terça-feira, 15 de março de 2016

Opinião do dia – Roberto Freire

Este movimento que hoje toma as ruas de todo o país é pluralista, diverso e o que nos une é retirarmos do poder a quadrilha que lá está. O Brasil está caminhando para tirar o PT do poder e encerrar este governo. A contagem regressiva para o impeachment começou. Impeachment já!

Nós não vamos tirá-la de lá se não ampliarmos a nossa luta. Os parlamentares que ainda dão sustentação ao governo precisam ser pressionados e convencidos. Não podemos discriminar ninguém neste momento. Alguns, infelizmente, não entendem isso e vêm fazendo o jogo deles [do PT], tentando nos dividir.
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Roberto Freire é deputado Federal (SP) e presidente nacional do PPS, em discurso na Av. Paulista, 13 de março de 2016.

Dilma pode dar a Lula superpoderes no governo

• Investigado na Lava- Jato, ex-presidente seria blindado no ministério

Petista assumiria cargo com delegação para atuar na política e na economia; em depoimento à PF divulgado ontem, ele comparou o tríplex em Guarujá a uma unidade do Minha Casa Minha Vida

Alvo da Lava- Jato, o ex-presidente Lula decide hoje seu futuro no governo Dilma. A ele foi oferecido um superministério com poder para para atuar na recuperação da economia e na articulação política. A ideia ganhou corpo depois das manifestações do último domingo. Lula estaria condicionando sua volta a Brasília a uma guinada na condução da economia. Caso assuma um cargo, ele ganha foro privilegiado, o STF. No depoimento que deu à PF, o ex-presidente comparou o tríplex em Guarujá, reformado por R$ 1 milhão, a apartamentos do Minha Casa Minha Vida. Ontem, o governo anunciou a indicação do subprocurador- geral da República Eugênio Aragão para o Ministério da Justiça.

Lula ensaia volta ao Planalto

• Alvo da Lava- Jato, ex- presidente negocia com Dilma ocupar superministério

Simone Iglesias , Eduardo Barretto , Catarina Alencastro, Cristiane Jungblut, Sergio Roxo - O Globo

BRASÍLIA e SÃO PAULO - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva desembarca hoje em Brasília para conversar com a presidente Dilma Rousseff sobre sua ida a um superministério político focado em dois pontos: recuperação da economia e articulação política para barrar o avanço do impeachment depois das manifestações do último domingo. Segundo auxiliares de Dilma, o petista apresentará condições para fazer parte da equipe, entre as quais uma guinada na condução da área econômica para agradar à base sindical e de movimentos sociais, o que contraria a política de ajuste fiscal de Dilma. O grande desafio de Lula vir a assumir um ministério é convencer a opinião pública de que não está tentando fugir do juiz Sérgio Moro, na Operação Lava- Jato, para que seu processo seja julgado no Supremo Tribunal Federal (STF).

Além de uma pasta política, Lula avalia também a possibilidade de assumir o Ministério das Relações Exteriores. Uma pessoa próxima ao ex-presidente disse ser uma pasta que promoveria uma melhora na economia de forma mais rápida, atraindo grandes investidores externos. Isso não excluiria suas ações na área de articulação política, nem a possível intervenção na condução econômica do governo. O interlocutor do ex-presidente considerou também que, dentro do Palácio do Planalto, Lula poderia não se sentir confortável. A oposição já afirma que Dilma ficaria como figura decorativa, uma “rainha da Inglaterra”, e Lula tomaria as rédeas do governo.

Interlocutores do ex-presidente disseram que ele se convenceu de assumir um ministério após as manifestações de domingo e da decisão da juíza Maria Priscilla Ernandes, da Justiça de São Paulo, de transferir para Moro a investigação do caso do tríplex, que envolve denúncia e pedido de prisão preventiva.

DEM prepara ação popular
Os líderes do DEM na Câmara e no Senado, Pauderney Avelino ( AM) e Ronaldo Caiado ( GO), já estão com uma ação popular pronta pedindo a suspensão de uma eventual nomeação do ex- presidente como ministro.

— É um escárnio, um tapa na cara do povo. O Lula deve aceitar para fugir do juiz Sérgio Moro e blindar a sua família. Ao fazer isso, o PT se antecipa ao impeachment, porque a presidente Dilma viraria rainha da Inglaterra. Mas isso vai colocar combustível na situação do Palácio do Planalto — disse Avelino.

— Nomear Lula seria uma ação ilícita, espúria, da presidente que dizia que jamais interferiu e nem interferiria na Polícia Federal e no Ministério Público. Se isso se confirmar, vamos entrar com uma ação popular em todos os estados para exigirmos a nulidade deste fato. Diz- se que rico, quando rouba, vai para o ministério. Ele ( Lula) seria réu confesso — afirmou Caiado.

Numa tentativa de descolar a ida de Lula para o governo de suposta fuga das investigações, o ministro Jaques Wagner (Casa Civil) enfatizou que o STF é a instância máxima do Judiciário e também investiga e julga:

— O STF não é Justiça também não? O mensalão não foi julgado lá?

Wagner, que participou da reunião de coordenação política com Dilma e outros sete ministros ontem pela manhã, disse que Lula está sendo perseguido.

— Tem gente babando sangue. Lula virou troféu e por isso o concurso entre o MP de Curitiba e São Paulo.

Ontem, emissários do ex- presidente estiveram no Planalto para pavimentar a conversa com a presidente. Enquanto o ex- chefe de gabinete de Lula Gilberto Carvalho se reunia com Jaques Wagner, o presidente do PT, Rui Falcão, esteve com Ricardo Berzoini ( Secretaria de Governo). Segundo um auxiliar presidencial, a ideia é que Lula assuma um ministério que faça essencialmente articulação política, caso da Secretaria de Governo, ocupada por Berzoini.

— A Casa Civil é hierarquicamente de maior subordinação e tem uma pauta administrativa muito grande. Não é para isso que Lula está vindo. Ele vem para fazer política — diz um auxiliar da presidente.

A pressão para que o ex-presidente assuma o posto aumentou depois das manifestações de domingo, que deixaram o governo nas cordas, na avaliação de petistas. A bancada do PT pretende fazer um apelo para que Lula aceite o convite.

— Acho que é natural ( o apelo). A gente sente isso não só na bancada, mas na base aliada também — disse Vicente Cândido (PT-SP), que esteve ontem com Lula para convidá- lo a uma reunião com os parlamentares do partido, amanhã, em Brasília.

O presidente do PT, que também esteve reunido com Lula ontem, deixou claro que é um entusiasta da ideia de ver o ex-presidente no Ministério.

— A minha opinião é que ele deveria ir ( para o governo), independentemente dos protestos. Mas é uma decisão difícil, que tem que ser muito pensada — afirmou Falcão.

Descontente com os rumos da economia e apesar da pressão do PT pela saída de Nelson Barbosa (Fazenda), Lula não quer, neste momento, que ele seja substituído. Na semana passada, o ministro esteve no Instituto Lula, conversando com o ex- presidente, que ainda o avaliza na pasta. A queda de braço entre o ministro da Fazenda e o PT está cada vez mais forte, com o recrudescimento da crise política.

Pedido de prisão do ex-presidente agora está nas mãos de Sérgio Moro

• Juiz deve enviar documento ao MPF em Curitiba; defesa de Lula diz que vai recorrer

Thiago Herdy, Renato Onofre e Cleide Carvalho - O Globo

SÃO PAULO - A juíza Maria Priscilla Ernandes Veiga, da 4 ª Vara Criminal de São Paulo, transferiu ao juiz Sérgio Moro, de Curitiba, responsável pela Lava- Jato, a decisão sobre a denúncia e o pedido de prisão do ex- presidente Lula, na investigação do tríplex do Guarujá.

O caso era conduzido por promotores paulistas. Moro enviará agora a denúncia para análise do Ministério Público Federal. Lula disse que vai recorrer, e os promotores avaliam fazer o mesmo. A juíza Maria Priscilla Ernandes Veiga Oliveira, da 4 ª Vara Criminal Central de São Paulo, decidiu encaminhar para a 13 ª Vara Federal de Curitiba, presidida pelo juiz Sérgio Moro, a denúncia e o pedido de prisão preventiva contra o expresidente Lula, proposto pelo Ministério Público de SP. A juíza declinou da competência no processo por entender que, “como é público e notório, tramita perante aquela vara os processos da chamada ‘ Operação Lava- Jato’”, que apura crimes envolvendo empreiteiras acusadas de pagar propina em contratos da Petrobras.

A defesa de Lula informou que vai recorrer da decisão. Promotores do MP- SP disseram, em nota, que aguardam serem intimados para decidir sobre possível recurso.

Para justificar a decisão, a juíza juntou ao processo cópia de decisão de Moro de 24 de fevereiro deste ano, que determinou a realização de busca e apreensão em endereços ligados ao ex-presidente Lula.

Ela citou a suspeita do MPF de que “benefícios concedidos pelas empreiteiras ao ex-presidente” poderiam estar relacionadas “ao esquema da Petrobras, o que, por sua condição, tendo parte dos fatos ocorridos durante o mandato presidencial, justifica, por si só, a competência federal”.

Entre os benefícios supostamente concedidos ao ex-presidente, a juíza cita a cessão de um apartamento tríplex no Edifício Solaris, no Guarujá, reformas no mesmo imóvel e um sítio em Atibaia usado por Lula em momentos de lazer.

Depois que receber o processo, Moro deverá encaminhar a denúncia ao MPF em Curitiba, que poderá ratificar ou não o pedido feito pelos promotores paulistas.

Fontes que acompanham a investigação informam ser provável que o MPF apresente nova denúncia, usando só os dados do processo do MP- SP que forem complementares à investigação da Lava- Jato.

