segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Opinião do dia – Luiz Sérgio Henriques

Explicitado de outra forma, eis o paradoxo diante de nós: esta esquerda chegou à exaustão e daqui por diante só incendiará corações valentes e mentes sectárias. No entanto, nenhum país moderno pode permitir-se viver sem uma esquerda atualizada, capaz de contribuir para a elaboração de caminhos razoáveis para todos. Será preciso reconstruí-la do começo.
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Luiz Sérgio Henriques, tradutor e ensaísta, é um dos organizadores das ‘Obras’ de Gramsci no Brasil. – ‘Uma esquerda exausta'. O Estado de S. Paulo, 16 de agosto de 2015

Com líderes da oposição nas ruas, protestos focam impeachment

• O ex-presidente Lula foi um dos principais alvos em Brasília, SP e RJ; o juiz Sérgio Moro ganhou cartazes de apoio e virou ‘herói

Com adesão da oposição, atos focam em impeachment

O Estado de S. Paulo

• PM diz que participação superou a de abril; Aécio (PSDB) usou carro de som para criticar Dilma; Lula foi um dos principais alvos em Brasília, SP e RJ; Sérgio Moro ganhou apoio e virou ‘herói’

Pela terceira vez neste ano, milhares de brasileiros tomaram as ruas do País para protestar contra a gestão Dilma Rousseff, o PT e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Líderes dos partidos de oposição tomaram parte nas manifestações de maneira ostensiva e engrossaram os pedidos de impeachment da presidente.

As manifestações em todo o País também se transformaram em atos de apoio à Operação Lava Jato, que investiga o esquema de corrupção na Petrobrás.

Na avaliação do Palácio do Planalto, os protestos deste domingo trazem preocupação ao governo porque encamparam a pauta do impeachment e escolheram Dilma e Lula como os principais alvos das críticas, sátiras e ofensas.

Conforme números da PM, a quantidade de pessoas nas ruas superou a manifestação do dia 12 de abril, mas ficou abaixo da registrada em 15 de março. Neste domingo, ao menos 790 mil engrossaram os protestos em diversas cidades, contra 660 mil de abril e 1,9 milhão de março.
Todos os Estados do Brasil registraram algum tipo de protesto. Em Belo Horizonte, o senador Aécio Neves, presidente nacional do PSDB e candidato derrotado por Dilma em outubro do ano passado, subiu em um carro de som dos manifestantes e discursou contra o governo.

Em São Paulo, onde o senador tucano José Serra também participou dos atos, cerca de 350 mil manifestantes ocuparam a Avenida Paulista, segundo a PM – número também superior ao registrado em abril no mesmo local.

Instituto. Em frente ao Instituto Lula, a CUT organizou um ato de defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Inicialmente, PMs que trabalhavam no local contabilizaram 1.500 pessoas, mais tarde em nota divulgada nesta noite o órgão falou em 600 pessoas. Kim Kataguiri, um dos líderes do Movimento Brasil Livre, fez projeção de mobilização de 1 milhão de pessoas em todo o País. "Esperamos reunir hoje um milhão de pessoas em todo o Brasil. Nossa projeção é que seja maior que o último, mas menor que a primeira manifestação do ano."

O senador José Serra (PSDB-SP) chegou por volta das 16 horas à Avenida Paulista, região central de São Paulo, e deu uma volta em torno do carro de som do movimento Vem Pra Rua.

Foi muito assediado e teve o nome conclamado pelos ativistas. "A manifestação é uma demonstração de impaciência. As pessoas ficam muito contentes de me ver aqui. Quase a totalidade são meus eleitores. A manifestação é pacífica, sem governo ou sindicato por trás. Nas manifestações antigas, eu me lembro, tinha governo, sindicato, patrocínio. Eu me lembro. Hoje, não tem. Não tem partido. É um imenso grau de espontaneidade", exaltou.

No Rio de Janeiro, o ato começou por volta de 11h e percorreu cerca de dois quilômetros na pista junto à areia da praia da Avenida Atlântica. Um homem foi agredido e teve de deixar o local com escolta da polícia após manifestar apoio a Dilma e Lula. Na capital mineira, reunidos na Praça da Liberdade, cerca de 6 mil pessoas participaram da manifestação, segundo a Polícia Militar.

O senador Aécio Neves (PSDB-MG) esteve no ato e fez um curtíssimo pronunciamento carro de som, dizendo apenas que "o Brasil despertou. Chega de corrupção. O meu partido é o Brasil". Pessoas protestam em frente à casa onde a presidente Dilma Rousseff morou, em Uberaba, no Triângulo Mineiro. Em Vitória, cinco trios elétricos chamaram a atenção das pessoas com músicas de letras contra o PT. A Polícia Militar informou que aproximadamente 20 mil pessoas participavam do até no meio da tarde.

Na região Norte, sob um calor de 36º, aproximadamente 600 manifestantes pediam o impeachment da presidente Dilma Rousseff ou a intervenção militar, em Manaus. Eles se reuniram a partir das 14h, na Avenida Eduardo Ribeiro, região central, para iniciar passeata contra o governo. O baixo número de integrantes nos primeiros momentos fez com que os manifestantes se igualassem em número com o contingente da Polícia Militar, de 650 oficiais. Oferecidas pelos organizadores do protesto, mais de dez faixas com mensagens contra o PT foram distribuídas. Entre os movimentos presentes na concentração da passeata estavam adeptos de intervenção militar, parlamentaristas, membros da Maçonaria, movimentos estudantis, entre outros.

De acordo com a Polícia Militar, cerca de 2 mil pessoas participaram da manifestação em Porto Velho (RO). O movimento teve início às 17 horas, na Praça das Três Caixas D'Água, zona central da capital e seguiu pelas principais avenidas portovelhenses.

No município de Ariquemes, a Organização Não-Governamental Viva Mais encabeçou a manifestação pelas principais ruas da cidade. De acordo com o presidente da entidade, Rick Graeff, cerca de 100 pessoas participaram da passeata. "Não foi o nosso esperado. Na última manifestação, quase três mil pessoas participaram, dessa vez o público foi muito menor, mas estamos fazendo a nossa parte e lutando por um Brasil melhor", reforçou Rick. As cidades de Presidente Médici e Vilhena também anunciaram que iriam participar da manifestação, mas não houve presença da população para registro do manifesto.

Na capital de Roraima, 24 bandas de rock se revezam desde 2h em uma tenda montada na Praça do Centro Cívico, no centro da cidade, no evento "Rock Contra a Corrupção".

O movimento esperava a participação de cerca de 10 mil pessoas. Também sob o efeito do calor, o amapaense não se animou a ir para protestar na rua. A concentração começou às 15h na Praça da Bandeira e de lá, por volta das 16h, os poucos manifestantes, sem faixas e cartazes e com um pequeno carro de som, saíram percorrendo as principais ruas do centro de Macapá. Nenhum político compareceu. De acordo com a Polícia Militar apenas cem pessoas participam do ato.

No Rio Grande do Sul, o Movimento Brasil Livre diminuiu o trajeto previsto da caminhada devido ao número de participantes. Enquanto estimam um público entre 30 mil para 50 mil, a Brigada Militar fala em 20 mil.

No protesto, não houve citação ao pacote de elevação de carga tributária que deve ser apresentado pelo governador Ivo Sartori (PMDB) nesta semana. Os participantes da mobilização na capital gaúcha defendem um processo de impeachment contra a presidente. A crise financeira vivida pelo Rio Grande do Sul, que resultou no parcelamento de salários do funcionalismo estadual em julho, motivou inúmeros protestos de servidores nas últimas semanas e provocou questionamentos à gestão do governador nas redes sociais.

Em Curitiba a manifestação reuniu 60 mil pessoas, segundo a Polícia Militar e também a organização. Essa foi a terceira manifestação na capital paranaense, a primeira reuniu 80 mil pessoas segundo a PM e 100 mil pelos organizadores, já a segunda teve 40 mil segundo a PM e 60 mil pela organização. O protesto - que durou duas horas e meia - foi promovido pelas redes sociais e iniciou às 14 horas, dominou a área central da capital e teve quatro carros de som que também pediam apoio popular por meio de assinaturas às “10 medidas contra a corrupção”, espécie de cartilha lançada pelo Ministério Público e que pode virar um projeto de lei.

Em Florianópolis, a passeata teve como destino a sede do Tribunal de Justiça, na avenida Beira-Mar Norte. Diferente do dia 15 de março, quando uma chuva forte atrapalhou a manifestação, neste domingo há sol e temperatura alta, o que favorece a adesão anti-PT. Os protestos foram organizados por três grupos civis, o Movimento Brasil Livre, o Vem Pra Rua e os Revoltados online. Em cima do carro de som do MBL, desfilou o senador Na capital do Paraná, a manifestação iniciou pouco depois das 14 horas. Na região central da cidade, onde se realizam os principais atos políticos no Estado, o Movimento Brasil Livre saiu em passeata para a Boca Maldita. A PM informou que aproximadamente 20 mil pessoas fizeram todo o trajeto.

No Nordeste, o protesto na capital maranhense começou com a participação de 500 pessoas, segundo a Polícia Militar do Maranhão. Quatro trios elétricos puxavam os gritos de ordem.O percurso do protesto em São Luís tem a extensão de 1,8 km. Os manifestantes em Recife começaram a se dispersar por volta das 14h. A mobilização, que começou às 9h, percorreu cerca de 3,5 quilômetros ao longo da Avenida Boa Viagem e, segundo os organizadores, reuniu cerca de 20 mil pessoas. A polícia não divulgou uma estimativa.

De acordo com a Polícia Militar, o protesto em Fortaleza reuniu 15 mil pessoas. Paulo Angelim, coordenador do Instituto Democracia e Ética, uma das entidades responsáveis pela organização, disse que rasgaria o diploma de arquiteto se no ponto mais alto da manifestação não tivessem 50 mil pessoas.O deputado federal Jair Bolsonaro participou do ato e defendeu a cassação da presidente Dilma Rousseff e do vice Michel Temer.

