segunda-feira, 18 de maio de 2015

Opinião do dia – Luiz Sérgio Henriques

Numa situação em que um governo precocemente envelhecido luta para alcançar alguma estabilidade e, com isso, ter condições mínimas de sobrevivência, é natural que curtas manobras de cabotagem tomem o lugar de reflexões de mais fôlego, que indiquem novas rotas de navegação.

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*Luiz Sérgio Henriques é tradutor e ensaísta, um dos organizadores das 'obras' de Gramsci no Brasil/site:www.gramsci.org, no artigo ‘As Repúblicas irmãs’. O Estado de S. Paulo, 17 de maio de 2015.

Levy propõe aliar cortes a aumento de impostos

• Numa reunião de quatro horas com a presidente Dilma, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, propôs um corte perto de R$ 80 bilhões no Orçamento deste ano, aliado a um aumento de impostos. Também participaram Nelson Barbosa e Aloizio Mercadante. A decisão sairá até quinta-feira.

Em reunião com Dilma, Levy propõe corte com mais imposto

• Presidente e ministros discutiram tamanho da redução dos gastos

Gabriela Valente e Danilo Fariello – O Globo

BRASÍLIA - O governo federal poderá voltar a elevar impostos, além de aprofundar os cortes do Orçamento de 2015, para atingir a meta fiscal deste ano. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, levou ontem à reunião com a presidente Dilma Rousseff e demais ministros da Junta Orçamentária, a possibilidade de que mais tributos sejam elevados por decretos, para compensar eventuais medidas aprovadas no Congresso que enfraqueçam o ajuste em curso. Levy considera compensar dessa forma, por exemplo, perdas fiscais com a mudança nas regras da aposentadoria e a possível manutenção da desoneração sobre folha de pagamentos.

A reunião entre Dilma, Levy e os ministros do Planejamento, Nelson Barbosa, e da Casa Civil, Aloizio Mercadante durou quatro horas. Os ministros foram convocados ao Palácio da Alvorada para mostrar à presidente as opções para o contingenciamento das despesas no ano, que deverá ser anunciado até quinta-feira. As propostas variam de R$ 60 bilhões a R$ 80 bilhões, cifra defendida por Levy. Quanto maior o corte, menor seria a necessidade de aumentar impostos.

No sábado, Levy já defendera, publicamente, que a "alternativa" aos aumentos de gastos, como o fim do fator previdenciário, seria o aumento de impostos.

— Toda a vez que se cria um gasto novo obviamente, está se contratando novos impostos — disse o ministro da Fazenda em Florianópolis, na véspera do encontro com Dilma.

Apenas neste ano, o governo já alterou pelo menos oito tributos federais com vistas a elevar a arrecadação em setores como combustíveis, crédito pessoal, automóveis e até cosméticos.

Em função da queda de braço de governo e Congresso, que modificou uma das Medidas Provisórias do ajuste fiscal e diminuiu seu efeito, o peso dos argumentos de Levy para um corte drástico

— ou mudança de tributação equivalente — ganhou força. O ajuste liderado por ele é visto por economistas como a possibilidade de resgatar a confiança do mercado internacional, de investidores, empresários e até das famílias. A meta de superávit deste ano é de 1,2% do PIB.

Internamente, Levy defende um contingenciamento de gastos próximo a R$ 80 bilhões, segundo fontes do governo. Ele estaria disposto a sacrificar os investimentos para garantir o cumprimento da meta de economia para pagar juros da dívida pública, o chamado superávit primário, de R$ 66,3 bilhões, ou 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano. Segundo interlocutores do Planalto, a presidente teria recomendado aos ministros que não vazassem o valor do corte antes do anúncio oficial.

Desde janeiro, despesas consideradas não prioritárias pelo governo sofreram um corte de 33%. Como a votação do Orçamento 2015 atrasou e só foi feita em março — geralmente ela ocorre no ano anterior — esse contingenciamento para os primeiros meses do ano foi estabelecido em dois decretos. Esses cortes atingiram de passagens aéreas a investimentos em infraestrutura, e já faziam parte do ajuste fiscal em curso.

Desta semana, porém, a definição do contingenciamento do ano não pode passar. Isso porque o contingenciamento tem de ser publicado em prazo de até 30 dias após a sanção presidencial da LOA (Lei Orçamentária Anual) aprovada no Congresso, sob risco de o governo incorrer em crime fiscal.

Corte deve ficar perto de R$ 70 bi, e governo já procura receita extra

• Reunião neste domingo discutiu opções de bloqueio de gastos; anúncio deve ser feito até sexta

• Leilões de petróleo e folha de pagamento, alta de tributos e venda de ações da Caixa Seguridade entram nos cálculos

Valdo Cruz, Gustavo Patu e Gabriel Mascarenhas – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Em reunião neste domingo (17) no Palácio da Alvorada, a presidente Dilma ouviu de sua equipe econômica que "não há muito espaço para o corte do Orçamento ficar abaixo" de R$ 70 bilhões.

O valor, segundo assessores, seria "muito próximo do necessário" para garantir o cumprimento da meta de superavit primário (receitas menos despesas) neste ano.

Um corte na casa de R$ 70 bilhões representaria fazer o governo voltar ao patamar de gastos de 2013, como tem defendido Joaquim Levy.

A decisão final será da presidente Dilma e pode ser discutida nesta segunda (18) por ela em reunião com líderes aliados, comandada pelo vice-presidente Michel Temer.

A petista é pressionada pela ala mais política do governo a cortar cerca de R$ 60 bilhões, para evitar uma paralisia do governo federal.

Já a equipe econômica preferia um corte de R$ 80 bilhões, por causa das mudanças que o Congresso está fazendo no pacote fiscal, que já reduziu em cerca de R$ 4 bilhões a economia prevista.

Para atingir a meta, Dilma tem em vista ao menos mais quatro fontes de recursos, que tenta viabilizar ainda neste ano. São elas a venda de ações do setor de seguridade da Caixa, aumento de impostos, leilão de concessões de exploração de petróleo e da folha de pagamento dos servidores.

A reunião deste domingo, com os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil), Nelson Barbosa (Planejamento) e Joaquim Levy (Fazenda), durou cerca de quatro horas.

Receitas
Segundo a Folha apurou, com a venda de ações da Caixa Seguridade o governo quer arrecadar ao Tesouro valor próximo ao obtido com a BB Seguridade --cerca de R$ 6 bilhões. A única dúvida é se a operação conseguirá ser montada para gerar recursos ainda neste ano.

No caso da concessão de petróleo fora do pré-sal, estima arrecadar pelo menos R$ 2 bilhões em 2015.

Com o aumento de tributos, só a elevação da alíquota da CSLL de bancos de 15% para 17% pode render mais R$ 1,5 bilhão. Já o leilão da folha dos servidores não tem previsão fechada.

A equipe econômica acredita que os cortes, que devem ser anunciados até o final desta semana, e o aumento de receitas levarão à meta de economia deste ano, de R$ 66,3 bilhões para todo o setor público, sendo R$ 55,3 bilhões apenas do governo.

A meta do setor público equivale, hoje, a 1,1% do PIB. O mercado avalia que, se o governo chegar a 0,8% do PIB, já será um bom caminho.

Levy defende elevar tributos por decreto para cumprir meta fiscal

Gastos novos geram novos impostos, afirma Levy

• Ministro da Fazenda comentou a flexibilização, na Câmara, das MPs que endurecem o acesso a benefícios trabalhistas e previdenciários

Gabriela Lara - O Estado de S. Paulo

FLORIANÓPOLIS - O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, admitiu neste sábado em Florianópolis que a aprovação das medidas de ajuste fiscal na Câmara fora do tamanho esperado poderá fazer com que o governo realize um contingenciamento maior do que o inicialmente previsto ou aumente impostos. "Isso pode nos levar a ter que reduzir as despesas ainda mais", disse.

Segundo ele, outra opção, para garantir o cumprimento da meta fiscal de 1,2% do PIB, á aumentar impostos. "Toda vez que se cria um gasto novo obviamente está se contratando novos impostos", disse, ao comentar o fato de a Câmara ter flexibilizado as medidas provisórias 664 e 665, que endurecem o acesso a benefícios trabalhistas e previdenciários. Os textos ainda serão apreciados pelo Senado.

"Por isso é muito importante na hora em que as coisas forem votadas não estar se criando novos gastos, às vezes até no médio prazo, porque isso deve criar (a necessidade de) novos impostos."

Ao ser perguntado sobre o fato de os deputados terem aprovado uma emenda que cria uma alternativa ao fator previdenciário - o que em tese facilitaria a aposentadoria dos brasileiros e prejudicaria a situação fiscal principalmente no médio e longo prazos - Levy disse que, dentro do governo, há uma percepção de que não há espaço para novas despesas, nem no curto prazo nem no futuro mais distante.

"O médio prazo dá uma indicação para quem vai investir", afirmou. "E qualquer desvio de despesa no médio prazo também tem impacto na taxa de juros, com repercussão para investimento muito grande."

