*Karl Marx, “Para a
crítica da economia política” p. 30, Os pensadores v.1. 4ª edição. Editora Nova
Cultura, São Paulo, 1987
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
quarta-feira, 1 de junho de 2022
Opinião do dia - Karl Marx*: poder das ideias(3)
Luiz Werneck Vianna*: As eleições como forma superior de luta
Algo de muito grave ocorreu aqui para que nos encontremos na miserável situação do regime Bolsonaro, inimigo do nosso passado, de suas tradições e instituições, que não só quer aviltá-las como erradicar a sua memória para cujo sinistro desígnio já conspira para sua perpetuação. Tal resultado malévolo não é fruto apenas das circunstâncias desafortunadas que nos viram nascer como nação marcada pelo estigma do latifúndio e da escravidão, que ainda nos atormenta, pois ao longo da nossa história, inclusive recentemente, contamos com oportunidades de buscar alternativas benfazejas, que perdemos por incúria.
Vera Magalhães: Promessas fake assombram Bolsonaro
O Globo
O caos que Jair Bolsonaro promove no Brasil
não afeta só a vida dos mais pobres, a economia, a imagem do país no exterior,
a resiliência da democracia e direitos e liberdades vários. Vira e mexe
acontece, também, de essa esculhambação geral atingir o próprio Bolsonaro.
Quando isso ocorre, o que se vê é um homem em franco desespero, sem saber como
lidar com as próprias limitações. E aí o risco é para todos os brasileiros.
Tirado das cordas em que se enfiou com sua
gestão temerária da pandemia, graças à vacina que tanto tentou boicotar e à
ajuda do Centrão, Bolsonaro mirou alguns outros truques para voltar a crescer
nas pesquisas: de um lado aprofundar o ataque ao sistema eleitoral e estimular
o antipetismo irracional, e de outro fazer “mandrakarias” fiscais para turbinar
o Auxílio Brasil, tentar segurar o preço dos combustíveis e fazer média com o
funcionalismo, sobretudo com as categorias de policiais federais, por meio de
reajustes.
O segundo braço da estratégia naufragou por
completo até aqui. O Auxílio Brasil se mostrou, como já apontavam os
economistas e especialistas em políticas públicas, um programa mal desenhado,
sujeito a desvios, com logística capenga e, pior, cujo acréscimo de valor em
relação ao Bolsa Família foi rapidamente corroído pela inflação.
O resultado é que, segundo o mais recente Datafolha, 69% dos beneficiários o consideram insuficiente, a rejeição a Bolsonaro (45%) entre os que recebem o pagamento é maior que no conjunto da população, e 66% dos cadastrados afirmam que o programa não terá influência sobre seu voto.
Bernardo Mello Franco: Bolsonaro não quer debate
O Globo
Jair Bolsonaro não gosta de ser
questionado. A quatro meses da eleição, ele avisou que deve faltar aos debates
entre os presidenciáveis. Só pretende dar as caras no segundo turno — se
houver, é claro.
“No primeiro turno, a gente pensa. Porque se eu for, os dez candidatos ali vão querer todo o tempo dar pancada em mim”, disse.
Em conversa com o animador Ratinho, o
capitão propôs um formato inusitado de debate: as perguntas feitas aos
candidatos teriam que ser combinadas antes do início do programa. “Até para não
baixar o nível”, justificou.
Num encontro a sério, os políticos são
confrontados com assuntos incômodos e precisam se virar sem a cola do
teleprompter. O que Bolsonaro propõe é outra coisa: transformar um gênero
jornalístico em peça de propaganda.
Em 2018, o capitão só aceitou participar de dois debates. Na Band, ficou nervoso quando Guilherme Boulos quis saber por que ele embolsava o dinheiro do auxílio moradia em Brasília. Na RedeTV!, foi espinafrado por Marina Silva por ter ensinado uma criança de colo a fazer o sinal de arminha.
Elio Gaspari: O cardeal da floresta
O Globo / Folha de S. Paulo
O Vaticano fala baixo. O Papa Francisco
acaba de elevar ao cardinalato o arcebispo de Manaus, Dom Leonardo Steiner. Um
cardeal na Amazônia já seria muita coisa, mas não foi só. Há três semanas,
Steiner havia sido nomeado presidente da Comissão Episcopal Especial para a
Amazônia. Se isso não bastasse, ele nasceu na cidade de Forquilhinha (SC),
assim como seus primos Paulo Evaristo (outro franciscano) e Zilda Arns. Esse
pequeno burgo fundado por colonos alemães deu à Igreja dois cardeais e a médica
que revitalizou a Pastoral da Criança. Seu processo de beatificação tramita na
Santa Sé. (Ela morreu em 2010, durante o terremoto do Haiti.) Saíram de
Forquilhinha três bispos, 58 padres e mais de cem irmãs de caridade. Em 2005
João Paulo II mandou Dom Leonardo Steiner para a prelazia de São Félix do
Araguaia, antes ocupada por Dom Pedro Casaldáliga.
