segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Opinião do dia – Rubens Bueno

É de um cinismo sem tamanho. Ela não tomou nenhuma providência em nenhum momento durante tantos anos de desfalque na Petrobras, que foi usada para abastecer políticos da base aliada. Não se viu nenhuma ação dela para combater essa corrupção.

Quem aprofundou a investigação? O Ministério Público Federal, a Polícia Federal e a Justiça. Se dependesse do governo, estaria tudo encoberto."

Rubens Bueno, deputado federal (PR) e líder do PPS na Câmara dos Deputados sobre as declarações de Dilma na Austrália, Correio Braziliense, 17 de novembro de 2014.

PF investigará corrupção também no setor elétrico

• PF vai investigar se esquema de doleiro também envolvia negócios com hidrelétricas

Cleide Carvalho – O Globo

Foco no setor elétrico

CURITIBA - A Polícia Federal investiga se o esquema operado pelo doleiro Alberto Youssef alcança também negócios no setor elétrico. Nas investigações da Operação Lava-Jato, os agentes encontraram na mesa de João Procópio de Almeida Prado, acusado de ser o braço-direito do doleiro, uma planilha identificada como "Demonstrativo de Resultado - Obra Jirau", com a contabilidade da Camargo Corrêa na obra da hidrelétrica construída no Rio Madeira, em Rondônia, com financiamento de R$ 7,2 bilhões do BNDES.

A empreiteira foi uma das sócias do consórcio que arrematou a concessão até 2012, quando vendeu sua participação. Segundo o Ministério Público Federal, Prado era o elo do esquema de Youssef com a Camargo Corrêa. Ele é concunhado de João Ricardo Auler, presidente do conselho de administração da Construções e Comércio Camargo Corrêa, um dos presos na Lava-Jato.

Youssef disse à Justiça que Auler foi seu principal contato na construtora antes de Eduardo Hermelino Leite, atual vice-presidente da empresa, preso preventivamente. Leite é o único executivo de empreiteira, até agora, acusado pelo doleiro de ficar com parte do dinheiro da propina a ser dividido com os políticos. Procurada, a Camargo Corrêa informou que o Prado "jamais prestou serviços" para a construtora e que desconhece a planilha citada.

Segundo o MPF, Prado era de extrema confiança do doleiro. Operava as contas no exterior, controlava depósitos e pagamentos fora do Brasil, e era também encarregado da abertura de empresas offshore, em nome dele ou de terceiros. Entre os dias 3 e 13 de março passado, Prado, Youssef e Leonardo Meirelles movimentaram ¬ 1,06 milhão de uma conta da Elba Services, na Suíça, para a DGX Import, em Hong Kong.

Youssef afirmou que o primeiro contato que teve com a Camargo Corrêa foi acompanhando o ex-deputado federal José Janene, do PP, um dos flagrados no mensalão e que faleceu em 2010. A reunião foi com João Auler.

A Camargo Corrêa participou de duas grandes obras da Petrobras investigadas na Lava-Jato: a modernização da Repar, refinaria que fica no Paraná, com sobrepreço apontado pelo TCU de R$ 633 milhões e da Unidade de Coqueamento da Refinaria Abreu e Lima, com danos ao erário já identificados de R$ 613,2 milhões. A Camargo Corrêa também fez repasses de R$ 2,875 milhões para a Costa Global, empresa de consultoria do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa. Os depósitos foram feitos cinco meses após a saída de Costa da estatal, mas ele disse à Justiça que os pagamentos eram propinas.

Empresas pagam advogados
Para o MPF, é estreita a ligação de alguns dos principais executivos de empreiteiras com Youssef. Os mais próximos do doleiro seriam Leite, da Camargo, Ricardo Pessoa, da UTC/Constram, e Mateus Coutinho, da OAS.

Um dos exemplos está no depoimento da contadora do doleiro, Meire Poza. À Justiça, ela disse que em março, quando foi deflagrada a primeira fase da Lava-Jato, ela e Prado ficaram responsáveis por buscar dinheiro na Camargo Corrêa e na UTC para pagar os advogados dos presos ligados ao doleiro. Meire visitou a UTC, que teria se comprometido a dar R$ 500 mil para pagar os advogados de Enivaldo Quadrado e Carlos Alberto da Costa, ligados ao doleiro.

Depois, Meire disse ter se desentendido com os interlocutores. Um dos presos na última sexta-feira, o advogado Carlos Alberto Costa e Silva, segundo ela, acabou sendo acionado para fazer o "meio de campo" com as empreiteiras.

A UTC se tornou sócia de Youssef em empreendimentos na Bahia. A empresa se associou em 2010 à GFD, de Youssef, no hotel Web Salvador Iguatemi e na compra de terreno em Lauro de Freitas, por R$ 5,3 milhões. Para que a sociedade se concretizasse, foi aberta Sociedade em Cota de Participação, tendo a UTC como sócia ostensiva e a GFD como sócia participante.

A UTC é uma das contratadas para obras na Refinaria Alberto Pasqualini (Refap), no Rio Grande do Sul. No total, os negócios da empresa com a Petrobras superam R$ 8 bilhões.

Ao GLOBO, a UTC informou que é sócia da GFD num empreendimento específico, o Dual Medical&Business, em Lauro de Freitas, e que a Sociedade em Cota de Participação é um instrumento temporário, usado no setor imobiliário, a ser encerrado ao fim do empreendimento (início de 2016). Confirmou que os custos foram divididos e ressaltou que não há nenhum tipo de sociedade entre as duas empresas. De acordo com a nota, UTC e GFD são cotistas no Web Hotel de Salvador ao lado de outros investidores. A empresa informou que detém 30% das cotas e que a GFD tem 37% e que as documentações foram encaminhadas ao MPF. Sobre o pagamento de advogados, confirmou que foi procurada por Meire Poza, mas que a ajuda foi negada.

PF vê elo entre lobista do PMDB e Transpetro

• Anotações em agenda de ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás são vistas como indícios de que Fernando Baiano tinha interesses em subsidiária

Ricardo Brandt, Fausto Macedo - O Estado de S. Paulo

Anotações na agenda do ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa, delator da Operação Lava Jato, revelam ligação entre Fernando Soares, o Fernando Baiano, apontado como operador do PMDB no esquema de propinas na estatal, e a Transpetro, subsidiária que atua no setor de navios, segundo investigação da Polícia Federal.

No caderno apreendido pelos agentes federais na casa de Costa, em março, quando a operação foi deflagrada, as anotações em sequência “FB” e “Navios” são interpretadas pelos policiais como Fernando Baiano e subsidiária da estatal, respectivamente. O registro indica também a data da reunião, com quem seria o encontro, assuntos e os valores de propina na Petrobrás tratados entre o réu confesso do esquema de corrupção e o suposto operador do PMDB. Fernando Baiano está com a prisão decretada, mas fugiu.

A Polícia Federal suspeita que essa nova frente de investigação possa atingir o presidente licenciado da Transpetro Sérgio Machado, que chegou ao cargo em 2004 por indicação do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Machado está na mira das novas etapas da Lava Jato desde 8 de agosto, quando o delator afirmou em depoimento ter recebido em mãos R$ 500 mil de Machado. O pagamento, ocorrido em 2012, seria referente a uma propina por locação de navios, cuja negociação fora intermediada pela diretoria de Abastecimento da Petrobrás, sob o comando de Costa.

Segundo eles, todos os grandes contratos da estatal tinham cobrança de propina de até 3% em um esquema de loteamento de diretorias na estatal pelo PT, PMDB e PP, que abasteceu também o PSDB e o PSB.

Núcleo empresarial. No mesmo item de assuntos a ser tratado no suposto encontro com “FB”, o delator da Lava Jato anotou siglas e nomes de executivos e empresas que se tornaram alvo da fase Juízo Final, a sétima da Operação Lava Jato. A Polícia Federal está convencida de que as iniciais QG são de Queiroz Galvão, uma das empreiteiras sob suspeita da Juízo Final. O nome entre parêntesis é do executivo Ildefonso Colares, preso na sexta-feira. Os investigadores suspeitam que “R$ 3,0” significa R$ 3 milhões. Há ainda a anotação “Engevix (Gerson)”. Trata-se de Gerson Almada, outro dos 23 detidos na carceragem da Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba.

Em um dos computadores da empresa Costa Global, aberta em 2012 pelo ex-diretor de Abastecimento, depois que ele saiu da Petrobrás, o nome de Fernando Soares, o Baiano, aparece associado a valores. Num deles, o montante é de R$ 2,1 milhões. O registro foi anexada ao despacho do juiz federal Sérgio Moro nos pedidos de prisão da Lava Jato.

Defesa. Por sua assessoria, Sergio Machado declarou “ser mentirosa e absurda a acusação feita contra si por Paulo Roberto Costa”. O criminalista Mário de Oliveira Filho, que defende Baiano, foi enfático. “O sr. Fernando não é lobista, nem operador do PMDB, mas representante no Brasil de duas empresas espanholas.” Já a Engevix, “por meio de seus advogados e executivos, prestará todos os esclarecimentos que forem solicitados”, diz em nota. A Queiroz Galvão não respondeu à reportagem até a conclusão desta edição.

Executivos presos tentarão delação, prevê procurador

• Rodrigo Janot espera novas delações, agora de empresários presos na sexta

• Ele rechaçou críticas de que recomendou o arquivamento de muitos inquéritos no Supremo

Aguirre Talento - Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, espera que a prisão de executivos e presidentes de grandes empreiteiras do país na operação Lava Jato faça com que muitos dos detidos busquem o instituto da delação premiada para tentar reduzir o tamanho de suas penas.

"Isso é um rastilho de pólvora. Quando um começa a falar, o outro diz: Vai sobrar só para mim?". E aí eles começam a falar mesmo."