Ao declinar da competência no processo, a juíza deixou de analisar o pedido de prisão contra Lula. Ela também decidiu tirar o sigilo do processo contra Lula.

“O pretendido nestes autos, no que tange às acusações de prática de delitos chamados de ‘ lavagem de dinheiro’, é trazer para o âmbito estadual algo que já é objeto de apuração e processamento pelo Juízo da 13 ª Vara Federal de Curitiba/ PR e pelo MPF, pelo que é inegável a conexão, com interesse probatório entre ambas as demandas, havendo vínculo dos delitos por sua estreita relação”, escreveu a juíza.

Em nota ontem, os advogados de Lula, Roberto Teixeira e Cristiano Zanin Martins, escreveram que vão entrar com pedido de impugnação à decisão da juíza, por entender que “não há qualquer elemento concreto que possa vincular o tríplex ou a suposta reforma realizada neste imóvel ‘ a desvios da Petrobras’”.

Para os advogados de Lula, ainda que essa “hipótese criminal” fosse considerada, o caso seria de competência da Justiça estadual, pelo fato da Petrobras ser sociedade de economia mista. Eles argumentam que mesmo sendo tratado pela Justiça Federal, o caso caberia a juízo em SP, onde está localizado o imóvel investigado.

Também em nota, os promotores Cássio Conserino, José Carlos Blat e Henrique Araújo disseram ter tomado conhecimento da decisão pela imprensa e que, embora a respeitem, entendem que a competência para o caso é da Vara Criminal da capital, não da Federal de Curitiba. Segundo eles, a investigação tem origem na Bancoop, sediada em SP e “sem ligação alguma com os fatos relativos à Petrobras”: “Os crimes antecedentes e a lavagem de dinheiro são de competência estadual, conforme elementos colhidos na investigação criminal, sem interesse algum da União”.

Wagner reconhece força de protestos, mas critica juiz da Lava- Jato

• Para analistas, pressão das ruas acelera impeachment

No dia seguinte à manifestação que reuniu 3,6 milhões de pessoas contra o governo, o ministro Jaques Wagner (Casa Civil) reconheceu o tamanho dos protestos, mas afirmou que o juiz da Lava- Jato, Sérgio Moro, criminaliza os políticos. Segundo ele, Moro foi o “rei da festa” nos protestos. Analistas ouvidos pelo GLOBO avaliam que o recado das ruas é claro e pressiona o Congresso para apressar a votação do impeachment da presidente Dilma.

Jaques Wagner acusa Moro de criminalizar a política

• Para ministro, juiz da Lava- Jato virou o ‘ rei da festa’ nas manifestações

Catarina Alencastro, Eduardo Barretto, Cristiane Jungblut - O Globo


- BRASÍLIA- O ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, acusou o juiz Sérgio Moro de criminalizar a política na sua condução, ao lado da Polícia Federal, das investigações da Lava- Jato. Em entrevista, ontem, ele reconheceu a força da manifestação, mas disse que, ao promover uma ação tão duradoura quanto a Lava- Jato, Moro demonstra que tem um plano traçado. Wagner chegou a comparar a política brasileira com o seriado americano “House of Cards”, no qual o ambicioso Frank Underwood é capaz de tudo, até matar, para atingir seu objetivo de chegar à Casa Branca.

— Evidentemente que teve um plano traçado, não estou inventando. O Moro quando escreveu aquele negócio dele, da Operação Mãos Limpas... ele está quase chegando no seu objetivo, da criminalização da política. Alguma vez teve algo tão espetaculoso durante tanto tempo? — questionou Wagner, acrescentando: — Vamos ser francos. É bem- vinda a investigação, se ela produzir o que todos nós queremos, uma relação público- privada menos perniciosa, vamos chamar assim, genericamente. Agora, o que eu não acho razoável é que nesse processo... tudo está sendo criminalizado. 

Manifestação produzida 
Wagner rejeitou a comparação das manifestações de domingo, quando 3,6 milhões de pessoas foram às ruas para pedir o impeachment de Dilma, com as Diretas Já. Para ele, os protestos de ontem foram bem mais produzidos e segmentados. As Diretas Já, disse, não contaram com patrocínio.

— O governo reconhece, sem desmerecer. Mas nunca tivemos uma manifestação tão produzida. Não me venham falar de espontaneidade — declarou o ministro, que citou a mudança no horário da partida entre São Paulo e Palmeiras, da tarde para a manhã, como um apoio ao protesto.

Wagner, que participou com outros sete ministros da reunião de coordenação política com a presidente Dilma Rousseff, sustentou que as manifestações atingiram a classe política como um todo, sem poupar a oposição. Para ele, Moro foi “o rei da festa”.

— O Aécio veio achando que ia chegar e ia ser o rei da festa. O rei da festa foi o Moro. O Moro e outras coisas preocupantes. Os parlamentares da oposição não tiveram beneplácito. Quem achou que ia faturar não faturou — pontuou.

Ainda sobre a manifestação, Wagner admitiu que foi grande e que deve ter “animado” a oposição. O ministro atribui o mau momento econômico do Brasil como principal alimento da insatisfação popular.

— O principal é a economia. As pessoas vinham com esperança — afirmou Wagner, e completou:— O mau humor acaba sendo apontado para o governo federal. NA WEB glo.bo/1M2xucf Fotogaleria: as manifestações de domingo pelo Brasil

Palavra de especialistas

- O Globo

Cláudio Couto - Cientista Político da FGV- SP
Por sua magnitude, os protestos provocam um enfraquecimento ainda maior do governo e fortalecem o impeachment no Congresso. O porém é que o Eduardo Cunha, que vai conduzir esse processo, carece de legitimidade. Esse é o grande trunfo do governo: Cunha virou um anti-símbolo do combate à corrupção. Se pedem a saída da presidente Dilma por eventuais malfeitos, por que deixar o presidente da Câmara, que também é investigado, conduzilo? O fato de lideranças do PSDB terem sido vaiados sinaliza que as manifestações, por mais que sejam contra o governo, não alcançam apenas aqueles que são puramente anti- petistas. Os participantes mostram- se contrários à classe política em geral.

Paulo Baía - Cientista Político da UFRJ
As manifestações de ontem pressionam o Congresso Nacional, e sobretudo o Senado, para a solução do impeachment. E pressionam o governo para que procure romper o isolamento e estabelecer algum tipo de contato com as demandas da sociedade. E as manifestações de ontem pedem uma resposta muito rápida. A população se manifestou pela negação do governo e a favor da Lava- Jato, que é o que está dando respostas mais imediatas. Tivemos a maior manifestação política da História do país, buscando um fio de esperança. Daí apontar o juiz Sérgio Moro como sinalização dessa esperança. Há também uma contundente crítica ao sistema político e aos representantes políticos.

José Álvaro Moisés - Cientista Político da USP
O recado das ruas para o governo foi muito claro: querem fora Dilma, PT e o ex-presidente Lula, além de apoio a Sérgio Moro e contra a corrupção sistêmica. Para o Congresso, foi para que dê seguimento ao exame do processo de impeachment. A manifestação com esse volume e a convenção do PMDB, que decidiu progressivamente descer do governo, criam uma nova conjuntura política. Há um erro de avaliação do governo ao dizer que o protesto foi por causa da situação econômica. Aliás, nós não temos mais governo. A presidente cede a pressões, fica trocando ministros. A hostilidade ocorreu de forma localizada contra políticos de oposição porque eles têm um desempenho aquém do desejado.

Carlos Pereira - Cientista Político da FGV/ EBAPE
O impacto das manifestações é gigantesco. É devastador. Diante dos novos eventos, a partir da prisão do marqueteiro João Santana, do acordo de delação do senador Delcídio Amaral e das manifestações, os custos do dissenso diminuíram diante da preferência acachapante da maioria da população a favor do impeachment. Então, os parlamentares da base do governo, agora, têm que pensar muito para votarem com o governo. Os custos de quebrar essa preferência majoritária serão muito altos. Com um escândalo de corrupção bilionário, toda a classe política sofre. Mas o foco fundamental dos protestos é o governo. É o ex-presidente Lula e a defesa do impeachment. E o apoio inconteste ao judiciário.

Lula deve virar ministro para evitar Moro e socorrer Dilma

Para evitar Moro e ajudar governo, Lula deve assumir superministério de Dilma

• Ex-presidente, alvo da Operação Lava Jato, está próximo de aceitar cargo de ministro a ser criado especialmente para que ele comande a articulação do Planalto com movimentos sociais e lidere enfrentamento com a oposição na batalha pelo impeachment da petista

Ricardo Galhardo, Vera Rosa, Tânia Monteiro, Carla Araújo e Alberto Bombig - O Estado de S. Paulo

O tamanho das manifestações pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff e a decisão da Justiça de São Paulo de transferir para o juiz Sérgio Moro a deliberação sobre o pedido de prisão feito pelo Ministério Público Estadual aumentaram as chances de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumir um posto na Esplanada dos Ministérios. O ex-presidente ainda não comunicou sua decisão, mas tanto o PT quanto o Planalto dão como certo que ele aceitará o convite para ocupar uma espécie de superministério a ser criado sob medida para ele.

A reviravolta no núcleo do governo é vista como o último lance para evitar o impedimento de Dilma. Até agora, a tendência é de que o ex-presidente assuma a Secretaria de Governo, hoje comandada por Ricardo Berzoini. Segundo apurou Estado, a pasta será reformulada e dará a Lula poderes de interlocução com o Congresso e com os movimentos sociais. Ele comandaria, por esse arranjo, o enfrentamento com a oposição à presidente nas ruas e na política.

A decisão só não foi anunciada ainda porque o governo e advogados de Lula estudam se não há empecilho jurídico para a posse. O cuidado ocorre para que Dilma não seja acusada de obstruir a Justiça, uma vez que Lula é alvo da Lava Jato.

