sábado, 14 de dezembro de 2019

Opinião do dia: Caetano Ernesto Araújo – ‘A plataforma de uma esquerda democrática’

Um estratégia de mudança que tem a democracia como premissa e a construção da equidade e da sustentabilidade como objetivos deve ser considerada a plataforma, em construção, de uma esquerda democrática. Avançar nesse rumo implica, contudo, substituir a percepção de emancipação como simples retirada de empecilhos para a realização da liberdade por uma alternativa que enfatize o aspecto de construção, de processo, de aprendizado coletivo que o processo der mudança com essa finalidade carrega.

Atribui-se a Michelangelo a definição de escultura como a arte de retirar, em oposição à pintura, que seria a arte de acrescentar. Nessa imagem, a estratégia de mudança da esquerda democrática teria semelhança maior com a pintura: um processo de acumulação e aprendizado, de experiência coletiva tanto de decisões relevantes quanto de assumir a responsabilidade por suas consequências.

*CF. “Socialismo, democracia, esquerda democrática”. In: As esquerdas e a democracia, coletânea organizada por José Antônio Segatto, Milton Lahuerta e Raimundo Santos. Brasília: Verbena Editora/FAP, dezembro de 2018.


Link do livro: 

Ricardo Noblat - Aos cuidados do general Mourão: balanço do AI-5 e o que é ditadura

- Blog do Noblat | Veja

Modesta contribuição para aumentar os conhecimentos do vice-presidente

O general Hamilton Mourão refere-se ao Ato Institucional nº 5, baixado há 51 anos pelo governo Costa e Silva, como “o grande instrumento autoritário que os presidentes militares tiveram à mão”. Mas não reconhece que houve um golpe no país em 1964, nem uma ditadura que se estendeu por 21 anos.

“Discordo do termo ditadura para o período de presidentes militares”, argumenta. “Para mim foi um período autoritário, com uma legislação de exceção, em que se teve que enfrentar uma guerrilha comunista, que terminou por levar que essa legislação vigorasse durante 10 anos”.

Seria interessante, sugere, que se pesquisasse quantas vezes o AI-5 foi utilizado efetivamente durante os 10 anos que ele vigorou. Porque muitas vezes, segundo ele, “se passa a ideia que todo dia alguém era cassado ou afastado. E não funcionou dessa forma. É importante ainda que a História venha à luz de forma correta”.

O Congresso foi fechado duas vezes com base no AI-5. A primeira sob a alegação da necessidade de se “combater a subversão e as ideologias contrárias às tradições de nosso povo”. A segunda, em 1977, porque o general Ernesto Geisel disse que o MDB havia estabelecido no Congresso a “ditadura da minoria”.

Hélio Schwartsman - O pulo no fosso

- Folha de S. Paulo

Quando a maioria dos eleitores decide marchar para o precipício, o país cai no abismo

Um dos problemas da democracia é que, quando a maioria dos eleitores decide marchar para o precipício, o país cai no abismo. É o que acontece no Reino Unido com a maiúscula vitória do premiê Boris Johnson.

A principal consequência da votação é que Johnson conseguiu carta branca para efetivar o divórcio entre os britânicos e a União Europeia, que agora deve ocorrer antes do final de janeiro. E é o brexit que pode ser objetivamente descrito como um pulo no fosso.

Embora muitos britânicos achem que a separação representará a retomada dos tempos gloriosos, nos quais o povo decidia seu próprio futuro sem a interferência de estrangeiros e em que os bons empregos não eram roubados por estrangeiros, ela significa, em termos mais concretos, a renúncia ao acesso privilegiado a um mercado de mais de 500 milhões de pessoas e a inutilização da melhor ferramenta para lidar com o problema da estagnação demográfica, que é a imigração.

Julianna Sofia - Reforma no serpentário

- Folha de S. Paulo

Bolsonaro deve promover minirreforma no serpentário

Parlamentares de influência na Esplanada consideram favas contadas alterações no gabinete ministerial de Jair Bolsonaro em janeiro. Apesar das negativas palacianas, a expectativa é que o presidente promova uma minirreforma, revendo a posição de três ou quatro peças do primeiro escalão da República até o início do próximo ano legislativo.

