quinta-feira, 11 de março de 2010

Reflexão do dia – Evaristo da Veiga

Uma pátria respeitada, não tanto pela grandeza do seu território como pela união dos seus filhos; não tanto pelas leis escritas, como pela convicção de honestidade e justiça do seu governo; não tanto pelas instituições deste ou daquele molde, como pela prova real de que essas instituições favorecem, ou, quando menos, não contrariam a liberdade e desenvolvimento da nação.


(Evaristo Ferreira da Veiga, citado por Joaquim Nabuco em “O Abolicionismo”, pág. 3 – Editoria Nova Fronteira,, Rio de Janeiro, 1999)

Governo forte:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

O que prevalecerá na eleição presidencial deste ano, a capacidade de sedução popular do presidente Lula e a boa situação da economia,proporcionando uma sensação de bem-estar à população, ou a percepção de parte do eleitorado de que uma política externa cada vez mais radicalizada à esquerda tem reflexos inevitáveis na maneira de conduzira política interna?

Mais ainda: a visão cada vez mais clara a favor de um Estado forte e ativista, que a ministra Dilma representa, indutor não apenas de investimentos, mas que escolhe as áreas prioritárias, financia projetos de grandes empresas multinacionais, privadas ou estatais, e define vencidos e vencedores, tem apoio da maioria da população ou é repudiada por ela? Para quem já declarou que uma pessoa idosa de esquerda deve ter problemas, o presidente Lula está se saindo melhor do que encomenda.

Ele já contou que resolveu criar o Partido dos Trabalhadores para se contrapor à atuação dos comunistas dentro das fábricas.

Lula definitivamente não é comunista, pode ser no máximo um social democrata tipo europeu, mesmo sem saber mais semelhante aos seus arqui-inimigos do PSDB do que gostaria, mas cercado de assessores que ainda acreditam na implantação do socialismo.

Sua formação de líder sindicalista, acostumado a centralizar as decisões e a enfrentamentos radicais com grupos adversários, deixou-lhe no espírito uma queda por regimes autoritários que conseguem resultados rápidos, daí a admiração por planejamentos centralizados como os do governo Geisel.

Sua opção preferencial pelos ditadores o aproxima cada vez mais de governos comunistas como o de Fidel Castro, e de teocracias autoritárias como a do Irã, como forma de se contrapor aos Estados Unidos, não para se opor a ele.

Lula sonha ser um polo de poder internacional, e por isso se coloca como possível mediador da crise do Oriente Médio, sem nenhuma base histórica nem geográfica para tanto.

Na América Latina, aproxima-se cada vez mais de regimes autocráticos como o de Hugo Chávez na Venezuela e seus satélites Evo Morales, da Bolívia, Rafael Correa,no Equador, Daniel Ortega, na Nicarágua, e se distancia de governos de direita como o do recém-eleito presidente do Chile Sebastián Piñera,único que protestou contra a prisão de dissidentes em Cuba na recente cúpula de países latinos e do Caribe no México, e a cuja posse Lula não terá tempo para comparecer.

Uma tendência que já vinha se firmando no panorama internacional, e que a crise internacional desencadeada em 2008 e ainda não totalmente superada incentivou, é o fortalecimento da estatização da economia.


E junto com ela uma ideia enganosa que é alimentada por um grupo forte dentro do governo Lula, de que o Estado deve ampliar sua atuação na economia de maneira perene, e não emergencial.

Ao mesmo tempo, já antes mesmo da crise, uma mudança estrutural vinha ocorrendo, superando uma tese antiga de que democracia e capitalismo sempre tiveram estreita correlação: o surgimento de países capitalistas não-democráticos.

As teses que ligavam a expansão econômica ao fortalecimento da democracia foram desmentidas nos últimos anos, constata o historiador inglês Niall Ferguson.

Entre 2001 e 2007, nunca o mundo como um todo experimentou um crescimento econômico tão expressivo, e apesar disso a democracia ganhou muito pouco nesse período.

Ao contrário, diz ele, as economias que cresceram mais rapidamente desde 2000 foram as de países não-democráticos.

Ferguson analisa o caso dos chamados Bric (Brasil, Rússia, Índia e China),conjunto de países que, segundo a consultoria Americana Goldman Sachs,serão as principais economias dentro de 40 a 50 anos.

Enquanto aparte da comunista China no PIB mundial cresceu 2,5 pontos percentuais nos últimos sete anos, a democrática Índia cresceu apenas 0,6%.

A Rússia autocrática de Putin teve performance superior ao democrático Brasil por uma margem comparável.

E essa disparidade entre democracias e autocracias tende a se ampliar,ressalta Ferguson em trabalho já comentado aqui na coluna. A íntima relação benéfica entre capitalismo e democracia parecia existir entre os anos 1980 e 1990 do século passado, mas hoje essa relação direta desapareceu.

Ferguson destaca que uma economia comandada pelo Estado está enriquecendo a China e outros países asiáticos, sem importar seus sistemas políticos, enquanto suas demandas por energia e commodities enriquecem produtores democráticos e não-democráticos indistintamente.

O que fortalece ideias de governos fortes,tentativas de controle da opinião pública, utilização de instrumentos da democracia como plebiscitos e referendos para manipulação do eleitorado, e o fortalecimento de representações sindicais e de classe em conselhos com poderes decisórios, para superar o Congresso.

A ideia de Estado forte encontra um amplo respaldo na população brasileira, como ficou demonstrado no debate provocado por Lula no segundo turno da eleição de 2006 sobre as privatizações.

Recente pesquisa encomendada pelo Instituto Millenium revela que no geral os brasileiros são contra a estatização de empresas multinacionais, de grande porte, veículos de comunicação e bancos. Também mostraram-se contra a privatização de empresas como Petrobras, Caixa Econômica,BNDES, Furnas etc.

Mas os resultados são sempre muito equilibrados, mostrando que o país está dividido. Apenas metade dos brasileiros é contrária à estatização, e a população da Região Sudeste é a que tem a mentalidade mais estatizante.

Delírio autoritário:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O senso de limite o presidente Luiz Inácio da Silva, é notório, perdeu há muito tempo.

Para não retroceder no tempo à época em que comandava a oposição combatendo seus adversários na base do insulto, do ataque a tudo, aí incluídas ações de governo em favor do interesse coletivo, fiquemos com o período da Presidência durante o qual se notabilizou pela defesa das piores causas.

A noção do ridículo o presidente Luiz Inácio da Silva substituiu pela arte de consolidar identificação popular mediante um comportamento já comparado ao de animador de auditórios de espetáculos popularescos.

Ainda assim, construiu um ambiente de respeitabilidade externa em virtude de ter sabido semear e colher os frutos do terreno preparado por seus antecessores sem lhes dar o devido crédito.

Contou ponto também a favor de Lula o fato de ter reduzido ao mínimo das gafes inevitáveis – e que até serviram para compor o tipo – suas manifestações no exterior.

O presidente brasileiro não repete lá fora as performances internas. Deixa de lado os improvisos e, assim, evita os consequentes (propositais?) erros de linguagem, termos chulos e piadas de mau gosto.