Questionado sobre a possibilidade de haver uma quadrilha operando no desvio de recursos da Petrobras, Janot afirma que "em princípio sim, tudo indica que sim, mas está cedo para falar ainda".

À Folha, o procurador fez ainda um balanço de sua gestão no comando do Ministério Público e rechaçou críticas de que recomendou o arquivamento de muitos inquéritos no Supremo Tribunal Federal desde que assumiu o cargo, em setembro de 2013.

Novas delações
Isso é um rastilho de pólvora. Quando um começa a falar, o outro diz: Vai sobrar só para mim?", e aí eles começam a falar mesmo. Todos vão negociar. Se um abrir a boca, abre todo mundo. Um me perguntou: E se eu não tiver ninguém para entregar?" Eu disse: Sempre tem, você pode se entregar, se entregue, autodelação". Eu só não aceito perdão judicial [no acordo de delação]. Se for um crime que tenha já semiaberto, sempre que for possível eu vou botar o aberto. Vá cumprir pena em casa, sem problema nenhum.

Empreiteiros
Em principio é fraude em licitação, lavagem de dinheiro, crime contra o mercado e corrupção ativa.
Elas [empreiteiras] diziam que eram alvo de concussão [exigência de dinheiro por parte de funcionários da Petrobras]: Eu sou obrigado a dar, senão eu não consigo participar desse negócio e eu morro à míngua". Se puder me explicar como a fraude à licitação decorre de concussão, eu concordaria com a tese. Como a concussão te obriga a fazer um cartel, fraudar uma licitação e ganhar um dinheirão? Está sendo extorquido para ganhar dinheiro? Para ter que botar US$ 100 milhões no bolso? Vamos combinar, não é. A delação quebrou com essa ponte.

Presídios
A gente ainda vai pegar esse dinheiro. Hoje são cerca de R$ 700 milhões bloqueados [dos empreiteiros]. Se as empreiteiras vierem [fazer delação], nas cláusulas do acordo, vamos colocar a exigência para a construção de presídios. Nós vamos ter que fazer licitação para construir? Não. Eles vão me dar é in natura".

Políticos
São muitos fatos e muitas pessoas. Há também muita gente que não tem foro, mas tem relação com o fato. O que estamos investigando? Pagamento de propina com dinheiro desviado da Petrobras. As empreiteiras faziam o retalho das licitações. Teu lote é aquele, teu lote é aquele outro. Eu pego meu lucro, engordo ele, os outros engordam mais. Essa diferença entre meu lucro e o que engordei vai irrigar o sistema. Desse dinheiro, pelo que entendi do [ex-diretor da estatal] Paulo Roberto Costa, você tem dinheiro destinado a caixa dois de campanha.

Interferência
Estava visível que queriam interferir no processo eleitoral. O advogado do Alberto Youssef operava para o PSDB do Paraná, foi indicado pelo [governador] Beto Richa para a coisa de saneamento [Conselho de administração da Sanepar], tinha vinculação com partido. O advogado começou a vazar coisa seletivamente. Eu alertei que isso deveria parar, porque a cláusula contratual diz que nem o Youssef nem o advogado podem falar. Se isso seguisse, eu não teria compromisso de homologar a delação.

Legado da lava jato
O sistema republicano e a Justiça começam a mudar de paradigma. A Justiça de três, quatro anos para cá, não é mais uma justiça dos três Ps, de puta, de preto, de pobre. Ela está indo em cima de agente político e de corruptor. Acho que [essas novas operações e prisões] serão o grande propulsor da reforma política. E esse sistema é corruptor mesmo, se continuar esse sistema não vai mudar nada, pois vamos derrubar essas pessoas e outros virão ocupar esses espaços. O efeito que estou apostando é a reforma política.

Arquivamento
Eu arquivei 65 inquéritos, desses, cinco envolvem o senador Cícero Lucena (PSDB-PB). Em dias separados pegou uma motoca, botou caixa de som e começou a fazer propaganda eleitoral. Instauram-se cinco inquéritos, crime eleitoral, ambiental e de trânsito. Outros cinco da Kátia Abreu (PMDB-TO). Uso de armas da República em papel da CNA (Confederação Nacional da Agricultura). Há caso de deputado que cometeu crime quando era prefeito, mas foi verificar e ele não era prefeito no período. Arquivei um do senador Fernando Collor (PTB-AL). Alguém num avião ouviu que o Collor havia mandado matar o PC Farias e abriram inquérito de homicídio. Você precisa ter um mínimo de elementos para abrir inquérito. No STF se perguntavam como esses casos poderiam estar lá, ocupando a pauta do Supremo. O que eu fiz? Tirei o que tinha de lixo. E mais vai sair. Dizem que eu arquivei só do PT. São 20 do PMDB, 8 do PSDB e 3 do PT.

Inquéritos abertos
Eu requisitei a instauração de 29 inquéritos. Coisas que têm fundamentos. Também apresentei 11 denúncias contra parlamentares. Isso sem contar o trabalho na Lava Jato, na operação Ararath [que apura crimes contra o sistema financeiro e lavagem de dinheiro em Mato Grosso]. A atuação está visível.

Atraso de balanço fecha mercado para Petrobras

Talita Moreira, Fernando Torres e Claudia Schüffner – Valor Econômico

SÃO PAULO e RIO - O mercado de capitais vai ficar fechado para a Petrobras até a divulgação do balanço do terceiro trimestre. Sem números devidamente auditados, é impossível a estatal emitir títulos de dívida para financiar seu plano de investimento.

O atraso também tem um efeito inédito na credibilidade da maior companhia da América Latina, o que pode elevar o custo de captação quando o mercado reabrir as portas para a empresa.

A situação não é dramática porque a Petrobras não precisa acessar o mercado agora, mas, se o impasse perdurar, pode afetar a sua capacidade de investimento e da cadeia de fornecedores.

A contratação pela Petrobras, há pouco mais de 20 dias, de dois assessores externos para apurar a extensão dos casos de corrupção não é suficiente para que o auditor ateste a validade do balanço, segundo um executivo da área. Antes que haja um resultado consistente sobre esse trabalho de apuração, os administradores da companhia não podem tirar uma conclusão. "O auditor não pode concluir antes que a companhia conclua", diz.

Em junho, a estatal tinha em caixa R$ 66,4 bilhões. Os recursos são suficientes para cobrir os R$ 23 bilhões em dívidas que vencem até meados de 2015 e bancar os investimentos de dois trimestres. Não é, porém, uma folga tão grande para uma empresa cujo plano de investimento para o período 2014-2018 soma US$ 206,8 bilhões. Para fazer frente a esses números e não comprometer sua já alta alavancagem, a Petrobras precisa do mercado.

Para manter a estrutura atual rodando, a empresa precisará de US$ 20 bilhões ao ano, até 2018, entre empréstimos e captações. Desde janeiro, levantou US$ 13,6 bilhões por meio de emissões de bônus no exterior e R$ 800 milhões no mercado local com debêntures.

A companhia estudava a possibilidade de fazer uma captação em euros até o fim de dezembro. Agora, as chances minguaram. "O ano acabou para a empresa", disse um banqueiro que atua na estruturação de ofertas de bônus.

Gestores de fundos de investimentos sequer têm mandato para comprar títulos de uma empresa sem conhecer seus dados financeiros. Ao mesmo tempo, se não divulgar o balanço do terceiro trimestre até o fim do ano, a Petrobras descumprirá cláusulas de uma série de emissões de bônus.

Atraso do balanço trava captações da Petrobras
O mercado de capitais vai ficar fechado para a Petrobras, na melhor das hipóteses, até a maior companhia da América Latina divulgar seu balanço do terceiro trimestre. Sem números convincentes - e devidamente auditados - é impossível a estatal emitir títulos de dívida no Brasil ou no exterior para financiar seu bilionário plano de investimentos.

O atraso também tem um inédito efeito na credibilidade da companhia, o que pode elevar o custo de captação quando o mercado reabrir as portas para ela. Na sexta-feira, gestores de recursos falavam em danos à imagem da Petrobras diante da incapacidade da estatal de apresentar dados básicos para uma empresa de capital aberto.

A situação não é dramática porque a Petrobras não precisa acessar o mercado agora, mas tampouco é confortável. Se o impasse perdurar, pode afetar a capacidade de investimentos da estatal - e da cadeia de fornecedores a seu redor.

No fim de junho, a Petrobras tinha em caixa R$ 66,4 bilhões. Os recursos poderiam cobrir os R$ 23 bilhões em dívidas que vencem até meados do próximo ano e bancar os investimentos de dois trimestres (a estatal investe cerca de R$ 20 bilhões a cada três meses).

Não é uma folga tão grande para uma empresa cujo plano de investimentos para os próximos anos soma US$ 206,8 bilhões. Para fazer frente a esses números e não comprometer sua já alta alavancagem, a Petrobras precisa do mercado de capitais.

O estrategista-chefe da XP Investimentos, Celson Plácido, vê três caminhos para a estatal ter mais folga financeira. Um deles é emitir ações, algo fora de cogitação enquanto não fizer as pazes com o mercado. Outro é vender ativos. "Ou então ela corta investimentos e, nesse caso, não vai precisar captar tantos recursos", diz.

Para manter a estrutura atual rodando, a Petrobras precisará de US$ 20 bilhões ao ano entre empréstimos e captações. Desde janeiro, levantou US$ 13,6 bilhões por meio de emissões de bônus no exterior e R$ 800 milhões no mercado local por meio de uma operação com debêntures.

A companhia estudava a possibilidade de fazer uma captação em euros até o fim de dezembro. Agora, as chances de isso acontecer minguaram. "O ano acabou para a empresa", afirma um banqueiro que atua na estruturação de ofertas de bônus.