Falando baixo, em 1964 o Vaticano afastou da Arquidiocese de São Paulo o regalesco cardeal Dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta. Anos depois chamou para Roma seu sucessor, Dom Agnelo Rossi, que se aproximara demais da ditadura. Para o lugar, o Papa Paulo VI mandou um religioso pouco conhecido: Paulo Evaristo Arns. Ele viria a se tornar um campeão na defesa dos direitos humanos. Falando baixo, Roma também mudou o arcebispo do Rio de Janeiro, trocando o bisonho Dom Eusébio Scheid por Dom Orani Tempesta.
Vinicius Torres Freire: O PIB melhorou, mas pouca gente sentiu no bolso, na pele ou na alma
Folha de S. Paulo
Importa
mais a vida cotidiana, que é de gente catando o que comer no lixo, largada na
rua e de carestia horrenda
O desempenho da
economia no primeiro trimestre vai ser muito melhor do que o esperado não faz
mais do que um par de meses. Os números do PIB saem nesta quinta-feira. Outros
indicadores continuam a mostrar melhora. Ou ao menos despiora: isto é, avanço
em relação a uma situação muito deteriorada, ganhos que não compensam ainda as
perdas, "crescimento sobre base baixa", como se diz no jargão.
Um desses
avanços é na situação do emprego, com o copo meio cheio do aumento do número de
pessoas empregadas, e com o copo furado dos salários, os menores da década e
com despiora interrompida no mês passado. Os números do emprego foram divulgados nesta terça-feira (31) pelo IBGE.
Para quase todas as pessoas, os números do PIB causam tédio, indiferença ou descrença irada. Basta dizer que a economia ao menos despiorou para ser objeto de ira de bolsonaristas ou oposicionistas, ao mesmo tempo. Pouca gente liga porque importa mais a "sensação térmica", a vida cotidiana, que é de gente catando o que comer no lixo, largada na rua e de carestia horrenda.
Bruno Boghossian: O apetite pela reeleição
Folha de S. Paulo
Por que um presidente sem soluções para o
país pede mais quatro anos de mandato?
Para um político em busca da reeleição,
Jair Bolsonaro demonstra um desinteresse curioso pelo ato de governar. O
presidente abriu a semana com um sobrevoo na região atingida pela chuva em
Pernambuco. Foi econômico ao indicar soluções para a tragédia e se saiu com um
comentário resignado: "Infelizmente, essas
catástrofes acontecem. Um país continental tem seus problemas".
Apontar problemas é um talento especial de Bolsonaro. Ele admitiu que políticos têm responsabilidade pela ocupação desordenada das cidades, mas dividiu a culpa e afirmou que "a população poderia colaborar", evitando áreas de risco. Faltou lembrar que seu governo congelou a construção de novas casas populares e murchou investimentos em programas habitacionais.
Mariliz Pereira Jorge: Vagabundo
Folha de S. Paulo
'Não podemos generalizar', disse Bolsonaro
sobre a ação criminosa da PRF em SE
Jair Bolsonaro ficou fulo da vida quando
questionado sobre a ação da PRF no episódio de tortura e assassinato
de Genivaldo de Jesus Santos, em Sergipe. Deu chilique básico de gente
autoritária, disse que será feita justiça "sem exageros". Não faço
ideia do que seja "justiça sem exageros", mas pelo visto é mandar os
diretores dispensados da corporação para uma temporada nos EUA.
Genivaldo foi asfixiado em uma viatura. Tudo filmado por uma enorme plateia, mas as perguntas que incomodam Bolsonaro são culpa da mídia que "sempre tem um lado, o da bandidagem". "Não podemos generalizar", disse. Sobre a ação criminosa da polícia, só silêncio. A passada de pano habitual de quem defende que a ditadura deveria ter matado 30 mil.
Deirdre Nansen McCloskey*: Iliberais de esquerda e de direita
Folha de S. Paulo
Os dois polos estão ansiosos por
impulsionar a economia, mas ela depende das pessoas
Quase todo mundo acredita que o Estado
comanda, faz, impulsiona, conduz, movimenta, regula, gera a economia. Parece
bom, ou assustador, dependendo do ponto de vista de cada um sobre se o Estado é
sábio ou burro.
Essa crença é resumida num termo mágico, um
entre tantos que ganharam destaque nos últimos 200 anos: "política
pública". Se alguma coisa dá errado, pensam os modernos, deve haver
uma política pública que dê um jeito. Não fiquem parados. Façam alguma coisa.
