*Luiz Werneck Vianna, Sociólogo, PUC-Rio. “A pergunta que não quer calar”, Blog Democracia Política e novo Reformismo, 10/7/2021
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
segunda-feira, 12 de julho de 2021
Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna*
Fernando Gabeira - Sem medo de militares
O Globo
São tempos duros, talvez os mais difíceis,
porque conjugam o devastador governo Bolsonaro com uma terrível pandemia.
Consegui sobreviver, trabalhando
diariamente. Por volta das 20h, quando cessam minhas tarefas, como um sanduíche
e vou-me embora do Brasil. Através dos livros e documentários, percorri outros
países e épocas. Acompanhei a crise dos anos 20 na Europa e a efervescência
intelectual do continente. Vi conferências, como a de Max Weber, em Munique,
sobre a ciência. Aprendi a respeitá-la, mas também a reconhecer seus limites,
definidos por Tolstói: “Quem somos nós, o que devemos fazer?”. Uma pergunta que
nem a ciência nem a política respondem. Nada nos alivia da decisão de como
viver nossa vida.
No entanto, em tempos de pandemia, a
ciência pode evitar nossa morte. Por isso tornou-se o farol em tempos de
obscurantismo sanitário.
Percorri de novo os horrores do nazismo, da
colonização europeia na África, as histórias de mutilações que os belgas
levaram ao Congo, o coração das trevas, descrito por Conrad.
Acompanhei, dentro dos detalhes possíveis, o romance de um intelectual seduzido pelo nazismo e uma judia. Ele, acreditando que a morte é a realidade que faz o humano; ela, afirmando que é o fluxo de renascimento que nos define.
Carlos Pereira* - Quem ‘merece’ um impeachment?
O Estado de S. Paulo
Gravidade das irregularidades tem
importância menor que a falta de apoio político no Congresso e na sociedade
Alguns argumentam que o fato de o Brasil,
em pouco mais de 30 anos, já ter abreviado, por meio de impeachments, o mandato
de dois presidentes legitimamente eleitos e existir o potencial risco de um
terceiro nos próximos meses seria um sinal de que algo não vai bem na
democracia brasileira.
Alega-se que um impeachment acentuaria a polarização política... aumentaria o conflito entre partidos... desenvolveria a sensação de crise política permanente e generalizada... chegaria a criar desconfiança nas próprias regras do jogo democrático.
Diferentemente de regimes parlamentaristas,
que dispõem de mecanismos flexíveis de término antecipado de governos, como o
voto de não-confiança ou mesmo a perda de maioria parlamentar pela saída de
parceiros da coalizão governista, presidencialismos não possuem outros
mecanismos capazes de quebrar a rigidez de mandato presidencial além do
impeachment.
Sem contar os 130 pedidos de impeachment já submetidos a Câmara dos Deputados contra
Bolsonaro, já ocorreram 193 pedidos durante o período de 1990 e 2018
no Brasil. Ou seja, somente um pouco mais de 1% dos pedidos foram de fato
efetivados.
Como demonstra Mariana Llanos e Anibal Perez-Linán no artigo Oversight or representation? Public Opinion and Impeachment Resolutions in Argentina and Brazil, esta marca é muito inferior às democracias parlamentaristas avançadas onde 5% dos votos de não-confiança iniciados levaram de fato a queda antecipada de seus governos.
Antonio Claudio Mariz de Oliveira* - Decisão necessária versus omissão criminosa
O Estado de S. Paulo
Sr. presidente da Câmara, não passe à
História como cúmplice do pior governo
O homem, quando se vê diante de uma
situação que o obrigue a tomar uma decisão, ou a toma ou simplesmente se omite.
É evidente que se optar por agir sua ação trará consequências. No entanto,
também a omissão provocará repercussões, que vão variar de acordo com a
motivação de sua inércia. Aliás, há momentos em que a inércia é mais marcante e
traz um maior estigma do que a decisão mesmo que errada. No caso, ela constitui
crime de lesa-pátria.
A inércia adotada no caso do impeachment do
atual presidente da República está sendo colocada como uma prerrogativa do
presidente da Câmara dos Deputados. Ele se apoia no Regimento Interno da Casa,
que lhe dá, sem consignar prazo, a possibilidade de dar seguimento ou engavetar
pedidos de impedimento, como vem fazendo.
Diz ele que o regimento não o obriga a
submeter os requerimentos à apreciação da Câmara, pois não há prazo para a
apreciação da respectiva postulação. Realmente, não há nas normas regimentais a
consignação de prazo para as providências decorrentes de um pedido. Mas a
inexistência de um lapso temporal não o autoriza a engavetar os pedidos.