Gestores de fundos de investimentos sequer têm mandato para comprar títulos de uma empresa sem conhecer seus dados financeiros. Ao mesmo tempo, se não divulgar o balanço do terceiro trimestre até o fim do ano, a Petrobras descumprirá cláusulas ("covenants") de uma série de emissões de bônus em circulação no mercado, conforme relevou o Valor na semana passada.

Recorrer a empréstimos também ficou mais difícil. "Não há banco no mundo que faça um desembolso para a Petrobras neste momento", opina um diretor de uma instituição estrangeira.

A piora na percepção de risco ficou evidente nos preços dos bônus da estatal negociados no mercado. Os títulos com vencimento em 2024 estavam cotados na sexta-feira a 100,66% do valor de face, com queda de 2,15 pontos em relação à véspera. O rendimento do papel subiu para 6,20% ao ano, reforçando uma piora que já se via nas últimas semanas. No fim de outubro, a taxa estava em 5,43%.

Alexandre Ataíde, gestor de portfólio da Spinnaker Capital, observa que as taxas dos bônus de 2024 da Petrobras subiram mais que o prêmio de risco do Brasil em novembro. "Houve uma piora inerente à própria companhia", afirma.

Porém, o "efeito Petrobras" respingou em outras estatais, com o temor dos investidores de que os problemas encontrados na companhia possam se repetir nas demais controladas do governo. Bônus do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) que vencem em 2020 estavam cotados a 106,80% de seu valor de face na sexta-feira, com queda de 0,23 ponto em relação à véspera. Os bônus perpétuos do Banco do Brasil emitidos em 2012 encostaram no menor patamar da história e eram negociados a 101,59%, redução de 1,79 ponto.

Os papéis com risco "quase soberano" - semelhantes ao risco-país - já vinham em queda desde o período eleitoral. Entretanto, houve uma piora com o atraso no balanço da Petrobras e as prisões desencadeadas pela Polícia Federal na Operação Lava-Jato. "Investidores estrangeiros começam a se perguntar se pode haver problemas de governabilidade [no segundo mandato de Dilma Rousseff]", diz um banqueiro.

Para continuar a acessar o mercado de bônus, a Petrobras terá de restaurar a confiança dos investidores, segundo Longdley Zephirin, presidente e diretor de pesquisa do Zephirin Group. "Se a confiança não for restabelecida, pode afetar não apenas a Petrobras, mas levar a atrasos na estrutura de óleo e gás que é necessária para o futuro da empresa e do Brasil", diz.

Na opinião de um gestor de recursos, o mau humor dos investidores tende a diminuir nos próximos dias, mas a sucessão de más notícias começa a "manchar" o nome da Petrobras.

Esse ponto é importante porque a estatal sempre foi considerada boa pagadora. Mesmo descontentes com a gestão da companhia e com a política econômica brasileira, investidores estrangeiros costumavam correr em massa para os títulos da Petrobras. Na emissão de bônus feita em março, a empresa captou US$ 8,5 bilhões, mas a demanda chegou a US$ 23 bilhões.

Apesar do arranhão na imagem, a avaliação de crédito da Petrobras não será afetada de imediato, segundo as agências Standard & Poor's (S&P) e Moody's.

"A Petrobras acessa o mercado com precificações abaixo de seu rating. E ela não tem necessidade de acessar o mercado agora", diz Regina Nunes, presidente para o Cone Sul e para a América Latina da S&P. A companhia é classificada em "BBB-" pela agência, igual à nota atribuída ao Brasil.

Em nota, a Moody's afirma que o adiamento do balanço não tem implicações para o rating da empresa no curto prazo. Porém, a vice-presidente da agência Nymia Cortes de Almeida acrescentou por e-mail que a governança corporativa é um fator importante na definição do rating. (Colaboraram Sérgio Lamucci, de Washington; Vinícius Pinheiro e Thais Folego, de São Paulo)

Oposição quer usar fala de Dilma para levar Duque à CPI da Petrobras

• Decisão seria a prova de que o governo vai mesmo investigar e não ficar só no discurso

Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA - A oposição acusa o governo de querer capitalizar politicamente as ações da Lava-Jato, mas pretende usar o próprio discurso da presidente Dilma Rousseff como arma para forçar a aprovação, na CPI Mista da Petrobras, da convocação de Renato de Souza Duque, ex-diretor de Serviços da estatal preso na última sexta-feira. O DEM e o PSDB acusam Dilma de atribuir como ação de governo uma investigação que é independente e dizem que isso só será verdade se a base aliada mudar de postura na CPI Mista. Na semana passada, houve um acordo dentro da CPI para evitar a convocação de Duque e de empreiteiras.

O líder do DEM na Câmara, deputado Mendonça Filho (PE), disse ontem que a convocação de Duque será a prova de que a presidente não quer ficar apenas no discurso. Ele frisou que a investigação não é do governo, mas fruto da ação do Ministério Público, da Polícia Federal e da Justiça federal.

- O governo até agora atuou para impedir a investigação da CPI Mista. A bancada aliada atuou para impedir a convocação de Duque na semana passada. Espero que esse discurso dela (da presidente) possa fazer uma recondução da postura do governo até aqui - disse Mendonça Filho.

O líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (SP), foi irônico ao comentar as declarações de Dilma e do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo - que acusou a oposição de querer transformar a Lava-Jato em "terceiro turno eleitoral".

- Se os líderes do governo concordarem em convocar o Duque, talvez comecemos a dar um pouco de crédito às declarações. Como é que a presidente Dilma vai continuar dizendo que não sabia de nada? - disse Aloysio.

- Não vejo nenhuma autoridade da presidente nesta questão. Ela comandou a Petrobras, por meio do Conselho da empresa, e foi ministra de Minas e Energia. É possível até que ela não soubesse de tudo, mas não pode dizer que não sabia de nada - completou o líder do PSDB na Câmara, Antônio Imbassahy (BA).

Para a oposição, Graça Foster perdeu a condição de se manter na presidência da empresa. A avaliação é que a Petrobras está desgastada e que o governo precisa anunciar mudanças na gestão.

Apreensão no PT e no PMDB
Do lado da base aliada, o líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), disse que não se opõe à convocação de Duque. Já o líder do PT na Câmara, deputado Vicentinho (SP), disse que ainda vai discutir a questão com a direção do partido.
- Não sei se Duque foi indicado pelo partido. Se foi, não foi para fazer propina. - disse Vicentinho.

Nos bastidores, PT e o PMDB estão preocupados com os desdobramentos das investigações. O PMDB tenta se descolar de Fernando Baiano, que está foragido. O vice-presidente Michel Temer conversou com aliados ontem sobre as denúncias, e o clima é de apreensão. O discurso é lembrar que, em depoimentos dados na investigação, Baiano foi apontado como tendo relações com Nestor Cerveró, ex-diretor da estatal indicado pelo PT.

Já o líder do PPS na Câmara, deputado Rubens Bueno (PR), disse que apresentará requerimento à CPI Mista solicitando cópias do contrato da Petrobras com a Camargo Corrêa, em relação ao pagamento de aditivos para a obra da termelétrica de Termoaçu, no Rio Grande do Norte, como revelou O GLOBO. Na sexta-feira, o PPS já havia defendido a convocação de Duque.

Delações, telefonemas e milhões em propina

Carlos Rollsing – Zero Hora (RS)

CURITIBA - Até amanhã, 23 suspeitos de participação em esquema de corrupção envolvendo a Petrobras prestam depoimento para delegados em Curitiba. A Justiça Federal negou pedidos de habeas corpus destacando o grau das evidências apresentadas para a efetivação da prisão. Entre os detidos, dois executivos fecharam o primeiro acordo de delação premiada com o MPF

Alguns dos empresários mais poderosos do país e executivos de empreiteiras responsáveis por obras bilionárias passaram o fim de semana na carceragem da Superintendência da Polícia Federal (PF) em Curitiba (PR). Presos na sexta-feira na sétima fase da Operação Lava-Jato, 23 suspeitos de participação em esquema de superfaturamento de obras e pagamentos de propina em contratos da Petrobras, que teriam movimentado R$ 10 bilhões, prestam depoimentos desde sábado.

Do grupo, 17 permanecerão detidos pelo menos até amanhã, quando se encerra o prazo de prisão temporária de cinco dias decretada pelo juiz federal Sérgio Moro. A PF poderá solicitar a prorrogação, decisão que caberá à Justiça. Caso isso não ocorra, a maior parte dos suspeitos será liberada. Os outros seis envolvidos, alvos de prisão preventiva, deverão ficar mais tempo na carceragem. Durante o fim de semana, advogados tentaram obter habeas corpus que determinassem a soltura de seus clientes. A Justiça Federal de Porto Alegre, que abrange a Região Sul do país, negou os pedidos, alegando a robustez das evidências que constam nos autos do processo.

Houve pouca movimentação ontem na superintendência da PF na capital paranaense. Pela manhã, os 23 detidos deixaram o local em um ônibus e uma van. Eles foram ao Instituto Médico Legal para fazer os exames de corpo de delito. Na saída do prédio, apenas um advogado aceitou falar. Sem identificar o seu cliente, informou que três depoimentos foram tomados ontem durante todo o dia. Hoje deverão ocorrer outros três, e mais quatro amanhã.

Lobista disse que não se entregará
A PF informou que delegados se revezam para fazer os interrogatórios dentro do prazo de cinco dias das prisões temporárias. Outros agentes seguem trabalhando em análises de documentos.

O primeiro acordo de delação premiada com empresas envolvidas no esquema de corrupção na Petrobras foi fechado pelo Ministério Público Federal (MPF) com executivos da Setal. O grupo tem contrato de mais de R$ 4 bilhões com a estatal. Dois executivos do Setal, Augusto de Mendonça Neto e Julio Camargo, afirmaram ter entregue R$ 30 milhões para a diretoria de serviços da Petrobras, comandada por Renato Duque, indicado pelo PT e suspeito de receber propina. Duque, que esteve no cargo entre 2003 e 2012, também está preso.