Mais recentemente, no entanto, o presidente Lula tem dado sinais de que os altos índices de popularidade podem ter-lhe subtraído por completo a companhia da sensatez, além de ter reduzido a agudeza do instinto de sobrevivência que o faz se preservar do risco extremo e manter acesa a mítica.

Lula menospreza princípios. Só fala e se mobiliza em defesa de interesses A imprensa internacional retratou isso nas críticas feitas a ele quando da visita a Cuba no dia exato em que o dissidente Orlando Zapata morria depois de 85 dias de greve de fome em protestos pelas transgressões aos direitos humanos patrocinadas pelo regime dos irmãos Castro.

Lula não apenas confraternizou com a ditadura de maneira ousada, como depreciou ao limite da crueldade a ação dos dissidentes condenados, torturados e mortos por crime de opinião.

Que o presidente não se importa com princípios, ironizando quem se importa como adeptos do “principismo”, e que defende apenas interesses, o Brasil todo sabe. São inúmeros os exemplos.

Internamente é a praxe. Lula só poderia ter tido a fidalguia de não mostrar esse lado ao mundo. Aos 25 anos de retomada democrática depois de quase três décadas de regime autoritário, o Brasil não merecia ser exposto assim.

Como um país que elegeu e reelegeu um presidente da República que dá de ombros à luta pelo direito de se opor e ainda compara seus combatentes a criminosos comuns.

Os traficantes, assassinos e sequestradores do Brasil e os presos políticos de Cuba – ou de qualquer parte do mundo, por suposto – para Lula estão em igualdade de condições. Opositor é criminoso.

Ou não foi isso que ele disse quando afirmou: “Imagine se todos os bandidos que estão presos em São Paulo entrassem em greve de fome e pedissem libertação”?

“Temos de respeitar a determinação da Justiça e do governo cubanos”.

Uma manifestação de desapreço ao conceito de solidariedade mundial e de hostilidade à ação da Anistia Internacional, cujo trabalho é justamente se envolver, denunciar, protestar contra as agressões aos direitos humanos.

Graças a isso, durante a ditadura militar brasileira os combatentes do regime – alguns atuais auxiliares de Lula, uma delas sua candidata a presidente – puderam levar notícias ao mundo do que se passava aqui.

O presidente Lula ultrapassou todos os limites do aceitável. Foi além de países democráticos que apoiaram ditaduras e que ainda mantêm relações comerciais e diplomáticas com regimes autoritários, mas nunca ousaram defender as razões dos ditadores, nem justificar suas ações, ignorar as atrocidades cometidas, acusar os dissidentes de criminosos, muito menos emprestar seu prestígio em defesa da autodeterminação dos déspotas amigos.

É de se perguntar o que acham a ministra Dilma Rousseff e os demais aliados, auxiliares, admiradores e seguidores do presidente Lula desse perfilhamento à tirania e dessa indiferença ao clamor pela liberdade.

Por uma questão de conveniência calarão ou tergiversarão aludindo a um mal-entendido na interpretação das palavras. O mundo, entretanto, não será tão condescendente.

Enigmáticos

Primeiro Lula e Ciro ficaram de conversar em janeiro para definir o futuro. Depois o encontro ficou para fevereiro, sendo adiado em seguida para 15 de março e agora marcado para 15 de abril.

Jogam juntos, evidente. Embora nem o PT saiba exatamente para quê, circulam versões a respeito no partido. Uma delas reza que Lula mantém Ciro na presidencial para conter os índices de Serra nas pesquisas.

Outra diz que Ciro é reserva técnica para vice.

Petistas mais inconformados com a hipótese de tê-lo como candidato ao governo de São Paulo, consideram a hipótese de que, se demorar muito, Marina Silva acaba ultrapassando Ciro nas pesquisas.

Nelson Sargento e Teresa Cristina - Agoniza mais não morre

O lulismo e o ovo da serpente:: Aspásia Camargo

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Líder histórico do Partido dos Trabalhadores, Lula descolou-se de seu partido com o objetivo pragmático de garantir a vitória eleitoral em 2002 e a governabilidade de sua gestão, em condomínio com amplo espectro partidário. Essa metamorfose, coroada por intervenção midiática, acabou transformando-o de líder descontente e severo na figura do "Lulinha paz e amor".

O PT, do qual Lula manteve distância protocolar durante seu governo - sem jamais abandoná-lo à própria sorte -, foi criado em 1979 com fortes raízes sindicais, mas também influenciado pelos radicais católicos, além de correntes de origem marxista e guerrilheira. Essas três vertentes sofreram revezes históricos ao longo das décadas de 80 e 90, enquanto o PT se consolidava como único partido de massas, e como oposição radical, atraindo segmentos importantes, como intelectuais, artistas, juristas, professores, inconformados com as desigualdades sociais do País e com o imobilismo conservador das elites brasileiras.

Administrar a "disfunção natural" dessas lideranças inadaptadas ao fluxo da globalização e do capital, e que sempre permaneceram minoritárias no plano parlamentar e eleitoral, foi missão que apenas Lula poderia cumprir em sua consolidação no poder.

O que define o lulismo, em primeiro lugar, é o pragmatismo desencarnado das bandeiras ideológicas, incompatíveis com a conquista e o exercício do poder. A despolitização que já o havia caracterizado como líder sindical reaparece na Presidência, protegida pelo selo de uma liderança de origem popular e pelo amor visceral às classes populares, das quais é egresso. A familiaridade com que a elas se dirige, vocalizando suas necessidades e vontades e zelando por lhes dar proteção e conforto, ampliando sua renda e abrindo-lhes novas oportunidades de consumo, é a marca registrada da era Lula - cujo paternalismo é temperado pela intimidade e pela identidade de quem conhece, em oposição ao patriarcalismo mais elitista e distante que foi a tônica da liderança populista de Vargas.

Para poder influir acima das diferentes correntes ideológicas que atravessam as classes populares - segundo pesquisa de André Singer - foi preciso alimentar uma identidade direta, quase primitiva e despolitizada das massas em simbiose direta com a figura do líder.

O líder, por sua vez, representa essa massa, às vezes, de forma brincalhona e picaresca, saboreando boutades populares, provérbios, metáforas e parábolas que horrorizam as camadas superiores e contrariam os códigos de conduta da Presidência. Essa liderança de humor e alegria, com uma ligeira pitada da clássica malandragem brasileira, contrasta com o protótipo mais silencioso, pessimista e trágico do getulismo, que jamais deixou de ser uma expressão das elites. Lula, ao contrário, parece ser a encarnação mesma da identificação popular com uma trajetória de vida bem-sucedida, estimulada pelos altos níveis de mobilidade social que marcaram o Brasil durante a maior parte do século 20.

Essa é, aliás, a mensagem do filme Lula, o Filho do Brasil, no qual, muito mais que a origem miserável nordestina, o que ressalta é a rapidez da escalada ao patamar de torneiro mecânico e líder sindical no coração da próspera capital paulista. Daí a presidente da República, o que ocorreu foi apenas "a perseverança", tão recomendada por sua mãe, dona Lindu, e uma continuação natural da vocação para a prosperidade, consubstanciada no milagre brasileiro.