No exterior, os protestos em Paris e Nova York reuniram poucas pessoas. Na Times Square, um grupo reduzido pedia intervenção militar no Brasil. Na capital francesa, cerca de 20 pessoas protestaram em frente à embaixada do Brasil. O grupo disse não pertencer a nenhum dos movimentos que organizaram os protestos em território brasileiro.

Protestos nas ruas mantêm governo Dilma sob pressão

• Manifestações superam as de abril - Dilma, Lula e Renan são alvos principais - 85% sugerem a renúncia da presidente

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Grupos contrários à presidente Dilma Rousseff voltaram às ruas para protestar neste domingo (16), mantendo a pressão sobre o governo num momento em que ele tenta recuperar a iniciativa política para barrar pedidos de impeachment da presidente.

Em São Paulo, os protestos atraíram cerca de 135 mil pessoas para a avenida Paulista, segundo o Datafolha. A concentração foi maior do que a observada em 12 de abril, quando o instituto estimou em 100 mil os manifestantes no local, mas menor do que a de 15 de março, quando 210 mil foram à Paulista.

Houve protestos em pelo menos 169 cidades, incluindo todas as capitais. Estimativas da Polícia Militar, com métodos menos confiáveis que os do Datafolha, sugerem que as manifestações atraíram 612 mil pessoas nas capitais, mais do que as 540 mil de abril.

Convocados por grupos que se articulam nas redes sociais da internet e não têm vínculos com partidos políticos, os protestos tiveram como alvos principais Dilma, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que, na semana passada, apresentou um pacote de reformas econômicas para ajudar Dilma a sair da crise.

Segundo o Datafolha, 85% dos manifestantes que foram à avenida Paulista sugerem que a presidente renuncie ao cargo, e 82% defendem o impeachment, para que ela seja afastada e processada pelo Senado.

Líderes da oposição participaram dos protestos sem serem hostilizados como nas manifestações anteriores. Em Belo Horizonte, o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), discursou no alto de um carro de som. O governo considerou os protestos expressão da "normalidade democrática", disse o ministro Edinho Silva, da Secretaria de Comunicação Social.

Foco em Lula e Dilma nos atos preocupa Planalto

• Governo avalia que presidente ganhou mais tempo para tentar estancar a crise econômica e política

• Para assessores, o risco é de que revelações da Lava Jato sobre petistas possam dar mais gás a ataques contra o PT

Valdo Cruz, Marina Dias, Mariana Haubert – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Ao final de mais um dia de protestos pelo país, o Palácio do Planalto respirou aliviado porque as manifestações deste domingo (16) não repetiram as concentrações observadas em março.

Mas preocupa o governo o fato de a mobilização seguir forte e ter focado nas figuras da presidente Dilma Rousseff, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do PT.

A avaliação interna do governo é que a petista ganhou mais tempo para tentar superar a crise política e econômica, depois de na semana passada já ter conseguido estancar as articulações da oposição no Congresso e em tribunais que podem desaguar na abertura de um processo de impeachment contra ela.

Em reunião na noite deste domingo (16) no Palácio da Alvorada, Dilma e sua equipe destacaram como positivo o fato de a oposição não ter conseguido ter grande visibilidade nos atos, mesmo tendo feito convocação expressa e ter participado dos atos.

Segundo um ministro, apesar de "todo o peso partidário que foi jogado, ficou tudo dentro da normalidade". O PSDB usou suas inserções comerciais no rádio e na TV para convocar pessoas para os atos deste domingo e alguns de seus principais líderes foram para as ruas.

Normalidade
A orientação da presidente à sua equipe, porém, foi de não dar entrevistas no final do dia e passar, por intermédio do ministro Edinho Silva (Comunicação Social), uma breve avaliação oficial dos atos: "O governo viu as manifestações dentro da normalidade democrática".

Em caráter reservado, ministros avaliaram negativamente o fato de, nesta terceira onda, as manifestações estarem muito concentradas na presidente, em Lula e no PT.

Para assessores, o risco é de que revelações da Operação Lava Jato sobre integrantes do PT envolvidos no petrolão possam dar mais gás a ataques diretos às principais lideranças petistas.

Além de Dilma e Edinho Silva, participaram da reunião no Palácio da Alvorada os ministros José Eduardo Cardozo (Justiça), Jaques Wagner (Defesa) e Aloizio Mercadante (Casa Civil).

O líder do PT no Senado, Humberto Costa (CE), disse que o resultado das manifestações "não significa que a insatisfação com o governo diminuiu".

Já o senador Delcídio Amaral (PT-MS), líder do governo no Senado, acredita que o foco do protesto no impeachment da presidente pode ter contribuído para evitar um crescimento expressivo no número de participantes.

"O povo brasileiro tem consciência, não entra no embalo de alguns", disse.

Atos reúnem 879 mil, mas governo vê quadro estável

• Manifestantes foram às ruas em todos os estados e no Distrito Federal

• Protestos pediram a saída de Dilma, apoiaram a Operação Lava-Jato e atacaram o PT e o ex-presidente Lula. Maior concentração foi em São Paulo, onde 350 mil estiveram na Avenida Paulista, segundo a PM

Novos protestos contra o governo Dilma e o PT reuniram ontem 879 mil pessoas em mais de 200 cidades, em todos os estados e no Distrito Federal, segundo cálculos oficiais. As manifestações foram maiores que as de 12 de abril e menores que as de 15 de março (quando 2,4 milhões foram às ruas), fato que causou alívio no Palácio do Planalto. Na avaliação do governo, embora significativos, os protestos não põem em risco a estabilidade política. Mais uma vez, São Paulo, onde 350 mil pessoas foram à Avenida Paulista, teve a maior participação. As queixas foram concentradas em Dilma, no PT e no ex-presidente Lula. Houve apoio maciço às investigações da Lava-Jato e ao juiz Sérgio Moro. No Rio, a PM não estimou o público na orla de Copacabana. O senador Aécio Neves (PSDB) participou do protesto em Belo Horizonte.

Apesar das ruas

• Atos atraem 879 mil, governo avalia que adesão é insuficiente para agravar crise política

-BRASÍLIA, SÃO PAULO e RIO - O 16 de agosto levou pelo menos 879 mil pessoas às ruas de 205 cidades, de forma pacífica, em todos os estados e no Distrito Federal. Embora significativa, a adesão aos protestos, menor do que a de 15 de março e maior do que a de 12 de abril, não abalou a estabilidade política do país e foi insuficiente para agravar a crise, na avaliação do Planalto. À noite, o ministro Edinho Silva (Secretaria de Comunicação Social) divulgou nota considerando as manifestações dentro “da normalidade democrática”.

Segundo a análise de um integrante do governo, a semana menos belicosa no Congresso ajudou a desmobilizar as pessoas. Foi também a semana em que Dilma tomou as rédeas da articulação política.

— A semana passada foi muito boa para a gente. Estávamos preparados para algo mais expressivo, mas um Congresso mais calmo levou a uma mobilização menor nas ruas — disse um ministro ao GLOBO.

Lava-Jato é exaltada
Desta vez, a Lava-Jato se tornou também protagonista e os manifestantes declamavam o apoio ao trabalho do Ministério Público Federal. Os protestos ligaram diretamente a operação à presidente e ao ex- presidente Lula. Cartazes e camisetas estampavam a imagem do juiz Sérgio Moro, tratado como herói por manifestantes no Rio e em São Paulo. Em Brasília, o destaque foi um boneco inflável gigante de Lula vestido como um presidiário. Em nota, o Instituto Lula reagiu à provocação: “O povo brasileiro sabe que ele (Lula) só pode ser acusado de ter promovido a melhora das condições de vida e acabado com a fome de milhões de brasileiros, o que para alguns, parece ser um crime político intolerável”, diz a nota.

No começo da noite, os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil), Edinho Silva, Jaques Wagner (Defesa) e Ricardo Berzoini (Comunicações) se reuniram com a presidente para analisar o dia de manifestações. A orientação do Planalto foi tratar os protestos como algo “normal e democrático”. A ideia inicial do governo era destacar um ministro para fazer um breve pronunciamento sobre os protestos, mas, após a reunião, a opção foi uma nota curta, para evitar o risco de serem mal interpretados. Se, de um lado, não queriam provocar os manifestantes; de outro, temiam que uma postura mais conciliadora fosse entendida como apoio aos protestos.

A avaliação feita na reunião com a presidente é que o governo não está conseguindo mostrar para a população que está se esforçando para corrigir os rumos da economia. Outra conclusão é que a população vincula os desmandos investigados pela Lava-Jato à presidente Dilma. Aos integrantes do governo foi pedido que evitassem provocações. A recomendação não impediu que petistas reagissem, nas redes, com ironia aos manifestantes, usando a hashtag #CarnaCoxinha ao se referir ao protesto.

O Movimento Brasil Livre, que organizou algumas das passeatas, distribuiu faixas gigantes, de 100 metros, defendendo o impeachment da presidente.

O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves, que evitou participar dos outros atos, subiu ontem em um trio elétrico em Belo Horizonte. Afirmou que o fez como cidadão, não como político.

Segundo estimativas do site G1, os protestos de ontem ocorreram em um número menor de cidades — 205 contra 224 de 12 de abril. São Paulo concentrou o maior número de manifestantes. Foram 350 mil, 75 mil a mais do que em abril. Os números, no entanto, foram menores do que os de março, quando 1 milhão de pessoas protestou contra o governo.

Em dias de trégua com a presidente Dilma, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no âmbito da Lava-Jato, também foi alvo de protestos em Maceió. Renan se reaproximou de Dilma, apresentou um pacote anticrise, a Agenda Brasil, uma espécie de antídoto contra a cruzada oposicionista do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Os protestos, que ocorreram sob sol forte nas principais capitais, reuniram celebridades e chegaram a ter coreografia. No Rio, a atriz Regina Duarte assistiu a manifestação de cima de uma árvore, na Avenida Atlântica. As bandeiras iam da intervenção militar ao impeachment. O “Fora, PT” foi ouvido pelas ruas de todo o país.