Deflagrada na sexta-feira, a nova fase da Lava-Jato prendeu doleiros e diretores de oito das maiores empreiteiras do Brasil. Dois continuam foragidos: o lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano, que seria operador do PMDB, e Adarico Negromonte Filho, irmão do ex-ministro das Cidades Mário Negromonte. Os nomes foram incluídos na lista de alerta da Interpol. O advogado de Baiano informou ontem que seu cliente não deverá se entregar à polícia.

O esquema de corrupção na Petrobras, segundo investigações da PF e do MPF, envolveria um cartel entre as maiores empreiteiras do país. Elas combinariam os vencedores das licitações, cobrando o preço limite. Com a ajuda de empresas intermediárias, repassavam propina a doleiros e diretores da Petrobras, que faziam o dinheiro chegar a partidos – PT, PMDB e PP são apontados como beneficiários – e políticos.

Localizada em uma área de pouco trânsito e cercada por árvores, a sede da PF registrou movimento mais acentuado de advogados. A maioria portava sacola com roupas, alimentos e até caixas de bombom para os detidos.

Geração de empregos deve ser a pior desde 99

Camilla Veras Mota e Marina Falcão – Valor Econômico

SÃO PAULO e SALVADOR - Depois do inesperado fechamento de 30,3 mil vagas pela economia formal em outubro, conforme mostrou o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) na sexta-feira, a geração de postos no país em 2014 se encaminha para ser a pior desde 1999, quando começa a série histórica disponibilizada pelo Ipea Data.

Até o mês passado, o registro do Ministério do Trabalho e Emprego acumula 730,1 mil vagas com carteira na série sem ajuste, que só contabiliza as informações enviadas dentro do prazo legal. Se dezembro mantiver a sazonalidade negativa dos anos anteriores e fechar entre 400 mil e 500 mil empregos, o saldo do ano não deve chegar a 500 mil, avalia José Márcio Camargo, economista-chefe da Opus Investimentos. "Novembro é que vai definir o patamar", comenta. No mesmo mês, Em 2013, foram abertos 47,4 mil postos.

Priscilla Burity, do banco Brasil Plural, observa que a desaceleração do Caged neste ano deve-se principalmente ao desempenho das contratações. Em outubro, elas caíram pelo quinto mês consecutivo em relação ao mês anterior, 7%. Mantida essa tendência, um aprofundamento do ritmo de demissões pode comprometer novembro, avalia.

O resultado de outubro surpreendeu a média de estimativas colhidas pelo Valor Data, de 56,7 mil novas vagas, e levou a LCA Consultores a revisar a projeção para o ano de 445 mil postos para 250 mil, na série sem ajuste. No ano passado, o país criou 730,6 mil empregos. Em 2009, auge da crise, o saldo foi de 995,1 mil.

Na série com ajuste, a projeção passou de 700 mil para 400 mil - número bastante inferior à expectativa do governo no início do ano, de abertura de 1,4 milhão de vagas. O ministro do Trabalho, Manoel Dias, afirmou na sexta-feira que o resultado do ano será "provavelmente" menor do que a projeção atual, de um milhão de vagas. Ele não detalhou, contudo, a estimativa oficial.

Apesar dos resultados bastante negativos da indústria e da construção civil - com saldos líquidos negativos de 11,8 mil e de 33,5 mil, respectivamente -, o desempenho dos serviços foi a principal surpresa negativa, afirmam economistas.

No mês passado, o setor abriu apenas 2,4 mil postos com carteira assinada, longe da média dos anos anteriores, em torno de 30 mil. "Essa perda de fôlego indica que o setor não deve ajudar mais a criação de vagas como nos meses anteriores", pondera Romão, da LCA. Ele chama atenção para o segmento bastante heterogêneo de administração de imóveis e serviços técnicos, que fechou 8,8 mil postos. "Esse é um sinal claro de piora."

Os serviços vinham respondendo por uma parcela significativa da geração de emprego formal neste ano. Até setembro, eles foram 62,6% do saldo, contra 41,4% no mesmo intervalo do ano passado e 33,1% em 2008.

O comércio manteve certo fôlego e abriu 32,7 mil vagas com carteira - patamar ainda inferior, entretanto, ao de outubro do ano passado, de 50 mil. "O Caged vem desacelerando desde 2010. O que temos visto neste segundo semestre é uma intensificação desse movimento", pondera Camargo, da Opus.

PSB se divide sobre aproximação com PT

• Socialistas discutem rumos do partido a partir de 2015. Preocupação é com a viabilidade administrativa dos governadores da sigla: Câmara (PE), Rollemberg (DF) e Coutinho (PB)

Patrycia Monteiro Rizzotto – Brasil Econômico

Depois da guerra eleitoral, lideranças do PSB discutem sobre a possibilidade de hastear a bandeira branca da paz para o PT. Embora não haja consenso dentro do partido sobre a reaproximação política com o antigo aliado, são grandes as preocupações dos representantes da legenda com a questão da governabilidade dos socialistas que vão assumir os governos de Distrito Federal, Pernambuco e Paraíba, a partir de 2015. Na semana passada, os presidentes das executivas estaduais se reuniram com Carlos Siqueira, presidente nacional do PSB, para discutir os novos rumos da legenda a partir do ano que vem. Um novo encontro está previsto nos próximos dias para definir o futuro posicionamento. "Há três possibilidades sendo cogitadas internamente no partido.

A primeira é a de manter uma postura independente no Senado e Câmara, decidindo sobre as pautas, sem fazer barganhas políticas. Que é o que já vinha acontecendo mais recentemente, desde que o partido saiu do governo para que Eduardo Campos assumisse sua candidatura. Em geral, por questão de afinidades políticas, sempre fomos favoráveis aos temas do governo. Mas também está sendo avaliada a possibilidade de irmos para a oposição ou a terceira opção — que é a minha, particularmente — de fazermos uma aproximação, mantendo a independência política", afirma o senador João Capiberibe (PSB/AP). De acordo com ele, o partido está muito dividido sobre suas alternativas e por isso não dá para dizer qual corrente vem ganhando mais força dentro do PSB.

"Entre os deputados e senadores do partido há uma inclinação maior pela posição de independência, mas entre as executivas regionais há um equilíbrio de forças. Nossa maior preocupação é coma viabilidade administrativa dos nossos governadores eleitos (Paulo Câmara, de Pernambuco; Rodrigo Rollemberg, Distrito Federal; e Ricardo Coutinho, da Paraíba) porque, com exceção de São Paulo, Paraná e talvez o Espírito Santo, creio que nenhum estado brasileiro pode se dar ao luxo de não estabelecer um diálogo com o governo federal. Creio que nós procuraremos construir uma ponte com o governo Dilma", diz Capiberibe. Desmentindo algumas especulações, o senador nega que esteja sendo discutida uma fusão do PSB com PPS e PSD.

Por outro lado, ele confirma a saída de Marina Silva do partido até março do ano que vem. "O que estamos articulando é a formação de um bloco político de atuação parlamentar com o PDT e o Psol. A Marina, por sua vez, vai seguir seus planos iniciais, que é o de recolher assinaturas para fundação de seu partido, o Rede Sustentabilidade", comenta, mencionando que, por enquanto o partido não faz planos para 2018. "Ainda estamos tratando as feridas desta eleição", diz. Já o deputado Beto Albuquerque (PSB/RS), está entre os socialistas que rejeitam veementemente a ideia de se aliar de novo ao PT. "Tivemos um ano difícil, repleto de adversidades. Não há possibilidade de reaproximação com o PT porque discordamos da atuação do governo.

Na minha opinião, o caminho natural de quem disputa uma eleição e perde é buscar espaço da oposição", afirmou. Segundo Albuquerque, o PPS e o PV também devem fazer parte do bloco partidário que está sendo formado pela bancada federal do PSB e a proposta é fazer oposição, sem necessariamente ficar alinhado ao PSDB. "Vivemos num país democrático e não é porque elegemos governadores que temos de rezar pela cartilha do governo federal. Precisamos manter o diálogo, entendendo que Dilma também não pode virar as costas para a população governada pelos partidos de oposição.

O PSB tem de ser coerente com o que protagonizou em 2014", argumenta. Na opinião do cientista político Antonio Lavareda, é provável que o PSB escolha manter uma postura independente a partir de 2015. "Creio que o partido não vai adotar uma postura de oposição subserviente ao PSDB. Isso seria incompatível com a proposta de terceira via que ele vem apresentando", diz, relembrando que o PSB já se colocou como alternativa à polarização entre PT e PSDB em 2002, quando lançou a candidatura de Anthony Garotinho à Presidência.

Para Lavareda, a aproximação entre PSB e PT é difícil por causa das feridas abertas durante a última eleição. "Se Eduardo Campos estivesse vivo, ele insistiria na proposta de independência", frisa. Ele acredita que o partido pode dar uma guinada e fortalecer suas novas lideranças para o pleito de 2018. "Beto Albuquerque, Geraldo Júlio (prefeito do Recife) e Paulo Câmara são lideranças promissoras", afirma.

Troca de partido reduz competitividade

• "A capilaridade ficou no PT, não veio comigo", justifica Dutra, que não se reelegeu e teve votação reduzida à metade

Cristian Klein – Valor Econômico

SÃO PAULO - A três meses do início de nova legislatura no Congresso, os partidos planejam um realinhamento de forças com previsões de fusões e criação de novas legendas. Tudo para driblar a regra que coíbe a infidelidade partidária, num movimento capitaneado por articuladores políticos como o ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab (PSD) e o governador do Ceará Cid Gomes (Pros). No entanto, para os que trocam de sigla - a maioria oriundos do baixo clero - a mudança significa entrar num vulnerável grupo cujo perfil tem como característica uma reduzida taxa de reeleição. De acordo com os resultados da disputa em outubro, entre os 84 parlamentares que trocaram de partido ao longo da legislatura e buscaram um novo mandato 33 - 39,3% - não se reelegeram. É uma taxa superior aos 30,2% da média geral, de todos os deputados que tentaram se reeleger, e ainda mais distante se comparado com o grupo dos que permaneceram em suas agremiações, cuja proporção de não reeleitos foi de 27,7%. Ou seja, ter mudado de partido aumentou em até 11,6 pontos percentuais a chance de fracasso de um deputado que quis permanecer na Câmara.