Levy também disso que o Ministério da Previdência está "fazendo contas" para orientar debate sobre o fator previdenciário que vai ao Senado. "O sentimento é que tirar (Fator Previdenciário) vai aumentar as despesas de forma significativa no médio prazo, mas o Ministério da Previdências está calculando quanto seria", disse. Depois, voltou a frisar que a preocupação do governo federal é "não criar novos gastos que gerem novos impostos".

Questionado sobre a reunião que haverá amanhã com a presidente Dilma Rousseff para discutir o volume do corte no orçamento que será anunciado, Levy brincou: "Estamos nos preparando e não sei que horas (a reunião) vai acabar". Ele voltou a dizer, como tem feito nos últimos dias, que o principal objetivo é levar as despesas discricionárias para o nível de 2013. "(O ano de) 2014 foi um pouco além do que podemos sustentar", avaliou.

De acordo com o ministro, o governo usa como linha de referência, para determinar os cortes, a evolução das receitas e das despesas. "Na parte que o governo pode controlar, na diminuição dos gastos na própria carne, que são as despesas de custeio, despesas de condicionamento dos ministérios, nós devemos estar voltando ao nível de 2013, um nível relativamente robusto, mas que dá a disciplina necessária para botar o gasto numa base sólida que nos permita estar caminhando na direção da meta fiscal", afirmou, antes de ministrar uma palestra para lideranças estaduais e empresários.

Diante da dificuldade em aprovar as medidas de ajuste fiscal no tamanho esperado, o Ministério da Fazenda poderá defender um corte mais profundo no Orçamento da União de 2015, em torno de R$ 78 bilhões, para dar sinais de que o governo está de fato comprometido com as contas públicas. A presidente precisa anunciar o tamanho do corte orçamentário que atingirá ministérios de aliados no Congresso até a próxima sexta-feira. O comunicado deve ocorrer na véspera.

Na tarde de hoje o ministro estará em Joinville, onde almoçará com executivos das 50 maiores empresas de Santa Catarina e visitaria algumas companhias. No fim do dia ele deve acompanhar, em Joinville, a missa de sétimo dia do senador Luiz Henrique da Silveira.

FGTS vira solução para destravar crédito

• Poupança do trabalhador brasileiro passou a ser vista como a única fonte de recursos para resolver falta de dinheiro na economia

Murilo Rodrigues Alves - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A poupança forçada do trabalhador brasileiro passou a ser cobiçada em Brasília como a solução capaz de resolver o problema de falta de recursos para destravar o crédito subsidiado à casa própria e às empresas. Criado em 1966 como alternativa à regra que tornava o trabalhador estável após dez anos de empresa, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) passou ser a fonte única para resolver a secura de recursos em meio ao ajuste fiscal e ao desempenho pífio da economia.

“Parece que o fundo se tornou a última garrafa de água do deserto”, brinca um membro da equipe econômica do governo quando questionado se o FGTS tem caixa para socorrer o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o crédito imobiliário. “Que bom que todo mundo quer os recursos do fundo. É um sinal positivo, de boa administração. É preciso lembrar que o dinheiro é do trabalhador e é essencial em várias áreas da economia”, afirmou o ministro do Trabalho, Manoel Dias, ao Estado.

Só de patrimônio líquido o FGTS tem R$ 75 bilhões, cifra superior à economia prometida pelo governo para o pagamento dos juros da dívida, o superávit primário, de todo o ano, de R$ 66,3 bilhões. Os ativos estratosféricos do FGTS foram acumulados ao longo de décadas por mecanismos de poupança forçada dos trabalhadores, a fim de suprir a falta de recursos privados para investimentos de longo prazo. São destinados, por lei, ao financiamento de habitação popular, saneamento e infraestrutura.

No entanto, há interesse por esses recursos em toda parte. Levantamento feito pelo Estado aponta que na Câmara há 104 projetos de lei envolvendo o FGTS, além de uma emenda à Constituição. No Senado, são outros 37 projetos.

As propostas dos parlamentares pedem, em sua maioria, a permissão para que o trabalhador possa usar os recursos do FGTS em várias situações, da quitação das mensalidades de curso superior a compra de máquinas e equipamentos agrícolas, passando por pagamento de pensão alimentícia, abertura de microempresa e até mesmo tratamento de infertilidade.

Há ainda projeto que propõe que não haja restrição para poder usar os recursos. Pelas regras atuais, o trabalhador pode sacar o dinheiro quando se aposenta, na compra de casa própria, demissão sem justa causa, fechamento da empresa onde trabalhava ou em casos de doenças graves dele mesmo ou cônjuges e filhos.

A remuneração das contas vinculadas ao FGTS é um dos temas mais polêmicos. O mais recente dos projetos, apadrinhado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), sugere que a correção das contas seja feita pela taxa da poupança (6,17% ao ano mais Taxa Referencial) para depósitos a partir de 2016. Hoje, o ajuste é de 3% ao ano mais TR (Taxa Referencial). Se aumentar a correção, o financiamento para os setores atendidos pelo fundo (habitação, saneamento e infraestrutura) precisa ser mais custoso.

Liberdade. Outro ponto bastante discutido é a liberdade de escolha para os investimentos. Hoje, o dinheiro administrado pela Caixa é aplicado segundo diretrizes formuladas pelo conselho curador, sendo que a metade dos 24 integrantes é indicada pelo governo.

Como a aprovação é pela maioria mais um voto, conselheiros afirmam, sob condição de anonimato, que a vontade do governo sempre prevalece. Se houver empate, o voto de minerva é do ministro do Trabalho. Especialistas defendem que o ideal seria abrir concorrência para que outros bancos oferecessem opções mais rentáveis ao fundo.

“Todo mundo está metendo a mão no bolso do trabalhador e as centrais sindicais não falam nada”, afirma Mário Avelino, presidente do Instituto do Fundo Devido ao Trabalhador. Pelos cálculos dele, a correção das contas da forma como é feita retirou dos trabalhadores R$ 34,6 bilhões apenas nos primeiros cinco meses deste ano.

O Banco Central e a Caixa, gestora do fundo de garantia, se defendem em quase 50 mil processos na Justiça que pedem a mudança na correção do dinheiro depositado por um índice de inflação.

Lula monta conselho para definir seu futuro

• Ex-presidente cria equipe para tentar pavimentar eventual candidatura

• Time de petista tem Josué Gomes, Haddad, Padilha e Palocci; ministro de Dilma já foi participante assíduo

Catia Seabra, Gustavo Uribe – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O ex-presidente Lula tem repetido que descarta a hipótese de concorrer à Presidência num cenário como o atual. Mas, por via das dúvidas, arregimentou uma equipe para pavimentar uma eventual candidatura em 2018.

Batizado de "grupo para o futuro", o time foi montado em 2014 e tem se reunido semanalmente no Instituto Lula, seu escritório político.

Além de assessores da entidade, o conselho de Lula inclui os prefeitos Fernando Haddad (São Paulo) e Luiz Marinho (São Bernardo) e os secretários municipais Alexandre Padilha (Relações Governamentais) e Arthur Henrique (Trabalho).

As reuniões contam ainda com a participação do empresário Josué Gomes, presidente do grupo Coteminas, do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci e do presidente do sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Rafael Marques.

Até janeiro, quando assumiu o Ministério do Planejamento, Nelson Barbosa foi assíduo participante. Agora, sua presença foi reduzida.

O presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), Luciano Coutinho, é um conselheiro eventual.

Lula conduz o debate baseado em pilares que define como marcos de sua administração: desenvolvimento social, estabilidade, direitos humanos e política externa.

Insatisfeito com a articulação política do governo da presidente Dilma Rousseff, repete que não tem condições de disputar a Presidência sem propostas. E admite não ter ainda essas respostas.

Segundo aliados, Lula teme o desvanecimento de seu capital político e está apreensivo quanto ao destino do PT.

Na opinião de um amigo, pela primeira vez Lula está "sem brilho no olhar".

Em busca de saídas, Lula recrutou seus colaboradores. Nos encontros, instiga-os a apresentar soluções. Ele também ouve muitas reclamações e pedidos de intermediação junto à presidente.

"As reuniões servem de aconselhamento ao presidente [Lula].Para orientá-lo nos movimentos que ele deve fazer", explica Rafael Marques.

Filho do ex-vice-presidente José Alencar, morto em 2011, Josué Gomes afirma que sua participação depende da disponibilidade de agenda.

"Participo quando o assunto envolve economia. Para dar um depoimento sobre como estão o mercado e a competitividade", afirma.

Além dessas reuniões, o instituto organiza a cada 15 dias um encontro ampliado, com a presença dos presidentes do PT, Rui Falcão, e da CUT (Central Única dos Trabalhadores), Vagner Freitas.

Para esses encontros, realizados num hotel, Lula convida palestrantes. Luciano Coutinho e o economista-chefe do banco Credit Suisse, Nilson Teixeira, já foram lá.