Em SP, 350 mil vão à Avenida Paulista

• Durante o ato, palavras de ordem contra Lula, pedidos de impeachment e mensagens de apoio à Lava-Jato

- O Globo

-SÃO PAULO- Com pedidos de impeachment da presidente Dilma Rousseff, palavras de ordem contra o ex-presidente Lula e mensagens de apoio à Operação Lava-Jato, cerca de 350 mil pessoas, segundo a Polícia Militar, compareceram, na tarde de ontem, à terceira manifestação do ano contra o governo federal, em São Paulo. O ato, realizado na Avenida Paulista, teve público superior ao do protesto do dia 12 de abril, que reuniu 275 mil pessoas, mas inferior à da manifestação de 15 de março, quando 1 milhão de manifestantes saiu às ruas, de acordo com a PM.

“Lula nunca mais”, “Fora Dilma” e “A nossa bandeira jamais será vermelha” foram os principais gritos dos manifestantes ouvidos na Paulista. Não houve incidentes. Idosos e famílias com filhos, boa parte deles vestidos de verde e amarelo, eram a maioria entre os que circulavam pela avenida. O clima tranquilo permitiu que o comércio continuasse com as portas abertas durante a manifestação.

Camisetas vendidas a R$ 30
Com o calor, os vendedores ambulantes de cerveja puderam faturar. Camisas com a inscrição “Fora Dilma e leve o PT junto” eram vendidas por R$ 30 e faziam sucesso. Na hora do almoço, os shoppings e restaurantes da região ficaram cheios.

Os grupos organizadores se dividiram em nove carros de som em dez quadras da avenida. O hino nacional também foi cantado em coro algumas vezes. O Vem Pra Rua e o MBL foram os que mais atraíram público. Um grupo pequeno pedia a intervenção militar. Um outro grupo fez um panelaço em frente ao Masp. Alguns manifestantes levaram cartazes em inglês para avenida, com o objetivo de alertar a imprensa estrangeira que cobria o ato, sobre os problemas que o país enfrenta.

O discurso de feito em junho por Dilma, em que a presidente saudou a mandioca, foi alvo de paródias nos carros de som dos grupos que organizavam a manifestação.

Os irmãos Felipe Siansiulli, de 31 anos, e João Siansiulli, de 36 anos, eram uns dos muitos defensores do juiz Sérgio Moro na Paulista. Eles desfilavam com um cartaz com a foto do magistrado da Lava-Jato ao lado da frase: “Sérgio Moro, herói nacional”. Outros manifestantes abordavam a dupla para tirar fotos.

— Ele está tendo coragem de colocar na cadeia quem precisa pôr — afirmou João.
No carro de som do Vem Pra Rua um cartaz dizia: “O Brasil apoia a Lava-Jato”. O movimento colocou juristas para discursar com o objetivo de mostrar que há bases legais para o afastamento de Dilma.

— Somos contra o golpe que essa camarilha liderada pelo Lula e José Dirceu deu nos cofres do Brasil — discursou Miguel Reale Junior, exministro da Justiça, no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Reale Junior pediu a renúncia de Dilma, apesar de dizer que o Congresso pode ser pressionado para abrir o processo de impeachment.

— Dilma, saia por favor. Nos liberte da camarilha — afirmou o jurista.

O líder do Vem Pra Rua, Rogério Chequer, também leu uma carta enviada pelo ex-petista Hélio Bicudo, que não pôde comparecer porque estava doente, em que ele acusava o governo de corrupção e de enganar o povo.

Para tentar mostrar que o ato não reunia apenas representantes da elite ou “coxinhas”, nas palavras de Chequer, foi chamado para discursar no caminhão do Vem Pra Rua um líder de uma cooperativa de catadores de lixo.

Já o Movimento Brasileiro Livre (MBL) levou para a Paulista, como também fez no Rio e em Brasília, uma bandeira gigante com as cores do Brasil e a palavra “impeachment”.

Ataques a Janot e Renan
Renato Batistta, um dos líderes do MBL que discursou, acusou o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de fazerem “um acordo contra a saída de Dilma”. — Vão afundar com ela — afirmou Batistta. Vários cartazes pediam a saída de Janot e de Calheiros, mas o nome do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que recentemente decidiu romper com a presidente Dilma e pode decidir sobre o andamento dos pedidos de impeachment, não apareceu nos discursos.

Fernando Holliday, outro líder do MBL, atacou a propaganda do PT, veiculada no último dia 6, em que o partido dizia ser o responsável por colocar comida na mesa dos brasileiros. Para ele, o partido não pode fazer esse tipo de afirmação.

— O povo não é representado pelo PT e deseja não só o fim desse governo, mas o fim desse partido.

Juiz da Lava-Jato tem dia de herói no Rio

• Manifestantes fazem deferências a Sérgio Moro e promovem apitaço no ato que durou três horas em Copacabana

- O Globo

Além do já esperado tom crítico ao governo Dilma Rousseff, um nome figurou entre os cartazes e gerou defesas apaixonadas no protesto de ontem na Praia de Copacabana, na Zona Sul do Rio: o do juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal do Paraná, responsável pelos processos da Operação Lava-Jato. Em um dos carros de som, havia uma faixa com a inscrição “Je suis Moro” ( Eu sou Moro). A idolatria pelo magistrado também foi vista em outros protestos Brasil afora.

Outro assunto lembrado durante o ato foi o julgamento das contas de Dilma pelo Tribunal de Contas da União ( TCU). Cartazes pediam aos ministros do TCU — que deram mais 15 dias para a petista responder sobre as irregularidades — que reprovassem as contas de 2014 da presidente.

Lula também foi criticado
A manifestação começou por volta das 11h e durou cerca de três horas. A Polícia Militar do Rio disse que não daria estimativa de público “por conta dos constantes desencontros do número estimado por organizadores e da própria PM”. Parte dos presentes vestia verde e amarelo e carregava faixas e cartazes com críticas a Dilma, ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao PT. Em alguns deles, lia-se “Fora, Dilma”, “Impeachment já”, “Golpe é pedalar com o dinheiro público” e “Moro, Papuda neles”. Os participantes também fizeram um apitaço e cantaram os hinos Nacional e da Bandeira.

O designer Marco Aurélio Coelho, de 32 anos, foi à manifestação criticar o governo e vender camisas feitas por ele com o rosto do juiz da Lava-Jato, com os escritos “Vai, Moro”. Segundo Coelho, a imagem foi inspirada na famosa foto do ex-guerrilheiro Che Guevara, tirada pelo fotógrafo Alberto Korda e reproduzida pelo artista plástico Jim Fitzpatrick nos anos 1960.

— Fiz 70 camisas e já vendi 50 a R$ 25 cada. O Sérgio Moro está fazendo um trabalho fundamental no combate à corrupção.

Moro também foi lembrado em discursos de organizadores do ato, que pediram aplausos.
A advogada Sônia Costa, de 65 anos, é a favor da saída do PT e do PMDB do governo, mas disse que não vê nenhum político que a represente.

— Se encontrar alguém, me fala — brincou, enaltecendo só um nome: — Tem o Sérgio Moro, um homem seríssimo.

O ato teve confrontos entre críticos do governo e simpatizantes do PT. Em um deles, um funcionário público do Recife, que não quis se identificar, gritou “Viva a democracia” e “Lula 2018”. Foi o suficiente para ser cercado por manifestantes que o fizeram recuar até a areia da praia, aos gritos de “filho da p...” e “vai para Cuba”.

— Estamos numa democracia. Sou a favor do PT. Posso falar o que quiser — disse, ao sair escoltado por oito PMs.

Políticos estiveram no ato de Copacabana, entre eles os deputados estaduais Flávio Bolsonaro (PP-RJ) e Luiz Paulo (PSDB), o deputado federal tucano Otavio Leite e Indio da Costa (PSD-RJ). O humorista Marcelo Madureira comandou o carro de som do movimento Vem pra Rua.

Aécio vai a ato em BH: ‘Indignação é enorme’

• Serra participa de manifestação em São Paulo; Humberto Costa, do PT, chama protesto de ‘CarnaCoxinha’

- O Globo

-BELO HORIZONTE, BRASÍLIA e SÃO PAULO- Ao contrário dos protestos anteriores, que contaram com a presença de poucos políticos, as manifestações de ontem tiveram a participação de integrantes da oposição, principalmente tucanos, que também participaram da convocação dos atos. Em Belo Horizonte, o senador Aécio Neves (MG), presidente nacional do PSDB, procurou minimizar o número menor de pessoas em relação ao protesto de março dizendo que “não importa o tamanho da manifestação, porque a indignação hoje é enorme”.

Parlamentares do PT recorreram às redes sociais para comentar os protestos. O tom foi de pedido de respeito ao resultado das eleições. O senador Humberto Costa (PT-PE) ironizou o ato de Minas, chamado por ele de “CarnaCoxinha”, contrariando orientação do Planalto para evitar provocações.

A manifestação em Belo Horizonte reuniu 6 mil pessoas na Praça da Liberdade, e Aécio chegou a ser carregado e chamado de presidente por parte dos presentes.

— O Brasil vai encontrar o seu caminho pela força de sua gente, pelas manifestações que estão ocorrendo por toda a parte. Não importa o tamanho, porque a indignação hoje é enorme, maior que na época das eleições, mas o Brasil é mais forte que tudo isso. Não sei se esse governo consegue superar — avaliou.

Aécio cobrou do Tribunal de Contas da União isenção na análise das contas de 2014 da presidente Dilma Rousseff. O senador tucano disse que os tribunais não podem sofrer constrangimento:

— Estou aqui para fazer um brado das instituições. Não podemos permitir que os nossos tribunais sejam, de alguma forma, constrangidos pelo governo federal. Façam o que tem que fazer, julguem com isenção.