Essa espécie de "maldição" dos infiéis atingiu mesmo aqueles que concorreram a deputado estadual, um cargo mais baixo na hierarquia da escada política. Nenhum dos quatro conseguiu. É o caso de Almeida Lima, que em 2010 já havia perdido a legenda do PMDB para se reeleger senador e teve que concorrer a deputado federal. Agora, seu caminho foi, de novo, o de descer mais um degrau, porém, sem sucesso.

Durante o mandato, o parlamentar saiu do PPS - cuja dezena ainda marca os últimos números de seu celular, 2323 - e voltou para o PMDB. Com 8.280 votos, obteve um terço da votação do décimo e último eleito pela coligação, na qual terminou em 14º lugar. No geral, alcançou a 37ª votação para uma Assembleia Legislativa com 24 deputados.

Almeida Lima justifica o mau desempenho a uma "série de fatores", desde o cansaço com a vida parlamentar em Brasília, a falta de financiamento de campanha até o desestímulo em concorrer ao cargo no Estado. Sua campanha, conta, restringiu-se aos últimos 30 dias. "Não queria nem ser candidato a deputado estadual. Recebi uma missão [do partido] para concorrer", afirma.

O deputado diz que se ofereceu para ser um coordenador da campanha à reeleição do governador e também pemedebista Jackson Barreto ou um secretário estadual tampão - "algo que justificasse sair de Brasília e não ser candidato", resume.

Suas pretensões, porém, não foram atendidas, da mesma forma que em 2010, quando o PMDB sergipano, controlado por Barreto, fez uma aliança que impediu Almeida Lima de concorrer à reeleição no Senado. Pelo acordo, o PMDB apoiou Eduardo Amorim (PSC) para senador, e o PT, do governador Marcelo Déda, em troca do lugar de vice na chapa majoritária, que foi ocupada por Jackson Barreto. No ano passado, com a morte de Déda, Barreto assumiu o governo e, no mês passado, reelegeu-se no primeiro turno.

A saída de Almeida Lima para o PPS e o retorno ao PMDB não lhe garantiu mais espaço ou apoio político. Pelo contrário. Ele reclama que, apesar de ter destinado recursos de emendas parlamentares para vários municípios, apenas 20 prefeitos, num total de 75, assumiram compromisso integral ou parcial de lhe ajudar. "Não tive caixa dois. E sem isso você não se elege", afirma.

O parlamentar conta que a adesão de vereadores, reunidos pelos prefeitos, não vem pela troca de apoios entre eleições municipais e estaduais. A fatura é cobrada na própria disputa a deputado e não custa pouco. O preço para um vereador pedir voto, durante 90 dias de campanha, pode partir de R$ 10 mil e chegar a mais de R$ 50 mil, dependendo da cidade. "O apoio não sai pela cor dos seus olhos", argumenta Almeida Lima. Como não existe rubrica para essa compra de voto indireta na prestação de contas à justiça eleitoral, argumenta o pemedebista, é preciso receber doações e fazer pagamentos por fora, com o caixa dois. "Há rubrica de despesa de campanha para pagar marqueteiro, advogados, jornalistas, fotógrafos, até maquiador. Mas não para essa rede de apoios, o que, a meu ver, também não seria legítimo", diz.

Almeida Lima atribui à falta de financiamento um "fato enorme" para seu insucesso eleitoral. Suas receitas, porém, foram de R$ 426.620,00 - dos quais R$ 400 mil doados pela JBS, segundo ele, com a ajuda de correligionários na direção nacional. É o segundo maior valor entre os que concorreram à Assembleia e 2,3 vezes maior do que a arrecadação média dos 24 eleitos, que foi de R$ 183.071,12. Pelo critério de eficiência, o desempenho é ainda pior, pois cada um de seus 8.280 votos custou R$ 51,50 - 7,6 vezes mais do que a média de R$ 6,72 por voto registrada pelos eleitos.

O deputado diz que não teve reciprocidade mesmo nos municípios beneficiados por suas emendas parlamentares. "Você libera R$ 1,2 milhão para uma escola, para um mercado municipal, para um quadra de esporte, uma praça, mas o prefeito não me apoiou, e o vice-prefeito também não. Aí, abrem a urna e recebo 8 votos, e candidatos que não levaram nada para o município, mas são apoiados pelo prefeito, têm 700 votos", reclama.

A trajetória de Almeida Lima reflete um fenômeno que explica boa parte das trocas de legenda: a falta de espaço partidário. Desse modo, não é a simples mudança de sigla que leva ao fracasso, mas é a migração que já demonstra uma dificuldade do político em manter sua base de apoio.

O deputado federal reeleito Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, reconhece que este é o perfil de quem troca de partido. Em sua empreitada para fundar o Solidariedade, no ano passado, Paulinho negociou com dezenas de parlamentares nesta situação. "Geralmente, é um deputado que está sem espaço nenhum no partido dele. Troca para ver se melhora, e muitas vezes não melhora", diz.

Um desses casos é o de Domingos Dutra (SD-MA). Egresso do PT, por discordar da aliança do partido com o clã Sarney, Dutra foi para o Solidariedade e viu sua votação de 82 mil, em 2006, e 81 mil, em 2010, cair à metade neste ano, quando obteve apenas 40.424 votos. Ficou em sétimo lugar numa coligação que elegeu cinco deputados federais. "Saí do PT, onde estava 33 anos e fui presidente estadual. O partido tem diretórios em todos os municípios. Essa capilaridade ficou no PT, não veio comigo. Andei 520km a pé, em caminhadas por 90 municípios. As pessoas batiam palma, meu discurso é forte, contra a família Sarney. Mas eu ia embora e não ficava ninguém alimentando o eleitor", justifica o deputado.

Dutra diz que os recém-criados Pros e o Solidariedade não têm a mesma estrutura que os partidos já consolidados. Lembra que mesmo Paulinho, que se reelegeu, teve a votação reduzida ao sair do PDT. O sindicalista, que em 2010 obteve 267 mil votos e foi o quinto mais votado em São Paulo, recebeu 227 mil, caindo para a décima maior votação a deputado federal.

"Isso prejudica. Falei com o João Dado (SD-SP), que também não se elegeu. Com o Bala Rocha (SD-AP) aconteceu a mesma coisa. Eram do PDT, que tem base sindical. Quando o líder sai, leva muito pouco da militância, principalmente os filiados mais antigos, que resistem em mudar", afirma Dutra.

O parlamentar argumenta que nos municípios, especialmente os menores, a capilaridade é que "vai amarrando" os eleitores na figura dos intermediários. É o vereador, o pastor, o padre, o presidente de sindicato, o prefeito, o ex-prefeito. Ao lado desses cabos eleitorais, o carro de som e o cartaz "valem muito", diz.

Há também situações em que a troca de partido e o revés nas urnas ocorreram com deputados envolvidos em escândalos de corrupção. É o caso de Luiz Argolo (SD-BA), ex-PP, acusado de ter envolvimento com o doleiro Alberto Youssef, preso na Operação Lava-Jato. Argolo teve uma ligeira queda em sua votação de 68 mil para 63,6 mil e é o primeiro suplente numa coligação que elegeu 14 deputados. Pode voltar na próxima legislatura, embora o Conselho de Ética da Câmara tenha recomendado, há 15 dias, a cassação de seu mandato.

A queda eleitoral de Berinho Bantim (SD-RR) foi maior: de 10.111 votos para só 2.434 votos, cerca de 25% do que há quatro anos, quando se elegeu pelo PSDB. Agora, porém, concorreu, à semelhança de Almeida Lima, a deputado estadual, ficando em 31º lugar. Isso contrariou, segundo Paulinho da Força, o acordo de que tentaria se reeleger à Câmara. Bantim é um dos envolvidos no caso da Operação Gafanhoto - que chegou a prender o ex-governador do Estado, Neudo Campos, em 2003 - e responde ação no Supremo Tribunal Federal (STF).

Paulinho diz que Berinho Bantim fez uma "dobradinha" com outro candidato a federal e que a direção nacional do Solidariedade decidiu fazer uma intervenção no comando regional. Uma das razões para o parlamentar concorrer a deputado estadual, conta Paulinho da Força, seria a estratégia de protelar o julgamento de seu processo na Justiça. "Às vezes, interessa para o processo [sair do STF e] voltar [para o Estado]", diz. Procurada pela reportagem, a assessoria de Bantim informou que o deputado não esteve durante a semana em Brasília e também não responde por telefone, seja celular ou de escritório político no Estado. O Solidariedade também diz não ter o contato do parlamentar.

Na opinião do presidente do partido, as novas articulações de criação e fusão de legendas não deverão se concretizar. "O Cid [Gomes, que pretende fundir PDT, PCdoB e Pros] não tem controle do próprio partido. O Lupi vai entregar o PDT? Já o Kassab [que estaria por trás da refundação do PL para posterior fusão com o PSD] será que ele se dedicou enquanto fazia campanha ao Senado? Fazer partido não é fácil. Dá muito trabalho. Eu não faço mais", diz Paulinho.