No governo, o ex-presidente ganha prerrogativa de foro privilegiado. Isso significa que, em caso de denúncia, a ação tem de ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal, saindo da alçada de Moro, considerado implacável com investigados pela Lava Jato. Ontem, a juíza Maria Priscilla Ernandes, da 4.ª Vara Criminal de São Paulo, transferiu para Moro a decisão sobre a denúncia e o pedido de prisão preventiva de Lula, apresentados pelo Ministério Público paulista no caso do tríplex do Guarujá. A defesa do ex-presidente vai recorrer.

Reconfiguração. Lula viaja hoje à noite para Brasília e deve se encontrar com Dilma amanhã para bater o martelo sobre o assunto. Segundo seus aliados, Lula rejeitou a Casa Civil nos moldes em que o ministério funciona hoje por considerar que a pasta tem muitas atribuições administrativas. As opções são a Secretaria de Governo, hoje ocupada pelo ministro Ricardo Berzoini, ou uma reconfiguração da Casa Civil, transferindo as atribuições administrativas para outra pasta.

Caso aceite o convite para integrar o governo, Lula terá a tarefa de reunificar as bases parlamentar e social de Dilma para tentar barrar o impeachment da presidente. Ele tem dito que isso só será possível se houver um redirecionamento da política econômica do governo.

Em conversa por telefone com Dilma, no fim da tarde de ontem, Lula disse a ela que resistiu muito sobre a ida para o governo para não passar a ideia de que aceitara um cargo com o objetivo de obter foro privilegiado. Mudou de ideia, porém, após os protestos de domingo, que tiveram como alvo ele próprio, a presidente e o PT.

“Eu quero ajudar a salvar o nosso projeto”, afirmou Lula, segundo um amigo dele que esteve ontem à noite no Planalto, para acertar detalhes sobre as novas funções do ex-presidente. “É fato que nós o pressionamos muito. Ele não topava, mas hoje (ontem) me disse: ‘Tem uma hora em que a guerra se torna tão difícil que precisamos agir rápido.”

No modelo sob análise, a principal missão de Lula será estancar a debandada do PMDB, principal partido da base aliada, e segurar os outros partidos que ainda apoiam o governo. Em convenção realizada no sábado, o PMDB fixou prazo de 30 dias para resolver se abandona Dilma. Foi uma espécie de aviso prévio para uma decisão praticamente tomada.

Berzoini, nesse organograma, viraria secretário executivo do ministério que hoje comanda. Dilma também ofereceu a Lula a Casa Civil, mas ele não quer assumir essa pasta. Em conversas reservadas, o ex-presidente disse que a Casa Civil tem muito poder e que, ocupando esse cargo, seria considerado primeiro-ministro, constrangendo Dilma. “Se Lula vier, seguramente será para cuidar do que mais conhece, que é a política”, declarou o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner.

Lula deve aceitar convite de Dilma para ser ministro

- Folha de S. Paulo

O ex-presidente Lula deve aceitar o convite da presidente Dilma Rousseff para ser ministro.

A informação foi confirmada por um dos principais assessores da presidente.

Ele deve se encontrar com Dilma amanhã, em Brasília, para discutir as várias possibilidades de se integrar ao governo.

O petista pode ir para a Casa Civil, no lugar de Jaques Wagner, ou para a Secretaria de Governo, no lugar de Ricardo Berzoini.

A segunda opção é tida como mais provável já que, no cargo, Lula não se envolveria em questões burocráticas, ficando livre para a sua principal missão: negociar com o PMDB para evitar o desembarque do governo e a abertura de um processo de impeachment contra a presidente.

A ida de Lula para o governo é considerada pela equipe de Dilma como a última cartada para evitar um processo de impeachment contra ela.

Um outro efeito da nomeação é que, no ministério, Lula ganhará foro privilegiado, o que impediria que ele seguisse sendo investigado por procuradores em São Paulo e também na Lava Jato em Curitiba.

As investigações sobre o ex-presidente seriam deslocadas para a Procuradoria-Geral da República, em Brasília, e supervisionadas pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

Para se defender da acusação de que Lula, na verdade, estaria fugindo da Justiça, dirigentes do PT já usam o argumento de que os ministros do STF, que passarão a comandar as investigações do ex-presidente, são os "juízes dos juízes", em tese os mais capazes do país e que podem inclusive reformar decisões do próprio Moro.

Conforme a coluna informou na terça passada (8), o PT lançou a ideia logo depois que ele foi conduzido coercitivamente para depor, por decisão de Moro.

A nomeação de Lula para um ministério gera polêmica até mesmo entre seus seguidores. Assessores próximos do ex-presidente são contra. Aliados políticos, como o prefeito Fernando Haddad e o presidente do PT, Rui Falcão, defendem enfaticamente que ele aceite.

O ex-presidente teria ficado mais à vontade para aceitar o convite depois que a juíza Maria Priscilla Veiga Oliveira, da 4ª Vara Criminal da Capital, não decretou a prisão dele e decidiu enviar o pedido para ser analisado em Curitiba, onde o petista é investigado na Operação Lava Jato.

Adesão a manifestações anti-Dilma surpreendeu tucanos e peemedebistas

Daniela Lima – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A forte chuva que desaguou sobre o Rio no sábado fez o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), despertar no domingo (13) desconfiado da adesão que os protestos contra Dilma Rousseff teriam na capital fluminense.

Desafeto declarado da presidente, o peemedebista decidiu sair para fazer uma caminhada em seu condomínio.

"Vi uma bandeira numa janela. Depois outra. Aí veio a senhora levando o cachorro para passear cheia de verde e amarelo nas costas. Não tinha mais dúvida que ia ser grande. Conheço rua, sinto o cheiro", relatou a um aliado. Cunha voltou para casa e esperou a repercussão dos atos.

A quase 500 quilômetros de distância, outro adversário de Dilma também se espantava com o volume de gente nas ruas. Em Belo Horizonte, dentro do carro em direção à praça da Liberdade, o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), comentou: "Que loucura isso. Olha a quantidade de gente".

Aécio fez uma rápida passagem pelo ato em Minas e voou para São Paulo. De dentro da sede do governo paulista, acompanhado pelo governador tucano Geraldo Alckmin e outros políticos, recebeu relatos de manifestações nas mais diversas capitais do país. Alckmin titubeou, mas decidiu ir com a comitiva da oposição até a avenida Paulista, palco do maior ato anti-Dilma no país.

No local, encontraram o presidente do DEM, senador Agripino Maia (RN). Ele havia telefonado para o irmão, que mora no Rio. "Como é que foi aí?", perguntou. "Grandioso", ouviu. Confiante, foi almoçar com os colegas de partido antes de seguir para a Paulista. "Levei entre 40 e 50 minutos para atravessar a avenida de uma calçada a outra. Era gente que não acabava mais", relatou.

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ficou em casa, no seu Estado, e viu a maior manifestação da história do Brasil pela TV. "Ele ficou surpreso", contou um aliado.

A mesma sensação foi experimentada pelo vice-presidente Michel Temer, principal beneficiário de uma queda de Dilma. Amigos telefonaram com votos de que tivesse sabedoria para enfrentar o que viria pela frente.

Quem conversou com o vice sustenta que em nenhum momento ele esboçou "vibração", "mas pareceu muito impressionado". "Acho que só domingo ele percebeu que realmente pode acontecer [o impeachment]", resumiu um amigo.

Freire defende união para retirar ‘quadrilha’ petista do poder

Fábio Matos - Assessoria do Parlamentar

SÃO PAULO - Diante de uma Avenida Paulista completamente tomada por manifestantes que pedem o impeachment de Dilma Rousseff, o deputado Roberto Freire (SP), presidente nacional do PPS, conclamou as oposições a continuarem trabalhando fortemente para angariar o apoio de mais parlamentares ao impedimento da petista.

Em seu pronunciamento no carro de som do Movimento Brasil Livre (MBL), em frente ao Museu de Arte de São Paulo (Masp), no “coração” da Avenida Paulista, Freire afirmou que, após a nova rodada de manifestações em todo o Brasil, neste domingo (13), o governo Dilma caminha para o encerramento.

“Este movimento que hoje toma as ruas de todo o país é pluralista, diverso e o que nos une é retirarmos do poder a quadrilha que lá está”, disse o parlamentar. “O Brasil está caminhando para tirar o PT do poder e encerrar este governo. A contagem regressiva para o impeachment começou. Impeachment já!”.

O presidente do PPS criticou aqueles que vêm desqualificando as manifestações por causa da adesão de figuras controversas da política brasileira e de alguns setores mais conservadores da sociedade. Para Freire, o momento é de aglutinar forças, e não dividir, e a prioridade é o impeachment de Dilma.

“Nós não vamos tirá-la de lá se não ampliarmos a nossa luta. Os parlamentares que ainda dão sustentação ao governo precisam ser pressionados e convencidos. Não podemos discriminar ninguém neste momento”, afirmou o deputado. “Alguns, infelizmente, não entendem isso e vêm fazendo o jogo deles [do PT], tentando nos dividir.”

Além de Freire, o MBL levou ao palco uma comitiva de parlamentares da oposição, entre os quais Bruno Araújo (PSDB-PE), Carlos Sampaio (PSDB-SP), Ônyx Lorenzoni (DEM-RS), Mendonça Filho (DEM-RS) e Darcísio Perondi (PMDB-RS) – este último, um dos dissidentes da base aliada e árduo defensor do impeachment na bancada do PMDB. Pelo PPS, também participaram do ato em São Paulo o líder da bancada do partido na Câmara, Rubens Bueno (PR), o deputado federal Raul Jungmann (PE) e o deputado estadual Davi Zaia (SP), presidente do Diretório Estadual do partido em São Paulo.