Na Avenida Paulista, em São Paulo, o senador tucano José Serra circulou entre os manifestantes por cerca de uma hora e não discursou:

— Estou vindo para ver qual é o sentimento das pessoas. Naturalmente, tudo tem que ser feito dentro da Constituição, das leis e das evidências — disse, ao ser perguntado se defendia o impeachment da presidente.

Outro senador do PSDB, Aloysio Nunes Ferreira (SP) participou da manifestação em Brasília e disse que seu partido apoia os protestos, embora não os lidere. Aloysio avaliou que as pessoas não estão mais aceitando a corrupção.

— O PSDB participa, apoia, mas não lidera nem tem pretensão de conduzir este movimento, que é da sociedade. O que é absolutamente indiscutível é que a população maciçamente reprova este governo. A rejeição da presidente é oceânica — afirmou.

O presidente do DEM, senador José Agripino (RN), disse no Twitter que as manifestações refletem o desejo da população: “O que eu ouvi hoje nas ruas, frente a frente com milhares de pessoas, resume fielmente o sentimento de 71% dos brasileiros que querem o fim deste governo”.

Pelo lado do governo, a orientação foi de evitar qualquer tipo de provocação. Apesar do pedido, o senador Humberto Costa (PT-PE) usou o Twitter para publicar foto de manifestantes de Minas Gerais dizendo “Não adianta isolar o Cunha. Hoje somos milhões de Cunhas”. Na legenda, escreveu: “Resumo do “CarnaCoxinha”.

O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), disse que os protestos são da democracia e pediu aos petistas que não alimentem o ódio. “Aos meus eleitores e aos que acompanham nosso trabalho: a Democracia brasileira foi construída com muita luta! Vamos defendê-la sempre. Não alimentemos o ódio contra aqueles que têm ódio e intolerância contra nosso governo. Nossa resposta: viva a Democracia e a República! Nascemos nas ruas e é com as ruas que Dilma vai seguir liderando as mudanças no Brasil! Os atos de hoje são próprios da democracia”, escreveu no microblog.

O deputado Carlos Zaratini (PT-SP) publicou foto de Dilma, com a frase “Eu brigo até a hora do voto, depois eu respeito o resultado da eleição”, pronunciada pela presidente, na última quinta, em ato com movimentos sociais. “Manifestações são democráticas e devem ser respeitadas, assim como o governo democrático da presidente Dilma”, disse, usando a hashtag “não vai ter golpe”.

Em BH, Aécio faz discurso com ataques ao governo


• Senador mineiro foi pela primeira vez a manifestação de protesto contra Dilma

Pedro Venceslau, Valmar Hupsel Filho, Gustavo Porto, Leonardo Augusto e Mônica Bernardes – O Estado de S. Paulo

Ao contrário do que ocorreu nos dois protestos anteriores, o presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), compareceu ontem a um ato em Belo Horizonte e discursou em um carro de som. Sob o comando de Aécio – que foi derrotado por Dilma Rousseff no segundo turno da eleição presidencial do ano passado –, o PSDB, pela primeira vez, havia convocado formalmente os militantes do partido a participar dos atos no País.

Desde a primeira grande onda de manifestações, no dia 15 de março, os organizadores vinham defendendo um caráter apartidário ao movimento.

Aécio escolheu a capital de Minas – Estado que governou por dois mandatos – para estrear nas ruas. Ele chegou à Praça da Liberdade, na região centro-sul da cidade por volta do meio-dia e foi recebido pelos parlamentares aliados.

“O Brasil despertou. Chega de corrupção. Meu partido é o Brasil”, disse, em rápido discurso do alto de um carro de som do Movimento Brasil Livre (MBL). O senador tucano voltou a afirmar que foi à praça como cidadão. “Meu partido é o Brasil”, afirmou. “O Brasil despertou. Vivemos em um país cidadão, onde as pessoas têm o direito de participar da construção do seu próprio destino. Venho como um cidadão indignado com a corrupção, com a mentira, com a incompetência desse governo que vem fazendo tão mal aos brasileiros, com a inflação saindo do controle, desemprego crescendo em todo o país e juros na estratosfera.”

Em São Paulo, os políticos foram mais discretos e evitaram o microfone. O senador José Serra (SP) também testou sua popularidade na Avenida Paulista e foi bastante assediado. Serra chegou por volta das 16h, no auge do evento, e circulou em torno do carro de som do grupo Vem pra Rua. O tucano fez questão de dizer que ele estava ali como o “José” (e não como senador) e exaltou a ausência de partidos políticos no ato. “Não tem governo, partido nem sindicato por trás. É imenso o grau de espontaneidade. As manifestações antigas eram bonitas, mas tinha governo, partido e patrocínio. Hoje não tem”, afirmou.

Entre selfies e abraços, ele também ouviu cobranças dos manifestantes e reclamações sobre o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, que se aproximou do Palácio do Planalto. Serra aproveitou para criticar o governo Dilma. “É injusto dizer que o governo não tem uma agenda. Tem sim: evitar o impeachment. Tudo gira em torno disso, até a agenda de viagens.”

Marcha. Sem bandeiras ou camisas do partido, militantes e políticos do PSDB se reuniram no Parque Mário Covas e marcharam até o carro de som do movimento Vem Pra rua, carregando uma grande do Brasil uma grande bandeira do Brasil. Postulantes à Prefeitura de São Paulo pela legenda tucana, o vereador Andrea Matarazzo e o empresário João Doria Jr. também circularam entre os ativistas.

O único partido que levou militantes uniformizados e distribuiu material gráfico foi o Solidarieade. Kim Kataguiri, um dos líderes do Movimento Brasil Livre, ironizou a participação de Aécio em Belo Horizonte. “Aécio subiu no nosso caminhão em Belo Horizonte. Como pode? A gente xingou tanto ele”. O MBL fez críticas ao PSDB nas redes sociais depois que o partido recuou da proposta de pedir o impeachment de Dilma no Congresso.

No interior paulista, políticos do PSDB também marcaram presença. O secretário estadual de Transportes, Duarte Nogueira, ex-presidente estadual do PSDB, participou do protesto em Ribeirão Preto (SP).

O senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), candidato a vice-presidente na chapa de Aécio em 2014, participou pela manhã da manifestação na Esplanada dos Ministérios, em Brasília. Na rampa do Congresso, ele afirmou que um processo de impeachment de Dilma “está, sobretudo, nas mãos do PMDB”, principal partido de sustentação do governo federal. “Não há divisão do PSDB sobre esta questão”, disse o senador. “O impeachment não depende exclusivamente do PSDB. A chave está, sobretudo, nas mãos do PMDB.”

"Não deixe de ir às ruas, não deixe de ir às manifestações, manifestações em defesa da democracia, manifestações em protesto ao governo e ao sistema que foi instalado no Brasil desde 2003", diz o tucano. "Manifesto em defesa da reconstrução da vida pública, da moral, da economia e da política brasileira."

Renúncia. No Recife, o deputado federal Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) defendeu a renúncia da presidente como forma de preservar o País. “A melhor decisão é a renúncia dela. Essa ficha tem que cair”, afirmou Jarbas que também criticou seu correligionário, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). “O Cunha tem que sair junto com ela (Dilma). Ou mesmo na frente dela.”

Ainda na capital pernambucana, o líder da minoria na Câmara, o deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), afirmou durante as manifestações contra a presidente Dilma Rousseff (PT) que seu partido “está pronto para se unir e apoiar um governo de coalização do vice-presidente Michel Temer”.

Pelo Twitter, o deputado federal Roberto Freire (PPS-SP) escreveu que Dilma, Lula e PT “têm futuro definitivamente comprometido” e o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) divulgou um número celular em seu perfil para envio de fotos e pediu renúncia da presidente.


Repúdio a Dilma e Lula monopoliza atos

Por Fernando Torres, Cristiane Agostine, Flavia Lima, Natalia Viri, Simone Cavalcanti, Lucas Marchesini Letícia Casado, Sérgio Ruck Bueno, Alessandra Saraiva, Cristian Klein, Renata Batista -  Valor Econômico

SÃO PAULO ,  BRASÍLIA, PORTO ALEGRE e RIO – As manifestações contra o governo da presidente Dilma Rousseff reuniram ontem 879 mil pessoas em todos os Estados da federação, além do Distrito Federal, número similar aos 701 mil registrados atos de 12 de abril, mas bem inferior aos 2,4 milhões de presentes em de 15 de março. Os números são projeções feitas pela Polícia Militar de cada estado, nas cidades em que este tipo de levantamento foi feito nas três ondas de atos.

As concentrações foram marcadas por maior presença partidária, com o comparecimento de diversos caciques tucanos e do DEM e uma mensagem clara pela renúncia ou impeachment da presidente e a investigação e eventual prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sob a alegação de que estaria envolvido na Lava Jato. Assim como ocorreu há alguns meses, o aprofundamendto da crise econômica não foi um tema presente nas manifestações. Predominaram as menções à Operação Lava-Jato, que apura o escândalo da Petrobras, e faltaram referências a problemas como inflação, desemprego e aumento das tarifas de serviços públicos.

Em São Paulo, epicentro das movimentações anteriores, compareceram 135 mil pessoas segundo o Datafolha, mais que os 100 mil de abril e abaixo dos 210 mil de março. Nos cálculos da Polícia Militar, que projetou nada menos que 1 milhão de pessoas em março, estiveram ontem na Avenida Paulista 350 mil presentes, um comparecimento mais expressivo que os 275 mil registrados em abril.

Fora da capital paulista, a manifestação com maior presença foi a de Curitiba, com 60 mil presentes, segundo divulgou a Polícia Militar local. Reduto contra o PT, a capital paranaense registrou este ano o maior distúrbio de rua no País, em uma manifestação de professores contra o governador do Paraná, Beto Richa (PSDB), em abril.

