quarta-feira, 26 de julho de 2023

Vera Magalhães - Desarmar é preciso, mas não é simples

O Globo

Lobby no Congresso a favor da permanência da autorização para acesso a determinadas armas por civis é gigante e tem patronos de peso

O pacote de projetos e decretos na área de Segurança e Justiça lançado pelo governo na semana passada mira duas das mais nefastas heranças do bolsonarismo: o armamentismo sem freios promovido pelo ex-presidente e as ameaças à democracia por ele incentivadas e que levaram a atos como os do 8 de Janeiro. Nos dois casos, será necessário um encontro de contas nada simples entre o governo eleito com a promessa de literalmente desarmar essas bombas e um Congresso cuja disposição para tal agenda ainda não está clara.

A reação aos dois Projetos de Lei que mexem em penas para crimes contra agentes públicos e o próprio Estado Democrático de Direito e ao decreto que estabelece regras mais duras para o porte e a posse de armas, o funcionamento dos clubes de tiros e as normas para colecionadores, atiradores desportivos e caçadores ainda está sendo construída nos bastidores, dado o período de recesso parlamentar.

Elio Gaspari - O Cristo de Lula volta ao palácio

O Globo

A imagem conta uma história de tempos estranhos

Lula recolocou em seu gabinete a imagem do Cristo Crucificado de 1,50m com a qual conviveu por oito anos. A história da peça fala dos tempos estranhos que o Brasil viveu.

Ela foi presenteada a Lula pelo empresário José Alberto de Camargo, que a havia comprado por R$ 60 mil ao bispo de Caxias (RJ), Dom Mauro Morelli. Estava bastante maltratada e em 2003 foi para os cuidados de Antonio Fernando Batista, do Iphan mineiro, coautor do catálogo da obra do Aleijadinho. Durante três meses, as peritas Lucienne Elias e Alessandra Riosado devolveram-lhe a beleza e estabeleceram sua origem ibérica, do final do século XVI.

Foi a primeira vez que uma imagem de Cristo entrou no gabinete presidencial. Fernando Collor havia levado uma Virgem Maria, e José Sarney um São José. (Getúlio Vargas e Ernesto Geisel eram agnósticos.) À época, a imagem valia cerca de US$ 30 mil. Lula havia prometido doá-la à Arquidiocese de Brasília.

Fernando Exman - Processo de reequilíbrio de poder na capital

Valor Econômico

Seja qual for o desfecho da reforma ministerial, o recado de Lira é que a pauta da Câmara será conduzida por ele até fevereiro de 2025

O relógio marcava quase 13h quando Luiz Inácio Lula da Silva subiu ao palco do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), sede da transição, no dia 29 de dezembro de 2022. Ladeado por algumas das ministras que hoje correm risco de demissão, anunciou o que restava do primeiro escalão do governo que tomaria posse em menos de 72 horas. Estava concluída, enfim, uma construção repleta de impasses. No período da redemocratização, aliás, ela só não foi mais demorada que a conduzida pelo ex-presidente Fernando Collor de Mello. E sete meses depois já apresenta fadiga de material e rachaduras.

Para repará-las, deu-se início a um processo de reequilíbrio de poderes: Planalto e Centrão medem forças, em uma dinâmica na qual a reacomodação das peças será determinante para a estabilidade do governo daqui em diante. Lula quer impor limites e o ritmo das conversas. Se possível, ampliar os canais de diálogo com o grupo para além do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

Zeina Latif - A inflação de serviços não assusta mais

O Globo

As engrenagens da política monetária estão funcionando, e o índice recua, mais aqui do que em boa parte do mundo

Quando um banco central faz a avaliação dos riscos inflacionários para decidir a estratégia de política monetária, seu trabalho envolve um amplo conjunto de informações. Dentre elas, as trajetórias da inflação dos diferentes grupos de despesas que compõem a cesta do consumidor. Aqui, também, os detalhes importam. Se, por exemplo, a desinflação decorre de fator pontual — como o corte de tributos sobre combustíveis em 2020 ou as condições climáticas favoráveis derrubando os preços de alimentos in natura, como agora —, a notícia não é tão boa.

A inflação de serviços é um recorte bastante analisado, por ser particularmente impactada pelas condições do mercado de trabalho, onde a política monetária tem maior importância. Os serviços não são facilmente substituídos pela oferta externa e envolvem atividades que fazem uso mais intensivo de mão de obra, o que resulta em uma inflação mais rígida — no Brasil, a indexação de contratos é agravante.

Luiz Carlos Azedo - Censo pode alterar representação de estados na Câmara

Correio Braziliense

A “vida banal” sofre com a captura das políticas públicas pelos interesses privados. O levantamento é uma oportunidade de calibrar melhor o uso dos recursos públicos para mitigar essa situação

O Projeto de Lei Complementar 148/23, apresentado pelo deputado Rafael Pezenti (MDB-SC), propõe a alteração do tamanho das bancadas dos estados, de acordo com os resultados do Censo Demográfico 2022. É uma repercussão política dos números apurados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que oferecem um quadro muito mais atualizado da sociedade brasileira. Passamos por uma nova transição demográfica. Os fatos mais relevantes são baixo crescimento da população e sua redistribuição no território brasileiro.

Hoje, somos pouco mais de 203 milhões de pessoas. Houve um crescimento de 6,5% no número de habitantes — pouco mais de 203 milhões de pessoas —, numa taxa de crescimento de 0,52% ao ano — cerca de 4,7 milhões de pessoas a menos que o projetado pelo próprio IBGE. É a menor taxa da série histórica, iniciada em 1872, por iniciativa do imperador Pedro II.

Entrevista | Steven Levitsky: ‘Extrema direita não é maioria no mundo, mas está vibrante’

Por Janaína Figueiredo / O Globo

Em entrevista ao GLOBO, professor de Harvard Steven Levitsky analisa eleições espanholas, ataques à democracia em Israel e cenário nos EUA e América Latina

O resultado das eleições na Espanha instalou um debate sobre o poder da extrema direita no mundo e sua real capacidade de continuar crescendo. No país Ibérico, o radical Vox teve pouco mais de três milhões de votos, conquistando 33 cadeiras, 19 a menos do que nas eleições de 2019. Na visão de Steven Levitsky, coautor de “Como as democracias morrem” e professor da Universidade Harvard, a extrema direita está longe de ser dominante, mas está vibrante e tem a capacidade de influenciar a agenda e os sistemas políticos.

— Não podemos falar numa onda de extrema direita, mas podemos dizer que hoje ela está mais forte do que há uma geração — disse Levistky em entrevista ao GLOBO.

O professor de Harvard está especialmente preocupado pela situação política nos EUA, onde acredita que o ex-presidente Donald Trump tem chances de voltar ao poder em 2024, Israel e Índia. Na América Latina, acrescentou, "as pessoas estão zangadas com o status quo”, e isso se expressa, por exemplo, com crescimento do pinochetismo no Chile. 

Os principais trechos seguem abaixo:

Andrea Rizzi - Espanhóis disseram não à extrema direita

El País /O Globo

Resultado da eleição espanhola veio na ‘contramão de onda de avanço da extrema direita na Europa e é sinal de alerta sobre o potencial de mobilização do eleitorado de oposição a pautas e medidas radicais

revés para o partido de extrema direita Vox nas eleições legislativas de domingo na Espanha — e a vitória insuficiente do Partido Popular (PP), de direita moderada — vieram na contramão da onda ascendente que levou ao poder partidos ultraconservadores, nos últimos meses, a vários países europeus. O resultado espanhol tem claras repercussões no tabuleiro político do continente, não só pela ausência de mais um país de peso nas fileiras da ultradireita, mas também pelo impacto nos seus dilemas estratégicos.

Um exemplo desse debate ocorreu, neste fim de semana, com o terremoto político causado pelo líder da União Democrata Cristã (CDU) alemã, de centro-direita, Friedrich Merz, ao sugerir que poderia apoiar alianças locais com a legenda de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD). Reações críticas dentro do próprio partido fizeram o líder voltar rapidamente atrás.

A eleição de domingo descolou a Espanha de uma tendência forte no continente. Em abril de 2022, Viktor Orbán foi reeleito com uma vitória acachapante na Hungria. Em setembro, vieram os êxitos eleitorais do Irmãos da Itália (26%) que botou Giorgia Meloni no cargo de primeira-ministra italiana. Também o Democratas da Suécia (SD) atingiu inéditos 20% de votos. Em abril, foi a vez da ultradireita finlandesa obter outros 20% de votação. Em junho, nas eleições legislativas gregas, três partidos de extrema direita conseguiram representação no Parlamento. Em Portugal, o ultraconservador Chega avançou em relação a resultados anteriores (7%) e a AfD alemã não para de crescer e já empata em intenção de votos com o partido do premier social-democrata, Olaf Scholz.