Instado a falar de sua atuação no time de Lula, Arthur Henrique desconversou: "O time de Lula é o Corinthians".

PT estuda abreviar mandato da atual direção

• Manobra visa a contornar momento de crise e a reconstruir relação com o governo Dilma

Erich Decat e Ricardo Galhardo - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA e SÃO PAULO - Incentivados pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, setores do PT se movimentam para abreviar o mandato da atual direção partidária, que vai até 2017, e substituir a cúpula ainda neste ano. O palco para a manobra seria o 5.º Congresso Nacional do PT, marcado para junho, em Salvador. Os objetivos são repactuar o partido, no momento em que a legenda enfrenta sua pior crise, e reconstruir a relação com o governo da presidente Dilma Rousseff.

A ideia inicial de Lula é manter apenas o presidente, Rui Falcão, e substituir os demais 19 integrantes da Executiva Nacional. A insatisfação do ex-presidente com a atual direção foi manifestada logo após a reeleição de Dilma. Ele avalia que a criação de regras para adoção de cotas para jovens, mulheres e negros em todas as instâncias partidárias resultou no rebaixamento do perfil da direção, que agora deve ser reforçada com nomes de peso e experiência política que hoje estão distantes das tomadas de decisões da legenda.

Entre os nomes citados estão os dos ex-titulares da Secretaria-Geral da Presidência da República Luiz Dulci e Gilberto Carvalho. Também são lembrados o atual ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, e o titular da Secretaria de Comunicação Social da Presidência, Edinho Silva, além do assessor especial da Presidência, Marco Aurélio Garcia. Todos já foram sondados para dirigir o PT, mas declinaram.

Em reunião com assessores do Instituto Lula, semanas atrás, o ex-presidente pediu sugestões de ex-governadores e ex-prefeitos de grandes cidades, ex-parlamentares, dirigentes sindicais, líderes de movimentos populares e intelectuais petistas. "Quero que cada um me traga uma lista com dez nomes até amanhã", pediu Lula, segundo relatos. O ex-presidente, no entanto, não cobrou a relação dos auxiliares.

Coro. Aos poucos, a tese vem sendo incorporada por outras forças petistas. Na quinta-feira, a Democracia Socialista - grupo alojado na segunda maior força interna, a corrente Mensagem ao Partido - publicou o texto "Vencer a Crise do PT", no qual propõe que o congresso petista determine a substituição da atual direção em outubro. O texto ganhou simpatia de setores do Movimento PT, a terceira maior força interna. A Mensagem, da qual fazem parte ministros importantes de Dilma, tentou articular uma manobra para que o próprio Lula assumisse o comando do PT. O movimento foi abortado pelo ex-presidente.

Na sexta-feira foi a vez do ex-ministro José Dirceu, que cumpre prisão domiciliar pela condenação no julgamento do mensalão, publicar uma carta na qual também pede, em tom alarmista, uma nova direção partidária. "Tudo indica que o PT chegou ao limite na relação com o governo, o governo do próprio PT. E que chegou a hora de uma redefinição e repactuação partidária. (...) O período atual é o mais grave que o partido enfrentou. (...) São necessários um novo acordo partidário e uma nova direção para esse período histórico. Antes que seja tarde", diz o texto.

Além da repactuação interna, os defensores da troca de comando argumentam que a atual direção não tem força para se contrapor ao poderio das bancadas no Congresso. Amparadas nas máquinas dos mandatos, elas se tornaram estruturas de poder paralelas, independentes da cúpula partidária, e cada vez mais desassociadas do governo em função das medidas de ajuste fiscal que vão na contramão da história do partido e desgastam os parlamentares em suas bases.
Indagados sobre o afastamento entre partido e governo, petistas afirmam que não há como desatrelar uma coisa da outra. Ao mesmo tempo, ressaltam que internamente é cada vez mais presente o seguinte raciocínio: "Não vamos ser linha auxiliar da oposição, mas também não vamos ser beija-mão da situação".

Tal iniciativa foi colocada em prática na quarta-feira pelo próprio Lula, ao criticar Dilma por ter enviado o pacote do ajuste fiscal sem ouvir setores atingidos pelas medidas. A interlocutores, Lula insiste na crítica de que falta a Dilma apresentar um discurso dizendo o que quer no segundo mandato, dando uma "dimensão de futuro". Um documento previsto para o final do 5.º Congresso do PT deve reforçar as perspectivas "pós-ajuste fiscal".

Embora conte com apoio de forças importantes, a proposta de abreviar o mandato da atual direção enfrenta obstáculos. O primeiro é a falta de disposição do próprio Lula em executar a manobra. Para muitos, só ele poderia fazer isso, já que a proposta exige atropelar estatuto e resoluções do PT, como a que estipula cotas nas instâncias de direção.

Além disso, parte da corrente majoritária Construindo um Novo Brasil é contrária à proposta.

"Lula participou do processo de escolha da Executiva Nacional. Eu mesmo levei os nomes para ele", disse Francisco Rocha, coordenador da CNB.

Dízimo reforça caixa partidário

Dízimo partidário

• Legendas cobram de 1% a 11% do salário de políticos eleitos e filiados em cargos públicos

Leticia Fernandes – O Globo

Além da forte dependência do Fundo Partidário, a maior parte das legendas no Brasil recorre a uma outra forma de arrecadar mais recursos públicos, ainda que indiretamente e em volume bem menor. É a cobrança de uma espécie de dízimo dos ocupantes de cargos eletivos ou indicados políticos para posições de confiança nos governos.

No estatuto de 25 dos 32 partidos registrados no país, a doação de filiados em cargos comissionados ou de confiança consta como obrigatória — ou como dever do filiado, sujeito a sanções. O percentual de contribuição varia de 1% a 10% da remuneração bruta ou líquida para os comissionados; incluindo os políticos eleitos, o percentual chega a 11%. São exceção apenas PSD, PPL, PSL, PCB, PCO, PSTU e PTN. Já a orientação para que políticos eleitos destinem parte de seus salários aos partidos está nas regras de todos eles.

A falta de clareza do Tribunal Superior Eleitoral sobre a prática cria uma zona cinzenta, aproveitada pelas legendas. Em 2008, o TSE proibiu a doação de funcionários em cargos comissionados a partidos políticos. Uma decisão recente contestou a contribuição de "autoridades públicas", mas não definiu exatamente o que é uma "autoridade". Segundo a Lei dos Partidos Políticos, estes não podem receber contribuição de "autoridade ou órgãos públicos", a não ser via Fundo Partidário, fatia do Orçamento que vai para o custeio das máquinas partidárias. Como O GLOBO revelou ontem, 17 dos 32 partidos do país têm no fundo mais de 90% de suas receitas.

TSE condena débito em folha
Em uma resolução de 2014, o TSE tentou definir o termo "autoridade": "aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta"! Em 2012, o TSE considerou irregulares as doações de quatro funcionários comissionados filiados ao diretório do PSDB de Criciúma. Nesse caso, o problema, segundo a Corte, foi a forma de pagamento das doações, debitadas da folha de pagamento.

O desconto em folha aparece no estatuto de DEM, PSDB e PRP. Entre todos os partidos, o PSL é o único a proibi-lo por escrito. Em textos mais sutis, legendas como o PMDB preveem o pagamento da contribuição por "débito em conta-corrente", matéria sobre a qual o TSE afirmou não ter posicionamento por nunca ter julgado caso concreto.

Para o advogado Marcelo Ribeiro, ex-ministro do TSE, é grave a contribuição compulsória de um funcionário comissionado. Segundo ele, seria uma forma usada pelos partidos para lucrar empregando na máquina pública:

— A impressão é que você está financiando o partido com dinheiro público. Seria como se eu te colocasse lá para você me dar dinheiro. Se estiver determinado que isso é compulsório, aí acho uma coisa grave, mais no caso dos comissionados do que dos políticos. Parece que o partido ocupa um espaço governamental e depois usa aquilo pra ser financiado — diz o ex-ministro.

Em 2013, a ex-deputada estadual do PSOL Janira Rocha (RJ) foi acusada de obrigar funcionários de seu gabinete a entregar parcela dos salários para financiar atividades partidárias. Janira, que não se reelegeu em 2014, mas continua filiada ao PSOL, sempre negou as acusações: disse que havia colaboração voluntária de militantes do MTL, uma corrente do PSOL. No ano passado, a Comissão de Ética do PSOL arquivou a denúncia contra Janira.

— Se você faz parte de uma igreja, você vai pagar dízimo. Se você é de um movimento, também vai pagar uma contribuição. Só que no movimento é diferente, ninguém vai te obrigar — disse, na época, Janira, que não foi localizada pelo GLOBO.

Uma ex-funcionária do gabinete de Janira, que pede para não se identificar, diz que não era bem assim:

— No dia em que a gente recebia o salário, uma assessora dela passava com uma bolsinha pegando o dinheiro em espécie. A gente aceitava porque o dinheiro ia para o MTL. Depois, desconfiamos que ia para o bolso dela, que não se misturava mais com a gente. Todo mundo se revoltou.