A norma regimental omissa cede ao civismo e ao compromisso que assumiu com a Nação quando recebeu um mandato parlamentar, outorgado por quem o elegeu.
Demétrio Magnoli - Duas estratégias diante do vírus
O Globo
O governo de Boris Johnson anunciou o “Dia
da Liberdade”, 19 de julho, quando caem as restrições sanitárias internas. O
Reino Unido tem elevadas taxas de óbitos acumulados (188 por 100 mil
habitantes) e de imunização completa (superior a 50%). Simultaneamente, a
Austrália estendeu mais um lockdown na Grande Sydney, e a Nova Zelândia
suspendeu a bolha de viagens que conecta os dois países. As duas nações da
Oceania têm baixas taxas de óbitos acumulados (menos de 4 por 100 mil) e de
imunização (inferiores a 11%). “Conviver com o vírus”, como escolheram os
britânicos, ou “Covid Zero”, como pregam australianos e kiwis?
“Países diferentes fazem escolhas diferentes”, declarou a primeira-ministra neozelandesa, Jacinda Ardern. Seu compatriota, o epidemiologista Michael Baker, falou em outro tom: “Sempre temos de ser céticos sobre aprender lições de países que fracassaram rotundamente”. Segundo os arautos da estratégia “Covid Zero”, os países da Europa “fracassaram rotundamente”, pois não evitaram a disseminação do coronavírus. O julgamento, porém, é menos óbvio do que sugerem as taxas de óbitos.
Ricardo Noblat - Bolsonaro ouve conselhos, mas não garante segui-los
Blog do Noblat / Metrópoles
Você acredita que o presidente conseguirá
se reinventar? Ou continuará o que é até o fim do seu mandato?
Quantas vezes você não ouviu ou leu que o
presidente Jair Bolsonaro, depois de mais uma diarreia verborrágica, agora
refluiria para nunca mais atacar adversários e instituições da República como o
Congresso e a Justiça? Devem ter sido muitas.
Pois auxiliares de Bolsonaro afirmam ter
ouvido que ele assim procederá doravante. Bolsonaro admite que se excedeu ao
chamar senadores da CPI da Covid-19 de bandidos, atacar ministros do Supremo
Tribunal Federal e usar a expressão “caguei”.
Sua situação vai de mal a pior a estarem
certas todas as pesquisas de intenção de voto aplicadas de janeiro para cá. Ela
só se agrava desde que a CPI foi instalada e, quanto a isso, não haverá muito
que fazer. O prazo para que a CPI chegue ao fim será prorrogado.
A batalha da opinião pública já foi perdida. Por larga maioria, os brasileiros acreditam que houve corrupção na compra de vacinas para combater o coronavírus, e que Bolsonaro sabia disso. Mais provas por vir deverão incriminá-lo. Fazer o quê?
Marcus André Melo* - Pandemia e popularidade
Folha de S. Paulo
Três explicações sobre o impacto da
pandemia sobre os governos
Há três explicações rivais sobre o impacto
da pandemia sobre a política. Na primeira, a expectativa é que os governantes
se beneficiem; na segunda, que tenham perdas; na terceira, o resultado seria
condicional.
A primeira das explicações é corolário da
tese de que situações excepcionais —guerras, terremotos— produzem incentivos à
cooperação, com os governantes visando um bem coletivo maior. Esse resultado,
conhecido na literatura como "rally round the flag" (todos em volta
da bandeira), no entanto, apresenta pouco poder explicativo para a longa pandemia da
Covid. O efeito previsto tende a ser de curto prazo, o que já foi
detectado em várias
pesquisas. Bolsonaro foi um dos poucos que não se beneficiaram
no curto prazo.
A segunda explicação é que calamidades impactam negativamente a avaliação de governantes mesmo quando não seja razoável lhes atribuir responsabilidades por elas. A análise clássica da literatura é o efeito dos ataques de tubarões nas eleições presidenciais de 2016 em Nova Jersey, nos EUA. O eleitorado parecia punir os seus representantes em um movimento de "responsabilização cega".
Celso Rocha de Barros – O golpe é para roubar
Folha de S. Paulo
Ao atacar presidente da CPI, Forças
sinalizam que protegerão seus corruptos
Jair Bolsonaro disse que ou a eleição
de 2022 vai ter voto impresso ou ela não vai acontecer. As Forças
Armadas e todas as outras instituições da República deveriam ter publicado uma
nota conjunta dizendo: “Jair, se der golpe, vai morrer. Abs.” Não publicaram.
