O Globo
Encontro com os comandantes deixa a
impressão de que as Forças Armadas precisam ser acalmadas e compensadas, mesmo
com os recentes episódios
Só um país em crise faz uma reunião,
sábado, de seis às oito da noite, no palácio residencial, entre os comandantes
militares e o presidente da República. A crise foi gerada pelo envolvimento de
muitos militares no projeto de um novo golpe contra as instituições
democráticas. Em uma parte da reunião, eles falaram sobre investimentos que o
governo pretende fazer nas Forças Armadas. No PAC, até 2026, seriam R$ 53
bilhões. De novo, o esforço dos civis é para tentar compensá-los e acalmá-los
não se sabe por qual motivo. É simplesmente inconcebível que quepes pairem
sobre a República. Mas essa presunção dos militares foi plantada há muito
tempo.
O historiador Carlos Fico, da UFRJ, lembra
que um erro da Constituição de 1891, a primeira da República, acabou se eternizando
na história constitucional brasileira.
—Durante a constituinte de 1988, Afonso Arinos, José Genoíno e Fernando Henrique Cardoso, quer dizer, direita, esquerda e centro, tentaram evitar que o artigo 142 fosse redigido daquela maneira. Não conseguiram. Por pressão do general Leônidas Pires Gonçalves. Nunca conseguimos enfrentar o que se iniciou em 1891. Rui Barbosa, na época, incluiu o artigo 14 na Constituição de 1891, estabelecendo que as Forças Armadas eram a garantia dos poderes constitucionais. Mas o que era isso? Era uma atribuição do poder moderador do Imperador que, por causa desse artigo, foi atribuído às Forças Armadas. Esse fantasma, que vem do século 19, continua a assombrar. Há dezenas de exemplos na história. É um problema muito arraigado na sociedade, no imaginário militar e em muitos setores civis também.