Aprovem uma lei e os salários subirão. Aprovem outra e a indústria brasileira
vai prosperar.
É mágica efetuada com palavras. Veja
o discurso de Lula, algumas semanas atrás, quando delineou as políticas
públicas que vai adotar depois que for vitorioso em sua sexta tentativa de
chegar à Presidência.
O Estado vai estimular, conduzir, gerar a economia. Ou veja o bolsonarismo, parte do qual é feito de decisões sábias de não ter uma política pública, para começo de conversa, mas outras partes do qual nem tanto. Desencorajar as vacinas, por exemplo. Obstruir os direitos reprodutivos da mulher, por exemplo. À moda de nosso Trump, usar o discurso que Mussolini, Salazar ou Figueiredo usaram, por exemplo.
Vera Rosa: O mutirão que Lula quer desavermelhar
O Estado de S. Paulo
Há um duelo de rejeições no mercado da política e a 3.ª via continua no acostamento
Um curto-circuito gaúcho entre o PT e o PSB
levou Luiz Inácio Lula da Silva a escolher o Rio Grande do Sul para a primeira
viagem com Geraldo Alckmin, vice em sua chapa. De hoje até amanhã, Lula tentará
resolver o impasse na aliança entre os dois partidos, que têm pré-candidatos ao
governo no Estado onde o presidente Jair Bolsonaro ainda demonstra força
política.
O roteiro também previa um dia em Santa
Catarina, mas outra disputa regional entre concorrentes do PT e do PSB fez a
dupla adiar a visita. Sob o slogan “Todos Juntos pelo Brasil”, a campanha passa
a ideia de movimento para além das fronteiras da esquerda. Nem sempre, porém, é
possível conter divergências domésticas.
O mutirão que Lula quer desavermelhar ainda enfrenta resistências no centro e na centro-direita, sem contar os senões do próprio PT. Na semana passada, o ex-presidente foi aconselhado a levar um economista mais ortodoxo para a equipe, numa tentativa de acalmar a Faria Lima. “Não é preciso essa ansiedade. Nós vamos ter um plano de investimentos”, reagiu Gleisi Hoffmann, que comanda o PT.
Fernando Exman: Assédio institucional contra a Petrobras
Valor Econômico
Bolsonaro vê empresa como rival na
pré-campanha
Foi no município de Candeias, a 50
quilômetros de Salvador, que o então presidente Getúlio Vargas pronunciou-se
sobre a criação da Petrobras.
Era 23 de junho de 1952, e o Congresso
ainda discutia o projeto enviado pelo Executivo meses antes. Vargas enfrentava
questionamentos em relação ao caráter nacionalista da proposta, que acabou por
ser sancionada apenas no fim do ano seguinte: mais especificamente, no dia 3 de
outubro de 1953. A Petrobras completará 69 anos um dia depois do primeiro turno
de uma eleição que pode ser determinante para o seu futuro.
Naquele discurso de 1952, Vargas aproveitou
uma visita à região produtora de petróleo do recôncavo baiano para explicar o
modelo escolhido para a empresa.
Primeiro, relembrou que fora na Bahia anos
antes, em 1939, que pela primeira vez jorrou petróleo no Brasil. O feito
ocorreu depois de inúmeras sondagens, mas a produção dele resultante era apenas
suficiente para atender a uma pequena parcela da demanda local. As reservas
baianas chegaram a produzir 5 mil barris por dia no fim de 1951.
“Com essa produção, ainda estamos muito longe de atender às necessidades do país, que consome, em média, 130 mil barris diários, prevendo-se que, em 1953, esse consumo atingirá 170 mil”, completou Vargas, que dificilmente poderia imaginar que aproximadamente 70 anos depois o Brasil produziria 2,9 milhões de barris de petróleo por dia.
Pedro Cafardo: Gastar ou não gastar, um dilema regional
Valor Econômico
“Índice da miséria” indica reeleição
difícil de Bolsonaro
Mesmo quem não mora em São Paulo certamente
já ouviu falar do Minhocão. É uma via elevada expressa que liga as zonas leste
e oeste da capital paulista. Seu nome oficial, Elevado Presidente João Goulart,
foi adotado em 2016. Desde sua inauguração, em 1971, pelo então prefeito Paulo
Maluf, chamava-se Elevado Presidente Costa e Silva.
Muita gente defende a demolição desse
monstrengo que atravessa o centro da cidade ou sua transformação em jardim
suspenso, algo polêmico. Mas não é disso que se pretende tratar aqui, e sim dos
sinais emitidos em cima e embaixo do elevado.
Fechado para veículos nos fins de semana, o
Minhocão abre quatro pistas bem agradáveis para ciclistas e pedestres em seus
3,5 km. Um desses ciclistas, dias atrás, caiu em um buraco no elevado e, irritado,
resolveu fotografar e contar os rombos nas pistas: achou 11, alguns deles
capazes de estourar pneus de carros e provocar acidentes.