A maior manifestação em uma cidade do interior aconteceu em Ribeirão Preto (SP), outro reduto oposicionista. Protestaram na cidade 40 mil pessoas, de acordo com cálculo da Polícia Militar.

"Seja impeachment, cassação ou renúncia" era um dos lemas a dar o tom nas manifestações da Avenida Paulista. Principais grupos organizados da manifestação pela saída da presidente Dilma Rousseff em São Paulo, o Vem Pra Rua (VPR) e o Movimento Brasil Livre (MBL) tentaram afastar o estigma de que os protestos estão ligados apenas à elite. O VPR chamou para cima de seu carro de som manifestantes que vieram de cidades ou bairros mais periféricos da Grande São Paulo, como Ribeirão Pires e Capão Redondo.

"Chamam a gente de coxinha, de elite branca, mas não ligamos. A gente sabe que quem está aqui é o povo", disse aos gritos o empresário Rogerio Chequer, líder do VPR, no carro de som, antes de chamar ao microfone a líder da associação de catadores de lixo de Diadema, Maria Francisca.

Um pouco mais à frente, o MBL também rechaçava as críticas de elitização do movimento. "Querem invalidar [os protestos] nos chamando de coxinha, de elite. É o povo brasileiro que está aqui", afirmou, sob aplausos, uma das lideranças no carro de som.

Apesar da alegação de mais diversidade social nos protestos, o perfil geral dos manifestantes que tomaram a avenida era de uma maioria branca, de classe média ou alta e com a camisa da seleção brasileira ou com as cores da bandeira do Brasil.

Em Brasília, segundo a Polícia Militar do Distrito Federal, os protestos contra o governo federal reuniram cerca de 25 mil manifestantes. O número é semelhante ao apurado no protesto de 12 de abril e indica 5 mil participantes a menos do que o verificado em março deste ano.

A marcha, que se concentrou em frente ao Museu Nacional, na extremidade superior da Esplanada dos Ministérios, caminhou pacificamente até o gramado em frente ao Congresso Nacional.

Lá, os presentes foram surpreendidos por um boneco inflável enorme com a figura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva vestido com uniforme de presidiário e uma bola de ferro amarrada no pé por uma corrente.

A camisa de Lula tinha a inscrição "13-171", numa referência ao número do PT e ao artigo do Código Penal que trata do crime de estelionato. Já a bola de ferro tinha uma menção à Operação Lava-Jato.

No Rio, a presença do público tornou-se um enigma. Nem a PM e nem os organizadores divulgaram estimativas sobre presença de manifestantes na orla de Copacabana. Mas pessoas presentes avaliavam que o contingente de pessoas se aproximava mais daquele calculado em 12 de abril, quando reuniu cerca de 10 mil pessoas, segundo a PM, e entre 20 e 25 mil pessoas, de acordo com os organizadores. Na primeira grande manifestação, em 15 de março, a PM estimou em 15 mil pessoas, e os líderes da mobilização em 100 mil pessoas.

Ainda na capital fluminense, assim como em São Paulo, o VPR ajudou a recolher assinaturas em prol de campanha nacional com propostas de mudanças na legislação para melhorar prevenção e combate à corrupção e impunidade. A campanha, lançada pelo Ministério Público Federal (MPF) e é batizada de "Dez Medidas Contra a Corrupção", e tem objetivo coletar 1,5 milhão de assinaturas em todo o país para que as propostas cheguem ao Congresso Nacional, por meio de um projeto de lei de iniciativa popular.

Em Porto Alegre, a manifestação chegou a reunir 30 mil pessoas neste domingo, informaram a Secretaria da Segurança Pública do Rio Grande do Sul (SSP) e a Brigada Militar (BM). O número ficou abaixo dos 35 mil manifestantes do último protesto, realizado em abril, e dos 100 mil que haviam participado da primeira passeata, em março. Um dos coordenadores do Movimento Brasil Livre no Estado, o advogado Christiano Huber, discordou das avaliações oficiais e disse que cerca de 50 mil pessoas estiveram no ato de ontem, apesar do tempo fechado e de algumas pancadas de chuva.

Para o cientista político André César, sócio-diretor da Hold Assessoria Legislativa, a manifestação de ontem mostraria falta de capacidade política da oposição em capitalizar a rejeição crescente de Dilma. "À oposição falta uma cara, falta identificação, falta uma proposta factível e isso se reflete no cansaço das pessoas desse processo", disse.

Para César, o fato de o senador Aécio Neves (PSDB-MG) ter se apresentado no ato que ocorreu pela manhã em Belo Horizonte e não ter falado como representante do partido, mas como "mais um brasileiro" foi uma sinalização neste sentido.

Planalto vê imagem de Dilma ‘colada’ na corrupção

• Avaliação é que atos reforçaram vinculação da presidente ao desgaste enfrentado pelo PT e que o PSDB conseguiu ‘partidarizar’ movimentos

- Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - As manifestações contra o governo, em 26 Estados e no Distrito Federal, acenderam o sinal amarelo no Palácio do Planalto. A avaliação foi a de que os protestos conseguiram "colar" a imagem da presidente Dilma Rousseff e de seu padrinho, Luiz Inácio Lula da Silva, ao escândalo de corrupção da Petrobrás, principalmente na classe média. O governo acredita, ainda, que o PSDB "partidarizou" os movimentos, na tentativa de fazer avançar a tese do impeachment.

Em reunião com ministros que compõem a coordenação política, à noite, Dilma disse considerar que a população, embora insatisfeita, não vai apoiar iniciativas "golpistas". Mesmo assim, o diagnóstico foi o de que o governo enfrenta muitas dificuldades para vencer a batalha da comunicação e precisa tomar medidas de impacto para mostrar que entende o recado das ruas. Uma reforma administrativa, com corte de ministérios, está em estudo, mas Dilma ainda não bateu o martelo sobre o novo desenho da equipe.

Chamaram a atenção de ministros, nas manifestações de ontem, os bonecos de Dilma vestida de "irmã metralha" e do ex-presidente Lula com roupa de presidiário e a inscrição 13-171. Todos ali ficaram convencidos de que o desgaste do PT grudou não só em Lula como também em Dilma. Um auxiliar da presidente lembrou que o boneco de Lula custou caro (cerca de R$ 12 mil) e pode ter sido pago pela oposição.

A percepção do núcleo político foi a de que Dilma não conseguiu, até agora, transmitir a ideia de que a Operação Lava Jato, da Polícia Federal - responsável por desvendar o esquema de corrupção na Petrobrás - vai passar o País a limpo. Ao contrário: os protestos mostraram que a operação da Polícia Federal nocauteou o governo, Lula e o PT.

O senador Aécio Neves (MG), presidente do PSDB e candidato derrotado na disputa de 2014, foi muito criticado na reunião do Palácio da Alvorada. Ministros disseram que Aécio e os senadores tucanos Aloizio Nunes Ferreira (SP) e José Serra (SP) tentaram "faturar" em cima das manifestações.

Para evitar "panelaços" e esvaziar a repercussão dos protestos, todos foram orientados a não dar entrevistas após o encontro com Dilma, que durou quase três horas. Coube ao titular de Comunicação Social, Edinho Silva, emitir um curto comentário sobre os atos.

"As manifestações de hoje (ontem) atestam a normalidade democrática no Brasil", disse Silva. "O governo mantém sua agenda de trabalho para, em breve, o País voltar a crescer, gerando emprego e distribuindo renda."

No início da reunião, ministros avaliaram que os protestos deste domingo foram menores do que os ocorridos em abril. A Polícia Militar, porém, divulgou números indicando que o movimento foi maior.

Dilma reunirá nesta segunda-feira o vice Michel Temer e a coordenação política ampliada de governo para analisar o cenário no "day after" das manifestações. A ordem no Planalto é bater na tecla de que o governo tem "humildade" para admitir os erros. No diagnóstico de ministros ouvidos pelo Estado, a crise arrefeceu, mas está longe de acabar e o governo precisa tomar cuidado para não demonstrar soberba num momento em que os problemas na política prejudicam ainda mais a economia. Desta vez, porém, as manifestações deixaram de lado o ajuste fiscal.

Para o núcleo político do Planalto, Dilma acertou, nos últimos dias, ao sair do gabinete para defender sua gestão, apontando os riscos de uma ruptura nas regras do jogo. Com a popularidade em queda livre, Dilma só ganhou fôlego nos últimos dias após fazer acordo com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que divulgou a "Agenda País" e desviou o foco da turbulência e do ajuste fiscal. De quebra, isolou o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Ao cumprir a estratégia para se reaproximar dos eleitores perdidos, Dilma esteve no Maranhão e na Bahia, na semana passada, para inaugurar obras. Não foi só: tomou café da manhã com empresários, jantou com senadores aliados e integrantes do Judiciário e se reuniu com movimentos sociais dois dias seguidos. Em conversas reservadas, ministros afirmam que Dilma errou no passado ao não dialogar com os vários segmentos da sociedade e também com aliados do PMDB. "Mas agora a ficha caiu", constatou um de seus auxiliares.

Protestos ligam Lula a esquema de corrupção

• Ex-presidente divide com Dilma e PT o posto de principal alvo dos manifestantes; boneco gigante marcou ato na capital federal

Pedro Venceslau, Valmar Hupsel Filho, Roberta Pennafort, Vinícius Neder e Danielle Villela – O Estado de S. Paulo

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi um dos principais alvos de protestos neste domingo no País. Em Brasília, um enorme boneco inflável dele vestido com uniforme de presidiário foi levado até a Esplanada dos Ministérios. Nas demais capitais e em cidades do interior, faixas e cartazes responsabilizavam Lula pela crise e o associavam ao esquema de corrupção da Petrobrás, investigado pela Operação Lava Jato.