Defensor da contribuição dos filiados com cargos públicos, o vereador Elton Teixeira, do PT de Queimados, na Baixada Fluminense, doa R$ 852,50 mensais, 11% de seus rendimentos líquidos, o teto estabelecido pelo partido para os eleitos.

— O dinheiro do Fundo Partidário é insuficiente para a manutenção dos diretórios de municípios de pequeno e médio porte. Não chega na ponta. A contribuição do filiado é o que mantém vivo o diretório municipal, principalmente em anos não eleitorais — defende o vereador, que discorda que esse dinheiro seria uma segunda fonte de receita pública. — Quando você se filia ao PT, você conhece as regras. Em todos os partidos que eu conheço há contribuição de cargos comissionados ou eletivos, porque a atividade partidária é cara.

No PSDB, a vereadora do Rio Teresa Bergher é contra a contribuição compulsória. Ela doa R$ 200 por mês, mas discorda da prática do partido. Ao contrário do que consta no estatuto, a tuca-na disse que paga por boleto bancário:

— Claro que ninguém gosta de pagar, né? É verdade que ninguém nunca me botou a faca no pescoço. O Fundo Partidário é bem gordinho, mas nunca soube para onde vai esse dinheiro.

Outro tucano, o deputado federal Otávio Leite (RJ) diz que o PSDB não obriga comissionados a doarem, mas recebe doações voluntárias. Em cargo eletivo, é obrigado a doar 5% do seu salário líquido.

— É uma "facadinha" mas é necessário.

No caso do PMDB, que faz o desconto

em conta-corrente, o deputado estadual Edson Albertassi (RJ) disse considerar a contribuição justa, e afirmou que só quem tem mandato paga. Presidente nacional do PV — que cobra 10% do salário líquido dos políticos e 5% dos indicados pelo partido em cargos de confiança —, José Luiz Penna afirma que a doação não é obrigatória, mas um "compromisso político":

— Criticar isso é penalizar antecipadamente por um possível ato de corrupção. Doação é bom para o partido, e, quando as pessoas não contribuem, elas se sentem descompromissadas.

Procurados pelo GLOBO para explicarem o débito em folha, o que o TSE proíbe, PSDB, DEM e PRP não responderam.

Números
32 é o total de partidos existentes
Destes, 17 dependem até 90% da verba do Fundo Partidário para cobrir as suas despesas

25 partidos no brasil
Cobram doações de filiados em cargos comissionados na administração pública ou em cargos de confiança. O percentual de contribuição varia de 1% a 10% da remuneração bruta ou líquida

R$546 milhões foi a receita dos partidosem 2013
Desse total, mais de R$ 362 milhões vieram do Fundo Partidário. Outros R$ 183 milhões vieram de doações feitas porempresas privadas e pessoas físicas

34% é a receita do pt do fundo partidário
Já no PSDB, cerca de 63% das suas receitas vieram do Fundo Partidárioem 2013

100% é quanto dependem do fundo partidário
As siglas Solidariedade, PCO, PTdoB, PTC e PTB

R$ 11,6 milhões
Foi o total doado por filiados a partidos políticos em 2013

R$867 milhões
É a previsão da verba do Orçamento da União de 2015 dedicada ao Fundo Partidário

Cobrança com boleto bancário também para militante sem cargo público

• Em 2013, PT teve receita recorde de R$ 10 milhões só entre seus filiados

Chico de Gois – O Globo

-BRASÍLIA - Com dinheiro fácil vindo dos cofres públicos, via Fundo Partidário, os partidos praticamente não contam com doações dos próprios filiados. Em 2013, de toda a receita partidária de R$ 546 milhões, só 2% (R$ 11,6 milhões) tiveram como fonte o bolso dos que militam em alguma agremiação. E isso porque, naquele ano, houve um fato expressivo: do total, R$ 10,1 milhões foram para o PT. A quantia surpreende, pois, em 2012, a sigla só obteve R$ 20 mil com os chamados militantes-padrão; em 2014, R$ 1 milhão.

Os R$10,1 milhões doados por filiados da sigla em 2013 são 10 vezes mais que a contribuição dos dirigentes, que, naquele ano, engrossaram o caixa petista com mais R$ 1 milhão. O GLOBO procurou a assessoria de imprensa do PT quarta-feira; foi orientado a enviar um e-mail com os questionamentos, o que foi feito no mesmo dia. Mas, até o fechamento da edição, a legenda não justificou por que há diferença tão grande entre um ano e outro na receita vinda dos militantes.

No item "Receita de Contribuições", em 2013, o PT arrecadou R$ 15,8 milhões de seus parlamentares e de quem ocupa cargo executivo, e mais R$ 5,5 milhões de quem tem cargo de confiança. Em 2014, mais R$ 22,9 milhões.

Partidos como o PSDB, por exemplo, ou o PMDB, não registram contribuição de filiados. No caso dos tucanos, seus parlamentares deram R$ 175,9 mil. No PMDB, foram R$ 1,2 milhão. No PDT, com 19 deputados e 6 senadores, só três deles depositam regularmente uma parcela de seus salários para a legenda. Já o PSB contabilizou a doação de R$ 672 de filiados, em 2013.

PPL teve alta adesão
Entre os pequenos partidos, o PPL — sem nenhum representante no Congresso — conseguiu amealhar R$ 492,8 mil com doação de filiados em 2013. Naquele ano, só perdeu para o PT. Superou siglas de esquerda que costumam passar o chapéu entre seus militantes, como o PSOL, que juntou R$ 270,5 mil com os simpatizantes. Ano passado, o PPL, com cerca de 16 mil filiados, juntou mais R$ 676,6 mil entre eles.

O secretário nacional de Comunicação do PPL, Miguel Manso, diz que há dois tipos de filiado: o de base, que contribui anualmente com R$ 15;e o dirigente, que doa, por mês, de 2% a 5% do rendimento mensal declarado.

Para o partido, os filiados de base são os militantes e eleitores que compactuam com a ideologia e os princípios do PPL. Entre os dirigentes há quem almeja cargo parlamentar, diretores dos escritórios municipais e pessoas ligadas ao Executivo e ao Legislativo. As cobranças, obrigatórias, são por boleto bancário.

Apesar das doações, que se somam ao Fundo Partidário, Manso cita o conflito entre a arrecadação de grandes siglas e das tidas como pequenas ou novas:

— É uma luta inglória.

Em 2015, a legenda aposta em uma campanha de filiação que espalhou barracas por grandes cidades.

Bruno Wilhelm Speck - Subsidiar legendas é comum nas democracias

- O Globo

O financiamento dos partidos com recursos públicos é comum nas democracias atuais. Segundo levantamento do instituto Idea (International Institute for Democracy and Electoral Assistance, de Estocolmo), dois terços dos 180 países avaliados adotam algum tipo de subsídio estatal às organizações partidárias ou às campanhas eleitorais. Esses subsídios foram introduzidos de forma mais sistemática na segunda metade do século XX, mas Uruguai e Costa Rica foram os primeiros países a alocar recursos aos partidos políticos, já nos anos 1930. As justificativas oficiais para a introdução desses subsídios variam, mas há um reconhecimento crescente de que os partidos políticos cumprem uma função pública importante e merecem apoio financeiro do Estado para as suas atividades durante o processo eleitoral e fora dele.

As circunstâncias nas quais cada país introduz o financiamento público variam bastante. Nos Estados Unidos, o sistema de financiamento público das eleições presidenciais foi introduzido em reação ao escândalo Watergate. No Brasil, o Fundo Partidário foi introduzido no início do governo militar, em um contexto de repressão e limitação das liberdades políticas. Na Alemanha, os partidos políticos introduziram o financiamento estatal como forma de resolver as dificuldades financeiras das legendas, mas, ao mesmo tempo limitaram o acesso das maiores siglas a esses recursos. A história dos motivos oficiais e velados da introdução do financiamento público ainda está para ser escrita.

Uma constante no financiamento público de partidos tende a ser o fato de que ele dificilmente é revertido. Quando é introduzido o financiamento público, os partidos tendem a ampliá-lo de diferentes formas, seja aumentando os valores alocados, seja financiando eleições subnacionais ou regionais, como no caso do Parlamento Europeu; ou alocando recursos para as eleições primárias, como nos Estados Unidos.

Uma tendência recente é a adoção de financiamento público indireto por meio do acesso gratuito à mídia, sistema conhecido no Brasil com o horário eleitoral gratuito em rádio e TV, ou a ampliação do financiamento a partidos e eleições simultaneamente, adotada na Argentina e na Colômbia, entre outros. Uma vez introduzido o financiamento público, os partidos dificilmente largam esse osso.