Mais cedo, Freire e outros congressistas e lideranças da oposição estiveram na ala residencial do Palácio dos Bandeirantes com o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), que também participou da manifestação na Paulista.

O protesto deste domingo vem sendo considerado o maior da série de cinco grandes manifestações organizadas pelos movimentos sociais que pedem o impeachment de Dilma (as outras quatro aconteceram em 2015, nos dias 15 de março, 12 de abril, 16 de agosto e 13 de dezembro).

Ainda não há números oficiais a respeito do número de participantes no ato na Avenida Paulista, mas a expectativa dos organizadores é de que supere 1 milhão de pessoas – marca registrada no primeiro protesto, em março do ano passado. A se confirmarem as projeções, esta terá sido a maior manifestação de rua da história da democracia brasileira.

Presidente do Senado começa a costurar semiparlamentarismo

• Saída manteria Dilma com menos poderes, mas proposta esbarra em desembarque do PMDB do governo

Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

/BRASÍLIA - Com o aval da presidente Dilma Rousseff, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), decidiu articular a votação de uma proposta que reduziria os poderes da atual mandatária. A saída pelo semiparlamentarismo, calcula, permitirá à petista se manter no cargo sem ser afastada definitivamente pelo impeachment, que tende a ganhar impulso após os protestos do último domingo.

A sugestão, que foi discutida numa reunião a sós entre Renan e Dilma recentemente e revelada por ele a aliados próximos após a convenção do PMDB, preservaria o mandato da petista como presidente, mas deixaria a administração para um primeiro-ministro.

Esse posto, tradicionalmente ocupado por um parlamentar, poderia ficar com o vice-presidente Michel Temer, dependendo da emenda constitucional aprovada. A engenhosa solução aponta que Renan ainda resiste a abandonar Dilma. Tanto o senador Romero Jucá (PMDB-RR) como o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), já admitem nos bastidores que a gestão da presidente “acabou” e, por isso, é preciso buscar soluções alternativas. Renan acredita que a petista poderia ficar no cargo até o fim do mandato, mas teria de ceder poder.

Foi por isso que o presidente do Senado decidiu, na semana passada, criar uma comissão especial para discutir o regime de governo – o colegiado ainda não foi instalado. Contudo, a sugestão de Renan tem reduzidas chances de prosperar por dois aspectos, avaliam interlocutores. O primeiro, de ordem política: o desembarque do PMDB do governo, com aviso prévio de 30 dias, e os protestos do último domingo.

O segundo, de caráter legal, porque há dúvidas se uma proposta com esse teor, mesmo sendo uma emenda constitucional, poderia tramitar, uma vez que o Legislativo já rejeitou em 1993 em um plebiscito a mudança do regime de governo.

O peemedebista, que ainda não fez uma avaliação pública dos protestos, considera o impeachment da presidente uma saída traumática, mas considera que ela ainda não capitulou. “Nem todos os cartuchos foram esgotados da parte dela”, afirmou a um assessor.

PMDB e PSDB tratam do pós-Dilma, diz Aécio Neves

Natuza Nery – Folha de S. Paulo

Hostilizado por um grupo de manifestantes em sua curta participação nos atos de domingo (13), o senador Aécio Neves (MG) diz ter recebido as vaias com naturalidade. Ressaltou, porém, que, sem a política, as ruas de domingo (13) não terão a solução que desejam.

Presidente nacional do PSDB, Aécio admite um acerto de procedimentos com o PMDB para tirar Dilma Rousseff do poder. Mas deixa claro que não há acordo para interromper o processo que corre no Tribunal Superior Eleitoral não só contra Dilma, mas também contra o vice Michel Temer (PMDB-SP).

"Não cessará porque o TSE tem rito próprio", afirma.

Para ele, a saída mais legítima para a crise continua sendo convocação de novas eleições –cenário que tiraria o PMDB do jogo–, mas não é necessariamente a "solução" mais rápida.

Folha - As manifestações de domingo (13) aceleram o processo de impeachment?

Aécio Neves - O 13 de março vai ser lembrado como o dia em que os brasileiros pegaram seu destino nas mãos e disseram basta. Os brasileiros já não esperam nada deste governo e esperam muito da oposição.

Por que, então, o sr. e o governador Geraldo Alckmin foram vaiados?

Recebi isso com absoluta naturalidade, pois uma parcela amplamente majoritária da população compreende que ou há essa conexão das ruas com a política ou não há consequência prática para canalizar esse sentimento da população.

Sem a política, não há solução. Eu iria dez vezes às manifestações independentemente de uma ou outra pessoa ter considerado oportunista. Seria muito mais fácil ter ficado em casa. Fui e cumpri o meu papel.

O que acontece agora?

O governo acabou. O impeachment é uma possibilidade? É. Talvez aquela que apareça com maior vigor e não pode ser descartada, pois distenderá os ânimos e permitirá minimamente um reinício, por mais que saibamos que não será simples, pois sempre vai faltar a legitimidade do voto.

A Temer?

É. Mas até essa solução, que sempre vimos com muita preocupação, tem de ser admitida por nós. O ponto de convergência dos que foram e dos que não foram às ruas é que a presidente perdeu as condições de governar. É melhor sem ela. Mas há outros caminhos colocados, como o do TSE. É uma possibilidade, pelo acúmulo de denúncias e afirmações que chegam demonstrando financiamento ilegal da campanha com propina.

O impeachment interrompe o processo no TSE? Há acordo com o PMDB?

Não existe acordo. Até porque, do ponto de vista legal, não há sequer como fazê-lo. A contundência das provas pode levar o TSE também a julgar procedente a nossa ação. Não tem possibilidade de ser interrompida.

Então o PSDB não vai retirar o processo contra Dilma e Temer?

Não, nem há possibilidade de fazê-lo. Ele já está num nível de coleta de provas e terá um desfecho. Hoje o processo não é mais do PSDB. É do tribunal.

Como, então, viabilizar o diálogo entre PSDB e PMDB para um eventual "pós-Dilma"?

Ele se inicia com responsabilidade e deve ter outras etapas. É muito importante que PMDB e PSDB, além de outras forças políticas, conversem sobre o dia seguinte.

As conversas começam a ser construídas com um cenário sem a presidente da República. Acho que o PSDB, qualquer que seja o desfecho, tem responsabilidade com país.

Qualquer apoio ao próximo eventual governo é necessariamente apoio a uma agenda de reformas que a presidente perdeu as condições de fazer.

E essa ideia do parlamentarismo?

O Brasil está ficando ingovernável com essa estrutura político-partidária e com essa concentração absurda de receita nas mãos da União, com esse descontrole da gestão econômica e com a ocupação dos cargos públicos. A crise é uma grande oportunidade de retomarmos essa discussão, com um referendo junto à população brasileira. A ideia do parlamentarismo está crescendo no Congresso. Um novo regime permitiria uma redução drástica do número de partidos hoje. Nossa proposta deveria encontrar formas de restabelecer, por exemplo, a cláusula de barreira para [inibir] tantos partidos políticos. Se conseguirmos construir uma agenda de reformas estruturais nos próximos dois anos, pode ser que se crie a base para termos a mudança do sistema de governo. Não acho isso fora de alcance.

Com a Lava Jato no Congresso, como convencer a população a dar mais poder ao Parlamento?

Acho que tudo isso tem de ter um desfecho. Não temos de ter receio de fazer mudanças profundas. Temos simpatia, e outros partidos também, pelo sistema parlamentarista pós 2018, tendo uma transição agora.

Desde que Temer não tente a reeleição, caso assuma.

Sempre fui a favor do fim da reeleição. O que é preciso nessa transição de dois anos [até 2018] é o compromisso de que essa construção seja transitória. Por isso é que, no parlamentarismo, uma crise como essa teria um desfecho sem trauma. As conversas começam a ser construídas com o cenário sem a presidente da República. Esse é o fato novo e mais consistente dessas últimas semanas.

Dilma põe subprocurador- geral na Justiça

• Oposição critica escolha de Eugênio de Aragão, que tem bom trânsito no PT e substituirá Wellington César

Catarina Alencastro, Simone Iglesias, Eduardo Barretto - O Globo

- BRASÍLIA- O subprocurador- geral da República Eugênio de Aragão será o novo ministro da Justiça do governo Dilma, em substituição ao procurador baiano Wellington César Lima e Silva, que ficou só 11 dias no cargo. Aragão, que também é vice-procurador- geral eleitoral no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tem bom trânsito no PT

Wellington César avisou à presidente que decidiu não renunciar à sua carreira no Ministério Público baiano. O novo ministro, que entrou para o MPF antes da promulgação da Constituição de 1988, não é atingido pela decisão do Supremo Tribunal Federal, que proibiu a participação de procuradores em cargos do Executivo.

“Operação arriscada”
A oposição criticou a escolha de Aragão. Disse que a nomeação de um procurador que acompanha, ao lado do procurador-geral, Rodrigo Janot, a Lava- Jato, é no mínimo “operação política arriscada” e dá sinalização ruim à sociedade.

Deputados tucanos lembraram de parecer dado por ele favorável à presidente Dilma em ação movida pelo PSDB contra ela no TSE. Já para o vice- líder do PT, Paulo Pimenta ( RS), Aragão tem autoridade política e jurídica e bom diálogo com o Judiciário.

— Ele interferiu favoravelmente à presidente Dilma no processo que o PSDB está movendo contra ela no TSE, o que por si só revela mais do que simpatia. Traz preocupação porque revela uma tendência partidária — afirmou o líder do PSDB, Antonio Imbassahy (BA).

Para o líder do PPS, Rubens Bueno (PR), a escolha sinaliza que Dilma quer controlar o Ministério Público:

— Não vejo como boa nomeação tirar um membro do Ministério Público e colocar outro.