Na avenida Paulista, epicentro dos protestos em São Paulo, as palavras de ordem contra Lula foram muitas. Muitos participantes levantaram cartazes e faixas com imagens dele vestido de presidiário e entoaram palavras de ordem acusando o ex-presidente de ser “chefe de quadrilha”, “bandido” e “corrupto”. O ex-presidente Lula, conforme já afirmou o Ministério Público, não é um dos investigados pela Lava Jato.

No carro de som da Aliança dos Grupos Democráticos, organização que reúne diversos grupos anti-Dilma, Lula foi chamado de “ladrão” por diversos oradores, que entoaram o mote: “O povo anseia, Lula na cadeia”. “A indignação com o ex-presidente está cada vez mais forte. O nome dele foi citado em quase todos os discursos”, diz Carla Zambelli, porta-voz da Aliança. “Nós defendemos que o Lula vá para a cadeia”, completou Marcelo Reis, líder do Revoltados On Line.

Como contraponto, também em São Paulo, um grupo de militantes petistas e sindicalistas promoveu uma “vigília” em defesa de Lula em frente ao instituto que tem o nome dele, no bairro do Ipiranga, zona sul.

Em Brasília, o boneco “Lula Inflado” teve perfis criados no Twitter e no Facebook e virou “meme” na internet, com diversas fotomontagens humorísticas. Entre elas, uma na qual aparece ao lado dos “bebês-mamíferos” da Parmalat e outra entre princesas da Disney. No perfil do Twitter, “Lula Inflado” está em uma foto com o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT).

Rio. No Rio, o “Fora Lula” foi tão ouvido quanto o “Fora Dilma” na manifestação na orla da Praia de Copacabana, na zona sul da cidade. O nome e a foto do ex-presidente apareceram em muitos cartazes, e seu governo foi tachado de “corrupto”, “comunista” e “inimigo do Brasil”, e acusado de ter levado o Brasil “ao buraco”.

“A gente tem que colocar tudo no mesmo bolo. Dilma é menos qualificada que o Lula em termos de palanque, de discurso, e as pessoas ainda ficam com peninha do Lula. Mas é tudo a mesma coisa. Ela deu continuação ao que o Lula começou”, afirmou Dênis Abreu, do Cariocas Direitos, referindo-se às denúncias de corrupção. O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, e o prefeito da capital, Eduardo Paes, ambos do PMDB, também foram criticados, por serem aliados da presidente Dilma Rousseff.

Um funcionário público natural de Fortaleza simpático a Lula e a Dilma foi agredido por manifestantes e precisou de escolta policial para não se proteger. Ele vestia uma camiseta vermelha e gritou “Lula 2018”, no meio do ato. O homem, que não quis se identificar, foi xingado de “ladrão” e levou tapas dos mais exaltados, que o seguiram até a Avenida Nossa Senhora de Copacabana, onde PMs o colocaram em um táxi.

“Eu tenho direito de falar o que quiser: sou favorável à Dilma e ao Lula. Você acha que a elite branca que está aqui vai aceitar isso?”, disse. Um grupo de cerca de 20 pessoas deixou a manifestação e, apesar do cerco policial, continuou a xingá-lo pelas ruas.

Atos demonstram personificação do combate aos desvios

• Cientistas políticos debatem sobre as manifestações deste domingo na TV Estadão, confira

O Estado de S. Paulo

Foco maior em dois personagens, o juiz Sergio Moro e o ex-presidente Lula, foi um dos destaques observados nas manifestações deste domingo, 16, pelos cientistas políticos Carlos Melo e José Álvaro Moisés. Em debate transmitido ao vivo direto do estúdio da TV Estadão, em São Paulo, os cientistas políticos interpretaram os principais eixos das manifestações que tomaram as ruas do País ontem.

Segundo os acadêmicos, o juiz federal Sergio Moro tornou-se uma personificação do combate à corrupção. “Eu vi cartazes citando Moro e Joaquim Barbosa. Temos uma crise de liderança no Brasil. Ao nível da Justiça Federal, do Ministério Público e da Polícia Federal estão surgindo figuras jovens que querem dizer que não são convientes com um tratamento da lei que permite desmandos, desvios e corrupção. Há sinais de um inicio de uma mudança”, enfatizou José Álvaro Moisés, professor titular de ciência política da USP.

“Processos políticos são processos históricos, não se resolvem em uma semana”, explicou Carlos Melo, pesquisador e professor do Insper. “A Revolução Francesa começou provavelmente uns 30 anos antes do dia 14 de julho de 1789. É um processo de longo prazo e a gente está no meio deste caldeirão”, completou Melo.

Já o ex-presidente Lula voltou a ser alvo dos protestos porque a investigação da Operação lava Jato tem se aproximado de assuntos relacionados a ele. “Para chegar à Dilma seria preciso remover um obstáculo político importante que é o ex-presidente Lula”, ressalta Moisés. “Do ponto de vista histórico é um momento que dói, mas que é extraordinário”, concluiu o professor Carlos Melo.

Dilma ganha fôlego, mas pressão vai continuar

Por Rosângela Bittar – Valor Econômico

BRASÍLIA - O governo já estava impregnado da sensação, na sexta-feira que antecedeu as manifestações do dia 16, depois de agitado percurso de quatro meses e epicentro em julho, de que obtivera uma trégua. Sentiu arrefecer a pressão política que vinha sentindo de maneira insuportável.

As manifestações de ontem, já era esperado dois dias antes, poderiam ser gigantescas em número, ou menores que as anterior, mas, como alvos da crítica, as autoridades se convenceram que mudou o ambiente.

A presidente Dilma Rousseff considerou-se salva por uma concertação de ações, conversas e argumentos registrados nas atas políticas. Não houve um coordenador geral nem um único responsável por fazer o ar circular no Palácio do Planalto. Mas foram movidos os acordes do Executivo, do Legislativo, do Judiciário, do empresariado, e das autoridades internacionais, inclusive.

Como assinala um bombeiro da crise, "os fatos aconteceram e geraram consequências". Não dá para apontar um autor. Sabe-se que a participação dos agentes do governo, por desgastado, foi a menor. A presidente Dilma Rousseff tem dois coordenadores políticos, braços direito e esquerdo, os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil) e José Eduardo Cardozo (Justiça). Costuma ouvir nas questões políticas os ministros Jaques Wagner (Defesa) e Aldo Rebelo (Ciência e Tecnologia). Dá missões a um ou outro auxiliar com ascendência sobre um ou outro segmento, como a mídia, os governadores, os movimentos sociais. Mas não foi ela, no comando dessa rede, o gênio da política nem sua algoz.

Os sinais foram surgindo na sociedade, em momentos e locais distintos, e na economia os agentes se mobilizaram muito e primeiro. Quando a presidente Dilma foi aos Estados Unidos, Tim Geithner, William Rhodes, Thomas Shannon demonstraram ao governo, ao contrário da hostilidade esperada, preocupações candentes com a queda da economia brasileira. Aqui está o terceiro mercado dos investidores americanos, que gostariam de continuar a ter onde aplicar. Em períodos mais recentes, os embaixadores dos Estados Unidos e da Alemanha, acreditados em Brasília, expuseram ao governo as preocupações dos seus representados e colocaram à disposição as boias possíveis.

Os presidentes do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, e do Itaú, Roberto Setubal, foram à luta, aproveitando entrevistas e discursos para pedir moderação, não apenas em apoio a medidas da economia, mas à própria figura da presidente da República. Setubal, em uma inauguração do centro de processamento de dados da instituição que preside, por volta de abril, diante do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e para surpresa do político, embutiu em seu discurso público a disposição em ajudar. Estava tocado pelas fortes manifestações de março.

Paulo Skaf, da Fiesp, e Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira, pareceram em certo momento insufladores do golpe da troca da Dilma pelo vice Michel Temer, com quem se reuniram, mas a leitura correta, hoje feita no governo, é que estavam respondendo ao apelo de Temer: "Me ajudem a ajudar". Com o empresariado da indústria e da agricultura, com governadores e formadores de opinião, destaca-se na avaliação da concertação na sociedade o papel do ex-ministro Delfim Neto.

"Era uma junta médica querendo ajudar o paciente quando todos já o haviam desenganado", diz um intérprete. Entre empresários e banqueiros, chegou-se logo à constatação de que se já estava alto o preço com Dilma, maior seria sem ela.

A salvação veio em capítulos, e ao lado da economia, que precipitou a crise e dominou o seu ápice, seguiu funcionando em paralelo o motor da política.

O governo reconhece, num raro mea culpa, que errou muito na política, mas registra que seus adversários erraram mais. Entre eles, e principalmente, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). "Governo é como cobra. Se estiver morto no meio da estrada não se deve chegar perto", diz interlocutor da presidente. Cunha chegou. Na avaliação interna, resolveu enfrentar o governo e desafiar o Ministério Público, em seguida partiu para cima de Renan Calheiros (PMDB-AL), o presidente do Senado, e quem mais viesse. Diz o adágio popular que quem não deve não teme. Para o governo, Eduardo Cunha não quis provar que não devia, resolveu provar que não temia para as pessoas acharem que não devia. E o fez desafiando nada menos que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Contra o governo, e na visão do governo, abriu-se na Câmara uma pauta com a votação de projeto de reajuste generalizado e em cascata que acabaria com o ajuste fiscal em segundos. O empresariado se convenceu dos malefícios da iniciativa, bem como os governadores e os prefeitos. Supostos aliados de Cunha alertaram que todas as corporações do país, federais, estaduais e municipais, queriam entrar na PEC do reajuste dos advogados da União.

Cunha disse ao Valor, em uma entrevista publicada na sexta-feira, que há momentos em que a pressão para votar um projeto é irresistível, e que o próprio Michel Temer, quando presidente da Câmara, colocou em votação a PEC 300, do reajuste das polícias. O governo constata que é verdade, porém muitos outros instrumentos de criação de despesas foram engavetados por presidentes da Câmara aliados, comprometidos com as contas.