Também a migração das classes D e E para um patamar acima da pobreza é fenômeno mundial que encontrou abrigo favorável por meio da liderança de Lula. Facilitar o endividamento para aquisição de bens de consumo, créditos consignados para funcionários públicos e outras facilidades produziram frutos políticos que poderão ser mais bem avaliados no futuro.

O que caracterizou o lulismo foi a capacidade de manter em banho-maria o potencial de protesto de bandeiras anticapitalistas, que pareciam ter ruído com a queda do Muro de Berlim. Acendendo uma vela a Deus e outra ao diabo, Lula ficou bem com o Fórum de Davos por ter acatado as regras financeiras mundiais, mas não desagradou de todo ao Fórum Social Mundial, da mesma forma que conseguiu conduzir de forma pendular suas relações com o populismo latino-americano, ora agradando a Hugo Chávez, ora se distanciando dele.

Nas relações internacionais, consagrou-se como um estilo de "diplomacia presidencial" nacionalista, com ampliação das áreas de influência, consolidando o Brasil como país emergente e como membro protagônico do bloco dos gigantes continentais (Basic). O lulismo detém os louros de ter soterrado definitivamente a condição de subdesenvolvido e de ter viabilizado a formação/consolidação do G-20.

O contrapeso foram aventuras arriscadas e ideologicamente perigosas, como a abertura das relações de cumplicidade com o Irã e com o continuísmo de Manuel Zelaya em Honduras, tão a gosto do bloco socialista. É uma no ferro, outra na ferradura: namoro com Chávez e alianças com Nicolas Sarkozy e Barack Obama. Hostilidades de Evo Morales, mas acordos com a Bolívia. Ora o coração pende para o agrobusiness, ora para o MST. Cumprem-se as regras do jogo financeiro capitalista, mas questiona-se o princípio da propriedade, dando cobertura às invasões de empresas produtivas. Tudo isso sem falar no episódio do decreto dos Direitos Humanos, que reacendeu o temor do imprevisto e a mudança das regras do jogo. Mais uma vez, Lula recuou sob pressão.

É a administração das incertezas, que demonstra a fragilidade das instituições democráticas e o encanto pelas lideranças carismáticas diante de reivindicações políticas e sociais incontidas. Reflexos incontestáveis da inexorável gestação do ovo da serpente - iniciada nos idos de 1989, quando da primeira das três derrotas de Lula na corrida pelo Palácio do Planalto.

Aspásia Camargo, socióloga, é vereadora no Rio de Janeiro pelo Partido Verde (PV)

Serra governa até 2 de abril, afirma tucano

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Da Reportagem Local

Dois dias depois de uma reunião no Palácio dos Bandeirantes, o presidente nacional do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), disse ontem que o governador de São Paulo, José Serra, vai permanecer no cargo até o prazo final para a renúncia, dia 2 de abril.

Pela legislação eleitoral, um chefe do Poder Executivo tem que renunciar até seis meses antes da eleição, caso queira concorrer a outro cargo eletivo.

"Serra fica até o limite. Vai governar até quando é possível ficar no governo", disse Guerra, afirmando que o governador de São Paulo só deixa o cargo em 2 de abril.

Em conversas com tucanos, Serra discutiu a possibilidade de deixar o governo entre os dias 30 e 31.

A ideia é que o governador saia sem anunciar formalmente sua candidatura. A renúncia seria o suficiente para obter destaque nos jornais, em plena Semana Santa.

O anúncio oficial acontecerá depois do feriado, em Brasília. O lançamento consumirá dois dias: primeiro um jantar com os partidos aliados e, no dia seguinte, uma festa.

A estratégia tucana seria uma tentativa de reproduzir o impacto do lançamento da pré-candidatura da ministra petista Dilma Rousseff (Casa Civil) depois do Carnaval.

Aliados do governador chegaram a sugerir que ele deixasse o governo na semana anterior ao feriado, lançando sua candidatura em São Paulo.

No entanto, hoje a tese que vigora é a de que o lançamento deva acontecer em capítulos.

Apesar da decisão de Serra de permanecer no governo, o PSDB já montou uma estrutura para a campanha eleitoral e também discutiu ontem a fórmula de captação de recursos pela internet.

Ignomínia::Clóvis Rossi

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - É uma ignomínia, uma completa ignomínia, a coleção de absurdos que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disparou a respeito de Cuba, em entrevista à agência Associated Press.

Seria ignominioso em qualquer pessoa decente, mas se torna exponencial no caso de Lula, porque seus conceitos contra os dissidentes cubanos em greve de fome e a favor da ditadura acabam sendo uma condenação a seu próprio passado.

Ao equiparar a motivação (política) dos dissidentes a uma eventual ação similar dos criminosos de São Paulo, Lula está se declarando um ex-delinquente. Afinal, ele fez greve de fome, que agora repudia, e por motivos políticos.

Lula diz que é preciso "respeitar a determinação da Justiça e do governo cubano de deter as pessoas em função da legislação em Cuba".

Por que, então, não respeitou determinações da Justiça e do governo brasileiro no tempo em que era um líder sindical?

Pela simples e boa razão de que determinações de um poder judicial totalmente subordinado ao governo -e um governo ditatorial- não merecem respeito dos democratas. Nem aqui nem em Cuba.

A menos que Lula ache que há "boas" ditaduras e ditaduras "más".

Não há. O que há são valores universais: liberdades públicas, respeito aos direitos humanos -enfim, democracia. São princípios que organizam a convivência, os únicos decentes que o ser humano inventou até agora.

Em sendo assim, não há como discordar do preso político Guillermo Fariñas quando diz, como o fez a Flávia Marreiro, desta Folha, que Lula demonstrou seu "comprometimento com a tirania dos Castro".

Uma tirania que fez de Cuba o museu do fracasso do socialismo real, só louvado por três ou quatro intelectuais de quinta, que, sem público em seus próprios países, vêm à América Latina lamber as botas de tiranos e tiranetes de opereta.

Nem sabedoria nem coragem:: Alon Feuerwerker

DEU NO CORREIO BRAZILIENSE
É habitual lutadores políticos autênticos aceitarem a morte pela causa. Mas ninguém nunca viu bandido oferecer voluntariamente a própria vida em sacrifício por motivo político. Bandido não está atrás de morrer, ao contrário. É uma diferença fundamental

O PT e Luiz Inácio Lula da Silva precisam decidir se é desejável a transição democrática em Cuba. Ou se seria retrocesso. Precisam resolver se a mudança no sistema político de lá — para talvez aproximá-lo do nosso — representaria avanço. Ou se viria como capitulação ao imperialismo norte-americano. Precisam dizer se o socialismo melhora quando incorpora valores universais nascidos com a democracia liberal. Ou se piora. Ou se é incompatível com eles.

São questões objetivas.

Não peço ao governo do Brasil ou ao PT para se meterem na política interna de Cuba. Não defendo isso. Mas um debate verdadeiro exige que as posições políticas estejam claras. E já registrei aqui noutra ocasião (“Um poço de bom senso”) que o PT talvez não tenha maior dificuldade quando decidir pegar esse touro a unha. Afinal a sigla é, nas suas próprias palavras, um produto histórico da “esquerda democrática”. Conceito que só existe em oposição a uma esquerda “não democrática”.