Mas há exceções. Estas dependem de um ator externo forte. No caso da Alemanha, a Corte constitucional nos anos 1950 vetou o financiamento das organizações partidárias, liberando somente subsídios para as eleições. Depois, reviu a posição e adotou um teto máximo de financiamento. Cada partido pode receber do Estado no máximo a metade dos seus recursos totais arrecadados.

Na América Latina, curiosamente, foram líderes de esquerda que limitaram o financiamento público. No Peru, Alan García simplesmente não alocou recursos orçamentários ao fundo para partidos, extinguindo temporariamente o apoio a eles. Na Venezuela e na Bolívia, os dois líderes Hugo Chávez e Evo Morales aboliram o financiamento público por meio de reformas. A nova Constituição da Venezuela, de 1999, veda expressamente o financiamento público de organizações políticas, e Evo Morales aprovou uma lei em 2008 no mesmo sentido.

Em relação ao financiamento público de partidos e eleições, há dois conflitos distributivos constantes: o primeiro, mais conhecido, refere-se à distribuição dos recursos entre os partidos. O segundo, menos visível, coloca a sociedade em confronto com o conjunto dos partidos financiados.

Em relação a essa segunda questão, a legislação brasileira estabeleceu salvaguardas para os partidos, garantindo a eles um piso mínimo de financiamento e até indexando os valores à inflação e ao tamanho do eleitorado. Falta introduzir uma proteção em sentido contrário, salvaguardando a sociedade da demanda insaciável dos partidos por recursos adicionais, que se manifestou na recente aprovação da media que triplica os recursos do Fundo Partidário em 2015.

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Bruno Wilhelm Speck é professor de Ciência Política da USP

Novo seguro-desemprego afetará segmento social que é base do PT

• Principais prejudicados pelas mudanças serãotrabalhadores de baixa renda e com pouco tempo de carteira assinada

Daniel Bramatti e José Roberto de Toledo - O Estado de S. Paulo

O trabalhador rural José Aparecido Silva, de 46 anos, recebeu seguro-desemprego pela primeira vez no início de 2014, após conseguir ficar pouco mais de seis meses com a carteira assinada, colhendo café em fazendas da região de Ribeirão Preto. "Ajudou muito", disse.

A ajuda pode não se repetir. Silva é um dos 1,6 milhão de trabalhadores que teriam o benefício recusado caso já estivessem em vigor as mudanças aprovadas no início deste mês pela base governista na Câmara. As novas regras do seguro-desemprego devem prejudicar principalmente trabalhadores de baixa renda e que ingressaram há pouco tempo no mercado formal de trabalho - um segmento social significativo na base de eleitores da presidente Dilma Rousseff e do PT.

Com as novas regras, que ainda precisam do aval do Senado, serão alteradas as exigências de tempo mínimo de trabalho para se ter direito ao seguro-desemprego.

Até o início deste ano, qualquer pessoa demitida sem justa causa após seis meses com carteira assinada poderia receber o benefício. Pela proposta em tramitação no Congresso, esse prazo subirá para 12 ou 9 meses para quem solicitar o seguro pela primeira ou pela segunda vez em sua vida profissional, respectivamente. A partir do terceiro pedido, a exigência do prazo mínimo de seis meses de trabalho fica mantida.

Restrições. Na prática, isso reduzirá o contingente de beneficiados. Dos 8,5 milhões de seguros pagos em 2014, quase 20% não se enquadrariam nas novas exigências e teriam sido recusados se elas estivessem valendo na época, segundo estimativa feita pela área técnica do Ministério do Trabalho.

Nesses 20% haveria alta concentração de pessoas com baixa remuneração. Cálculos do Estadão Dados com base em relatórios do ministério mostram que, quanto menor a renda, maior a chance de o trabalhador ser demitido antes de um ano de trabalho.

Dentre todos os demitidos em 2014 que recebiam até dois salários mínimos, 23% tinham entre seis e doze meses de trabalho. Essa parcela cai para 12% no grupo com renda superior a dez salários mínimos.

Silva, que voltou a obter emprego no setor cafeeiro, teme não conseguir sacar o seguro desemprego quando for demitido. Atualmente, ele tem dois meses de carteira assinada. O emprego só existirá, porém, enquanto houver café a ser colhido. Para ter direito a uma segunda solicitação do benefício, o número mínimo de meses trabalhados será de nove, segundo as regras aprovadas pela Câmara. Silva acha difícil atender à nova exigência. "Não depende da gente", afirmou. "Quando acaba a colheita, também não costuma ter mais serviço."

As mudanças no seguro desemprego, que fazem parte das medidas de ajuste fiscal do governo, devem ser votadas pelo Senado nesta semana. / Colaboraram Rene Moreira, e Murilo Rodrigues Alves


Pela 5ª semana seguida mercado aumenta projeção para a inflação

• Segundo o relatório Focus, do Banco Central, analistas acreditam que o IPCA encerrá 2015 em alta de 8,31%; estimativa para alta dos preços administrados subiu para 13,50%

Célia Froufe - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Pela quinta semana consecutiva, os analistas ouvidos pelo Banco Central para o Relatório de Mercado Focus elevaram a previsão para a inflação deste ano. A expectativa é que o índice oficial de inflação, o IPCA, encerre 2015 em 8,31% e não mais em 8,29% como previsto na semana anterior. No Top 5 de médio prazo, grupo dos economistas que mais acertam as estimativas, a previsão segue bem acima da banda superior de 6,5% da meta do governo, mas ficou estacionada em 9,02% esta semana.

Para o fim de 2016, os analistas acreditam em uma inflação mais fraca. O ano que vem deve se encerrar com o IPCA em 5,5%. Na semana anterior, a estimativa estava em 5,51%. No Top 5 de médio prazo, a projeção foi mais conservadora: tais analistas acham que ficará em 6%.
Parte da alta da projeção para a inflação é explicada pelo aumento da expectativa de alta dos preços administrados, como energia elétrica, água e gasolina. O mercado subiu a perspectiva de alta dos administrados em 2015 de 13,20% para 13,50%.

Segundo a ata do Comitê de Política Monetária (Copom) da semana retrasada, porém, a alta dos preços administrados em 2015 será de 11,8%. No caso de 2016, a previsão de elevação é de 5,3%. O número de 2015 leva em conta uma alta de 38,3% na tarifa de energia elétrica, mesma expectativa do ata anterior. No caso de telefonia fixa a previsão da diretoria do BC é de uma queda de 4,1% em 2015, mesmo valor considerado no Copom anterior. O BC informou também que levou em conta hipótese de elevação de 9,8% no preço da gasolina e de alta de 1,9% no preço do botijão de gás.

Recessão. O Relatório de Mercado Focus mostrou que a expectativa mediana para o Produto Interno Bruto (PIB) de 2015 ficou congelada em 1,20%, como na semana anterior. Para 2016, a mediana das projeções se manteve em crescimento de 1% pela quinta semana seguida.
As projeções para o PIB ficaram inalteradas, apesar das expectativas sobre a produção industrial terem se deteriorado. A mediana das estimativas para este ano passou de uma baixa de 2,50% - a mesma de quatro semanas atrás - para um recuo de 2,80%. Para 2016, as apostas de expansão para a indústria seguem em 1,50% há seis semanas consecutivas.

Taxa de juros. Mais uma semana sem alterações nas expectativas para o rumo dos juros. O mercado financeiro manteve em 13,50% ao ano a previsão para a Selic no fim deste ano. Já no caso do fim de 2016, a mediana das projeções passou de 11,63%, o que indicava uma clara divisão do mercado sobre o rumo dos juros no encerramento do ano que vem, para 11,75% ao ano.

Dólar. O Relatório de Mercado Focus mostrou que o mercado financeiro praticamente não fez alterações para o cenário de dólar deste ano e do próximo ano. A mediana das estimativas para o câmbio no encerramento de 2015 continuou em R$ 3,20. A cotação final de 2016, por exemplo, seguiu em R$ 3,30 pela sexta semana seguida.

Carlos Siqueira e Roberto Freire - Um novo projeto para o Brasil

• Com o esgotamento do atual ciclo político do país, a união de PSB e PPS oferece à nação uma plataforma política que dialoga com o século 21

- Folha de S. Paulo

O avanço das tratativas em torno da fusão entre o PSB (Partido Socialista Brasileiro) e o PPS (Partido Popular Socialista), que resultará em uma nova força política no campo da esquerda democrática e oferecerá ao país uma alternativa real ao atual governo federal, representa mais do que simplesmente a união entre as duas legendas.

Trata-se, afinal, de um reencontro histórico entre o legítimo herdeiro do Partido Comunista Brasileiro e os socialistas, que têm uma trajetória de lutas em comum e estiveram juntos em vários momentos cruciais da democracia brasileira.

Esse realinhamento nos remete ao exemplo marcante da "Frente do Recife", grande inspiração no início de nossas vidas políticas. O movimento, que uniu comunistas e socialistas, foi hegemônico em Pernambuco da redemocratização de 1946 até o golpe militar de 1964 e repercutiu nacionalmente entre as forças democráticas de esquerda.