Ao invés disso, na semana passada comandantes
militares ameaçaram dar um golpe de Estado caso a CPI continue
a investigar oficiais bolsonaristas que roubaram dinheiro de vacina.
Pelo menos a turma de 64 tinha a decência
de mentir que o golpe deles era para combater a corrupção. Era uma época em que
o vício ainda prestava homenagem à virtude.
A CPI da pandemia já achou indícios fortes de que existem militares e ex-militares bolsonaristas enrolados no escândalo do roubo de dinheiro de vacina.
Ruy Castro - Espirro em público
Folha de S. Paulo
Cuidado! De repente, na padaria, sem
esperar e sem querer, você se torna uma ameaça sanitária
Bivacinado e de máscara dupla, dei-me outro
dia o prêmio de um pulo a uma padaria do Leblon em busca de alguns frios e
queijos. De repente, na fila do caixa, veio-me a vontade de espirrar. E, se
você já espirrou na vida, sabe como é. Nenhum espirro é um simples espirro.
Começa por uma comichão no nariz, anunciando algo que emana das profundas e vai
irromper queira você ou não. É algo que não leva mais que três segundos, mas,
como nos parece vir em câmera lenta, achamos que dura muito mais. E, deflagrado
o processo, exatamente como numa ejaculação, não há nada a fazer a não ser
relaxar e deixá-lo vir. Dá-se então, saindo de você, um rugido de Stromboli,
Vesúvio, Krakatoa.
O problema é que é quase impossível espirrar em segredo. Por perto há sempre alguém que, ao nos ver aflitos e levando as mãos ao rosto, sabe o que vai acontecer. E, mesmo que o espirro respeite os protocolos da pandemia, o fulano se prepara para se proteger. Mas outros são apanhados de surpresa. Para piorar, um espirro abafado por uma máscara emite um som que, mesmo lembrando um ronco produzido por uma tuba, muda apenas de atchim para atchê ou coisa assim.
Bruno Carazza* - Por que escolhemos os piores?
Valor Econômico
Reforma eleitoral merece maior atenção
Em 2008 a prefeitura de Belo Horizonte
realizou uma licitação para a concessão dos serviços de transporte coletivo
para os próximos 20 anos. Entre as regras da disputa, havia uma série de
requisitos técnicos definidos para, supostamente, filtrar apenas as empresas
que possuíssem capacidade financeira e operacional para exercer a atividade com
qualidade e segurança. Mas o diabo mora nos detalhes, como diz o chiste
comumente atribuída ao arquiteto Ludwig Mies van der Rohe (1886-1969).
O inciso VI do item 8.3.5.1 do edital
estabelecia que, para participar do leilão, os interessados deveriam comprovar
a disponibilidade de imóveis para abrigarem as garagens dos ônibus a serem
utilizados durante a vigência do contrato. O prazo para o atendimento dessa
condição era exíguo (a licitação seria realizada em 60 dias), e dada a escassez
de terrenos numa cidade do porte de Belo Horizonte, poucas empresas apareceram
para o certame. Não por acaso, apenas as concessionárias que já prestavam o
serviço apresentaram propostas - as mesmas que, há três gerações, controlam o
transporte coletivo na capital mineira.
Seja nas licitações públicas ou nos processos seletivos de empresas, os critérios condicionam as escolhas. E na política não é diferente.
Assis Moreira - Taxação verde e as boas intenções
Valor Econômico
Europa quer dar o tom da descarbonização
Em Veneza, cidade-monumento ameaçada de ser
tragada pela progressiva elevação nos níveis do mar, em consequência do
aquecimento do planeta, os ministros de finanças das maiores economias
desenvolvidas e emergentes, que formam o G20, falaram - e muito mesmo - de
mudança climática e taxação.
Pela primeira vez na história desse grupo
central na governança econômica global, os ministros mencionaram em comunicado
final, no sábado, o preço do carbono como um instrumento possível na luta
contra a mudança climática e perda de biodiversidade e para proteção do
meio-ambiente.
Aplicar um preço nas emissões de CO2 é
considerado por especialistas como um dos mecanismos fortes para fazer os
poluidores pagarem pelos estragos que causam, e incitar produtores e
consumidores a mudar de comportamento. À medida em que o preço do carbono
aumenta, as tecnologias verdes serão mais e mais utilizadas.