Mas você pode achar essa abordagem absurda, pois cada país tem uma história, uma circunstância, e não cabe julgar de fora, por nenhum critério. Nem tentar estabelecer padrões. Não haveria portanto uma escala civilizatória a percorrer, mas processos específicos, baseados apenas na absoluta soberania nacional e cultural. Não nos metemos na vida dos outros e eles não se metem na nossa. E ponto.

É intelectualmente defensável. Mas o argumento precisaria ser conduzido com radicalidade e amplitude, pois do contrário desmoraliza o proponente. Como, infelizmente, tem provado o nosso querido Itamaraty.

Ou talvez o sujeito acredite que existe sim a tal escala civilizatória, e que nela Cuba está adiante de nós. Por ter abolido a propriedade capitalista e trocado o projeto de uma democracia burguesa por outro, bem mais avançado. Então, pela lógica, se é bom lá também deveria ser proposto aqui. Nem que só para o futuro. O eleitor tem o direito de saber.

Se entre nós tal debate é em boa medida teórico, para os cubanos é bem prático. Especialmente para os que divergem do governo de Havana. Como os Estados Unidos querem e incentivam a mudança do sistema político de Cuba, todo mundo que ali defende a mesma coisa e começa a lutar pelos seus objetivos, mesmo quando pacificamente, acaba enquadrado pelas autoridades na categoria de inimigo do país. E corre o risco de puxar uma cana brava.

Terça-feira Lula comentou sobre a greve de fome de presos políticos em Cuba. O ato desesperado busca sensibilizar o governo cubano para que solte um grupo de prisioneiros. Lula criticou a greve. Poderia tê-lo feito com elegância. Poderia ter usado um argumento humanitário, ou religioso (religiões costumam proibir o suicídio). Mas preferiu fazer o paralelo talvez mais equivocado e deplorável de todo o abundante estoque de falas presidenciais, desde 2003.

Não é razoável soltar presos políticos só por causa de uma greve de fome, diz Lula, assim como não seria razoável libertar bandidos comuns que usassem essa mesma forma de pressão.

Poucas vezes, talvez nunca em sua longa e vitoriosa carreira política, Lula esteve tão completamente errado. São situações incomparáveis. Pode haver uma superposição, uma zona cinzenta entre a militância política e o banditismo. Mas são coisas diferentes, nunca iguais. E há um jeito fácil de distinguir uma categoria da outra.

É habitual lutadores políticos autênticos aceitarem a morte pela causa. Mas ninguém vê bandido oferecer voluntariamente a própria existência por um motivo político. Bandido não está atrás de morrer, ao contrário. Pode até perder a vida por causa das opções que faz, mas será um acidente, e nunca um sacrifício de caso pensado.

Claro que Lula sabe distinguir entre as duas turmas. Ainda mais como presidente da República. Ninguém chega onde ele chegou, nem sobrevive no poder, se não souber separar os dois segmentos.

Em termos simples e práticos, e para resumir, os presos políticos cubanos não são bandidos, são militantes de uma causa com a qual o presidente do Brasil parece não concordar. Paciência. Mas nem por isso nosso chefe de Estado tem o direito de se referir a eles como se fossem criminosos comuns.

Humilhar os adversários nunca é ato de sabedoria. Neste caso particular, considerando que Lula é o todo-poderoso presidente do grande Brasil e os alvos da fúria verbal dele estão presos, nas condições conhecidas, nem sequer pode ser entendido como ato de coragem.

Um período sob pesada artilharia:: Maria Inês Nassif

DEU NO VALOR ECONÔMICO

O governador de São Paulo, José Serra, tem até o fim do mês para decidir o seu destino eleitoral, mas os possíveis aliados do PSDB na disputa pela Presidência têm mais tempo que isso. Serra obedece o calendário de desincompatibilização definido pela lei: se não sair do governo até seis meses antes da eleição de outubro, apenas poderá se candidatar à reeleição ao governo do Estado. Os partidos, no entanto, têm até 30 de junho para definir suas alianças - ou, se for o caso, seus próprios candidatos. O calendário é diferente. Para o tucano, a situação se define até o primeiro dia de abril. O PSDB e os partidos que a ele se aliariam, no entanto, têm mais três meses para decidir o seu destino. Até agora, Serra tomou como decisão sua, pessoal e intransferível, a definição do timing da sua candidatura.

A partir de abril, ou se submete aos interesses dos partidos e mostra resultados, ou corre o risco de ver reduzida a sua base de apoio eleitoral. Quanto menos apoio formal tiver, menos tempo terá de horário eleitoral gratuito.

Isso, é lógico, vale para todos os candidatos que estão hoje na arena da disputa presidencial. Mas a candidata do PT, Dilma Rousseff, tem uma vantagem sobre seu principal concorrente. Dilma está num momento de ascensão nas pesquisas. Nos próximos 30 dias, segundo previsões do seu partido e também de adversários, ela deverá ultrapassar o candidato tucano. Nos próximos três meses, quando serão definidas as alianças eleitorais, terá invertido com Serra a posição nas pesquisas: negociará aliados como favorita na disputa.

Isso faz uma enorme diferença. Na prática, isso tem o poder de demover, por exemplo, qualquer eventual obstáculo à aliança com o PMDB. O partido de Michel Temer é dividido mas não rasga dinheiro: dificilmente deixará de se aliar a Dilma, com direito a uma vice-presidência, se sobre o palco de negociações tiver montado um cenário onde ela atue como protagonista. Da mesma forma, as próximas pesquisas - se não acontecer um fato relevantíssimo, que cole efetivamente na candidatura do PT e reverta a tendência de alta da candidata de Lula - serão um fator de atração para os pequenos partidos fisiológicos. De cara, as sondagens de intenção de voto terão o poder de garantir o horário eleitoral gratuito do maior partido parlamentar, o PMDB, para a candidata. E trarão para a candidatura, como troco, o horário eleitoral dos pequenos partidos. Tempo maior de horário gratuito não é apenas garantia de mais propaganda: é como se fosse também um seguro contra a ofensiva "de fora", destinada a criar os fatos novos que teriam o poder de derrubar o favoritismo da candidata do PT. É a garantia de tempo para comunicação direta com o eleitor, sem a mediação dos meios de comunicação.

Ou o PSDB reverte esse quadro, ou terá enormes dificuldades de manter horário eleitoral e palanques estaduais que serão fundamentais para seu candidato vencer as eleições. Para os partidos que os tucanos pretendem como aliados nas eleições de outubro, se Serra não emplacar, é mais vantajoso apoiar diretamente Dilma, ou então simplesmente fechar com um candidato que fuja da polarização PT-PSDB e preserve-os de desgastes futuros com o vencedor da disputa. Isso manteria a faixa de eleitorado do partido em questão preservado da contaminação de uma campanha que se prevê altamente agressiva; permitiria, assim, uma aliança no segundo turno com o favorito na disputa - ou a negociação de um apoio parlamentar já com o presidente eleito. Isto quer dizer que, dependendo das chances de um segundo colocado nas pesquisas no período que antecede a oficialização das alianças eleitorais, é preferível perder - inclusive com candidato próprio - do que se queimar com o candidato favorito.

