Britto não exclui de antemão a hipótese extrema, “se for o caso”, mas Wider é relutante. “Não adianta colocar o Exército na rua. Não estamos vivendo um estado de exceção”, argumenta. “O que precisamos é de Inteligência.” É a tarefa que tocará à PF no mutirão: mapear as ramificações criminosas nas áreas de risco à segurança eleitoral e propor ações para a sua desarticulação. Não é pouca coisa - para dizer o menos.
Relatório confidencial do setor de Inteligência do governo do Estado, divulgado quarta-feira por este jornal, traça um perfil alarmante da penetração dos grupos paramilitares nas comunidades carentes de uma dezena de bairros da capital. Passam de 500 os milicianos identificados, entre policiais, bombeiros, agentes penitenciários e civis propriamente ditos. Eles atuam também na Baixada Fluminense, no Grande Rio e na Região dos Lagos. Sempre se acreditou que as milícias se formaram para vender proteção contra os traficantes, desalojando facções criminosas como o Comando Vermelho e similares, extorquindo o comércio local ou se apossando dos melhores negócios.
A julgar pelo relatório, no entanto, o cenário de disputa com as quadrilhas da droga é antes fictício do que real: em 119 das 171 comunidades investigadas nem sequer havia tráfico quando os “vigilantes” começaram a dominá-las. Ou seja, não havia do que protegê-las. Pior ainda, segundo o secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, “já se percebe em alguns lugares” ligações de milicianos com traficantes. Nesse quadro de metástase, a coerção sobre os eleitores é um desdobramento previsível, que interessa a uns e outros, em busca de retaguarda política. Como escreveu ontem neste jornal a colunista Dora Kramer, “se o narcotráfico já se substituiu ao Estado nos territórios sem lei, se já capturou cumplicidades em todos os Poderes e se já contaminou boa parte das instituições, por que não pretenderia fazer o papel de Justiça Eleitoral?”
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