É ruim para as instituições republicanas e democráticas. A presidente sinaliza que quer o controle do MP para controlar a Polícia Federal e a Lava- Jato, que está chegando à presidente.
— Todos os políticos com foro privilegiado são levados para a Procuradoria-Geral da República. São informações que ele levará para dentro do governo. Isso, ao meu ver, é muito arriscado, delicado e perigoso — disse Pauderney Avelino, líder do DEM.

Pimenta criticou as suspeições sobre Aragão:

— É um nome que tem autoridade política e jurídica, firmeza nas suas convicções, diálogo com as instâncias do Poder Judiciário e todas as condições para ser o ministro precisa neste momento.

Na semana passada, o STF decidiu anular a indicação de Wellington César para a Justiça, com base em ação movida por partidos de oposição. Eles alegaram que um membro do MP não poderia assumir cargos no Executivo. Dilma deixou a critério dele decidir. Se Wellington fosse assumir a pasta, ele teria de renunciar à carreira de procurador.

Direitos conquistados
Ao Globo, Wellington César afirmou que optou pela demissão para não perder os direitos conquistados nos 25 anos de trabalho no MP. Ele contou ter passado os últimos dias fazendo consultas a especialistas do país inteiro, sobre a possibilidade de ter uma aposentadoria proporcional, mas não conseguiu nenhuma interpretação favorável da lei. A fragilidade do governo, segundo ele, não pesou na decisão:

— Ninguém joga uma carreira fora, que diz respeito a sua sobrevivência, a sua aposentadoria, a sua velhice amparada, por um cargo, independentemente de se tratar deste ou daquele governo, federal ou estadual — disse.

Wellington, que estava em seu primeiro dia como ministro quando ocorreu a condução coercitiva do ex-presidente Lula, garante não ter sofrido qualquer pressão por causa da Lava-Jato.

No TSE, medidas que favoreceram o governo

• Subprocurador recomendou a aprovação com ressalvas das contas de campanha de Dilma

- O Globo

- BRASÍLIA- O subprocuradorgeral da República Eugênio de Aragão já tomou várias medidas que favoreceram o governo, seja em processos do Supremo Tribunal Federal ( STF), seja no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), corte onde atua como vice- procuradorgeral eleitoral. Por outro lado, ele foi grande fonte de dor de cabeça ao governo quando, em 5 de fevereiro, declarou- se favorável à inclusão dos documentos da Lava- Jato enviados pelo juiz Sérgio Moro em um dos processos que pedem ao TSE a cassação da chapa Dilma Rousseff- Michel Temer.

Entre as ações favoráveis ao governo, Aragão enviou ao STF no ano passado um aditamento, com mais provas, à denúncia contra um dos maiores adversários de Dilma: o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, acusado de receber propina por um contrato da Petrobras.

Recentemente, ele assinou pareceres beneficiando Dilma. Num deles, em dezembro de 2014, pouco depois da eleição, rechaçou documento de técnicos do tribunal apontando irregularidades e recomendou ao TSE a aprovação com ressalvas das contas de campanha de Dilma.

Em novembro de 2014, ele já tinha entrado com recurso no TSE contra a escolha do ministro Gilmar Mendes — que não poupa críticas a Dilma — para relatar as contas da campanha. O recurso não prosperou e rendeu a Aragão a inimizade de Gilmar. Quando as contas foram aprovadas com ressalva, Gilmar insinuou que Aragão tinha agido com interesse político e atuava como advogado de Dilma. O procurador, que estava presente à sessão, não reagiu às provocações.

Aragão desagradou ao governo ao ser favorável à inclusão de documentos da Lava- Jato em processo que pode cassar mandato de Dilma. Ele endossou pedido para que investigados da Lava Jato sejam ouvidos como testemunhas no TSE. Nos documentos, Moro informou que delatores apontaram pagamentos de propina registrados como doações eleitorais.

Nascido em 1959, no Rio, Aragão se formou em Direito em 1982 na Universidade de Brasília (UnB), onde dá aulas. Ele começou no MPF em 1987, antes da Constituição de 1988. Isso lhe permite algumas atividades proibidas a quem entrou no órgão depois. Se quiser, pode advogar. A possibilidade de comandar a pasta sem deixar a carreira no MPF é outra vantagem.

Esta já é a terceira passagem dele pela pasta. Na década de 1980, ocupou cargo no ministério. Em 1991, foi por dois meses procurador-geral da Funai. Também já trabalhou, entre 1999 e 2000, na Administração Transitória da ONU no Timor Leste, ex-colônia portuguesa que se tornara independente da Indonésia.

Congresso discute como afastar Dilma

Por Tainara Machado - Valor Econômico

SÃO PAULO - Há uma nova saída para o "fora Dilma" sendo articulada no Congresso: o impeachment combinado com o fim da reeleição. Para isso, além de afastar a presidente, o Legislativo teria de votar uma emenda à Constituição - há uma PEC aprovada na Câmara pronta para ser votada no Senado. Os congressistas discutem mais de uma alternativa para encerrar o ciclo do PT: do parlamentarismo à convocação de eleições gerais. A única certeza é que Dilma perdeu as condições para governar. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, está convencido de que pode tocar o impeachment em até 45 dias. Dilma poderia ser afastada pelo Senado mais ou menos no início de maio.

Para analistas, impeachment é o mais provável
As manifestações contra o governo da presidente Dilma Rousseff aumentaram, para cerca de 70%, a probabilidade de impeachment, na opinião de bancos e consultorias. Para os analistas, apenas esse desfecho pode interromper a paralisia que domina Brasília e acelerar a saída da crise. "Com a situação atual, teríamos permanência no fundo do poço por um bom tempo", diz Mauro Schneider, da MCM Consultores. "O suporte popular vai aumentar a pressão sobre os congressistas", aposta Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho. O Eurasia Group, consultoria especializada em risco político, acredita que Dilma deixará o cargo em maio, após aprovação do impeachment pela Câmara. Na convenção realizada sábado, o PMDB já teria dado "fortes pistas de que está prestes a pular do barco".

Analistas projetam chance maior de mudança
Diante dos capítulos mais recentes da crise política e das manifestações de domingo, alguns bancos e consultorias passaram a atribuir probabilidade de até 70% a um cenário até então alternativo: o da presidente Dilma Rousseff não terminar o mandato. Esse desfecho, dizem, poderia dissolver a paralisia que toma conta de Brasília e acelerar a saída da crise, com repercussão positiva sobre confiança e atividade, além de ajudar a inflação via taxa de câmbio.

O mais provável, afirmam, parece ser o impeachment da presidente, quadro no qual o vice, Michel Temer (PMDB), assumiria a Presidência. A permanência da presidente no cargo passou a ter, em algumas análises, apenas 30% de chance. "Com a situação atual, teríamos permanência no fundo do poço por um bom tempo", diz Mauro Schneider, da MCM Consultores.

"O cenário mudou depois de domingo", avalia Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho. Para ele, é difícil atribuir probabilidades a cada cenário, mas parece haver 70% de chance de Dilma deixar a presidência neste ano. "O suporte popular vai aumentar a pressão sobre os congressistas", avalia ele, para quem há, além do impeachment, a possibilidade de cassação da chapa pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O impeachment, diz, não altera sua projeção de queda do Produto Interno Bruto (PIB) em 2016, de 3,5%, mas evita um cenário em que a recessão se aprofunda. "Até que as mudanças na condução da política econômica cheguem na economia real demora, mas pode haver algum ganho com melhora da confiança". A recuperação, avalia, será bem gradual, com crescimento de 0,5% a 1% do PIB em 2017. O que muda mais, no curto prazo, diz, é a taxa de câmbio. Em um cenário em que Dilma encerra o mandato, o dólar pode fechar o ano em R$ 4,30. Com chance maior de impeachment, afirma, sua projeção caiu para R$ 3,60.

"Já há algum tempo trabalhamos com cenário de queda da presidente", diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, para quem a chance de Dilma terminar o mandato é de 30%. "Para a economia, continua significando um ano difícil", diz ele, que projeta retração de 3,8% do PIB em 2016, mesmo com alguma melhora na segunda metade do ano. Em 2017, a estimativa é de avanço de 0,6% da economia, porque a questão fiscal ainda vai exigir ajustes profundos. O cenário, afirma, continua a ser de risco, até porque a partir do ano que vem as atenções se voltarão para as eleições de 2018.

Rostagno também pondera que não está claro o que vai acontecer depois do impeachment. O governo de transição, diz, pode ganhar governabilidade, mas a aprovação de reformas vai depender do grau de alinhamento entre PMDB e PSDB e de um imponderável: a Operação Lava-Jato. "As investigações continuam e podem surgir fatos novos envolvendo a oposição, a alta cúpula do PMDB".

De qualquer forma, avalia, o cenário seria de menos paralisia do que há atualmente. "Pelo menos o debate deve ganhar mais centralidade e podemos ter medidas de curto prazo que foram anunciadas, mas não avançaram, como corte de cargos comissionados".

A independência formal do Banco Central, por exemplo, que está na pauta de discussão do Senado, pode ser das primeiras reformas a avançar em um governo de transição, diz Schneider, da MCM. Para ele, as manifestações fizeram com que o processo de "encurtamento" do atual governo, que já estava se tornando provável nas últimas semanas, avançasse algumas casas. Por isso, diz, o grau de incerteza está diminuindo, e não aumentando. "De um cenário em que a chance de permanência ou saída era igual, de 50%, a interrupção do mandato ganhou probabilidade".

Para ele, não dá para ser taxativo sobre as perspectivas a partir dessa avaliação porque várias dúvidas permanecem, como a evolução da Lava-Jato. "Mas temos uma administração virtualmente paralisada. Só de sair dessa situação já há melhora de expectativas. As variáveis financeiras, como o câmbio, estão antecipando isso".