Após o golpe, os dois grupos se integraram às trincheiras do MDB (Movimento Democrático Brasileiro), em oposição à ditadura militar que perduraria por mais de 20 anos.

A parceria se repetiu em momentos fundamentais de nossa história, como a luta pela anistia, a campanha das Diretas-Já, a eleição de Tancredo Neves pelo Colégio Eleitoral, o voto favorável à Constituinte, o impeachment de Fernando Collor e, especialmente, o apoio ao presidente Itamar Franco. Apoiamos Lula em 2002 e também iniciamos juntos no governo, com o qual ambos rompemos em momentos distintos.

Diante do esgotamento do atual ciclo político do país após mais de 12 anos de governos do PT e da grave crise econômica que aflige os brasileiros, PSB e PPS se encontraram novamente na última eleição presidencial, unidos em torno do projeto de desenvolvimento representado pela candidatura do nosso saudoso Eduardo Campos.

É justamente a partir dessa aproximação que prosperou a tese da fusão entre os dois partidos, com o intuito de oferecer à nação uma plataforma política conectada com os anseios da sociedade contemporânea e que dialogue com o século 21.

A duradoura trajetória de lutas em comum entre PSB e PPS é apenas a fagulha que acende a chama desse novo partido que surgirá e nos dá autoridade para afirmar compromissos com o futuro. O fundamental é olharmos para a frente. Convidamos a sociedade a participar desse processo e oferecermos ao país uma alternativa consistente ao governo que aí está.

Em meio ao descrédito generalizado e certa deslegitimação da democracia representativa em todo o mundo, o que a sociedade deseja é encontrar novos atores e novas formas de se expressar e participar --e o novo partido não fugirá de suas responsabilidades neste mundo do futuro que já começou.

Temos de oferecer respostas diante de uma realidade marcada pela inovação nas comunicações, pelo avanço da tecnologia e das redes, e por uma juventude que constrói novas formas de participação social.

"Não vamos desistir do Brasil", a frase que Eduardo Campos inscreveu na história do país antes de nos deixar precocemente, funciona como lema a ser seguido por PSB, PPS e por todas as demais forças políticas comprometidas com a democracia em nosso país.

Não devemos nos conformar jamais com a desesperança, o descalabro, a desfaçatez, o estelionato eleitoral, a corrupção e as mazelas resultantes da ação predatória daqueles que se locupletam e se perpetuam no poder sem escrúpulos.

A nova força política que emergirá da união entre PSB e PPS acredita no Brasil, nos brasileiros, na República laica e democrática e na capacidade de superação que sempre marcou a nossa história. A sociedade pede mudança, um novo mundo pede passagem e este caminho já começou a ser trilhado.

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Carlos Siqueira, 59, é presidente nacional do PSB (Partido Socialista Brasileiro)

Roberto Freire, 73, deputado federal pelo Estado de São Paulo, é presidente nacional do PPS (Partido Popular Socialista)

Gilvan Cavalcanti de Melo - A fusão (‘Navegar é preciso’...)

Há uma reflexão de Gramsci muito importante na política concreta, real, que se poderia resumir assim: um partido terá significado e peso na medida de sua determinação de rumos da vida política do País. Sua capacidade de contribuir de forma positiva ou negativa para criação de acontecimentos, fatos e, ao mesmo tempo, impedir que outros fatos e acontecimentos ocorram.

Já seria um bom argumento para demonstrar a importância da fusão PSB e PPS. A soma das duas legenda terá como resultado: três governadores, 45 deputados federais, 588 prefeitos, 92 deputados estaduais e 5.831 vereadores. Com esses números terá força política de não pouca monta, poderá vir a ser a quarta legenda política depois de PT, PMDB e PSDB.

Outro argumento bastante relevante é que esta fusão tem como protagonista duas forças políticas originárias da luta contra o autoritarismo do Estado Novo, varguista. Um com viés socialista democrático e reformista, outro originário da influência da Revolução Russa de 1917. Personalidades de ambos participaram da fundação da UDN, na corrente Esquerda Democrática – João Mangabeira, Astrogildo Pereira, Hermes Lima, Domingos Velasco e Caio Prado Jr., entre outros. Dessa corrente surgiu o PSB, em 1947. Outros foram para o PCB, já na legalidade, naquela época.

Após o golpe militar de 1964 e os resultados eleitorais de 1965 para governadores de Minas Gerais e da antiga Guanabara, com vitórias das forças democráticas oposicionistas, o novo governo militar dissolveu os partidos através do Ato Institucional n° 2 de 27 de outubro de 1965, estabelecendo o bipartidarismo. O MDB transformou-se uma frente contra o autoritarismo, caracterizado por sua multiplicidade de correntes ideológicas, entre elas a socialista e a comunista.

A luta pelas liberdades democráticas do MDB em todo o país, dos sindicatos e da população obrigou o general Figueiredo a decretar, em agosto de 1979, anistia ampla, libertando os presos políticos, revogando as cassações e permitindo a volta dos exilados ao país reintegrando-os à vida nacional. A extinção do MDB deu-se em 27 de novembro de 1979, quando o sistema bipartidário chegou ao fim, surgindo em seu lugar o pluripadidarismo. O PCB só foi legalizado em 1985.

Somente, a partir de 1958 o PCB foi se afastando das posições dogmáticas, ortodoxas e convergindo, cada vez mais, com as ideais democráticas e reformistas. A ruptura radical se deu em 1992 com a dissolução do PCB. O PPS já nasceu reformista e democrático.

Assim, a grande virada ficou registrada na nitidez do texto do manifesto de sua fundação: “Um Partido que, desde sua formação, é plural, aberto à participação de todos os que acreditam que é possível, a todos os seres humanos, viverem iguais e livres. Um Partido que, num mundo de mudanças, assume o compromisso central com a vida, entendendo-a como indissociável da natureza e da cultura. Um Partido, que quer contribuir para a construção de uma nova ética, em que o ser humano, sem nenhuma discriminação, seja protagonista e beneficiário das transformações sociais. 

Um Partido novo, democrático, socialista, que se inspire na herança humanista, libertária e solidária dos movimentos sociais e das lutas dos trabalhadores em nosso país e em todo o mundo, prolongando hoje a luta que travamos desde 1922. Um Partido que não use o povo, mas seja um instrumento para que cada cidadão seja sujeito de sua própria história. Um Partido socialista, humanista e libertário, que tenha como prática a radicalidade democrática, que permita a cada ser humano exercer sua plena cidadania, na área em que reside e no planeta em que habita.”

A partir de agora se abre a possibilidade de pensar um partido democrático e reformista, com atores que tiveram raízes e origens diferentes. Em muitos acontecimentos e circunstâncias estiveram separados em outros tiveram histórias em comum.

O tema da fusão entre PSB e PPS foi tratado com variadas interpretações por atores políticos e analistas do cenário da vida política do País. No âmbito do agrupamento governamental há um momento de silêncio, temor e adeptos pelo fracasso da fusão.

No espaço da oposição parece que o fato é recebido com jubilo. Há declarações de líderes e dirigentes que explicitam o apoio com muita clareza. É o caso do governador de S. Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB). Numa entrevista a um jornal chegou a dizer: “São dois partidos que não são iguais, mas que têm um programa muito próximo, e então acho que é bom para a democracia”.

Diferente é a compreensão existente entre os adeptos e simpatizantes da fusão, explicitadas em entrevistas e declarações nos meios de comunicação de dirigentes partidários e intelectuais ligados aos dois partidos. Parece que se estabeleceu aí um “senso comum” com as suas implicações (religiosidade, filosofia vulgar, tradição e crenças populares). Ouve-se, e se ler expressões tais como: “A nova legenda deverá tomar um rumo de independência em relação à oposição e governo”. Outras mais brandas e suaves dizem: “ajudando bastante a que se supere o quadro de polarização PT versus PSDB”. Há expressões muito fortes, parecendo mais contrarias de que de apoio: “a nova legenda será satélite do PSDB”, ou “flerta com a oposição”.

Do meu ponto de vista esses serão os desafios para superar as dificuldades transitórias e unir as oposições compartilhadas na diversidade, no pluralismo político.

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Gilvan Cavalcanti de Melo, editor do blog Democracia Política e novo Reformismo. É membro do diretório nacional do PPS.

Aécio Neves - Popularidade x credibilidade

- Folha de S. Paulo

Presenciei mais um amplo e justo reconhecimento internacional a Fernando Henrique Cardoso, o presidente que mais fez pelo desenvolvimento do Brasil e pelo fortalecimento de suas instituições, na nossa história contemporânea, e que recebeu semana passada, da Câmara de Comércio Brasil-EUA, o título "Pessoa do Ano".

Ao lado do ex-presidente americano Bill Clinton e diante de um auditório repleto de políticos e empresários, FHC fez um discurso que já nasceu célebre, coroado por uma frase precisa: "Pode-se governar sem popularidade, mas não se pode governar sem credibilidade". Nada mais atual.