Num quadro de muita polarização, os partidos aliados a um candidato com chances reduzidas de vitória também perdem substância ideológica na disputa eleitoral. O caso do DEM é paradigmático. Nas eleições de 2006, aliado ao PSDB numa disputa de morte com o PT, o DEM viu o eleitorado que ideologicamente se alinharia ao partido migrar para o candidato que se apresentava como polar postulante de esquerda. O processo eleitoral conduziu o PSDB para a direita e expulsou o DEM desse eleitorado. A aliança do PSDB com o DEM nas eleições municipais de 2008, que elegeu como prefeito da capital o demista Gilberto Kassab, deu uma sobrevida ao partido, mas isso tende a não ser suficiente nessas eleições, principalmente diante da evidência de que o prefeito da capital vive um declínio de popularidade de difícil recuperação e não terá muito fôlego, até o final do mandato, para consolidar um eleitorado que seja propriamente de seu partido em São Paulo. O eleitorado conservador paulista é, ainda, profundamente tucano. Nesse cenário, o ex-PFL apenas não será engolido pelo PSDB se a votação de Serra for avassaladora - e daí ele leva consigo uma bancada parlamentar onde caberão tucanos e demistas - e, já como partido governista, consegue trabalhar para recompor o tamanho que tinha antes de 2002, quando o PSDB deixou de ser governo; ou se afasta do PSDB e tenta retomar o eleitorado ideológico de direita que foi absorvido pelos tucanos nas últimas eleições. Seria a forma de não perder completamente a importância no quadro político. Ficar sem o DEM não é uma boa alternativa para a candidatura Serra; ficar com um Serra em declínio não é bom para o DEM.

O mês de março, e os quase três meses que separam a desincompatibilização de Serra da oficialização das alianças eleitorais, portanto, são o tempo que o PSDB tem para reverter a curva de ascensão de Dilma nas pesquisas e atrair aliados. Será um período de guerra. Não será apenas uma amostra do que será uma campanha que, dizem as previsões, virá mais pesada que a de 1989, um período de pesada artilharia.

Maria Inês Nassif é repórter especial de Política. Escreve às quintas-feiras

''Tem gente inaugurando maquete'', ataca Lula; Serra ignora crítica

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Provocação era dirigida ao governador, que na véspera tinha apresentado modelo de ponte entre Santos e Guarujá

Roberto Almeida

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aproveitou ontem a inauguração da termelétrica Euzébio Rocha, em Cubatão (SP), para destilar números da economia brasileira e alfinetar o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), provável adversário de sua pré-candidata à Presidência, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT). "Estamos num ano de campanha e estamos percebendo que tem gente inaugurando até maquete", ironizou.

Lula não citou Serra nominalmente, mas a referência é clara. Anteontem, o governador paulista esteve em Santos, onde participou de evento para apresentar a maquete de uma ponte de ligação entre Santos e Guarujá. O projeto, que ainda não foi licitado, já havia sido apresentado pelo governo do Estado no mês passado. Em resposta à declaração de Lula, a assessoria de imprensa do governador informou que "o governo de São Paulo não se sente atingido".

Ao mesmo tempo que critica, Lula é alvo de reclamações constantes dos tucanos por suas viagens ao lado de Dilma. Sua agenda está praticamente a serviço da pré-candidata. Durante a visita à termelétrica - pronta desde novembro e "inaugurada" só ontem -, presidente e ministra abraçaram e posaram para fotos com operários.

Contudo, após alfinetar Serra sobre a maquete, o presidente foi mais longe e indiretamente propôs um duelo. "Eu, quando comecei minha vida política, dizia que político mentiroso fala assim: "Eu mato a cobra e mostro o pau"", assinalou.

"Ora, o fato de você mostrar um pau não significa que matou a cobra. Nós adotamos o discurso de que um político verdadeiro mata a cobra e mostra a cobra morta", continuou.

Só mais tarde, em evento em Araçatuba (SP), é que Dilma aderiu à provocação e adotou a mesma estratégia de Lula. "Nós não inauguramos maquetes, mas obras completas", disse, após assinar um edital de licitação para a Transpetro.

O desafio para o duelo faz parte da estratégia petista de comparar gestões, aplicada à exaustão ontem tanto no discurso de Lula como no de Dilma. Ambos procuraram associar a inauguração da termelétrica, ao custo de R$ 1,032 bilhão e associada ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), à redução da possibilidade de um apagão, como o que ocorreu entre 2001 e 2002, últimos anos de Fernando Henrique Cardoso na Presidência.

Dilma, a primeira a discursar, sublinhou logo na abertura de sua fala que a obra previne um engessamento da economia. "Essa termelétrica é mais uma obra do PAC e tem por objetivo garantir que nosso país possa crescer sem gargalos, obstáculos ao crescimento como aqueles que ocorreram entre 2001 e 2002, quando por oito meses o Brasil não tinha energia suficiente para abrir um único shopping center, uma única padaria, uma única loja", afirmou.

Dilma descreveu o apagão de 2001 como uma "loja de armarinhos", em que se colocam "todas as linhas e botões e não tem para quem vender". Mas não comentou o apagão de novembro do ano passado. Em seu discurso, Lula aproveitou a deixa. "Pode vir fazer investimento no Brasil que vai ter energia suficiente, que não vai mais ter apagão como teve em 2001", afirmou, sob a ressalva de que "com as intempéries a gente não brinca".

Colaboraram Chico Siqueira e Silvia Amorim

Presidente ''já inaugurou os mesmos projetos três vezes'', reage tucano

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Julia Duailibi e Silvia Amorim

Diante da crítica indireta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao governador de São Paulo, José Serra (PSDB), os tucanos foram a campo atacar o governo federal, tentando colar na pré-candidata governista à Presidência da República, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), a pecha de "inauguradora de obra inacabada".

"É muito estranho o presidente Lula falar uma coisa dessas. Justo ele que inaugura até ordem de serviço para licitação pelo País inteiro e com a ministra Dilma do lado", reagiu o líder do PSDB na Câmara, deputado João Almeida (BA). O presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), comentou o assunto no Senado: "Nada de inaugurar maquete, nada de campanha eleitoral. Ficam dizendo que a gente faz campanha eleitoral. Inúmeras vezes convidei o governador para, na quinta ou na sexta-feira, comparecer a eventos que promovemos, e ele não ia. Comparecia depois que terminava sexta."

Em mais um round do debate eleitoral, tucanos e petistas voltaram a se atacar nesta semana, acusando uns aos outros de inaugurar obras inacabadas com objetivo de colher benefícios políticos. Integrantes do PSDB foram a público criticar Dilma por participar no Rio de inauguração de obra que não contou com recursos do governo. Ontem foi a vez de o presidente atacar indiretamente Serra por ter mostrado maquete em apresentação de projeto sobre ponte entre Santos e Guarujá.

"Lula já inaugurou os mesmos projetos e visitou terrenos mais de três vezes. Ele é o personagem com menos autoridade nesse assunto", afirmou o deputado Arnaldo Madeira (SP). Para o deputado José Aníbal (SP), o governo ataca a oposição para justificar o fato de não conseguir entregar obras. "Serra não fez um ato de campanha. Ele é zeloso. Só inaugura o que é possível. O intuito foi testemunhar uma obra que será feita, que é muito desejada", disse Aníbal.