A partir de 2017, diz, variáveis como PIB e inflação poderiam ter evolução mais favorável mesmo que o governo de transição enfrente dificuldades para avançar com reformas estruturais. "A expectativa é de maior oxigenação, com ajustes na gestão da política econômica, o que por si só já injetaria mais otimismo", avalia.

Para Nelson Rocha, presidente do Banco Ribeirão Preto, a melhor saída para a economia seria a cassação da chapa pelo TSE, com realização de novas eleições diretas. "Seria a alternativa que mais fortaleceria a democracia brasileira, que é um diferencial que temos em relação aos demais emergentes, ainda que seja um processo mais demorado", afirma. Nesse cenário, a atividade poderia ser retomada já no último trimestre de 2016.

Para Rocha, no entanto, o desdobramento mais provável, principalmente depois das manifestações de domingo, é o de impeachment da presidente. Esse é um quadro, segundo ele, que ainda guarda muitas incertezas. "Não tem, na nossa avaliação, a mesma força que a cassação da chapa porque é um processo liderado pelo Congresso, que também tem seus quadros como alvo de denúncias".

Possivelmente, contudo, haveria retomada mais rápida da atividade do que em um quadro em que há permanência de Dilma no poder. "Aí, provavelmente, ficaríamos nesse cabo de guerra contínuo", diz ele. De qualquer jeito, afirma, a expectativa é de recuperação da economia, só que bem mais lenta e baseada em recuo da inflação e no setor externo.

Para Vale, da MB, se Dilma permanecer, a queda do PIB em 2016 pode encostar em 5%. Rostagno, do Mizuho, também avalia que tombo da atividade pode chegar a 4,5% com continuidade. "O cenário em que há permanência do atual governo, infelizmente, não dá margem para esperar mudança na política fiscal. Pelo contrário, o que estamos vendo é guinada à esquerda", afirma.

Câmara pode votar impeachment em 30 dias, diz Cunha

• Ministro critica celeridade, mas diz que Dilma tem os 172 votos necessários para permanecer no cargo

Isabel Braga, Eduardo Barreto, Catarina Alencastro, Eduardo Bresciani, Júnia Gama – O Globo

- BRASILIA- Dentro da estratégia de garantir celeridade total ao processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB-RJ), disse ontem que é possível votá- lo, no plenário da Casa, em 30 dias, como defende a oposição. O ministro Jaques Wagner (Casa Civil) reagiu à aceleração do processo após as manifestações do último domingo, mas afirmou que o governo seguramente terá mais dos que os 172 votos para barrar o processo na Câmara. A oposição, por sua vez, promete trabalhar para acelerar a análise do processo.

Eduardo Cunha trabalha para que a comissão especial do impeachment, composta por 65 integrantes, seja eleita e instalada até o final desta semana. Ele avisou que fará a eleição no dia seguinte ao julgamento do rito pelo Supremo Tribunal Federal — previsto para esta quarta-feira — e que ela poderá ser instalada no mesmo dia. Segundo ele, no entanto, o prazo de duração do processo de impeachment na Câmara dependerá do quorum nas sessões plenárias da Casa e de eventuais percalços da tramitação.

— Não é correr. Serão 15 sessões. Pode fazer em três semanas ou fazer em cinco semanas, depende do quorum. Darei o prazo para eleger ( e indicar os integrantes da comissão) de um dia para o outro e vamos fazer a eleição na quinta e instalar, talvez na própria quinta, ou na sexta — disse Cunha.

O ministro Jaques Wagner disse que é preciso conversar com os líderes aliados e ver a montagem da comissão especial.

— Vamos ter que cuidar da montagem da comissão e conversar com todo mundo. Tenho tranquilidade em dizer que nós temos tudo para barrar esse processo ainda na Câmara. O número que você precisa são 172, eu acho que seguramente nós teremos mais do que isso — afirmou Wagner.

Para o ministro, o impedimento de Dilma paralisaria o Brasil pelo resto do ano e não deve ser usado como solução para a crise econômica.

— O impeachment não é remédio para crise nem para impopularidade. Tem que ser a exceção da exceção. O processo está sendo muito mais político, de tentar consertar a economia — disse Wagner, rechaçando comparações com o impeachment do ex- presidente Fernando Collor: — Qual é a casa da Dinda aqui? Não tem. No plenário do Senado, Lindbergh Farias (PTRJ) atacou o vice-presidente Michel Temer e afirmou que o documento peemedebista “Uma ponte para o Futuro” é um “programa do golpe”. O senador Romero Jucá (PMDB- RR), que assumiu no sábado a vice- presidência do PMDB, censurou o colega dizendo que Michel Temer não pode ser chamado de golpista e destacou a crise entre o PMDB e o governo:

— O que nós temos que ver é o seguinte: da eleição para cá, esse processo de entendimento, de parceria foi se desconstruindo, ele foi se esfacelando.

No Palácio do Planalto, a presidente Dilma Rousseff reuniu- se com os seis ministros do PMDB. Segundo relatos, os ministros disseram à presidente que irão trabalhar para que os oposicionistas dentro do PMDB tenham uma convivência “respeitosa” com aqueles que defendem a permanência no governo. Na contramão do tom de afastamento adotado na convenção do partido sábado, os ministros reafirmaram o apoio à presidente.

— A convenção no sábado foi muito emocional, então nós nos sentimos na obrigação, depois dos movimentos de rua de domingo, de ter conversa com a presidente Dilma. Fomos reafirmar o óbvio: que somos governo, votamos nela, temos um vice-presidente que foi eleito com ela, administramos juntos e nossa posição é muita clara de apoio à presidente Dilma e contrário ao impeachment — disse o ministro da Saúde, Marcelo Castro, que defende que o partido, mesmo se decidir desembarcar da base aliada nos próximos 30 dias, respeite as posições daqueles que desejam permanecer no governo.

Comissão do impeachment será eleita um dia depois de decisão do Supremo

Por Raphael Di Cunto, Thiago Resende e Fernando Exman - Valor Econômico

BRASÍLIA - O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), afirmou ontem que pretende realizar a eleição dos integrantes da comissão especial que elaborará um parecer sobre o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff já na quinta-feira, um dia após a sessão em que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidirá sobre o rito do processo que pode destituir a petista.
A escolha do presidente e relator do colegiado deve ocorrer no mesmo dia ou até na sexta-feira, segundo previsão de Cunha, que antevê uma "guerra" na eleição da cúpula da comissão.

"Mesmo que não tivesse tido nenhuma manifestação [a favor do impeachment no domingo], daríamos prosseguimento na quinta-feira, depois da decisão do Supremo", disse. "Não é uma questão de pressa. Nunca houve tantos pedidos de impeachment na história desse país, depois do que eu acolhi já entraram outros dez, e precisamos decidir isso logo", afirmou Cunha, que é réu em ação penal no Supremo.

Na avaliação do pemedebista, o processo levará cerca de 45 dias para ser votado no plenário da Câmara. São 10 sessões de plenário para Dilma apresentar sua defesa e cinco para a comissão elaborar e votar o parecer. Se a oposição se mobilizar para dar quórum nas sessões não deliberativas de segundas e sexta-feiras, o prazo pode se resumir a três semanas. Caso contrário, a comissão terá até cinco semanas para decidir sobre o impeachment.

"Os partidos e deputados é que vão dizer se haverá ou não votações no plenário da Casa. Meu papel é abrir a sessão", disse. A oposição discute mobilizar 51 deputados de "plantão" para garantir o quórum mínimo das sessões as segundas e sextas-feiras.

Cada vez mais próxima do PMDB, que decidirá sobre o rompimento com o governo em 30 dias, a oposição investirá agora em convencer principalmente deputados de PP, PSD e PR - três dos maiores partidos da base aliada no Congresso - a votarem a favor do impeachment da presidente Dilma.

A avaliação de tucanos é de que parte considerável dos deputados destas bancadas já se declara favorável ao impeachment e é preciso construir maioria dentro destas legendas. Com o apoio do PMDB e sinalizações mais fortes dessas siglas, o entendimento é de que as outras bancadas da base com menor número de deputados tendem a abandonar o governo. As manifestações ocorridas no domingo, avaliam, deram novo impulso ao processo.

PP, PSD e PR têm, juntos, 110 deputados federais - número que ainda pode mudar até o fim da janela para parlamentares trocarem de partido sem perderem o mandato, que se encerra na sexta-feira. O PMDB conta com 67 parlamentares. É necessário o apoio de 342 dos 512 deputados com direito a voto para aprovar a abertura do impeachment contra Dilma.

Sobre a proposta discutida por congressistas em torno do parlamentarismo, Cunha, que defende esse modelo de governo, disse que implantá-lo agora - como tenta articular o PMDB do Senado - é "golpe" e que a tramitação apenas na Câmara duraria, pelo menos, 180 dias. "É um processo muito demorado", disse, lembrando que a Constituição tem que ser alterada. "Trocar o modo de governo para resolver a crise vai relembrar um passado que não deu certo", pontuou, sobre a mudança constitucional de 1961.

Apesar das recentes sinalizações de dirigentes e parlamentares do PMDB, os seis ministros de Estado indicados pelo partido disseram ontem à presidente Dilma Rousseff que buscarão apoios nas bancadas da sigla no Congresso para que o processo de impeachment seja enterrado.

Dilma e os ministros pemedebistas reuniram-se no Palácio do Planalto para uma análise do cenário político, depois das manifestações contrárias ao governo realizadas pelo país no domingo e da convenção nacional do partido. No encontro, o PMDB aprovou uma resolução proibindo filiados de assumirem novos cargos no Executivo nos próximos 30 dias, período em que o diretório nacional da legenda deve definir se deixa o governo federal.