Lembro que, em seus oito anos no Palácio do Planalto, FHC perdeu popularidade, mas jamais a credibilidade. Teve sempre como bússola a responsabilidade fiscal ao tomar medidas que, se não fossem as de aplauso fácil, eram absolutamente necessárias para colocar o país no mesmo passo do mundo em desenvolvimento ou impedir qualquer recuo ou risco às preciosas conquistas da estabilidade.

Especialmente no seu segundo mandato, como se sabe, enfrentou crises internacionais severas e instabilidades de toda ordem, além de uma oposição implacável. Ainda assim, jamais se permitiu apelar para o populismo barato, nem para a gestão irresponsável. O resultado foi a entrega ao sucessor de um país muito melhor e mais sólido do que recebeu.

Hoje, temos uma presidente que comanda um governo sem rumo, sem projeto e sem credibilidade. E essa não é mais a visão de um militante da oposição, mas do mundo. Fechamos a última semana com o Banco Central emitindo um boletim que confirmou a desaceleração da atividade econômica em todo o país.

No mesmo dia do reconhecimento a FHC, o FMI divulgou um estudo sobre a economia brasileira, no qual aponta "a erosão da credibilidade das diretrizes econômicas, em razão da persistente deterioração dos resultados fiscais e da inflação acima da meta".

Mais importante do que qualquer medida formal, para as instituições internacionais o crucial é o resgate da credibilidade e da confiança nas decisões econômicas. Missão difícil para um partido que mentiu durante toda a campanha e comanda um governo que não consegue convencer nem os membros de sua própria base aliada da necessidade de um ajuste nas contas públicas nos moldes do proposto pela administração federal.

Um governo que, em todo o primeiro mandato da presidente Dilma, desprezou a responsabilidade e recorreu a pedaladas fiscais para esconder os gastos irracionais e o populismo eleitoreiro. Fórmula que pode ter até lhe dado a reeleição, mas que lhe retirou grande parte do respeito de milhões de brasileiros.

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Aécio Neves é senador(MG) e presidente nacional do PSDB

Ricardo Noblat - Um governador acuado

- O Globo

"Não é papel dos militares fiscalizar o governo ou interferir na vida política do país" General Eduardo Dias da Costa, comandante do Exército
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Beto Richa (PSDB), governador do Paraná, recebeu uma notícia boa e outra ruim na última semana. A boa: o Tribunal de Contas rejeitou pedido do Ministério Público para suspender a lei que alterou o regime previdenciário dos servidores do estado. Bancada por Richa, a aprovação da lei resultou na violência policial contra professores que deixou mais de 200 feridos. Um massacre como Curitiba jamais viu.

A NOTÍCIA RUIM — e põe ruim nisso: o auditor fiscal Luiz Antônio de Souza, 49 anos, revelou em depoimento ao Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) de Londrina que a campanha de reeleição de Richa, no ano passado, recebeu R$ 2 milhões arrecadados com o esquema de corrupção na Receita estadual investigado pela Operação Publicano.

SOMENTE EM Londrina, o esquema, que envolveu 62 pessoas, funcionaria há 30 anos e, nos últimos dez, teria apurado R$ 60 milhões com o pagamento de propinas em troca do perdão de impostos. Tudo muito parecido com o que aconteceu no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, do Ministério da Fazenda. Suspeita-se do perdão, ali, de impostos que somam R$ 19 bilhões.

DONO DE uma fortuna estimada em R$ 40 milhões, Luiz Antônio está preso desde janeiro, quando foi flagrado com uma moça de 15 anos em um motel. Negociou com a Justiça a delação premiada para ter sua pena reduzida em caso de condenação. Ele e promotores já conversaram 30 horas. Luiz Antônio conta o que sabe sobre dois esquemas: o da corrupção na Receita e o da prostituição de menores.

NO QUE TOCA a Richa, Luiz Antônio disse que a ordem para levantar dinheiro destinado à campanha dele partiu de Márcio de Albuquerque Lima, inspetor-geral de Fiscalização da Receita estadual. Parceiro do governador em corridas de automobilismo, Márcio falava em nome de Luiz Abi Antoun, primo distante de Richa. Os R$ 2 milhões foram achacados de três empresas.

LUIZ ABI É investigado por suposta fraude em licitação ganha pela oficina Providence Auto Center, que consertava a preços exorbitantes os carros do governo do estado na região de Londrina. Preso em fevereiro sob a acusação de explorar sexualmente adolescentes, Marcelo Caramori, fotógrafo do governo, afirmou que Luiz Abi era "o grande caixa financeiro" das campanhas de Richa.

ENQUANTO LUIZ Abi tinha o poder de indicar ocupantes de cargos comissionados "em pontos estratégicos do estado", como "chefes de fiscalização e das polícias", Márcio de Albuquerque, segundo Caramori, "exerceria importante tarefa" no esquema de arrecadação, o que teria justificado sua nomeação em junho do ano passado para o cargo que ocupa hoje.

NATURALMENTE, Richa nega tudo. "Pegaram um criminoso, réu confesso, preso por abuso de menores, para me acusar sem nenhuma prova. Coisa de bandido", desabafou em sua página no Facebook. O PSDB do Paraná culpa o PT pela tentativa de desmoralizar Richa. O PSDB nacional nada disse até aqui. Permanece em silêncio obsequioso desde o espancamento dos professores em abril passado.

SE VALESSE desacreditar alguém pelo fato de ser réu confesso, os acusados de se beneficiarem do roubo da Petrobras e da extorsão de empreiteiras estariam a salvo dos incômodos que enfrentam há mais de seis meses. Palavra de bandido costuma ser reveladora quando se trata de bandidagem. Delator em busca de poucos anos de cadeia não pode mentir, sob pena de ser castigado. Se é assim com o PT, é assim com qualquer partido, ora.

José Roberto de Toledo - A conta é sua, eleitor

- O Estado de S. Paulo

Nada é tão ruim que não possa piorar. É o caso do sistema político brasileiro. O pouco que funciona, os parlamentares, com o PMDB à frente, estão querendo mudar. A reforma em tramitação no Congresso é concebida para afastar o eleitor da urna, facilitar a vida dos políticos e concentrar poder - o oposto do que as passeatas de 2013 pediam.

Não por acaso, os anos ímpares têm se notabilizado por manifestações contra quase tudo. Um dos alvos prioritários dos protestos são os políticos em geral - e alguns em particular. Por quê? Em anos ímpares não há eleições. O único jeito de o eleitor se manifestar é indo às ruas ou janelas.

Pois o Congresso está prestes a transformar os anos pares em anos ímpares da política também. O PMDB quer cassar o direito do eleitor de votar a cada dois anos e expressar seu descontentamento da maneira mais democrática que se conhece. Pela proposta que será apreciada nesta semana, só haveria uma eleição a cada cinco anos, para todos os cargos.

Quem perder que se contente em bater panelas ao longo de meia década, porque não haverá nenhuma outra maneira eficiente de demonstrar seu descontentamento. Não haverá mais eleições de prefeito e vereador alternadas com as de presidente e governador para liberar parte da pressão social acumulada a cada dois anos.

Enquanto a sociedade reclama maior participação nas decisões que vão impactar sua vida, os congressistas querem cortar a pouca que existe em 60%. Se haveria dez eleições ao longo dos próximos 20 anos, agora serão apenas quatro. Se a regra entrar em vigor já, a partir de 2016, em lugar de votar a cada dois anos, como têm feito desde o fim da ditadura, o eleitor só poderá votar em 2021, 2026, 2031 e 2036.

Se você é antipetista, imagine o que seria aguentar mais cinco anos de governo Dilma e dois anos a mais de mandato para o prefeito paulistano Fernando Haddad. Se você é petista, projete passar mais cinco anos sem poder nem sequer sonhar em tirar o PSDB do governo paulista. É o que o Congresso está pondo no fogo: uma panela de pressão do tamanho do Brasil, em meio a uma crise econômica e à perspectiva de racionamento de água. Além dos fabricantes de panelas, só os políticos têm a ganhar.

Depois da Operação Lava Jato, o financiamento de campanhas eleitorais passou a ser um problema até para quem o considerava uma solução para suas finanças pessoais. Marqueteiros estão estimando um corte de pelo menos 40% dos preços de produção da propaganda eletrônica - simplesmente porque quem paga a fatura está na cadeia ou vai fazer de tudo para não parar lá.
Propondo mandatos mais longos e menos eleições, os políticos estão tentando resolver um problema exclusivamente deles: diminuir o risco de ser preso ao buscar dinheiro para se eleger.

É como se o empregador dissesse para o empregado que, para resolver o problema de caixa da empresa, passará a pagar o salário só de três em três meses.

Pelos padrões internacionais, as eleições brasileiras nem são das mais exorbitantes. Mas se o problema é financiá-las, que tal diminuir os custos eleitorais, em vez de cancelar a eleição?