A senadora Marisa Serrano (MS) reagiu a Lula também mirando em Dilma. "O que é inadmissível e contra a lei é a pré-candidata do PT ir à inauguração de uma obra que não tem um centavo de recursos do governo federal ou o presidente apressar inaugurações para que a ministra participe dos eventos", disse, referindo-se à participação de Dilma na entrega do Hospital da Mulher Heloneida Studart, em São João de Meriti, no domingo. A ministra participou da cerimônia, apesar de a obra não ter recebido investimentos da União.

O coador furado do presidente:: Villas-Bôas Corrêa

DEU NO JORNAL DO BRASIL

A mistura da vaidade desde a sua qualificação como o líder mais popular do mundo e dos êxitos administrativos multiplicados aos limites do desatino parece que afrouxou alguns parafusos na cabeça do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A estafa na pré-campanha eleitoral que debocha dos prazos constitucionais, só nos registros da imprensa dos jornais do dia, passa a desconfortável impressão de um coador furado, com buracos por onde pingam todas as bobagens. O presidente Lula está dizendo o que lhe vem à cabeça, do absurdo mais extravagante à evidente contradição com a verdade.

Eleger a ministra-candidata Dilma Rousseff é a sua obsessão, que atropela as restrições legais e o decoroso limite do bom-senso.

Há dias, como o de ontem, em que Lula bate as suas marcas pessoais. É espantosa informação de que durante o período em que a chefe da Casa Civil da Presidência e pré-candidata do PT, ministra Dilma Rousseff, estiver em campanha, a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres vai contratar, por até R$ 1 milhão, um instituto de pesquisa, vinculado a universidades públicas, para fazer um levantamento sobre a participação das mulheres na política. Até 9 de abril o edital de contratação acolherá propostas das empresas interessadas, mas dela não poderão participar empresas tradicionais como o Ibope, Datafolha e Vox Populi. O que é a lógica do absurdo: a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres quer reunir dados levantados por empresas sem tradição nem experiência. E para quê? Difícil entender sem o molho da malícia. Pois o que não falta nesta pré-campanha, sinalizando a ressaca na reta final, são pesquisas de empresas que prezam a sua credibilidade. Um erro de boa ou má-fé pode representar a falência ou o prejuízo de milhões.

Em dia inspirado, a ministra candidata Dilma Rousseff defendeu o tesoureiro do PT, João Vaccari Netto, que está sendo investigado pelo Ministério Público de denúncia de desvio de recursos da Cooperativa Habitacional dos Bancários (Bancoop). E foi explícita: “Vaccari tem o direito de defesa”.

No balanço, uma curiosa inconfidência: vai receber um salário do PT, após deixar o ministério, em abril. E argumentou com escancarada sinceridade: “Vou ter que viver. Como não posso viver de brisa e não sou rica, eu vou ter salário“.

Até onde a memória ajuda, trata-se de uma novidade. Ou, com as devidas cautelas, a primeira vez que um candidato a mandato no Executivo reconhece de público que vai receber um salário do partido.

A ministra Dilma Rousseff terá muito que aprender com o seu mestre até chegar ao desembaraço da entrevista do presidente Lula à agência de notícias AP, que recolheu a sua defesa das decisões da Justiça cubana sobre os presos políticos que entraram em greve de fome, com uma morte. Lula não travou a língua e comparou os dissidentes cubanos a bandidos: “Eu penso que a greve de fome não pode ser utilizada como pretexto de defesa dos direitos humanos para libertar pessoas”. Ousou uma comparação extravagante: “Imagina se todos os bandidos que estão presos em São Paulo entrarem em greve de fome e exigirem a liberdade. Temos que respeitar a determinação da Justiça e do governo cubano de deter as pessoas em função da legislação de Cuba, como quero que respeitem ao Brasil”.

A pré-campanha, ainda sem candidato assumido da oposição, promete esquentar, antes mesmo dos prazos fixados pela Justiça Eleitoral. O exemplo vem de cima.

“Vou ter que viver. Como não posso viver de brisa e não sou rica, eu vou ter salário” (Dilma)

Meirelles, do BC, é indiciado por crime tributário

DEU EM O GLOBO

Investigação pode prejudicar planos políticos. Supremo determina segredo de Justiça para o inquérito

Jailton de Carvalho

BRASÍLIA. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, indiciou o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, por crime contra a ordem tributária.

O indiciamento de Meirelles, que tem status de ministro, consta em inquérito aberto pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no último dia 4. O caso tem como relator o ministro Joaquim Barbosa. O indiciamento pode prejudicar os planos políticos de Meirelles, que se filiou ao PMDB e tem sido cotado para compor como vice a chapa da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, à Presidência.

Procurado pelo GLOBO, Meirelles não quis dar entrevista.

Segundo um de seus assessores, o Banco Central não tem conhecimento do inquérito.

Segundo informações do STF, o inquérito tem 105 páginas e trata do suposto envolvimento do presidente do BC com crimes previstos na legislação extravagante e crimes contra a ordem tributária.

Joaquim Barbosa decretou o segredo de Justiça da investigação ainda ontem, logo após receber os autos enviados por Gurgel. Por isso, o detalhamento da denúncia não está disponível. Há vários tipos de crimes tributários. A sonegação fiscal é um deles.

Em seguida, o ministro devolveu os autos ao procuradorgeral da República. Caberá agora a Gurgel indicar as medidas a serem tomadas. Se quiser, poderá pedir quebra de sigilos, interrogar testemunhas e outras diligências. Não há prazo para os autos retornarem ao STF.

Desde que assumiu o comando do BC, em 2003, Meirelles foi alvo de sucessivas investigações do Ministério Público Federal sobre irregularidades fiscais, evasão de divisas e até crime eleitoral. As investigações começaram por iniciativa do procurador da República no Distrito Federal Lauro Cardoso e, depois, do ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles. Cardoso acusou Meirelles de cometer irregularidades para camuflar uma fortuna de aproximadamente R$ 100 milhões.

Parte das movimentações financeiras estaria em nome das empresas Silvania One e Silvania Two.

Entre 1996 e 2001, a fortuna de Meirelles teria aumentado 66 vezes.

Ele também foi investigado por prestar informações erradas sobre seu domicílio eleitoral em 2002, quando se elegeu deputado federal. Mas as investigações foram arquivadas por falta de provas. Durante a apuração do caso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva enviou uma medida provisória ao Congresso para dar status de ministro a Meirelles.

Com isso, investigações relacionadas ao presidente do BC teriam que ser conduzidas pela Procuradoria-Geral e não mais pela primeira instância do Ministério Público.

No Congresso, alguns parlamentares de PMDB e PT tomaram conhecimento do inquérito à tarde. Mas minimizaram sua importância, alegando tratarse de assuntos antigos. Por isso, não acreditam que haverá impacto na decisão que Meirelles vai tomar sobre seu futuro político. Na próxima semana, Meirelles entrará em férias. Aliados esperam que, a partir daí, ele decida seu destino político.

Meirelles teria como opção compor a chapa de Dilma ou disputar o Senado por Goiás.