"O PMDB tem uma divisão clara, a convenção mostrou isso", disse um participante da reunião ao Valor PRO. "Mas reafirmamos de maneira bem clara que estamos no governo, somos governo e somos contra o impeachment e à favor da manutenção do mandato da presidente."

Participaram da reunião os ministros Marcelo Castro (Saúde), Kátia Abreu (Agricultura), Henrique Eduardo Alves (Turismo), Helder Barbalho (Portos), Eduardo Braga (Minas e Energia) e Celso Pansera (Ciência e Tecnologia).

Entrevista Luiz Werneck Vianna

• A sociedade tradicional brasileira estrebucha com a intervenção cirúrgica no mundo da política.

Por Patricia Fachin - IHU On-Line

“O fato é que está sendo dissipado um nevoeiro e está sendo extraído um véu que encobria as relações espúrias entre o público e o privado”, afirma o sociólogo.

“Eu tenho medo de que se perca o que há de ‘revolução verdadeira’ nesse processo, e de que a velha política, o que há de pior na tradição republicana brasileira, reencontre o seu lugar. Nesse momento em que você me telefona (11-03-2015), o que está em curso é isso: a tentativa de desautorização, desmoralização e desqualificação do papel desses reformadores da vida republicana brasileira”.

A declaração é do sociólogo Luiz Werneck Vianna, em entrevista à IHU On-Line, concedida por telefone na última sexta-feira, ao comentar os fatos envolvendo as ações do Ministério Público e da Operação Lava Jato, que investiga as relações de corrupção entre o Estado e as grandes empreiteiras.

Apesar da crise política que se estende pelo país, com disputas de todos os lados, “as instituições estão funcionando, sim”, e no “Brasil há uma ‘revolução dos santos’”, aos moldes da que foi implementada no mundo anglo-saxão, conduzida por “homens irmanados em torno de princípios, da crença forte no sistema das leis, de valores éticos, como se fossem portadores de uma missão: a de renovar os fundamentos da cultura brasileira, especialmente da cultura política brasileira”, afirma o sociólogo.

Na entrevista a seguir, Werneck Vianna lembra que, ao longo da história do Brasil, a magistratura foi responsável por “articular” as relações entre o Estado e o setor privado. Contudo, pontua, a Constituição de 88 “releu e interpretou essa história, expurgou-a de seus elementos caracteristicamente autoritários e deu projeção e imprimiu uma leitura democrática a essas instituições. Mais que isso: inovou criando essa figura inédita no Direito comparado, que é o Ministério Público, para agir junto à sociedade, em defesa dela”.

Segundo ele, para entender o que acontece hoje no país, é preciso perceber que à medida que essas instituições “se robusteciam, a política institucional foi se enfraquecendo e se deteriorando até o ponto de que hoje boa parte dos representantes do povo está com a vida comprometida num inquérito policial”. Assim, hoje a “sociedade tradicional brasileira estrebucha com essa intervenção, porque essa é uma intervenção cirúrgica no mundo da política e especialmente na relação entre política e economia, entre os poderes políticos e econômicos; basta ver a relação dos partidos com as empreiteiras, por onde passa esse segredo de uma relação de contubérnio [convivência] entre a esfera pública e a esfera privada no Brasil”.

A dificuldade neste momento, adverte, é que “apenas com o Direito não será possível mudar o Brasil. A meu ver, a ilusão das instituições é a de que isso é possível somente se apoiando na Constituição e nos textos legais, mas isso não basta; é preciso que a política entre em cena também. Mas está difícil de a política entrar em cena do jeito que os partidos estão”. E conclui: “Temos que procurar salvar a política, porque, do contrário, a ‘revolução dos santos’ poderá ficar inconclusa e poderá ser uma página frustrada na política brasileira se ela não for completada pela ação política”.

Confira a entrevista.

IHU On-Line - Como o senhor está acompanhando os acontecimentos dos últimos dias?

Luiz Werneck Vianna – Parece muito difícil a recomposição desse governo, dada a crise econômica, a crise política, a crise moral. O tema da imprevisibilidade é o que parece ser o dominante: para onde vamos?

IHU On-Line - Nas últimas entrevistas que nos concedeu sobre a crise política, o senhor sempre sinalizou a importância de observar o bom funcionamento das instituições no Brasil nos últimos anos, chamando atenção, especialmente, para a atuação do Ministério Público. As investigações do MP acerca da relação entre o Estado e o setor privado e da Lava Jato reforçam sua tese anterior ou não?

Luiz Werneck Vianna – As instituições estão funcionando, sim. No Brasil há uma “revolução dos santos”, algo assemelhado à revolução que ocorreu no mundo anglo-saxão com o advento do protestantismo, tanto na banda europeia e inglesa quanto na banda americana que foi formada a partir dessa matriz.

IHU On-Line – Pode explicar o que é a “revolução dos santos”?

Luiz Werneck Vianna – Vou tentar. Trata-se da ação de homens irmanados em torno de princípios, da crença forte no sistema das leis, de valores éticos, como se fossem portadores de uma missão: a de renovar os fundamentos da cultura brasileira, especialmente da cultura política brasileira. Não à toa, algumas das principais personalidades desse movimento que quer, pelo Direito e suas instituições, salvar o Brasil, são praticantes de religiões protestantes.

Um personagem muito em evidência – não vou citar o nome - tem feito, inclusive, conferências em templos batistas. Ele é hoje um jovem, uma personalidade em evidência nesse processo, mas não está sozinho nisso. Além dessa adesão religiosa, eles são jovens: em geral homens que recém chegaram aos 40 anos e estão animados por esse espírito de salvação e missão. Basta ver a coragem com que se portam e a audácia com que agem, como que indiferentes ao contexto político, indiferentes a opiniões, se agradam ou não. A decisão do Ministério Público de São Paulo é clara em relação a isso: fizeram uma intervenção que ignora o contexto político e social e apenas se aferra a princípios e esses princípios devem ser estabelecidos por uma elite salvífica.

A novidade do quadro é que essas instituições nasceram da luta pela democratização do país. O Ministério Público vem direto da Carta de 88.

• “O tema da imprevisibilidade é o que parece ser o dominante: para onde vamos?”

IHU On-Line – Que princípios sustentam a atuação do Ministério Público e dessas instituições?

Luiz Werneck Vianna – A lei acima de tudo e o exercício do Direito como religião de salvação.

IHU On-Line – O senhor pode nos dar um panorama histórico de como, desde as origens do Brasil, houve uma relação direta entre setores do Direito, o Estado e setor privado, e como, a partir da Constituição de 88, a relação entre essas instituições começou a se romper? Como o Ministério Público e as instituições vêm atuando no país desde 88, até que se chegasse a esse momento?

Luiz Werneck Vianna – Essa explicação vai longe. A instituição Ministério Público só existe no Brasil, enquanto defensor da sociedade e não como peça instrumental do Estado. Basta ver a decisão recente do Supremo Tribunal Federal – STF, que lendo a Constituição Federal declarou ser inconstitucional que um membro do Ministério Público ocupe funções e exerça papéis no Poder Executivo.

A função constitucional desse Ministério Público é defender as instituições, o Direito e, nesse sentido, aos poucos ele foi se tornando um personagem institucional altamente influente na vida social, no meio ambiente, na saúde. Não se pode entender o tema do meio ambiente hoje, neste país, sem o papel de protagonismo que o Ministério Público vem exercendo nessa questão. Na saúde e nas questões sociais em geral, o MP vem atuando e está aí esse personagem que passou a atrair a atenção dos jovens postulantes a uma vida dedicada ao Direito. Uma multidão concorre a uma vaga no Ministério Público.

Uma nação concebida por uma teoria política
Nós, brasileiros, não somos filhos de uma revolução nacional libertadora; nós nascemos a partir de uma “revolução pelo alto”. O primeiro chefe de Estado que tivemos foi um herdeiro da Casa Real: Dom Pedro I, filho de Dom João VI e, com isso, as instituições foram montadas “por cima”, de “cima para baixo”.

Euclides da Cunha disse, caracterizando a revolução nacional brasileira, que se tratava de uma “revolução por cima”, em que uma teoria política concebida e admitida pelas elites, ia forjar de “cima para baixo” uma nação. Ele disse quase textualmente: “O Brasil é um caso singular de uma nação formada por uma teoria política”. Como essa nação foi formada? Por uma elite vigilante, com um papel dirigido para o exercício de uma pedagogia cívica, que fez de um povo invertebrado e desarticulado, uma nação.

Não à toa, depois das crises da Regência, a ordem imperial fez da magistratura um dos seus principais instrumentos para levar a ordem, tal como era concebida pelas suas elites. Foi essa a teoria política fundadora do Brasil, para levar essa ideologia, essas visões e esses valores para a população. Vai ser o juiz neste país, o magistrado, que vai articular o Estado aos rincões. Isso está muito claro na obra do grande estadista que foi Visconde de Uruguai, que foi Ministro da Justiça e escreveu a obra fundamental chamada O direito administrativo. O direito administrativo nesse sentido é o instrumento organizador da nossa vida, e não o direito civil. E o direito administrativo é o direito do Estado. Com isso, nós criamos essa forma singular de relação entre poder e Direito.

O Ministério da Revolução
Agora vamos virar a página e ir do Império para a República. Como realizar a modernização do país? Esse é o tema que se impõe com a Revolução de 1930. Dos ministérios criados pela Revolução de 30, qual deles é caracterizado como o “Ministério da Revolução”, nas palavras do dirigente da época, Getúlio Vargas? É o Ministério do Trabalho, “o Ministério da Revolução”. Qual foi a tarefa do Ministério do Trabalho? A criação de uma legislação social, de instituições que zelassem pela harmonia entre capital e trabalho, e mais, que zelassem pelo mercado de trabalho no Brasil. Tendo também – e nesse sentido sendo contínua à tradição que vinha do Império - um elemento de pedagogia cívica muito forte: educar os trabalhadores para a vida cívica e para os valores do patriotismo, ou seja, abriu-se a Constituição de 37.