Financial Times - Disposição de Netanyahu em ceder a radicais leva Israel à beira da destruição

Valor Econômico

Esta é uma crise criada pelo premiê israelense, em meio à ambição de retornar ao poder alinhado aos elementos mais extremistas da direita do país

A maior onda de protestos da história de Israel não foi suficiente para conter Binyamin Netanyahu. O extraordinário passo dado por reservistas do Exército, de recusar-se a prestar serviço militar em um país obcecado com sua segurança - ou alertas de ex-autoridades de segurança, executivos empresariais e muitos outros, também não. Em vez disso, o governo de extrema direita do premiê deu continuidade na segunda-feira à aprovação da primeira parte da reforma do Judiciário que desencadeou a maior crise interna de Israel desde a fundação do Estado, em 1948. Netanyahu está levando seu país por um caminho calamitoso que ameaça os valores e ideais democráticos da unidade judaica sobre os quais foi erigido.

Este é um momento sombrio para uma nação que há muito tenta figurar como um modelo de democracia no Oriente Médio. E a crise tende a se acirrar. Os sionistas ultranacionalistas, religiosos, que compõem a coalizão de Netanyahu insistem que o projeto de lei aprovado nesta semana, que impede que a Suprema Corte use o padrão da “razoabilidade” para derrubar decisões do governo, é apenas o começo.

Thomas Friedman* - Só Biden pode salvar Israel de Netanyahu

O Estado de S. Paulo

Primeiro-ministro limita poder da Suprema Corte; EUA precisam apoiar democracia israelense

Caro presidente Biden, em outubro de 1973, Egito e Síria atacaram Israel em um movimento simultâneo. Conforme os estoques israelenses de munição diminuíram, seu antecessor Richard Nixon ordenou o envio de armamentos que ajudaram a evitar que a única democracia judaica no planeta fosse destruída por forças externas.

Cinquenta anos depois, Sr. presidente, esta mesma democracia judaica precisa de outro envio massivo e urgente de ajuda para não ser destruída, mas por forças internas: o envio de duras verdades, algo que apenas o senhor é capaz de dar.

E quais são essas verdades? Se o primeiro-ministro, Binyamin Netanyahu, continuar a empurrar goela abaixo de Israel o projeto que despe a Suprema Corte da maior parte da sua autoridade – o poder de controlar o Executivo –, e o fizer sem consenso nacional, isso fraturará as Forças Armadas israelenses e minará não só os valores compartilhados por EUA e Israel, mas também os interesses vitais de Washington.

Sr. presidente, quando nos encontramos, o senhor me transmitiu uma mensagem bem calibrada pedindo que Netanyahu não “apressasse” a aprovação da legislação sem “o consenso mais amplo possível”, com o qual o premiê não conta – sua fala deu um choque elétrico no sistema político israelense, dominando o noticiário por vários dias.

Martin Wolf* - Índia de Modi trilha um caminho iliberal

Valor Econômico

Este governo está montado sobre o tigre da religião politizada na esperança de avançar na longa jornada rumo ao objetivo de criar uma Índia moderna, próspera e forte. A questão não é apenas onde o governo irá terminar, mas se conseguirá evitar ser devorado em sua jornada

A Índia de hoje é uma “democracia iliberal”. A Freedom House, um centro de estudos americano, a coloca no mesmo nível que a Hungria, cujo líder, Viktor Orbán, cunhou o termo. Os componentes, porém, são classificados de forma diferente: na Índia, os direitos políticos, em especial a política eleitoral, são mais saudáveis do que na Hungria, mas os direitos civis são mais fracos. Pior ainda, sob o governo do partido BJP, no poder desde 2014, os direitos civis têm sofrido uma alta deterioração. As classificações da democracia indiana ainda são muito superiores às de países como Bangladesh, Paquistão ou Turquia. Ainda assim, o país não é uma “democracia liberal”: a Freedom House simplesmente rotula o país como “parcialmente livre”.

No entanto, à medida que a política da Índia se torna menos liberal, seu governo tem ficado mais eficaz. Indicadores do Banco Mundial mostram que a “estabilidade política e ausência de violência”, o “controle da corrupção”, a “qualidade da regulamentação” e a “efetividade do governo” melhoraram desde que Narendra Modi se tornou primeiro-ministro. Por outro lado, houve pioras nos critérios “voz [dos cidadãos] e responsabilização [das autoridades]” e “Estado de Direito”. O governo de Modi é mais repressivo e mais eficaz que o de seus antecessores.