O espaço ocupado pelo DEM no ministério (três pastas de peso) não condiz com o volátil apoio parlamentar outorgado ao governo em votações importantes no Congresso. O incômodo não é de agora, mas recente movimentação de caciques da legenda na direção de presidenciáveis rivais irritaram Bolsonaro. Por esse motivo, tornou-se alvo preferencial na relação das mudanças o ministro demista Onyx Lorenzoni (Casa Civil), espécime ilustre no serpentário presidencial.

Abraham Weintraub é outro a pegar o beco. O titular da Educação goza de simpatia de Bolsonaro e filhos por sua fidelidade ideológica canina, mas empilha incompetência, verborragia, ativismo virtual agressivo, tretas mil e zero de resultados na gestão. Pressões pela troca crescem em progressão geométrica, e Weintraub se enfraquece em parceria com o padrinho --foi pelas mãos de Onyx que chegou ao ministério.

Demétrio Magnoli* - Inimigos da polícia

- Folha de S. Paulo

Policiais bandidos sempre existirão, mas a polícia bandida é fruto de seus superiores

Há, e são muitos, policiais profissionais que cumprem a sua missão de proteger a ordem pública e a segurança dos cidadãos respeitando estritamente a lei. Existem, e não poucos, policiais que vão muito além de seu dever. Eles apartam brigas de casais, assumem riscos pessoais excessivos para salvar indivíduos em perigo, fazem partos em situações de emergência, amparam famílias durante os dias traumáticos do sequestro de um dos seus. Por culpa dos inimigos da polícia, geralmente esquecemos disso.

Um inimigo da polícia é o policial que usa sua arma como ferramenta para violar a lei. Aquele que chantageia pessoas vulneráveis para obter propina, cobra tributos informais de atividades irregulares, engaja-se na intermediação de negócios ilegais, associa-se a máfias políticas ou empresariais. Ou, ainda, aquele que pratica pequenos gestos cotidianos de arbítrio, recorre à brutalidade gratuita, envolve-se em operações de vingança homicida, forma milícias. Esse tipo de policial degrada sua profissão: a substância pegajosa que dele emana suja o uniforme de seus colegas honestos e mancha até mesmo os distintivos dos colegas heroicos.

Bolívar Lamounier* - Pororoca de ilusões

- O Estado de S.Paulo

A do bolsonarismo é a incapacidade de olhar o Brasil numa perspectiva histórica mais dilatada

Outros povos podem ser felizes ou desgraçados por obra de estranhos. Os povos democráticos são os únicos que têm o bem e o mal feitos por suas próprias mãos” - J. F. Assis Brasil, político gaúcho, 1893

Nunca vi, mas posso imaginar a beleza do vagalhão, do grande estrondo que se forma na foz do Rio Amazonas quando aquele enorme curso d’água colide com as águas de outros rios.

A pororoca é um fenômeno real, maciço e formidável, que qualquer pessoa pode perceber a grande distância; uma difícil metáfora, portanto, para o nosso momento político, permeado muito mais por ilusões, incongruências, movimentos erráticos e até por desatinos que por ações organizadas e efetivas. O mais comum no curso da História brasileira é as forças políticas se contraporem de forma previsível, uma tentando ser pragmática e racional, obediente aos requisitos da economia, e a outra se deixando levar por (ou adotando como tática) algum delírio populista, de fundo emocional, religioso ou ideológico.

Penso, no entanto, que o Brasil atual se afastou daquele cenário tradicional e nada faz crer que retornará tão cedo à normalidade. Afastou-se – excetuado, naturalmente, o esforço do ministro Paulo Guedes no manejo da economia – em vista da linha divisória que se estabeleceu entre duas tribos alucinadas: petistas versus bolsonaristas.

Para bem apreender a referida mudança parece-me imprescindível remontar à eleição de 2018, na qual a maioria dos eleitores votou numa das duas principais alternativas com o único intuito de evitar a outra.

Os partidos ditos “de centro” naufragaram porque imaginaram poder navegar em seus frágeis barquinhos oratórios, não percebendo o portento vagalhão que se avizinhava. Claro, o embate das duas rejeições não se formou no vácuo. Constituiu-se no caldo de cultura de hostilidade a tudo e a todos que ganhou corpo em função da situação econômica, da maré montante da violência, da deslealdade de certas autoridades no tocante a suas respectivas missões institucionais e, não menos importante, dos fatos trazidos a público pela Operação Lava Jato. Este último aspecto merece breve reflexão. Não é raro uma sociedade reagir negativamente a uma grande mudança em razão do desconforto e do mau humor que ela engendra – refiro-me aqui à constatação de que a corrupção se alastrara por todo o corpo político, contaminando os três Poderes e grande parte do meio empresarial –, não obstante tal mudança ser o ponto de partida para um importante avanço na vida pública.

Adriana Fernandes - Ainda de pires na mão

- O Estado de S.Paulo

Governadores e prefeitos continuam à mercê de interesses políticos do presidente da ocasião

Na semana em que o Supremo Tribunal Federal formou maioria a favor da tese de que é crime, com reclusão de até dois anos, deixar de pagar ICMS declarado ao Fisco como devido, vale reflexão sobre as decisões da Corte que dão aos governos regionais o direito de não honrar as suas dívidas com a União e permitem a suspensão do bloqueio das garantias previstas nos contratos em caso de calote.

Enquanto é duro de um lado, o STF é frouxo de outro. É preciso reconhecer que, na maioria dos casos, as decisões do STF têm retardado o ajuste que deveria ter começado há anos nas contas estaduais e municipais. Em 87,2% das ações que os Estados disputam no STF envolvendo dinheiro, a União perde.

A situação é tão estranha que o STF deu liminar para Goiás ingressar no Regime de Recuperação Fiscal, o socorro que a União dá para os Estados em grave crise fiscal. Pelas vias tradicionais, a adesão depende do atendimento de uma série de requisitos, inclusive medidas de ajuste nos gastos.

De alguma forma, a suspensão do pagamento da dívida pelos Estados pelo Supremo removeu o sentido de urgência para a adoção de medidas impopulares. Os argumentos são de que a União tem capacidade de absorver a decisão e que a população não pode sofrer com a falta de serviços essenciais.

Governadores e prefeitos continuam de pires na mão batendo à porta do governo federal e à mercê de interesses políticos do presidente da ocasião. Vide a ajuda prometida pelo presidente Jair Bolsonaro ao prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, para pagar o 13.º de servidores e a fila de outros que também buscam ajuda semelhante.

Merval Pereira - O papel da inclusão social

- O Globo

Democracia está posta em xeque também pela desigualdade econômica exacerbada em países como o nosso

A crise do Chile, ainda em progresso, foi surpreendente não apenas para as autoridades do país, mas para todos aqueles que apontavam a experiência democrática chilena como exemplar para o desenvolvimento econômico e social de seus pares regionais. Líder entre seus iguais, o Chile é o único membro da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) da região, que reúne os países democráticos mais desenvolvidos do mundo, situação a que Brasil e Argentina aspiram.

A inflação chilena está em torno de 2%, abaixo da meta prevista, a desigualdade de renda vem caindo desde o retorno à democracia em 1990, com o índice de Gini, que a mede, saindo de 0, 57 para 0,46 em 2017. O do Brasil ficou em 0,62 em março deste ano. Como o número mais próximo de 1 representa maior desigualdade, é possível notar que o Chile, embora seja muito desigual, mais que a Argentina e Uruguai, por exemplo, não é o pior da região.

O embaixador do Chile no Brasil, Fernando Schmidt, constata, no entanto, que bons indicadores econômicos já não são suficientes para os chilenos, que querem uma distribuição melhor da renda nacional. Não há, portanto, uma explicação única para o que está acontecendo no Chile, mas um conjunto de fatores que provoca o que o psicanalista Joel Birman classifica de crise psíquica causada pelo neoliberalismo econômico, categoria em que inclui até mesmo a sociedade chinesa.

Ascânio Seleme - Desamor à cultura

- O Globo

Não há na História da humanidade uma civilização que tenha se destacado no tempo, restado na lembrança dos seus povos e nos livros de História como paradigma, sem ter aliado à sua jornada política uma produção cultural exuberante. Foi assim na Grécia. Foi assim no Egito e em Roma. No Império Britânico, na Rússia imperial dos Romanov e na China da dinastia Ming. Os regimes que sufocaram a cultura acabaram desaparecendo da memória afetiva da coletividade. É esse o destino que acabam encontrando todos os governos que enxergam na cultura uma adversária a ser derrotada.

Governos têm entre suas atribuições formais o fomento à cultura. Evidentemente o Estado não precisa produzir minério ou petróleo, nem fabricar parafusos ou pregos. Tampouco cabe ao Estado gerir teatros, casas de show ou cinemas. Mas é da sua competência incentivar as manifestações culturais do seu povo. Estados pobres não dão dinheiro ao autor e ao produtor de cultura, mas os incentivam por meio da redução de impostos. Governos pobres e engajados direcionam seus incentivos para os companheiros ideológicos. Governos pobres, engajados e burros não dão dinheiro, não incentivam e ainda atrapalham a produção cultural.

Esse parece ser o caso do governo Bolsonaro. O governo que torpedeou a Lei Rouanet, desidratou os cofres de estatais, como a Petrobras, que já foi a maior fomentadora cultural do país, e fez na área as nomeações do que havia de pior. A política de terra arrasada virou sua marca registrada. Ninguém se salva no agrupamento formado para gerir a cultura nacional. São tipos parecidos com personagens de história de terror ou de piadas preconceituosas, na melhor das hipóteses.

Míriam Leitão - Por que gritam as ruas do Chile

- O Globo

No país que era apontado como modelo, população saiu furiosamente às ruas. Entender o Chile é parte do esforço de proteger a democracia no continente

As ruas chilenas ainda não estão em paz, mas já é possível entender parte da eclosão e o balanço dos estragos. Houve dias em que quatro milhões de pessoas estavam em passeatas ao mesmo tempo, em todo o país. O Chile tem 17 milhões de habitantes. Isso seria equivalente a ter 49 milhões de brasileiros em manifestações. Foram para as ruas convocados pelas redes, sem haver liderança clara. A perda de patrimônio em infraestrutura pública e em bens privados é equivalente à destruição causada pelo terremoto de 2010.

Entender o Chile é parte do esforço de compreender o mundo contemporâneo. As redes de indignação e esperança, como define Manuel Castells, se formam anárquicas. Pesquisas de opinião do Instituto Cadem monitoram o sentimento popular e mostram que a desaprovação do governo de direita de Sebastián Piñera está em 77%. Melhorou. Já foi 82%. Mas Michelle Bachelet, de esquerda, chegou a ser rejeitada por 75% no final de 2016. Uma pesquisa feita entre os jovens dos grupos mais radicais, que teriam participado dos atos de vandalismo, mostrou que o ponto em comum entre eles é a solidão. O indivíduo está só nestes tempos líquidos, como diria o sociólogo Zygmunt Bauman.

De concreto, houve uma falha geral dos políticos em perceber o acúmulo de frustrações. A raiva é contra as magras aposentadorias, o preço dos medicamentos, as falhas dos sistemas de saúde e de transportes, o custo do crédito estudantil tomado pelas famílias para que os filhos fizessem curso superior, o que eles chamam de CAE, Crédito com Aval do Estado. O estopim foi o aumento da passagem do metrô.

O país era elogiado como exemplo do sucesso liberal. A reforma da previdência, feita pela ditadura, havia supostamente eliminado o déficit. A verdade é que o sistema de capitalização foi se tornando insustentável, mas os governos de direita e de esquerda não o corrigiram pelos vetos recíprocos.

João Rego - Que Democracia é esta?

- Revista Será? (Recife, 13/12/2019)

Vejo, com frequência, pessoas duvidando de que estamos em um regime democrático, com um olhar crítico e cético sobre os partidos políticos, onde um grupo de caciques, quase todos com relações promiscuas com o grande capital – principalmente em períodos pré-eleitorais – dominam o jogo político. Como é possível confiar em tais mecanismos de representatividade, diante de tanto descalabro? Ou então lançam dúvidas sobre o poder judiciário: “Ah! Esse STF, sempre tomando decisões ao sabor de interesses inacessíveis para nós, pobres mortais!” Isto, sem falar na brutal desigualdade social que, impermeável ao tempo, singra em nossa história, qual uma nave dos insensatos, parindo, geração após geração, uma população de desassistidos, com destino já selado pela inacessibilidade ao ensino de qualidade, principal mecanismo para romper os grilhões da vulnerabilidade social.

Democracia, um valor universal – principalmente após a queda do Muro de Berlim – é o legado cultural de uma nação. O nosso é um legado de valores políticos, marcado por regimes autoritários, capitalismo de compadrio, que vê o Estado como mais um património para suas estratégias empresariais, onde a corrupção é a palavra-chave para implementá-las, cavando, de forma profunda, a perversa vala das desigualdades.

Marcus Pestana - O copo está meio cheio ou meio vazio?

Caminhamos para o desfecho do primeiro ano do novo ciclo político brasileiro. Como sabemos na definição jobiniana: “o Brasil não é para principiantes”. Os dias foram turbulentos.

A economia dá sinais de retomada. Juros e inflação baixos, reformas em curso, portanto, o copo está meio cheio. Mas por outro lado, o desemprego continua elevado, as desigualdades crescentes, a instabilidade política ainda ameaça a confiança, a situação fiscal ainda é gravíssima. O PISA nos colocou em 59º. lugar entre 79 países. O IDH nos destinou a 79ª. posição entre 189 países. Inevitável enxergar o lado meio vazio do copo.

A velha raposa mineira, o ex-governador de Minas, Hélio Garcia, sempre advertia sua equipe em relação ao “gesto inútil”. Se uma fala ou um ato criassem muito barulho e nenhum resultado, deviam ser evitados. Fico me perguntando qual o ganho em cutucar o grande ator internacional Leonardo DiCaprio, a personalidade do ano eleita pela TIME, a “pirralha” ambientalista Greta Thunberg, ou o novo governo argentino? Ou abrir mão de receber a COP-25 e jogar fora o protagonismo brasileiro na questão ambiental? Ou agredir artistas brasileiros, sonhar com a volta do AI-5 e negar a discriminação racial em nossa história? Enfim, estilo é estilo.

O que a mídia pensa – Editoriais

Relatório de danos – Editorial | Folha de S. Paulo

Vitória de premiê no Reino Unido reforça o brexit e é recado para a esquerda

O maior triunfo do Partido Conservador britânico desde o auge da era Margaret Thatcher é um conto sobre soberania popular.

Desprezado pela intelectualidade seu país, Boris Johnson será um primeiro-ministro legitimado para executar a intrincada saída da União Europeia. O brexit, aprovado por 52% dos eleitores em 2016, arrasta-se desde então.

O processo em si ainda suscita uma série de dúvidas. Questões econômicas e de liberdade de movimento já estão decantadas, porém novidades tendem a surgir dessa caixa de Pandora.

O relatório de danos inclui, por exemplo, risco existencial. A robusta votação de nacionalistas escoceses no pleito desta quinta (12) sugere que a separação do país do Reino Unido terá renovado ímpeto, com efeitos diretos na sempre instável Irlanda do Norte.

Nos três anos de debate, contudo, pouco se disse sobre os eleitores que escolheram o brexit. Em simplificação exagerada, seriam integrantes de antiquados segmentos da sociedade a se vingar de uma globalização excludente.

Música | Bloco das Flores - Uma Declaração de Amor

Poesia | Charles Baudelaire - Perfume exótico

De olhos fechados, quando, alta noite, no outono,
Respiro o cheiro bom dos teus seios fogosos,
Vejo entreabrir-se além cenários deleitosos
Cintilando ao ardor de um sol morno de sono:

Uma ilha preguiçosa e molenga e sem dono
Em que há árvores ideais e frutos saborosos;
Homens de corpos nus, finos e vigorosos,
Mulheres cujo olhar tem franqueza e abandono.

Guiado por teu perfume às paragens mais belas
Vejo um porto a arquejar de mastros e de velas
Ainda tontos talvez da vaga alta que ondula,

Enquanto um verde aroma dos tamarindeiros,
Que passeia pelo ar e que aspiro com gula,
Se mistura em minha alma à voz dos marinheiros.

Tradução de Guilherme de Almeida