Na política, foi extenso e complexo o capítulo Michel Temer, cujas declarações à procura de alguém para coordenar a união do país foram mal interpretadas. O que se queria não era tomar o poder, mas dar poder ao vice, explica-se agora. Era para ele ser um lider informal, e perdeu tempo nas explicações sobre o significado de seu discurso.

Tirar Dilma por Michel jogava a eleição de 2018 em dois resultados ruins, de convulsão do país, precocemente. Numa disputa entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o senador Aécio Neves (PSDB-MG), divagam próceres do governo, "seria catastrófico Lula ganhar, ou Lula perder. Como Aécio iria governar?" Os movimentos a favor de Lula iriam para a rua em 24 horas: têm dinheiro, organização, tempo. Seria impossível o presidente eleito assumir.

Os governadores do Nordeste já haviam se manifestado a favor da presidente, em carta. O do Rio Grande do Norte chegou a dizer que quebraria; e os da oposição, entre eles Geraldo Alckmin, Beto Richa (PR) e Marconi Perillo (GO), fugiram do cenário do impeachment da presidente Dilma. Alckmin, registram os relatores da saga, compareceu a diferentes solenidades, em Mato Grosso do Sul, em Pernambuco, no interior de São Paulo, em todas fazendo o discurso da legalidade, serenando os ânimos.

O sangramento de Dilma, tática que a certa altura se confundiu com a ideia do impeachment, demorou a ser notado em sua gravidade. Quando todos se deram conta que a estavam levando à morte e não ao enfraquecimento, viu-se que era preciso dar força a ela e a Temer para conseguirem aprovar medidas para reerguer a economia.

Quando o presidente do Senado percebeu o que ocorria, pensou com os seus amigos senadores: "Se vai depender do Michel, que dependa de mim". Renan sempre achou que Temer tem poder demais. E começou a fazer os movimentos para segurar a presidente no cargo e ocupar o espaço bruto do desgaste de Cunha e do que considerava a pretensão salvadora de Temer. Como as medidas do ajuste estavam no Senado e do presidente da Casa dependiam importantes iniciativas das quais o governo precisa para sobreviver, foi fácil para Renan embainhar novamente a espada.

Para se capitalizar, Renan não precisou usar a sua já notória influência no Tribunal de Contas da União. Ali o governo já notara que, com as denúncias atingindo alguns ministros, o combate estava apenas concentrado em Augusto Nardes, que, nesta avaliação, tendo projetos políticos e eleitorais no Rio Grande do Sul, levaria o foco de luz até onde pudesse.

O governo notou que o Judiciário como um todo, onde vinha fazendo maioria folgada, reconheceu que não dá para colocar nas suas costas a responsabilidade de tirar um presidente da República contra quem não há nenhuma denúncia de desonestidade.

A discrição do Judiciário e sua presença efetiva na operação culminaram com o despacho do ministro Luiz Roberto Barroso, na noite de quinta-feira, retirando das mãos de Eduardo Cunha e passando às de Renan Calheiros a prerrogativa de, como presidente do Congresso, agendar a votação das contas do governo. Essa iniciativa não agradou Renan, como registra momento de bom humor da conversa política sobre a crise, porque a glória da ação protetora ficou agora com o Supremo Tribunal Federal, quando o presidente do Senado já se preparava para engavetar espetacularmente as contas da presidente Dilma.

A metáfora: estavam todos assoprando na mesma direção, o fogo pegou finalmente na sexta-feira, o ambiente melhorou. A realidade: nada está resolvido. A situação da economia é dificílima, mas foi dado à presidente fôlego político para retomar o governo e negociar a aprovação de medidas no Congresso.

Mesmo com atos, Dilma ganhou fôlego, dizem analistas

• Cientista político diz que o ‘alivio para o governo vem menos do refluxo das manisfestações’, mas por ter conseguido melhorar a articulação

Por Thiago Herdy – O Globo

SÃO PAULO — Cientista político da FGV, Claudio Couto afirma que as manifestações deste domingo demonstram que a presidente Dilma Rousseff conseguiu ganhar fôlego. O motivo, para ele, se deve a articulação política da presidente realizada na última semana junto ao Congresso. Ainda para Couto, mesmo com a adesão menor que em 15 de março, as manifestações estão concentrando um grande número de pessoas, e devem ser observadas com cautela.

O GLOBO: Qual é o reflexo dos atos para o governo?

Claudio Couto: Dilma ganhou fôlego, não por causa da manifestação, mas porque melhorou a articulação política junto ao Congresso. Ela conseguiu melhorar o clima, afinal de contas, temos hoje um homem bomba na Câmara, que é o Eduardo Cunha. A crise começa na Dilma, claro, ela é o centro da política nacional. Mas, o grande nome da crise é o Cunha.

As manifestações perderam força?

A questão numérica tem que ser olhada com cautela. Os números criaram uma armadilha, que é o paradoxo do sucesso. Como a de 15 de março foi muito grande, tudo que vem depois acaba sendo percebido como fracasso, o que não é correto. Não são do mesmo tamanho, mas ainda são muito grandes. O alívio para o governo vem menos do refluxo das manifestações, mas do fato de ele se articular melhor dentro das instituições públicas.

Foi a primeira vez que o Aécio Neves (PSDB) participou. Qual o significado?

É consistente com aquilo que ele defende na tribuna. Se ele acredita no afastamento da presidente, era de se esperar que se fizesse ali. Não ter sido mal recebido é sinal de que os movimentos não veem de maneira tao negativa, como no passado, a presença de liderança política.

Qual é o beneficio para ele?

Ele fala para convertidos. Mas se tornar o escolhido dos convertidos não é ruim, pode posicioná-lo na disputa interna no PSDB. É um jogo de risco, depende do que acontece daqui pra frente.

Há espaço de diálogo, ainda que mínimo, dos movimentos com o governo?

Nenhum. O grupo pede a saída do governo.

Foi a primeira vez que houve manifestação no Instituto Lula. É contraponto?

Querem trazer a militância para perto e chamar a atenção para um episódio muito sério, que foi a bomba jogada contra o instituto. Mas, perto das manifestações, foi muito pequeno. Não tem capacidade de fazer contraponto real.

Qual é o fôlego dos movimentos?

Se a presidente conseguir um acerto dentro do sistema político institucional que lhe garanta sobrevivência, as mobilizações de rua tendem a esfriar. Isso, é claro, se não tivermos grande revelação nas investigações da Lava-Jato que represente reviravolta.

• Para o cientista político, governo ganhou ‘sobrevida’ e protesto passou a ter mais claramente o combate à corrupção como mote

SÃO PAULO — O cientista política e professor da FGV-SP, Oscar Vilhena, acredita que o governo da presidente Dilma Rousseff ganhou sobrevida nos últimos dias, e os protestos passaram a ter mais claramente o combate à corrupção como mote.

O GLOBO: Qual o reflexo das manifestações para o governo?

OSCAR VILHENA: Os últimas semanas, o governo conseguiu diversos apoios: atraiu uma parcela do PMDB e setores da economia e da imprensa, que entenderam que há uma saída política que passa pela governabilidade. Houve ainda o adiamento da decisão do TCU (Tribunal de Contas da União) sobre as contas da presidente, o pedido de vista do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), que adia decisão sobre o pedido de cassação da chapa Dilma/Temer, e o Supremo decidindo que as contas presidenciais terão que ser analisadas pelo Congresso e não só pela Câmara. Além disso, Dilma foi ao encontro da fala de (Michel) Temer, que disse ser preciso “alguém” para reunificar, e de Renan (Calheiros, presidente do Senado), que propôs uma agenda. Essa reconstrução da base, essa reorganização tira um pouco da energia das manifestações.

É como se o governo ganhasse fôlego?

Sim, ganhou sobrevida, mas a situação não é simples. Tanto (Eduardo) Cunha, que preside a Câmara, e é visto como um aliado por parte dos manifestantes, quanto Renan, que agora é visto como traidor, estão implicados na Lava-Jato. No mais, a agenda do Renan não é a agenda da CUT, assim como setores sociais querem coisas distintas do empresariado. Mas como não há grupo político para solucionar os impasses criados por Dilma, ela ganha espaço para solucioná-los. Mesmo tendo que conciliar interesses contrapostos.

Há um fio condutor nos protestos?

Parece claro que passaram a ter um tom mais específico de combate à corrupção, de apoio ao juiz (Sérgio) Moro e respaldando instituições como a Polícia Federal e o Ministério Público. Há um certo grau de consenso em relação a esses temas. E vimos a presença mais contundente do ex-presidente Lula. O “Fora, Dilma”, o apoio ao impeachment e o “Fora, PT” já estavam presentes nos outros protestos. Lula apareceu agora, talvez, também por conta da Lava-Jato. Havia um certo resguardo em relação a ele, mesmo no mensalão houve dissociação. Agora, parecem associar o PT ao Lula e aos atos de ilegalidade.

Neste domingo, pela 1ª vez, Aécio Neves (PSDB-MG) esteve numa manifestação.

Vejo a entrada do Aécio nos protestos como tardia, e ele não participou como líder, mas como cidadão. E escolheu Belo Horizonte, que é um palanque menos visível que São Paulo, Rio ou Brasília. A oposição não tem se apresentado com clareza como uma alternativa de poder.

‘Vão arrumar uma saída para esta crise, mas outras vão aparecer’, diz historiador

• Para o historiador José Murilo de Carvalho, o País tem hoje um Executivo paralisado por incompetência, Congresso irresponsável, PT desmoralizado, oposição oportunista. E, apesar dos protestos nas ruas , há no ar “um cheiro de pizza”.