O cenário mais assustador, porém, está embaixo do Minhocão, um longo espaço coberto e sempre aberto a centenas de moradores de rua. Com barracas ou cabanas, neste maio gelado, famílias inteiras de sem-teto proporcionaram ali um “espetáculo” desolador.
Daniel Rittner: O telefonema mais importante do país
Valor Econômico
Muito mais que uma cordialidade entre
vencedor e perdedor
O telefonema mais importante dos próximos
quatro anos - uma ligação rápida mas crucial para pacificar minimamente o país
e tirar os brasileiros da exaustão emocional, para abrir caminho à
reconciliação das famílias, à volta de amizades desfeitas pela política, à
troca de gentileza entre vizinhos - tem data para acontecer: dia 2 de outubro
(primeiro turno das eleições presidenciais) ou 30 do mesmo mês (segundo turno).
Não vale declaração às redes de TV, nota do
QG de campanha ou postagem nas redes sociais. Tem que ser telefonema, coisa de
um ou dois minutos, filmado por ambos os lados para farta divulgação. O
candidato que sair derrotado das urnas ligará para o vitorioso. Reconhecerá a
derrota e desejará sucesso ao eleito. Dirá que as divergências entre eles não o
impedirão de trabalhar juntos pelo futuro do Brasil. O ganhador devolverá o
aceno. Agradecerá ao segundo colocado no discurso da vitória.
Numa das cenas antológicas de “Entreatos”, o documentário de João Moreira Salles que narra bastidores da campanha petista em 2002, ainda são nove e vinte da noite no domingo eleitoral quando Lula recebe a ligação do rival tucano. Ao desligar, vira-se para os companheiros: “Era o [José] Serra, reconhecendo que perdió. E que yo ganhei”. Respeito.
Cristovam Buarque*: Gratuidade insuficiente
Correio Braziliense
Mais uma vez, a comunidade interessada em
educação luta por uma causa correta, mas insuficiente: impedir o fim da
gratuidade no ensino superior, e não para que toda criança tenha gratuidade nas
escolas de qualidade. Para que os 800 mil alunos das universidades federais não
paguem, não para que os 50 milhões de crianças em idade escolar concluam o
ensino médio com qualidade, em escolas gratuitas. Aceita-se que isso seja
privilégio dos que podem pagar mensalidades elevadas, ou em raras boas escolas
públicas, em geral federais.
O debate é se a universidade estatal deve ser pública, não se as escolas de qualidade também devam ser todas públicas. Aceita-se que as boas escolas de educação de base sejam pagas, e que a escola seja desigual, conforme a renda da família da criança. Não se aceita que haja universidade de qualidade paga para os ricos e universidade sem qualidade gratuita para os pobres, mas isso é aceito para a educação de base. Nem ao menos se pergunta "por que cobrar para que crianças tenham acesso às melhores escolas?" Ainda menos "porque haver gratuidade no ensino superior de qualidade, sem direito à gratuidade no ensino fundamental e no ensino médio com qualidade".
O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões
Editoriais
Pouco a apresentar
Folha de S. Paulo
Impopularidade de Bolsonaro se correlaciona
à baixa atenção ao interesse público
É da natureza do governo Jair Bolsonaro
(PL) a fidelidade aos interesses de grupos aliados —sejam policiais, militares,
defensores de armas, ruralistas, evangélicos ou caminhoneiros— em detrimento da
atenção ao interesse público.
Entre inúmeros exemplos, nesta terça-feira
(31) a administração federal esteve novamente às voltas com o impasse
criado pela insistência do mandatário em conceder reajustes salariais para
as carreiras da área de segurança pública.
Como um governo previdente seria capaz de
prever, a benesse injustificada despertou demandas das demais corporações do
funcionalismo, cujos protestos e paralisações hoje prejudicam a prestação de
serviços à sociedade.
Previu-se, então, um reajuste linear de 5%
para todos os servidores, e a conta para os cofres públicos saltou do R$ 1,7
bilhão inicial para algo mais próximo dos R$ 8 bilhões —dinheiro que terá de
ser remanejado de outras áreas.
Agora, muito tardiamente, constata-se o
óbvio: para elevar os salários de profissionais que dispõem de estabilidade no
emprego e remunerações das mais elevadas do país, é preciso retirar recursos da
saúde, da educação, da ciência. E o presidente hesita diante de uma crise
criada por ele próprio.
Boas políticas públicas dependem de providências cotidianas e invisíveis para a maioria. Trata-se de cotejar custos e resultados, fixar metas, negociar com os envolvidos, persistir nos rumos traçados, aprender com a experiência.