Uma das partes mais caras das campanhas majoritárias são os programas de TV. São mais de 40 dias de bombardeio diário. Para cada spot de 30 segundos veiculado, há outro que foi gravado, mas nunca chegou a ir ao ar, porque não agradou quando foi mostrado em pesquisas sigilosas com eleitores. No final, são horas e horas de programação, boa parte jogada literalmente no lixo.

Por que não encurtar o horário eleitoral para três semanas, já que o eleitor define seu voto cada vez mais perto da eleição? Por que não acabar com os programas de meia hora - cuja audiência diminui a cada ano - e só veicular spots de 30 segundos ao longo da programação?

A resposta é a de sempre: se o eleitor pode arcar com a conta, por que os políticos haveriam de pagá-la?

Valdo Cruz - Se correr o bicho pega

- Folha de S. Paulo

A vida não está nada fácil para Dilma Rousseff. Em vários flancos, ela vive aquela situação de se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. Vamos por partes.

A petista levou um século para indicar Luiz Fachin ministro do STF. Quando o fez, só gerou confusão. Se antes já teve indicado ao Supremo chegando a Brasília no dia da sabatina no Senado, Fachin chegou bem antes e não consegue sair daqui.

Resultado do enrosco, Dilma conseguiu a proeza de chegar às véspera da votação de seu indicado sem ter a certeza de que ele será aprovado nesta terça (19) pelo Senado.

Se ganhar, ela também perde um pouco. Renan Calheiros, presidente da Casa, não quer Fachin. Promete infernizar ainda mais os dias da petista se ele virar ministro. Só que Dilma não tem mais para onde correr.

Neste domingo (17), a presidente reuniu sua equipe econômica para discutir e definir algo que sempre odiou. Cortar gastos, inclusive de investimentos e programas sociais.

Se dependesse apenas de sua vontade, a presidente cortaria o mínimo possível, quase nada, para tocar seus projetos e programas. Mas, se tomar esse caminho, a inflação volta a subir, o dólar dispara e os juros terão de ir para a estratosfera. Um autêntico beco sem saída.

Em setembro, Dilma terá outro abacaxi nas mãos. Vence o mandato do atual procurador-geral, Rodrigo Janot. Renan e Eduardo Cunha, presidente da Câmara, investigados na Operação Lava Jato, fazem de tudo para mandar Janot para casa.

Se ceder às pressões dos dois peemedebistas, será um vexame. Se fizer o mais recomendável e reconduzir Janot, indicará que não quer interferir nas investigações, mas sua vida pode virar um inferno como andam ameaçando por aí.

Enfim, Dilma está enrolada em encrencas criadas por ela própria. Não estivesse numa fase de fragilidade política, tiraria tudo de letra. Agora, não lhe resta outra saída a não ser enfrentar os bichos.

Marcos Nobre – Ventania

• Impasse atual teve origem na eleição de 2014

- Valor Econômico

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Denis Lerrer Rosenfield - O Brasil e os partidos

• Se essa primeira etapa de aprovação do ajuste fiscal não for levada a cabo, se ela não for seguida de iniciativas subsequentes de crescimento responsável, o próprio Brasil pode ser o maior prejudicado

- O Estado de S. Paulo

O país vive uma grave crise e, no entanto, os partidos políticos estão se comportando como se só os seus interesses propriamente partidários estivessem em jogo. As questões nacionais passam a segundo plano, servindo apenas de pretexto para os jogos cada vez mais brutos de poder. Governistas atuam como se oposição fossem, enquanto a oposição age como o PT de antanho, renegando, inclusive, as suas próprias ideias. É como se o país tivesse de testar o abismo para logo recuar. Destaca-se, neste cenário, o PMDB que, mal ou bem, está contribuindo decisivamente para a aprovação das medidas provisórias do ajuste fiscal, absolutamente necessário enquanto etapa preliminar do saneamento das contas públicas.

O PT, a partir dos dois últimos anos do governo Lula e dos quatro do governo Dilma, levou o Brasil a uma situação econômica e ética insustentável. A tal “nova matriz econômica”, eivada de posições estatizantes e esquerdizantes, conduziu ao descontrole da inflação, ao PIB negativo, às contas fiscais em desajuste extremo e, agora, ao desemprego. Neste meio tempo, apoderou-se cada vez mais da máquina estatal, colocando-a a serviço dos seus interesses partidários e eleitorais, como se só isso valesse. O país, enquanto bem maior, bem coletivo, não entrou neste cálculo, sendo apenas um meio de consecução dos objetivos propriamente partidários. A conta desta irresponsabilidade finalmente chegou e o partido, assim como o seu governo, tem imensas dificuldades em reconhecer os seus próprios erros. Continua apostando no marketing e em discursos de esquerda cada vez mais radicais, como se aqui se encontrasse a sua saída.

A esquizofrenia partidária, neste contexto, só tende a aumentar. Sua expressão mais manifesta consiste na oposição que o PT faz a seu próprio governo, tendo chegado, inclusive, inicialmente, a rejeitar demagogicamente as medidas do ajuste fiscal, condição mesma para que o país saia de seu atual atoleiro. Comporta-se como se o governo não fosse seu, como se essas medidas fossem coisas apenas do ministro Joaquim Levy, um “neoliberal”. Note-se que “neoliberal” significa, no atual contexto, a qualificação de uma política que tem como objetivo colocar as contas em dia. Ser neoliberal significa tão somente ser responsável. A esquerda perdeu o discurso.

O PSDB, que deveria ser o partido líder da oposição, não faz melhor figura. Adotou a atitude do PT de antanho, vindo a criticar as medidas de ajuste fiscal como se essas fossem prejudiciais ao país. Ora, essas medidas seriam muito parecidas com as que Aécio Neves viria a implementar caso tivesse sido eleito. É bem verdade que as medidas seriam mais abrangentes e teriam também um forte componente de crescimento. Em qualquer caso, um ajuste fiscal deveria ser feito. Neste sentido, os tucanos são contraditórios consigo mesmos, vindo a renegar o que eles mesmos defendiam na disputa eleitoral. Exercem uma oposição irresponsável, apostando também no fracasso. Acontece que um fracasso das atuais medidas econômicas, mais do que uma disputa partidária, mostrar-se-ia extremamente daninho para o país. É como se os partidos brasileiros não tivessem a menor noção do significado de “oposição responsável”, voltada para o bem coletivo. Cada um olha apenas o seu próprio umbigo!

O PMDB, apesar de seus conflitos internos e a voracidade fisiológica de boa parte dos seus membros, está se saindo melhor do que os seus partidos concorrentes. Graças às novas funções de articulação política assumidas pelo vice-presidente Michel Temer, o partido está se colocando como aquele que melhor expressa os interesses nacionais. Sua atitude de defesa do ajuste fiscal, coerente com uma posição governista e reconhecendo, implicitamente, os erros que foram cometidos, sinaliza para uma postura voltada para o bem coletivo, embora possa, evidentemente, usufruir dos seus dividendos políticos em caso de êxito. O vice-presidente tem clara consciência de que a não aprovação dessas medidas poderia vir a criar um quadro econômico e político extremamente maléfico para o país. Reconhece os limites do jogo político, reconhece aquilo que o país pode ou não suportar. E um downgrade das agências de avaliação de risco poderia ser insuportável!

O enquadramento do PT é um fato também novo nestes 12 anos de governos petistas. O partido sempre se comportou como se o governo fosse exclusivamente seu, colocando os demais partidos aliados em uma posição claramente subalterna. Agora, tentou fugir de suas responsabilidades e foi enquadrado. Procurou, mesmo, votar contra o ajuste fiscal como se não fosse coisa de seu governo, jogando, como se diz, para a plateia. Foi obrigado a fechar questão pelo vice-presidente e pelo PMDB que, por sua vez, teriam ameaçado não levar essas medidas de ajuste fiscal à votação. Forçado a recuar, o PT terminou aprovando essas mesmas medidas com as quais professa não concordar. A desorientação é total. Na hora decisiva, teve medo das consequências de sua irresponsabilidade. Foi impelido a ser governo, apesar de si mesmo.

Ocorre, porém, que o país não pode ficar a mercê das vicissitudes desses mais distintos posicionamentos partidários. Se essa primeira etapa de aprovação do ajuste fiscal não for levada a cabo, se ela não for seguida de iniciativas subsequentes de crescimento responsável, o próprio Brasil pode ser o maior prejudicado, o que significa dizer que o ônus recairá sobre o conjunto dos cidadãos. O país não pode ficar refém das disputas partidárias, como se essas fossem um mero jogo de substituição de posições. O governo age como se não tivesse sido oposição e a oposição age como não se tivesse sido governo. É como se contassem somente os interesses particulares de cada um. É como se nos pleitos eleitorais o bem coletivo e as propostas que poderiam a ele conduzir fossem um mero pretexto. Falta a escritura de um texto, de uma verdadeira narrativa, chamada Brasil.

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Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul