Liliana Lavoratti
São Paulo
DEU NO JORNAL DO BRASIL
Para cientista, governo esvaziou discurso dos adversários. Base apostará no continuísmo
As últimas semanas têm sido marcadas pela intensificação do debate em torno das candidaturas presidenciais. Há tempos se sabe que é uma disputa entre PT e PSDB, e que a hipótese de um terceiro nome vencer a eleição do ano que vem existe, mas é remota. O anúncio da doença da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) e as movimentações em torno dos nomes dos tucanos Aécio Neves e José Serra – governadores de Minas e São Paulo, respectivamente – até com a notícia, depois desmentida, de um acordo entre ambos, movimentaram e têm precipitado cada vez mais as articulações em torno do pleito do próximo ano.
Fora as especulações em torno de um terceiro mandato para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva – que já negou a pretensão – a discussão, pelo menos até agora, girou em torno de nomes e de suas viabilidades eleitorais.
– Propostas de governo, até aqui, praticamente inexistem. É natural que inexistam faltando ainda mais de um ano para a eleição, mas há exatos quatro anos ocorria o mesmo e em 2006, no embate entre Lula e Alckmin, situação e oposição apresentaram ao eleitorado dois programas de governo que eram um apanhado de generalidades – afirma Wagner Iglecias, doutor em Sociologia e professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (USP).
Não está descartado que no próximo ano isso se repita.
– Os governistas falam numa genérica continuidade do projeto levado a cabo durante os dois mandatos de Lula. De parte da oposição, até o momento, só mesmo a vaga idéia do ‘pós-Lula’, levantada há algum tempo por Aécio Neves, e, de vez em quando, uma ou outra crítica comedida de José Serra à política econômica – analisa o acadêmico.
Segundo ele, não há "nada de muito surpreendente" na fala de Aécio em relação ao "pós-Lula".
– Quem vier a ocupar o Palácio do Planalto a partir de 2011 não deverá ser imprudente a ponto de retirar algumas das conquistas que o atual governo promoveu, sobretudo para as camadas menos favorecidas, assim como Lula não pestanejou em manter alguns dos pilares da política econômica que herdou de FHC – ressalta.
Na avaliação de Iglecias, também não são surpreendentes as esparsas críticas que Serra faz à condução da economia.
– Não é nenhuma novidade que o governador de São Paulo e presidenciável tucano se oponha à política econômica que vem sendo adotada no Brasil nos últimos 15 anos, pelo menos – lembra o professor da USP. (Detalhe: período esse que inclui os dois mandatos de FHC, do mesmo PSDB).
Mas se a bandeira de campanha de 1994, quando FHC elegeu-se, foi a estabilidade da moeda, assim como a de Lula, em 2002 foi o resgate da dívida social brasileira, qual será a grande bandeira eleitoral de 2010? Na opinião de Iglecias, a manutenção das políticas públicas que têm dado certo, pequenas correções de rumo aqui e ali e o apoio de Lula, por certo, constituirão o discurso do candidato ou da candidatura da base.
– Já pelo lado da oposição, o que virá? É dela que se deve esperar novas ideias para o país. Afinal, vivemos nos anos recentes a pax lulista, com bons índices de crescimento econômico, incorporação de vastas parcelas da população mais pobre aos circuitos de consumo, (auto)enfraquecimento do Legislativo e relativa docilidade dos movimentos sociais. Mas as ambições do País devem parar por ai?.
Segundo Iglecias, uma questão é o que a oposição precisará apresentar ao eleitorado para convencê-lo de que pode governar melhor do que Lula tem feito.
– Apostará na crítica de cunho moral e no denuncismo do mau uso da coisa pública, como fez durante a crise do mensalão em 2005 e na campanha presidencial de 2006? Apresentará uma visão alternativa do papel do Estado, distinta desta espécie de neodesenvolvimentismo levado a cabo por Lula, e reconhecerá que aposta mais nas forças de mercado e num Estado menos interventor e mais regulador, novas privatizações ai incluídas, eventualmente? Dirá que, ao contrário de Lula e do petismo, não nutre muita simpatia pelos governos de esquerda e/ou populistas de alguns dos nossos vizinhos da América do Sul? – questiona
Iglecias acredita que quem conduzir a grande bandeira de 2010 e estabelecer os termos do debate deverá ter mais chances de vencer. Foi assim inclusive em 1998 e 2006, quando FHC e Lula.
– Dilma, se candidata, deverá propor a continuidade. Aécio ou Serra terão de propor mudanças. Talvez 2010 seja uma eleição pobre em termos de propostas.