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Bancoop atrasou até triplex de Lula

DEU EM O GLOBO

Em 2005, o presidente Lula e dona Marisa Letícia compraram uma cobertura triplex de frente para o mar na Praia das Astúrias, no balneário paulista de Guarujá, mas amargam até hoje na fila. O casal é uma das vítimas da Bancoop, cooperativa habitacional dos bancários, que está sob investigação do MP por suspeita de desviar recursos para campanhas do PT. Incapaz de concluir a obra, a Bancoop repassou-a para a construtora OAS, mas ela continua parada. Um imóvel como o de Lula naquela praia pode passar de R$ 1 milhão.

Segurança relata escolta para saques da Bancoop

E conta que depois Vaccari, hoje tesoureiro do PT, se reunia com presidente da cooperativa

Leila Suwwan SÃO PAULO

Testemunha-chave na investigação do caso Bancoop, o chefe de segurança da Cooperativa Habitacional dos Bancários até 2004, Andy Roberto Gurczynska, afirma ter realizado a escolta de funcionários da entidade na realização dos saques em dinheiro operação que teria sido utilizada para desviar somas milionárias dos empreendimentos imobiliários, parte deles supostamente para campanhas do PT.

Segundo ele, o ex-presidente da BancoopLuiz Malheiro, morto em acidente de carro em 2004, realizava encontros após os saques com João VaccariNeto, então presidente do Sindicato dos Bancários e hoje tesoureiro nacional do PT.

Gurczynska afirma, porém, que não presenciou a suposta entrega de envelopes de dinheiro.Vaccari nega as acusações e sustenta que as transações investigadas peloMinistério Público de São Paulo não eram saques e sim transferências interbancárias.

Em entrevista ao GLOBO na noite de anteontem,Gurczynska revelou que o controle de caixa do suposto esquema de desvio de recursos da Bancoop era acompanhado pela secretária particular de Luiz Malheiro, Helena Lage. Era ela quem programava os saques, enviava os funcionários e encomendava a escolta de seguranças.
Depois, contou ele, Helena recebia os recursos na sede da Bancoop

Encontros também com Berzoini

Além de encontros frequentes com Vaccari, o segurança relata que Malheiro também era escoltado para encontros com Ricardo Berzoini, na época em que este já era ministro da Previdência.

O petista era tratado como chefe. Gurczynska trabalhou para a Bancoop até a chegada de Vaccari, quando sua equipe foi substituída pela empresa Caso, de Freud Godoy, envolvido no escândalos dos aloprados um grupo ligadoao PT que tentou comprar um suposto dossiê contra o governador José Serra e outros tucanos nas eleições de 2006.

Eu ia até o banco com mais um para escoltar, geralmente, uma terceira pessoa. Entrávamos até determinada sala da tesouraria. De lá para dentro, a outra pessoa entrava e ela só trazia o pacote. Quando eu digo pacote, não era um pacote gigante.

Era coisa pequena. Muitas vezes era um envelope, muitas vezes aquele envelope grande, A4.

Muitas vezes trazia no próprio corpo. A pessoa entrava e saía. Se pedia escolta, era para escoltar alguma coisa disse Gurczynska.

Ele aceitou conceder entrevista ao GLOBO, mas estava sob forte esquema de segurança e pediu para não ter o rosto fotografado.

Segundo Gurczynska,os saques eram realizados por diversos funcionários do baixo escalão administrativo da Bancoop, a pedido de Helena Lage, que tinha um bom levantamento de tudo o que entrava e saía.

Ela e o irmão do Luiz (Hélio Malheiro) são as provas vivas de tudo.

Eram as pessoas mais próximas a ele e que tinham conhecimento.

Hélio prestou depoimento e entrou no programa de proteção às testemunhas após a morte do irmão. Helena, que não trabalha mais na Bancoop, segundo depoimentos,teria herdado a parte de Luiz Malheiro na empreiteira Germany, que teria sido utilizada na triangulação e desvios de recursos.

(O dinheiro sacado) era entregue para quem solicitou nossa escolta.

De lá,a gente não via o envelope até a gente ser solicitado para ir para outro lugar, que muitas vezes era o sindicato (dos bancários, presidido por Vaccari) relatou.

Gurczynska disse que os saques das contas da Bancoop, já em posse do promotor José Carlos Blat, que comanda as investigações, seriam as provas materiais de seu depoimento, prestado ao MP em janeiro de 2008. Afirmou não ter mantido registro dos encontros do chefe, para o qual sempre realizou a logística prévia e escolta.

Uma vez, o Berzoini ganhou uma caneta Mont Blanc. Ele (Malheiro) disse que estava presenteando o chefe por alguma coisa disse Gurczynska, lembrando que o petista era ministro da Previdência e tinha escolta da Polícia Federal.

Vaccari se disse perseguido por MP

Berzoini não foi localizado no celular ontem à noite. A assessoria de imprensa do PT informou que Vaccari Neto não concederia entrevista nem faria qualquer manifestação sobre o caso.

Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo de ontem, Vaccari negou a existência de caixa dois no PT e o rombo de R$ 100 milhões na Bancoop, cifra estimada pelo MP. Disse ainda que Helio Malheiros e Andy Gurczysnka foram demitidos da Bancoop por má prestação de serviços. Esse promotor quer sacanear comigo porque sou petista, tesoureiro do PT, disse Vaccari na entrevista.

Seu advogado, Luiz Flávio D’Urso, disse que Vaccari só passou a gerir a Bancoop em 2005 e que Gurczynska sequer afirma ter visto a suposta entrega de dinheiro.

Vamos aguardar se ele depõe prestando compromisso, sob responsabilidade da lei por falso testemunho afirmou o advogado.

O segurança disse que decidiu depor em favor das famílias prejudicadas na compra dos apartamentos. Antecipando ataques, afirmou que é um dos cooperados seu apartamento foi entregue e que cobrou na Justiça fatura de cerca de R$70 mil que teria ficado em aberto após sua dispensa.

Não sou nenhum Robin Hood. Os cooperados querem Justiça, não estão querendo prejudicar ninguém. Acho que quando a gente conta a verdade, dá para sustentar o resto da vida.

Ontem, dez associações de cooperados da Bancoop protocolaram pedido de intervenção e dissolução da entidade no MP. O grupo se reuniu com o promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social, Saad Mazloum, para detalhar as investigações e as suspeitas defraude e desvios. O pedido será encaminhado a um promotor por sorteio e correrá de forma independente.

O promotor José Carlos Blat já pediu o bloqueio das contas da Bancoop e a quebra de sigilo de Vaccari Neto. A defesa do tesoureiro do PT recorreu

Zimerman plays Chopin Ballade No. 1

Lula é alvo de críticas por defesa de prisões em Cuba

DEU EM O GLOBO

Declarações de presidente revoltam dirigentes de entidades como Anistia Internacional, Human Rights Watch, OAB e Tortura Nunca Mais

Christine Lages, Luisa Guedes e Sabrina Valle RIO, SÃO PAULO e BRASÍLIA

As declarações de Luiz Inácio Lula da Silva durante uma entrevista na de terça-feira receberam uma enxurrada de críticas ontem, num momento em que o governo brasileiro luta para manter a liderança na América Latina. De forma contundente, o presidente defendeu o respeito às decisões da Justiça cubana em relação aos presos políticos que entraram em greve de fome na ilha, e acabou comparando os dissidentes a bandidos comuns de São Paulo. As palavras de Lula indignaram dirigentes de entidades de defesa dos direitos humanos e a Ordem dos Advogados (OAB), consultados pelo GLOBO, além de ter provocado a revolta de diversos dissidentes cubanos.