Wilson Gomes* - Lula terá de compartilhar poder

Folha de S. Paulo

Alguém precisa ceder parte do seu espaço para o colega e tentar voltar com mais votos para o próximo embate

As especulações sobre substituições de ministros e outros nomeados ao primeiro escalão do governo atingiu um nível frenético. A acreditar-se no que publicam os jornais e sites de notícias, garantidos mesmo no governo Lula depois da iminente reforma só Janja e um ou dois ministros que o presidente fez questão de etiquetar publicamente como sendo dele.

Não se pode, claro, acreditar na maior parte do que se diz sobre danças das cadeiras em períodos em que governos sem maioria parlamentar precisam de rearranjo na distribuição de poder. Pois é muito difícil distinguir o que decorre de apuração jornalística e o que é o jornalismo sendo usado por suas fontes na política para fazer o jogo de balões de ensaio, frituras e testes de conceitos dos grupos concorrentes.

No Brasil, a temporada de demissões e contratações no governo é um período de lamentações e de reafirmação de quão inferior e movido por interesses mesquinhos é o jogo político, em contraste com a superioridade moral do povo.

Bruno Boghossian - Segundo semestre deve ser mais difícil para Haddad que o primeiro

Folha de S. Paulo

Ministro mostrou habilidade em negociações, mas verá mais resistências no Congresso

Pouca gente cantou vitórias nos primeiros meses de governo como Fernando Haddad. Com a bênção de Lula, o ministro tomou controle da agenda econômica, cortou intermediários e negociou com o Congresso o avanço de sua plataforma. As águas no segundo semestre talvez não sejam tão tranquilas.

O arcabouço fiscal e a reforma tributária navegaram com velocidade porque convergiam com interesses dos parlamentares. Não é que o ministro não tenha sido hábil nas articulações para aprovar as propostas, mas os congressistas também queriam mostrar serviço na área.

Hélio Schwartsman - Aposta errada

Folha de S. Paulo

Atividades de alto custo social como jogos e drogas deveriam pagar mais e não menos impostos

Moralismo não é o meu forte. Não me oponho ao jogo, nem às drogas, nem à prostituição. Desde que as partes não sejam forçadas por terceiros a fazer o que não desejem, não é função do Estado determinar o que as pessoas fazem com seu dinheiro, suas mentes ou seus corpos. Daí não decorre que o poder público seja um completo desinteressado nessas matérias.

Muitas vezes, é a coletividade que paga por decisões individuais que se mostrem custosas. O caso mais notório é o da utilização de drogas. Uma parte dos usuários acaba desenvolvendo problemas mais sérios, que incluem agravos à saúde física e mental e redução da produtividade.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Economia global não permite complacência

O Globo

FMI revisa previsão do PIB do Brasil para cima, mas momento é de aprovar reformas, não de comemorar

A revisão do relatório Panorama Econômico Mundial, do FMI, anunciada ontem, elevou a previsão de crescimento do Brasil para este ano. Em abril, a projeção para 2023 era de 0,9%. Agora, com a atualização, passou a 2,1%, em linha com a média prevista por instituições financeiras brasileiras. A mudança de 1,2 ponto percentual foi a maior registrada entre todas as grandes economias, mas, antes que o governo use o anúncio para tirar conclusões equivocadas, vale lembrar que o prognóstico do FMI para 2024 piorou — e é de apenas 1,2%.

Não é hora de abrir o espumante nem de complacência por parte do governo e do Congresso. A melhora da previsão de 2023 aconteceu por fatores conjunturais, principalmente o aumento da produção agropecuária. Para que a economia brasileira tenha condições de elevar de forma sustentada o ritmo de crescimento, o governo e o Parlamento precisam acelerar a aprovação de reformas, como a tributária, atualmente sob a análise do Senado.

Embora o prognóstico do FMI para a economia global neste ano tenha saído de 2,8% na análise feita em abril para 3%, continua abaixo dos 3,5% registrados no ano passado e da média histórica. Por isso motivos para preocupação não faltam. “A inflação está perdendo força na maioria dos países, mas se mantém alta” , diz o relatório. A continuidade do aperto monetário é esperada nos Estados Unidos e na Europa. Se confirmada, colocará pressão sobre os bancos.

Poesia | Amar - Carlos Drummond de Andrade

 

Música | Doris Monteiro - Mudando de conversa