Congresso fechou porteira mas pressão continua

Cristian Klein - Valor Econômico

SÃO PAULO - É a reforma política por excelência que tem sido feita no país nos últimos anos. Uma reforma que interessa aos profissionais do ramo e pouco aos eleitores. Primeiro, a criação e, agora, no que pode ser a nova moda, a fusão de legendas configuram-se como as principais mudanças no cenário político-partidário.

Nada de alteração no quase sexagenário sistema eleitoral. Sem mais o que dizer depois da longa campanha à reeleição, a presidente Dilma Rousseff defendeu a ampla reforma política. Lançou-a ao vento como quem joga conversa fora.

Sem consenso, a reforma possível - e errática - vem por dentro, numa marcha e contramarcha. É menos Dilma e PT, e mais Kassab, que criou o PSD e já planeja trocar de pele, num novo empreendimento partidário.

O ex-prefeito de São Paulo é a figura mais notável do processo de mutação que vem ocorrendo nos últimos anos no sistema partidário brasileiro. Na sua trilha, vieram outros: Paulinho (SD), Eurípedes (Pros), PEN, PPL. Kassab tocou o berrante, reuniu seu rebanho e forçou o voluntarioso Judiciário a abrir a porteira, em 2011.

No ano passado, o Congresso tratou de pôr a tranca novamente. Reafirmou o que já estava na legislação: tempo de TV e fundo partidário são distribuídos de acordo com os resultados da última eleição para a Câmara dos Deputados. O próprio Legislativo deu seu freio de arrumação. Caiu o incentivo para que "empreendedores" sigam o caminho de Kassab. O de construir, a todo momento, siglas que canibalizam o sistema partidário.

O estímulo, no entanto, vai continuar, enquanto houver a regra da fidelidade partidária - imposição do Judiciário que procurou coibir o troca-troca de legendas e o elevou a outro patamar, mais perigoso. Os magistrados tamparam de um lado e os políticos forçam a saída, por outros.

Sem a vantagem de fundar novas agremiações com deputados que trazem tempo de TV e fundo partidário das antigas legendas, a aposta agora é na fusão, outra justa causa para mudança de sigla.

É o que pretendem fazer Kassab, Cid Gomes - que mal entrou no Pros -, o DEM e o PSB, recém-derrotado com a candidatura presidencial de Marina Silva.

De novo, as urnas elegeram um Parlamento com uma miríade de legendas, 28, o que mantém o Brasil como o recordista mundial de fragmentação partidária.

Mas se o sistema eleitoral favorece a dispersão, a lógica no Congresso demanda uma ação coletiva, em bloco. O poder de barganha dos parlamentares - internamente e em relação ao Executivo - depende do tamanho de seus partidos.

A movimentação de bastidores, com possíveis fusões, vai nessa direção. O objetivo de Kassab é aglutinar deputados espalhados pelo grande varejo de siglas, algumas inclusive recém-criadas, como o Solidariedade. Nesse sentido, é possível que esteja em andamento uma espécie de seleção natural, contrária a diagnósticos mais catastróficos sobre a evolução do sistema partidário. O que não significa que estejamos bem.

Grandes deslocamentos, contudo, devem ser improváveis. A fusão pode representar crescimento mas também abre a brecha para que insatisfeitos saiam de suas legendas com justa causa. Com a refundação do PL, Kassab pode condensar a demanda por troca de partido, antes de arriscar a perda de alguns parlamentares na fusão com o PSD. É um louco, e ao mesmo tempo racional, malabarismo para driblar a legislação. Não tem nada de ilegal ou imoral. Mas dá uma ideia da confusão que o Judiciário poderá criar em sua novas "reforma política", prestes a entrar em vigor: a proibição do financiamento de empresas às campanhas.

Reação inclui ideia de 'Operação Mãos Limpas'

• Objetivo do discurso de Dilma para responder a denúncias na Petrobrás é ressaltar que governo combate a impunidade

Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff vai encontrar uma crise política em ebulição quando retomar suas atividades no Palácio do Planalto, amanhã, após uma semana fora do País. Mesmo antes de desembarcar, porém, ela já começou a ensaiar o discurso de reação ao escândalo que tomou conta da Petrobrás, no qual destaca uma espécie de "Operação Mãos Limpas" em curso no País, para acabar com a impunidade. Esse era o nome de uma operação que, na Itália dos anos 90, investigou a fundo as ligações entre a Máfia e os partidos políticos.

Essa foi a forma que o governo encontrou, até agora, para contornar as acusações sobre o desvio de dinheiro da estatal para pagamento de propina a integrantes de sua base de sustentação. O Palácio do Planalto e os aliados estão perplexos com a sétima fase da Operação Lava Jato, não por acaso batizada de Juízo Final.

Há preocupação com o impacto do escândalo na seara política, que pode atingir 70 deputados e senadores, e também com os efeitos na economia, com a paralisia da Petrobrás e a imagem da companhia em frangalhos dentro e fora do País. "Ninguém sabe onde isso vai parar", resumiu um auxiliar da presidente.

O receio de que a crise na Petrobrás prejudique ainda mais os investimentos no Brasil levou Dilma defender ontem a estatal. "Não se pode condenar a empresa", disse a presidente na reunião do G-20 na Austrália.

De volta ao Brasil, Dilma reforçará o tom desse discurso, que tende a jogar para o colo do PSDB o engavetamento de investigações num passado não muito distante. A presidente voltará ao Planalto no mesmo dia da sessão da CPI da Petrobrás no Congresso, que será agitada pela oposição.

Ministério. Dilma também vai se reunir com dirigentes de partidos aliados, ainda nesta semana. Ela tenta montar o xadrez da composição do novo ministério - mas os aliados prometem cobrar mais caro para reforçar o apoio ao governo.

Ela já avisou que a primeira definição será o novo ministro da Fazenda. "É a escolha de Sofia", resumiu a presidente, antes de embarcar para a Austrália.

Para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a escolha do sucessor de Guido Mantega é difícil porque o perfil de quem pode assumir a vaga está em falta no mercado. "Quando eu era oposição, reunia uns 30 economistas para discutir os problemas do País. Hoje, a gente conta aí uns três", disse ele, em recente reunião com senadores do PT, ao lembrar que muitos de seus interlocutores envelheceram e outros não aceitam essa tarefa.

Na lista dos cotados ainda para a Fazenda estão o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles - o preferido de Lula -, o ex-secretário executivo da Fazenda Nelson Barbosa, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, e do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco.

Alvo de críticas até mesmo no PT, o secretário do Tesouro, Arno Augustin, responsável pelas chamadas "pedaladas fiscais", também deve ser deslocado de posto. Dilma gosta de Arno, e estuda agora transferi-lo para a presidência da Itaipu Binacional.

Os percalços na economia têm ainda um ingrediente político. O Planalto depende do Congresso para aprovar o projeto de lei que desconte da meta do superávit primário - economia de gastos para pagamento dos juros da dívida pública - as despesas com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e com as desonerações tributárias.

Há ainda a tentar vencer a articulação do líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), desafeto de Dilma, para ser presidente da Casa. "O presidente da Câmara não é para defender o governo, mas também não é para atacar", emendou Arlindo Chinaglia (SP), que deve ser o candidato do PT para enfrentar Cunha. "Tudo indica que teremos muita emoção pela frente".

As duas faces de um escândalo

• Enquanto Dilma sai em defesa da limpeza da corrupção na Petrobras e afirma que as investigações podem "mudar o Brasil para sempre", a oposição vê cinismo na posição da presidente ao se esquivar de uma suposta responsabilidade

Amanda Almeida, Paulo de Tarso Lyra e Julia Chaib – Correio Braziliense

Na primeira manifestação pública sobre a nova fase da Operação Lava-Jato, a presidente Dilma Rousseff disse ontem que as investigações sobre o esquema de corrupção na Petrobras podem “mudar o Brasil para sempre”. Para a oposição, a petista se apropria inadequadamente da atuação da Polícia Federal, do Ministério Público e da Justiça Federal para se esquivar de suposta responsabilidade, já que a empresa esteve subordinada a ela no governo Luiz Inácio Lula da Silva, quando comandou o Ministério de Minas e Energia (2003-2005) e a Casa Civil (2005-2010).

“Acho que isso (investigações da Lava-Jato) pode mudar, de fato, o Brasil para sempre. Em que sentido? No sentido de que vai se acabar com a impunidade. Nem todos, aliás, a maioria absoluta dos membros da Petrobras, os funcionários, não é corrupta. Agora, há pessoas que praticaram atos de corrupção dentro da Petrobras”, disse a presidente, pouco antes do encerramento da reunião do G20, na Austrália. De acordo com os investigadores, nove empreiteiras formavam um cartel para faturar contratos bilionários com a Petrobras. Para isso, pagavam propina a agentes públicos. Só com a estatal, elas movimentam R$ 59 bilhões.

O discurso adotado por Dilma é semelhante ao usado na campanha eleitoral, quando ela precisava responder sobre os escândalos no governo petista. Mais uma vez, ela disse que não é o primeiro caso de corrupção na história do país. “Acredito que a grande diferença dessa questão é o fato de ela estar sendo colocada à luz do sol. Por quê? Porque esse não é, eu tenho certeza disso, o primeiro escândalo. Agora, ele é o primeiro escândalo investigado”, afirmou a presidente.

Dilma tentou isolar as empreiteiras dos supostos malfeitos dos executivos. “Não acho que dá para demonizar as empreiteiras. São grandes empresas, e se ‘a’ , ‘b’, ‘c’ ou ‘d’, praticaram malfeitos, atos de corrupção ou de corromper, acho que elas pagarão por isso”, disse. De acordo com o Ministério Público Federal, as empreiteiras investigadas pela Lava-Jato mantêm contrato ativos com a administração pública federal que somam R$ 4,2 bilhões. “Presente risco de que o mesmo esquema criminoso com nuances diversas esteja neles também sendo empregado”, registra em despacho o juiz Sérgio Moro, responsável pelo processo.