Uma drástica redução das emissões de gases de efeito estufa requer preço do carbono de pelo menos US$ 75 por tonelada - e o preço médio, onde isso existe, é de US$ 3 hoje, segundo dados apresentados em evento do G20.
Luiz Carlos Mendonça de Barros* - O FMI veio ao socorro do Brasil mais uma vez
Valor Econômico
Projeção do FMI de déficit fiscal de 1,7%
do PIB neste ano é um resultado exitoso
Assisti durante minha vida profissional
várias vezes o Fundo Monetário Internacional - o terrível FMI da minha
adolescência - ser chamado a ajudar o Brasil a sair de uma crise financeira
grave. Em uma delas fiz parte da equipe que foi a Nova York revelar ao sistema
bancário internacional que iríamos parar de pagar nossa dívida externa. Era a
então eufórica moratória externa do presidente José Sarney.
Mas agora é a primeira vez que vejo o FMI
voluntariamente vir ajudar o Brasil a enfrentar a crise de confiança em nossas
contas fiscais sob pesadas acusações dos segmentos mais liberais de nossa
”intelligentsia” econômica.
Na última quinta-feira, o jornal Valor Econômico trouxe a seguinte manchete “FMI projeta déficit primário de 1,7% do PIB em 2021 e a volta de superávit em 2024”. Em meio ao intenso debate que vem ocorrendo no mercado financeiro, a manchete do Valor representa um verdadeiro resgate de confiança da nossa situação fiscal. Em outras palavras, suas declarações mostram que estamos muito longe da situação de catástrofe - cujo título mais sofisticado é Dominância Fiscal - que um grande número de economistas do mercado diz já existir.
Mirtes Cordeiro* - O “brado” do medo e da covardia
Falou & Disse
Que chegue logo o amanhecer!
Numa atitude de desespero mais nefasta do
que outras já praticadas, o presidente bradou: “Caguei”.
O dicionário da língua portuguesa é vasto
quando se refere ao vocábulo “Caguei”, arremessado pelo presidente da República
contra a CPI da Covid, instrumento do Congresso Nacional encarregado de
investigar a responsabilidade pelas irregularidades cometidas durante a
pandemia, culminando até agora com mais de 530 mil mortos.
O vocábulo tem vários significados, mas
prefiro citar os mais sugestivos para a ocasião: 1 – sujar-se com as próprias
fezes e, 2 – ter medo. Um está relacionado ao outro, quando o governo nada tem
a expor sobre as promessas mirabolantes que apresentou em campanha eleitoral e
agora se dá conta que o mar não está para peixe, ou seja, a situação pela qual
passa o país já não permite que o lixo seja jogado para debaixo do tapete e que
as tentativas de manipulação das instituições democráticas prevaleçam.
É o que aparece na mídia com os trabalhos da Comissão Paramentar de Inquérito, evidenciando que a rede de pescaria movida pela corrupção foi jogada no Ministério da Saúde. É também o que anunciam os resultados das pesquisas realizadas a cada semana, com a manifestação da opinião pública sobre os transtornos provocados pelo governo.
O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais
EDITORIAIS
Muito mais do que apenas desgoverno
O Estado de S. Paulo
A CPI da Pandemia convidou um grupo de
juristas para estudar quais crimes podem ser imputados ao presidente Jair
Bolsonaro por suas ações e omissões na condução do País durante a emergência
sanitária. A rigor, o principal trabalho deste grupo de notáveis será dar um
enquadramento jurídico-penal ao sobejamente conhecido comportamento de
Bolsonaro como chefe de Estado e de governo no curso da maior tragédia que se
abateu sobre a Nação em mais de um século.
É evidente que o Brasil não seria o único
país do mundo a ser poupado dos efeitos devastadores de uma pandemia como a que
ora aflige todos, mas tampouco mais de meio milhão de mortos representam o que
seria o “curso natural” da peste entre nós. Houve esforços para que se chegasse
a este funesto resultado.
“Precisamos de uma avaliação jurídica mais
aprofundada sobre o enquadramento típico da conduta do presidente da
República”, afirmou o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), autor do
requerimento de formação do grupo. “Até tenho minha opinião sobre os tipos
legais que se aplicam, mas é oportuno buscar um respaldo maior.”
O grupo de juristas, coordenado por Miguel Reale Júnior, ex-ministro da Justiça e professor titular de Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), é composto pelos advogados Helena Lobo da Costa e Alexandre Wunderlich, além da juíza Sylvia Steiner, que integrou o Tribunal Penal Internacional. Os advogados Salo de Carvalho e Davi Tangerino deixaram o grupo por “conflito de interesses”.