Mas o fundamental é que essas instituições estão aí até hoje: a Justiça do Trabalho tem uma presença capilar imensa em qualquer lugar, porque em qualquer Comarca existe uma Justiça do Trabalho. O Direito, com isso, adquiriu um papel central na estruturação do capitalismo brasileiro, na modernização burguesa do país.

• “Houve uma mudança de geração, uma mudança de bibliografia. As faculdades de Direito não são mais as que foram nos anos 30, 40, 50”

Constituição de 88: o expurgamento
O que fez a Carta de 88? Releu e interpretou essa história, expurgou-a de seus elementos caracteristicamente autoritários e deu projeção e imprimiu uma leitura democrática a essas instituições. Mais que isso: inovou criando essa figura inédita no Direito comparado, que é o Ministério Público, para agir junto à sociedade, em defesa dela.

Vamos virar a próxima página da história brasileira: nesse meio tempo, houve uma mudança de geração, uma mudança de bibliografia. As faculdades de Direito não são mais as que foram nos anos 30, 40, 50; elas estão baseadas em outra bibliografia, a partir da qual o papel do Direito é visto numa dimensão transformadora da vida social. Esses jovens são descendentes disso, e não apenas disso, porque são filhos de outras mudanças e, inclusive, de visões de mundo religiosas. E sem controle político, garantido pela Constituição, firmaram esse papel de salvação.

A contraface: a política se enfraqueceu
Agora, qual foi a contraface disso? Ao mesmo tempo em que essas instituições se robusteciam, a política institucional foi se enfraquecendo e se deteriorando até o ponto de que hoje boa parte dos representantes do povo está com a vida comprometida num inquérito policial.

Os partidos não construíram identidades, se tornaram entidades passivas à manipulação do Poder Executivo viapresidencialismo de coalizão – esse é um velho tema que discuto e que já foi tema de várias entrevistas que concedi a vocês. E diante dessa debilidade dos partidos e da política em geral, a emergência dessas instituições do Direito teve uma ampliação do poder irrestrita e ilimitada. Esse é o quadro de operações que está aí.

IHU On-Line – Como analisa, em contrapartida, as críticas feitas ao Ministério Público e à Operação Lava Jato? Muitos afirmam que as ações dessas instituições são abusivas e que há um “estado de exceção” no país. Concorda com esse tipo de avaliação?

Luiz Werneck Vianna – A sociedade tradicional brasileira estrebucha com essa intervenção, porque essa é uma intervenção cirúrgica no mundo da política e especialmente na relação entre política e economia, entre os poderes políticos e econômicos; basta ver a relação dos partidos com as empreiteiras, por onde passa esse segredo de uma relação de contubérnio [convivência] entre a esfera pública e a esfera privada no Brasil.

Uma das formas fortes de ação desses novos protagonistas, desses “santos” na vida republicana brasileira de agora, tem como fulcro exatamente a relação entre a esfera pública e a esfera privada no sentido de separá-las, dissociá-las pela pureza republicana. Então, a “revolução dos santos” clássica no mundo anglo-saxão também foi animada por ideais republicanos como esses que animam hoje esses jovens procuradores e juízes no Brasil. Se você for ler os trabalhos que Sérgio Moro publicou antes de ser juiz, vai notar muito claramente a influência do Direito anglo-saxão na obra dele. Agora, há mais que isso, porque o Direito e suas instituições têm, na história do nosso país, um papel fundamental e esse é um assunto muito complexo.

IHU On-Line – O senhor chama atenção para a desvinculação das instituições jurídicas do Poder Executivo a partir da Carta de 88. Apesar disso, como analisa as discussões que questionam a natureza da Operação Lava Jato, entre aqueles que, de um lado, defendem a sua natureza republicana e, de outro, aqueles que afirmam que o Ministério Público e a Polícia Federal estão sendo usados pela política para derrubar apenas alguns políticos e partidos?

Luiz Werneck Vianna – A natureza da Lava Jato é republicana e sua função é denunciar o contubérnio entre a esfera pública e a esfera privada brasileira.

IHU On-Line – O senhor não vê essa “confusão” e “obscuridade” acerca da natureza da Operação Lava Jato?

Luiz Werneck Vianna – Não, isso é miopia, são pequenos interesses contrariados, é paixão ideológica; não tem análise verdadeira nisso. A relação espúria entre o público e o privado chegou num ponto tal que clamou aos céus uma intervenção.

• “A relação espúria entre o público e o privado chegou num ponto tal que clamou aos céus uma intervenção”

IHU On-Line – Há uma confusão de sentimentos, pelo menos à medida que, ao mesmo tempo em que existe esse clamor por justiça, há reações de medo de que as ações do Ministério Público possam significar um golpe?

Luiz Werneck Vianna – Os pequenos interesses vão ficar fazendo essas confabulações sobre golpe e não há como essa névoa se dissipar, a não ser com o tempo. O fato é que está sendo dissipado um nevoeiro e está sendo extraído um véu que encobria as relações espúrias entre o público e o privado. Essas confabulações cegam, inclusive, os interesses políticos constituídos agora.

É evidente que esse é um assunto muito complexo e não dá para falar de uma maneira desgovernada sobre tudo isso. O fato é que apenas com o Direito não será possível mudar o Brasil. A meu ver, a ilusão das instituições é a de que isso é possível somente se apoiando na Constituição e nos textos legais, mas isso não basta; é preciso que a política entre em cena também. Mas está difícil de a política entrar em cena do jeito que os partidos estão. Então, temos que procurar salvar a política, porque, do contrário, a “revolução dos santos” poderá ficar inconclusa e poderá ser uma página frustrada na política brasileira se ela não for completada pela ação política.

IHU On-Line – Por que a política não conseguiu acompanhar esse mesmo movimento da Justiça, do Ministério Público e das outras instituições?

Luiz Werneck Vianna – Porque ela estava comprometida com esse Estado que está aí, e a esquerda estava comprometida com esses movimentos sociais carimbados. Como uma ONG cooptada pelo poder público vai ter independência diante do Estado?

IHU On-Line – O que sugere em termos políticos? Movimentos devem se distanciar do Estado?

Luiz Werneck Vianna – Total não, mas o que não pode é se sujeitar ao Estado. Movimentos sociais não podem ser um braço do Estado nem estar a serviço do Estado. Vai ser muito difícil mudar isso.
Eu tenho medo de que se perca o que há de “revolução verdadeira” nesse processo e de que a velha política, o que há de pior na tradição republicana brasileira, reencontre o seu lugar. Nesse momento em que você me telefona (11-03-2015), o que está em curso é isso: a tentativa de desautorização, desmoralização e desqualificação do papel desses reformadores da vida republicana brasileira.

Entretanto, esses reformadores cometem um erro grave: o de não reconhecer a dimensão da política como uma dimensão a ser trabalhada. Por exemplo, foi um erro político a condução coercitiva do ex-presidente Lula; não jurídico. Agora, por que eles o fizeram? Porque eles são ausentes dessa questão política e eles não vão conseguir avançar no sentido de fazer com que tudo que estão trazendo de novo perdure e persista, se eles não se abrirem para a dimensão da vida política. Sem essa dimensão política, os nossos “santos” serão derrotados.

• “A brecha para a 'revolução dos santos' foi dada pela falência do sistema político”

IHU On-Line – O que o senhor quer dizer com isso claramente? Eles pertencem à dimensão da Justiça e não à da política. Por que e em que sentido devem ter essa dimensão política presente?

Luiz Werneck Vianna – É uma relação muito complexa. A caracterização geral para mim é essa: a “revolução dos santos” está sendo eficiente, mas enquanto todo esse processo ficar envolvendo apenas os atores vindos do mundo do Direito, isso será insuficiente e poderá se perder.

IHU On-Line – Vê possibilidades de mudança na política?

Luiz Werneck Vianna – Temos que fazer reformas políticas, criar novos partidos, animar novos partidos – também não precisa existir tantos como hoje -, mas para isso tem que expurgar os que estão aí.

IHU On-Line – O que o senhor tem pensado sobre a democracia e a crise de representação política nos últimos dias?

Luiz Werneck Vianna – Que os políticos que estão aí não têm condições de reprodução; o sistema tem que passar por uma reforma.

IHU On-Line – O senhor aponta a constituição de novos partidos como uma alternativa a ser buscada. Como constituí-los nesse momento?

Luiz Werneck Vianna – Sem dúvida. Estão aparecendo novos partidos relevantes por aí. Agora, é preciso uma legislação eleitoral que defenda a vida política partidária. Quanta coisa já se disse e se escreveu sobre isso. Não há mais nada a dizer, agora temos que fazer. A brecha para a “revolução dos santos” foi dada pela falência do sistema político.

IHU On-Line – Quais são os novos partidos que vê por aí?

Luiz Werneck Vianna – Não quero nomear novos partidos, mas há coisas novas, sim.

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Luiz Werneck Vianna (foto abaixo) é professor-pesquisador na Pontifícia Universidade Católica - PUC-Rio. Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo, é autor de, entre outras obras, A revolução passiva: iberismo e americanismo no Brasil (Rio de Janeiro: Revan, 1997); A judicialização da política e das relações sociais no Brasil(Rio de Janeiro: Revan, 1999); e Democracia e os três poderes no Brasil (Belo Horizonte: UFMG, 2002). Sobre seu pensamento, leia a obra Uma sociologia indignada. Diálogos com Luiz Werneck Vianna, organizada por Rubem Barboza Filho e Fernando Perlatto (Juiz de Fora: Ed. UFJF, 2012).