A presidente tentou ainda preservar a Petrobras dos estragos causados pelo escândalo. Dilma lembrou um dos maiores casos de corrupção da história corporativa mundial, ocorrido na norte-americana Enron, que apresentou receitas infladas no balanço e faliu depois de ser a sétima maior companhia dos Estados Unidos. “O que nós temos de condenar são as pessoas”, disse. “Não é um monopólio da Petrobras ter processos de corrupção. Quero te lembrar que um dos grandes escândalos de corrupção investigados no mundo foi o da Enron. E a Enron era uma empresa privada.”

"Cinismo"
Para a oposição, a presidente foi cínica ao comentar as investigações. “É de um cinismo sem tamanho. Ela não tomou nenhuma providência em nenhum momento durante tantos anos de desfalque na Petrobras, que foi usada para abastecer políticos da base aliada. Não se viu nenhuma ação dela para combater essa corrupção”, disse o líder do PPS na Câmara, Rubens Bueno (SP). De acordo com o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, preso na primeira fase da Lava-Jato e um dos delatores do esquema, as empreiteiras pagavam entre 2% e 3% de propina para políticos do PT, PMDB e PP em troca de contratos com a Petrobras.

Rubens Bueno afirma ainda que a presidente tenta capitalizar um trabalho que não foi feito pelo governo. “Quem aprofundou a investigação? O Ministério Público Federal, a Polícia Federal e a Justiça. Se dependesse do governo, estaria tudo encoberto”, comentou.

O líder do PSDB na Câmara, Antonio Imbassahy (BA), disse que a presidente “não tem autoridade” para “se apropriar das investigações”. “Ela comandou a Petrobras nos anos de governo Lula. Como presidente tinha todos os instrumentos no governo para evitar esse escândalo. Mesmo com a maior boa vontade que o brasileiro pode ter, ele não acredita que a presidente não sabia de nada. Pode ser que ela não sabia de tudo, mas não dá para acreditar que não sabia de nada”, disse.

Presidencialismo de coalizão está travado, diz Melo

- O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - O Brasil vive hoje um "travamento" do presidencialismo de coalizão e uma crise de liderança política, avaliou o cientista político e professor do Insper Carlos Melo, durante o seminário "Brasil 2015: Cenários Políticos e Econômicos", promovido pela Fundação Mário Covas e pela Fipe. Segundo ele, o modelo atual chegou à exaustão após três governos de um mesmo partido e precisa ser mudado, pois, mesmo que haja alternância de poder no futuro, o novo governo também passaria pelo menos problema.

Melo afirmou que o presidencialismo de coalizão está travado em razão do modelo adotado no País, em que se garante maioria no Congresso Nacional por meio da distribuição de cargos. "No primeiro mandato, isso é uma festa. Você tem 30 mil cargos para distribuir. É a tal da lua de mel. Quando vem a reeleição, eles já estão distribuídos, e aí tem que entrar na joia da coroa, nas agências reguladores ou diretorias de estatal. (...) Quando chega na sucessão do grupo político, você não tem mais o que dai", explicou.

O cientista político destacou que esse travamento se aplica mesmo em casa de alternância de poder, o que torna necessário a mudança do jogo. "Se o Aécio fosse eleito, melhoria a alternância, mas em três mandatos chegaria à exaustão novamente", afirmou. Melo destacou que, mesmo com o Orçamento Impositivo, apontado por algumas lideranças como a saída para o chamado "toma lá, dá cá", não resolveria. "Ai a negociação vai ser nova. Com a emenda garantia, vão perguntar: o que tem a me oferece agora", disse.

Na avaliação do professor do Insper, o governo carece de liderança política. Em uma crítica direta à Dilma Rousseff (PT), ele afirmou que um "presidente não pode se limitar a ser um gerente". "Um presidente não pega um projeto e vai vendo erro por erro", afirmou, destacando que esse é o perfil da petista. "Um técnico é mais ideológico do que político, o político é mais pragmático", acrescentou, afirmando que os ex-presidentes Lula, Fernando Henrique Cardoso e Getúlio Vargas são exemplos de líderes pragmáticos.

De acordo com o cientista político, esse "ideologismo" tem atrapalhado a definição do novo ministro da Fazenda, uma vez que a "presidente não tem força de impor um nome", ao mesmo tempo em que não tem o "diagnóstico de aceitar um nome que não seja de sua preferência". "Se me perguntarem qual a saída para isso, não sei. Recomendo acompanhamos atentamente esse governo", disse. Carlos Melo afirmou ainda que essa crise de liderança política também se dá pela inexistência de novos nomes para sucederem os atuais líderes.

"Nossos dois últimos líderes, Fernando Henrique está com 82 anos de idade, o Lula caminhando para 70 anos, convalescendo de um câncer. Quem sucede os dois?", afirmou. O professor avaliou que o movimento de volta de Lula em 2018, se de um lado parece arrogância, "por outro talvez seja a única alternativa para não abrir uma guerra interna". "Porque se não for ele, está aberta", disse, lembrando que nomes como Marta Suplicy, Fernando Haddad e Aloizio Mercadante seriam um dos principais atores dessa disputa.

Um beco sem saída – O Globo / Editorial

• Só se convoca Constituinte para refundar o regime; caso contrário, instaura-se a insegurança jurídica

O pensamento de Churchill de que a democracia é a pior de todas as formas de governo, excetuando-se as demais, tem o mérito das frases feitas ao comunicar de forma clara uma ideia, mas padece do aspecto negativo dos bordões que é simplificar a complexidade do tema.

Não há quem não se autoproclame "democrata", mas, como a História demonstra, muita barbaridade contra as liberdades é cometida em nome da própria democracia.

Nos últimos 20 anos, na América Latina, no ressurgimento do nacional-populismo no continente, bandeiras da democracia são desfraldadas enquanto o autoritarismo avança. Tudo também em nome de duas outras palavras mágicas: "justiça social". As mesmas que justificam atrocidades séculos a fora.

No centro da questão, hoje na América Latina, está o que fazer com a democracia representativa, regime o mais adequado para resistir às naturais pressões e contrapressões da luta política, sem rupturas institucionais e a hegemonia de um grupo político na sociedade.

O bom exemplo é o Brasil; o mau, os países bolivariano-chavistas e os influenciados por eles. Nestes, cassa-se a regra essencial da alternância no poder e atropela-se a independência entre Executivo, Legislativo e Judiciário. Não é bom caminho, ensina a História.

Mas é sempre presente a tentação da "via rápida" para as reformas que farão a suposta redenção do povo. Trata-se de uma ilusão que costuma cobrar alto preço das liberdades. É caso exemplar o da proposta de uma Assembleia Constituinte apenas para tratar da tal reforma política, assunto tão amplo e intrincado quanto desconhecido pela absoluta maioria da população.

Para a convocação desta assembleia será preciso superar um inamovível obstáculo legal: constituintes só são convocadas em momentos de ruptura, para que o tecido político e social seja restaurado. Esta via rápida para mudanças casuísticas é, portanto, inconstitucional, alertaram juristas e até ministros do Supremo quando a ideia foi lançada pelo PT, no Planalto, nas manifestações de junho do ano passado.

Por uma questão estratégica de segurança jurídica, mudanças na Carta podem ser feitas a qualquer hora, contanto que atendam aos requisitos específicos para tal: votação em dois turnos, nas duas Casas do Congresso, pelo quórum especial de 60% (três quintos). É assim, e até com restrições maiores, nas democracias mais estáveis. E não se trata de coincidência — elas são estáveis e prósperas por terem segurança jurídica.

A pressão das ruas é parte da democracia, mas deve se materializar em propostas encaminhadas pelos canais legais, submetidas aos devidos pesos e contrapesos do estado de direito. Entra-se em um beco sem saída se questões complexas como uma reforma política forem decididas sob achaque do "povo", na verdade representantes de corporações e de organizações ditas sociais, cooptadas à base de generosas doações feitas com dinheiro do contribuinte.

A crise derruba o emprego - O Estado de S. Paulo / Editorial

Com mais gente desempregada, vai ser mais difícil festejar o Natal neste ano. A crise bateu mais duramente no mercado de emprego, no mês passado, e a consequência foi o fechamento de 30.283 vagas com carteira assinada, segundo o Ministério do Trabalho. Foi o primeiro resultado negativo em outubro desde 1999, início da série do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), baseado em informações de todo o País. Mas nem tudo é tristeza nesse quadro. É quase impossível deixar de rir, e até de gargalhar, diante da explicação do ministro do Trabalho, Manoel Dias. Segundo ele, as demissões no mês passado foram causadas pela seca em São Paulo e pela dureza da disputa eleitoral.

"Como tivemos um debate muito renhido na campanha eleitoral, muita gente deixou de fazer investimentos para esperar passar as eleições e ver como ficava", disse o ministro. Além disso, a redução de 21.886 postos de trabalho em São Paulo, acrescentou Manoel Dias, comprova a importância da seca na redução do emprego.

O ministro está certo pelo menos quanto a um ponto, e isso já é notável quando se trata de um auxiliar da presidente Dilma Rousseff. Os empresários têm de fato investido menos que em outros tempos, mas começaram a cortar as compras de máquinas e equipamentos e a adiar seus planos de expansão bem antes das eleições. Talvez o ministro desconheça os números da indústria de bens de capital, muito ruins nos últimos quatro anos, mas esse é um detalhe pouco importante para a retórica dos atuais ministros. Tem havido, sim, muita insegurança entre os empresários, principalmente da indústria, e as eleições foram apenas mais um capítulo dessa história.