Gabriel Manzano – O Estado de S. Paulo

Atento às vozes que ontem bradavam “Fora Dilma” e “Fora PT” e aplaudiam a Polícia Federal e o juiz Sérgio Moro em manifestações por todo o País, mas ciente dos recentes acertos entre governo, tribunais e o Senado para garantir no cargo a presidente Dilma Rousseff, o historiador José Murilo de Carvalho diz sentir um “cheiro de pizza indo ao forno”. Isso , porém, não muda o cenário da crise brasileira, afirma. “Vão arrumar uma saída para esta, mas outras crises vão aparecer”.
Do alto de seus 50 anos de janela – de idade, são 75 – ele recorre à ironia para comparar a crise de hoje com outras mais antigas e famosas. Em1954, “tudo terminou em tragédia (o suicídio de Getúlio Vargas)”. Em 1964, só não foi pior por causa da “pequena disposição de luta do presidente (João Goulart)”. Em 1992, “tivemos uma opereta (a saída de Fernando Collor)”. Hoje, “temos um drama sem nenhuma grandeza”.

Por que sem grandeza? Porque “em tese, a melhor saída seria a renúncia da presidente e sua substituição pelo vice”. Mas ele não se ilude: “Nada sugere que ela possa ter a grandeza cívica de colocar o interesse nacional acima de sua vaidade”.

Imortal na Academia Brasileira de Letras, integrante da de Ciências, Zé Murilo, como o chamam os amigos, é titular de História da UFRJ e escreveu clássicos como Os Bestializados e Cidadania no Brasil. Neste balanço sobre o País, ele resume: “Se estivéssemos no parlamentarismo, já teríamos outro primeiro-ministro. Mas o que se vê é que estamos longe, ainda, de ser uma república democrática sustentável”. A seguir, a entrevista.

Acha que as manifestações de ontem alteraram alguma coisa no cenário político?

Tudo indica que levaram menos gente às ruas, mas continuam sendo um fenômeno nacional – foram 25 Estados – e desta vez com foco mais definido: em Dilma, no PT e na corrupção. Não reforçaram, nem reduziram, o movimento por impeachment. Com isso, as instituições – TCU, STF, Senado — e organizações empresariais – podem sentir-se encorajadas a levar a pizza ao forno. Mas o curso dos acontecimentos continua a depender das investigações do Ministério Público e da Polícia Federal e do novo herói nacional, Sérgio Moro.

Que comparação o sr. faz entre essa crise e outras famosas da nossa História?

Se caracterizarmos crise como coincidência de corrupção, estagnação econômica, chefe de Estado impopular e acuado politicamente, é possível sim, até onde alcança minha memória, lembrar as crises de 1954, 1964 e 1992. Em 1954, pela têmpera moral do presidente (Getúlio Vargas), tudo terminou em tragédia. Em 1964, poderia também ter terminado em tragédia pessoal e nacional, com guerra civil, não fosse pela pequena disposição de luta do presidente (João Goulart). Em 1992, tivemos uma opereta (com Fernando Collor). Hoje, por enquanto, temos um drama sem nenhuma grandeza, sem que se possa adivinhar o desenlace. A importante diferença entre as duas primeiras crises e as duas últimas é que nestas está ausente o pretorianismo, cabendo às forças civis se responsabilizarem totalmente pelo resultado.

Que elementos se juntaram para chegar ao que temos hoje?

Generalizando, pode-se dizer que a combinação de presidencialismo e voto proporcional, que facilita a multiplicação de partidos, em países de recente expansão do eleitorado e sem partidos consolidados, constitui receita segura para crises. O início da democratização do voto data de 1945 – e os partidos mais antigos, do governo militar. A expansão do eleitorado e a falta de barreiras ao aumento do número de partidos transformaram a criação dos últimos em bom negócio. Chegamos ao que se chamou de presidencialismo de coalizão, depois de cooptação, hoje mais adequadamente descrito como de mensalão, ou petrolão, todos instáveis. Daí me parecer que, passada a crise atual, virão outras. É maldição que afeta quase toda a América ibérica.

As instituições estão funcionando bem, os militares nos quartéis, a imprensa atua sem restrições. O que foi que não funcionou? É um sinal de que a democracia tem seus limites e só ir às urnas votar não basta?

É verdade, e eu acrescentaria que também estão funcionando bem o Ministério Público, graças à independência que lhe deu a Constituição de 1988 e à nova geração de procuradores que se formou depois, o Judiciário, após a sacudidela que lhe deu Joaquim Barbosa, e a Polícia Federal, que parece estar deixando de ser pau mandado do ministro da Justiça. E mais ainda: a punição dos responsáveis pelo mensalão, acoplada aos resultados até agora exibidos pela Operação Lava Jato, representa pequena revolução em nossa tradição de impunidade dos poderosos. Mas o Legislativo e o Executivo, e junto os partidos políticos, estão longe de um funcionamento satisfatório. Temos um Executivo paralisado por incompetência e arrogância de sua chefe, um Congresso irresponsável, um partido do governo desmoralizado pelas denúncias de corrupção e uma oposição oportunista. Não é bom. Estamos ainda longe de uma república democrática sustentável.

Grandes manifestações do passado contra a ditadura, como a Passeata dos 100 Mil no Rio ou as Diretas Já, tinham um país inteiro unido contra o governo. Hoje não há ligação dos protestos com as instituições políticas. Como resolver isso?

As manifestações de junho de 2013 foram sintoma da corrosão da legitimidade do sistema representativo. É uma ironia, se nos lembrarmos de que nunca houve tantos brasileiros votando como agora. Passados dois anos das manifestações de 2013, nada foi feito para responder ao que pediam as ruas – essa interlocução não avançou além da retórica. Os partidos mantiveram suas práticas, as eleições continuaram a ser financiadas por dinheiro suspeito, as campanhas se mantiveram sob o comando dos marqueteiros. O resultado da última eleição foi adequadamente considerado estelionato eleitoral, o que lhe tira a legitimidade, embora não a legalidade. A natureza fragmentada e antipolítica do movimento de 2013 também não ajudou. O problema da representatividade do sistema político continua a ser uma pedra no caminho.

Além da crise existencial que abalou o PT, temos hoje uma sociedade complexa, globalizada, com desafios para os quais a esquerda, de modo geral, não tem conseguido dar respostas – veja-se a Grécia e a Espanha. Quanto do enfraquecimento do PT é fruto de erros e abusos de seus líderes e quanto de uma crise de identidade das esquerdas?

As esquerdas antigas, categoria em que se enquadra a nossa, sempre foram marcadas pelo estatismo, pela alergia ao mercado e à iniciativa individual. Entre nós, ela acoplou ao estatismo a tradição clientelista e patrimonialista. São traços presentes no PT, em convivência com a preocupação tradicional das esquerdas com a promoção da igualdade social, mesmo com arranhões à liberdade. No governo Lula, o estatismo não pôs em risco conquistas importantes da política econômica e concentrou-se na promoção da política social, não sem, ao mesmo tempo, patrocinar práticas clientelistas e antirrepublicanas já devidamente punidas. Creio que a crise do PT tem mais a ver com atraso ideológico, falta de criatividade e mau diagnóstico da realidade brasileira – sem esquecer, naturalmente, os malfeitos – do que com o exemplo das esquerdas europeias que, pelo menos, estão tentando renovar-se. A esquerda do PT ainda apoia o bolivarianismo e o castrismo. É patético. Lembra a frase do Millôr (Fernandes, jornalista carioca falecido): as ideologias, quando ficam velhinhas, vêm morar no Brasil.

Como outras vozes, o sr. acha que a melhor saída é a renúncia da presidente e sua substituição pelo vice. Por quê?

Porque pouparia à nação os traumas de um eventual processo de impeachment e de uma eventual nova eleição – que, tão próxima da última, se faria em clima de guerra e dificultaria o governo do vencedor, adiando as medidas de recuperação da economia. Dos peemedebistas, pode-se dizer tudo, menos que não sabem fazer política. O vice, como já revelou em ato falho, poderia costurar um arranjo político que destravasse o governo, apaziguasse o Congresso, facilitasse a aprovação das medidas econômicas corretivas e arrastasse o país até 2018. O PSDB não precisaria enfrentar outra guerra eleitoral e, se vencedor, descascar o abacaxi plantado pelo governo Dilma. O PT se livraria do imbróglio criado por Dilma, poderia lamber as feridas em paz e se reinventar, como propôs o próprio Lula.

E continuaria em cena o presidencialismo de coalizão.

Sim, o problema com esta solução é que o presidencialismo valoriza excessivamente a personalidade dos presidentes, como em 1954, 1961, 1964, 1992. Getúlio reagiu à crise matando-se, Jânio montou a farsa da renúncia, João Goulart fugiu, Collor tentou uma bravata ridícula. No parlamentarismo, já teríamos outro primeiro ministro. A recusa da atual presidente de admitir os erros elementares que cometeu, sua inapetência para o diálogo, sua fixação na imagem de guerrilheira, nada disso sugere que possa ter a grandeza cívica de colocar o interesse nacional acima de sua vaidade. Daí que, realisticamente, pode-se esperar uma saída de acomodação, de arreglo. O TCU já ensaia uma pedalada legal. O Senado já está pedalando. Só falta o STF entrar na dança. Em vez de drama ou tragédia, podemos ter outra opereta barata.

Como historiador experimentado, que já viu tantos altos e baixos, pensando no futuro o sr. está mais para esperançoso ou para desalentado?

Guardo algumas lembranças desde a crise de 1954, depois revistas em parte pelo estudo. Não há como não reconhecer que o País mudou radicalmente nos últimos 70 anos. Mudou, sobretudo, devido à entrada do povo na política, pelo voto e pelas ruas. Mas a sensação principal que guardo, talvez muito influenciada pelo momento atual, é a de ter vivido um processo de ciclotimia nacional, de idas e vindas, de avanços e recuos, de esperança e desalento. O País parece ter grande capacidade de se auto-sabotar. Parecemos incapazes de um esforço concentrado e persistente em torno de objetivos comuns que nos poderiam colocar entre os países capazes de combinar liberdade política e igualdade social. Lembro-me aqui de uma frase de Euclides da Cunha: “Estamos condenados à civilização: ou progredimos ou desaparecemos”. O risco é que não aconteça nenhuma das duas coisas.