As demissões nas fábricas de São Paulo são componentes de um quadro bem conhecido e de nenhum modo surpreendente, mostrado de forma inequívoca pelos números das entidades do setor, como a Fiesp, e também pelas pesquisas do IBGE. Na economia paulista, a indústria foi responsável pelo maior número de dispensas, 12.122. A agropecuária apareceu em seguida, com 11.037, e a construção civil em terceiro lugar, com 6.021. Comércio, serviços e administração pública mais contrataram do que demitiram, e nisso acompanharam a tendência nacional.
Segundo o Caged, em todo o País foram fechados 11.849 postos na indústria de transformação, 33.556 na construção civil, 557 na atividade extrativa mineral, 85 nos serviços industriais de utilidade pública e 19.624 na agricultura. O comércio abriu 32.771 postos, os serviços, 2.433 e a administração pública, 184.

O ministro Manoel Dias disse acreditar num cenário melhor em novembro e, além disso, chamou a atenção para o resultado positivo do ano, com criação líquida de 912.287 postos de trabalho formal. Mas, como vem ocorrendo há mais de um ano, o otimismo tende a murchar quando se examinam os componentes do quadro.

A fonte dos melhores empregos, a indústria de transformação, criou apenas 46.981 nesse período. A construção civil, somente 71.809, apesar do alarde do governo sobre o programa de habitações populares e sobre os investimentos em infraestrutura. Os serviços abriram 582.425 vagas, ou 63,84% do total, e os empregos foram criados principalmente em segmentos de baixa produtividade e de salários modestos. O comércio contratou 81.142 pessoas. Com certeza poderia ter contratado mais, se os empresários do setor estivessem menos pessimistas quanto às vendas de fim de ano.

Segundo o IBGE, a produção industrial cresceu 0,4% em 2011, diminuiu 2,3% em 2012 e aumentou 2,1% em 2013. Nos primeiros três anos do atual governo, o produto da indústria ficou estagnado e o quadro piorou neste ano. De janeiro a setembro, o resultado foi 2,9% inferior ao de um ano antes. A queda no investimento combina com esses dados. Até setembro, neste ano, a produção de máquinas e equipamentos foi 8,2% menor que no ano anterior. Em 12 meses a queda foi de 4,3%. Ao longo do ano passado aumentou 12,1%, depois de ter diminuído 11,2% em 2012. Como pode alguém se espantar com a piora do emprego na indústria?

Ricardo Noblat - Desce do palanque, Dilma!

- O Globo

"Você não vai acreditar, não é? Nós tivemos o primeiro escândalo da nossa História investigado"
Dilma Rousseff

Na Austrália, do outro lado do mundo, sob o efeito do fuso horário, talvez, como se ainda estivesse em cima de um palanque, certamente, a presidente Dilma Rousseff concedeu sua primeira entrevista coletiva sobre o arrastão de donos e executivos de empreiteiras que marcou na semana passada mais uma etapa das investigações sobre a roubalheira na Petrobras. Perdeu uma rara oportunidade de ficar calada.

DILMA FOI VÍTIMA da síndrome do terceiro turno, que não acomete apenas a oposição. Disse um monte de bobagens, invenções e falsas verdades para uma plateia de jornalistas que se deu por feliz em anotar o que ouviu. E assim procedeu como se ignorasse que o distinto público conhece cada vez melhor os vícios e espertezas dos seus representantes. Vai ver que ela ignora mesmo.

VAMOS AO QUE DISSE. Teve o atrevimento de afirmar de cara lavada que "pela primeira vez na História do Brasil" um governo investiga a corrupção. E não satisfeita, culpou governos passados pela corrupção que acontece hoje na Petrobras. Stop! O governo dela não investiga coisa alguma. Polícia Federal e Ministério Público investigam. Os dois são órgãos do Estado, não do governo.

CORRUPÇÃO EXISTE em toda parte e o tempo inteiro. Mas enquanto não se descobrir que houve corrupção na Petrobras em governos anteriores aos do PT, vale o que está sendo escancarado pelas investigações: o PT privatizou, sim, a Petrobras. Apropriou-se, sim, dela. Corrompeu-a, sim. E usou-a, sim, para corromper. Depois de Lula, Dilma é a figura mais importante da Era PT.

ADIANTE. Para Dilma, o escândalo cuja paternidade ela atribui a outros governos e cuja decifração reivindica para o seu, "poderá mudar o país para sempre. Em que sentido? No sentido de que vai acabar com a impunidade". Stop! Sinto muito, Dilma, mas o escândalo que poderá mudar o país para sempre, e que acabou com a impunidade, foi o do mensalão. Quer tirar de Lula a primazia?

DIZER QUE "essa questão da Petrobras já tem um certo tempo " e que "nada disso é tão estranho para nós" é uma revelação digna de nota. Primeiro porque o governo dela se comportou como se nada soubesse quando estourou o escândalo. Segundo porque o máximo que ela insinuou a respeito foi que havia demitido Paulo Roberto Costa, ex-diretor da empresa, réu confesso.

ORA, ORA, ORA. "Paulinho ", como Lula o chamava, saiu da Petrobras coberto de elogios pelo Conselho de Administração da empresa, que foi presidido por Dilma até ela se eleger presidente da República. Foi um dos 400 convidados de Dilma para o casamento da filha dela. E ao depor na CPI da Petrobras, contou com a proteção da tropa do governo. Dilma nada fez para que não fosse assim.

ADIANTE, POIS. O escândalo da Petrobras não dará ensejo à revisão dos contratos do governo com as principais empreiteiras do país, avisou Dilma. Muito menos a uma devassa na Petrobras. "Não dá para demonizar todas as empreiteiras. São grandes empresas", observou Dilma. "E se A, B ou C praticaram malfeitos , atos de corrupção, pagarão por isso". Stop!

QUER DIZER: mesmo que reste provado que as nove maiores empreiteiras do país corromperam e se deixaram corromper, os contratos que elas têm com o governo for a da Petrobras não serão revistos. Não parece razoável que empresas envolvidas com corrupção num determinado lugar possam ter se envolvido com corrupção em outros? Por fim: se a Petrobras não pede uma devassa é só porque Dilma prefere que seja assim.

Jose Roberto de Toledo - Política concreta

– O Estado de S. Paulo

Poucas empresas são mais generosas com campanhas eleitorais do que as empreiteiras cujos presidentes e diretores passaram o fim-de-semana em Curitiba, como hóspedes da Polícia Federal. Juntas, doaram mais de R$ 180 milhões nas eleições de 2014, segundo levantamento de Rodrigo Burgarelli, do Estadão Dados. E a fatura vai aumentar. Faltam prestações de contas do 2º turno.

Os alvos de tanta contribuição desinteressada estão em todos os partidos que contam – e até em alguns que não contam. A generosidade empreiteira não vê barreiras geográficas nem ideológicas. Doa para deputados, senadores, governadores e presidentes – sem discriminação.

Nada mais franciscano: pediu, levou. As doações universais das construtoras são o amálgama que une governo e oposição em uma única e imensa obra de engenharia política.

A medida da generosidade empreiteira pode ser tomada pelo que se conhece até agora através das prestações parciais das contas eleitorais. Sabe-se, por exemplo, que ela se estendeu às campanhas presidenciais de Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB) – embora ainda não se conheça toda a extensão dessa generosidade. Isso sem contar outros presidenciáveis.

Ao menos oito governadores eleitos foram beneficiados por doações de uma ou mais empreiteiras que tiveram executivos presos na Operação Lava Jato, da Polícia Federal. Juntos, receberam mais de R$ 35 milhões dessas empresas suspeitas de superfaturamento na Petrobras. Há governadores dos três maiores partidos: PMDB, PT, PSDB – além de PSB, PDT e PC do B.

No caso de um deles, as contribuições para sua campanha vindas das construtoras investigadas somam mais de 40% de tudo o que ele arrecadou. É Renan Calheiros Filho, eleito governador de Alagoas pelo PMDB – e herdeiro político do presidente do Senado. Em valores absolutos, Renan Filho só não recebeu mais do que Rui Costa (PT) – eleito governador da Bahia-, cuja campanha contabilizou R$ 9,4 milhões originários das mesmas empreiteiras.

Em terceiro lugar por volume vivo de doações recebidas das investigadas aparece o governador reeleito de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB). Via Comitê Financeiro do PSDB para governador, sua campanha recebeu R$ 6,8 milhões das construtoras Queiroz Galvão, UTC Engenharia e OAS. A lista de governadores ficará maior e as posições no ranking poderão mudar depois que os eleitos no 2º turno fizerem suas prestações de conta finais.

Dos novos senadores, ao menos 12 viram suas campanhas se beneficiaram da mesma generosidade. Juntos, receberam R$ 8 milhões dessas empreiteiras. São do PSDB, PMDB, DEM, PT, PSD, PTB e PP. As doações das empresas sob suspeita variam de 2% a 35% do valor total arrecadado pelos novos senadores.

Na Câmara dos Deputados seria provavelmente mais rápido dizer quem não recebeu doações dessas empresas do que o contrário.

A suspeição que recai sobre as empresas se transfere para os políticos que tiveram suas campanhas parcialmente financiadas por elas? Não, obviamente. As doações foram feitas dentro do que prevê a lei: menos de 2% do faturamento anual das empreiteiras. Se o volume é multimilionário e a lista é extensa é porque essas empresas faturam bilhões – graças, em parte, a contratos com governos e empresas estatais. Mas isso deve ser coincidência.

Talvez por não acreditar em coincidências, 6 dos 10 ministros do Supremo Tribunal Federal votaram pela proibição das doações eleitorais de empresas. Só não bateram o martelo porque um seu colega estuda o tema há sete meses, sem decidir como votar.

Certo é que assim que o STF barrar as doações empresariais, o Congresso votará uma reforma política para preencher o vazio que a decisão judicial provocará. À britadeira da Justiça se seguirá a betoneira do Legislativo. É a política do concreto.

Férias. O leitor será poupado desta coluna nas próximas duas semanas.