Eu penso que a greve de fome não pode ser utilizada como pretexto de direitos humanos para libertar pessoas.

Imagina se todos os bandidos que estão presos em São Paulo entrarem em greve de fome e pedirem liberdade declarou Lula à agência de notícias Associated Press, na terça-feira.

Temos que respeitar a determinação da Justiça e do governo cubano, de deter as pessoas em função da legislação de Cuba, como quero que respeitem ao Brasil.

Pesquisador da Human Rights Watch (HRW), Nik Steinberg acredita que o silêncio das autoridades pode aliviar as pressões sobre o regime castrista e dificultar a mudança de posicionamento das autoridades cubanas em relação aos dissidentes da ilha.

Acredito que qualquer país que falhe em criticar a repressão a direitos civis e políticos não está fazendo pressão sobre Cuba. O silêncio diante destes abusos ou a comparação entre presos políticos e bandidos não vai exercer pressão sobre o governo cubano para mudar essa realidade.


AI: julgamentos desrespeitados

Para Steinberg, que passou duas semanas em Cuba no ano passado para elaborar um relatório, a comparação feita por Lula durante a entrevista foi infeliz e desanimadora para os que lutam pelo fim do isolamento de Cuba.

É muito decepcionante que o presidente Lula tenha comparado esses presos políticos a bandidos. Nós estamos falando de pessoas que foram impedidas de exercer seus direitos básicos de se expressar.

A presidente do Grupo Tortura Nunca Mais, Cecilia Coimbra, classificou a posição de Lula como extremamente infeliz, e afirmou que o presidente se contradiz ao defender o governo cubano ao mesmo tempo em que prega a política de não intervenção e respeito às decisões de outros países.

Quando ele critica a greve de fome (como instrumento político) e defende as decisões do governo cubano sobre o assunto ele está, sim, se metendo.

Está defendendo um país que está longe de ser uma democracia e um governo que precisa ser questionado afirmou, lembrando que, durante a ditadura brasileira, os desaparecidos políticos também eram chamados de bandidos.

Já o diretor para a América Latina da Anistia Internacional, Javier Zuñiga, criticou o sistema judicial cubano, justificando a greve de fome dos dissidentes, ameaçados pelo descaso às suas condições físicas.

Nós não somos a favor ou contra a greve de fome. Infelizmente o sistema judicial cubano não é independente.

Os julgamentos de dissidentes não são respeitados e esse é um dos maiores problemas naquele país.

Ele também criticou a postura de Lula em relação aos dissidentes, afirmando que a Anistia Internacional entrará em contato com o governo para informá-lo sobre a situação dos presos de consciência na ilha: Nós acreditamos que Lula tem informações equivocadas e estamos prontos para informá-lo sobre os prisioneiros.

Temos documentos que mostram os motivos pelos quais essas pessoas estão presas e o que acreditamos ser um prisioneiro de consciência.

Após ler a entrevista de Lula, o presidente da OAB, Ophir Cavalcante, afirmou que o regime castrista é repudiado pela sociedade brasileira. A comparação é despropositada, pois tenta banalizar um recurso extremo (a greve de fome) que é, ao mesmo tempo, um símbolo de resistência a um regime autoritário que não admite contestações, disse ele, em nota. Para Cavalcante, mais razoável seria se o governo brasileiro se preocupasse com as péssimas condições carcerárias a que estão submetidos. O fundador do Movimento de Justiça e Direitos Humanos do Rio Grande do Sul, Jair Kirschke, afirmou que comportamento de Lula em relação aos direitos humanos ao longo de seu governo foi desastroso e criticou a posição do presidente.

Lula, ou quem o assessora, não teve cautela. É uma declaração absurda.

Não há nenhuma razão de Estado forte o suficiente para justificar qualquer tipo de violação aos direitos humanos disse Kirschke. Ditadura é ditadura, não importa se de esquerda ou direita. Temos o dever de denunciar.

E no caso de Lula, ele não só não denunciou, como tentou justificar o injustificável declarou.

'É um insulto que não vamos perdoar jamais'

DEU EM O GLOBO

Ao organizar a carta dos presos políticos cubanos ao presidente Lula, Oscar Espinosa Chepe esperava conseguir a mediação do Brasil para a libertação de Orlando Zapata e de outros dissidentes em grave estado de saúde.

Ontem, em entrevista ao GLOBO, de Havana, ele reagiu com um misto de indignação e decepção à declaração em que Lula comparou prisioneiros políticos em greve de fome a presos comuns.

Preso em 1957 por participar do movimento contra Fulgencio Batista, Espinosa foi diplomata e economista do governo para depois passar à dissidência.

Em março de 2003, se tornou um dos 75 opositores presos na Primavera Negra e está em liberdade vigiada por problemas de saúde.

Cristina Azevedo

O GLOBO: O presidente Lula perguntou o que aconteceria se todos os criminosos presos em São Paulo fizessem greve de fome pedindo a liberdade. Como o senhor recebeu essa declaração?

OSCAR ESPINOSA CHEPE: O presidente Lula me decepciona totalmente. Eu sentia simpatia por ele, por ser um homem popular, um sindicalista. Comparar criminosos com lutadores pacíficos pela democracia, pessoas classificadas pela Anistia Internacional como presos de consciência, é terrível. Sua atitude débil, frouxa, em relação à Venezuela já era preocupante. E também em relação ao Irã. Ele visitou Cuba com interesses econômicos, porque o porto de Mariel tem uma posição estratégica em relação aos EUA. Lula caminha direto ao oportunismo e ao populismo. Nós contávamos com ele. Todos os democratas estão tristes porque perdemos uma figura que pensávamos que seria útil ao mundo. Lamento por nós e pelo mundo.

Ele disse que não recebeu a carta pedindo a intercessão do Brasil por Orlando Zapata...

ESPINOSA: Nós enviamos a carta. Primeiro ligamos para a embaixada pedindo uma entrevista com o embaixador ou outra pessoa que pudesse nos receber. Mas a secretária disse que a política da embaixada era não receber ninguém. Então, enviamos a carta para o e-mail do protocolo oficial da embaixada. Não podem alegar que não receberam. A carta era respeitosa, tínhamos simpatia por Lula. A maioria dos presos o via como sincero e democrata. Comparar-nos com delinquentes e assassinos?! Eu era diplomata. Podia ter ficado calado e continuado a viajar o mundo. Meus companheiros sofrem na prisão. Isso é um insulto que não vamos perdoar jamais. Não somos delinquentes. Somos patriotas. Fizemos muito mais do que ele. Lula não é o Brasil. O Brasil é muito maior do que Lula.
O senhor teme novas mortes na prisão? Quantos presos políticos estão doentes?

ESPINOSA: Todos têm problemas de saúde depois de sete anos de má alimentação, água contaminada, má atenção médica e falta de condições de higiene. Há 26 em estado muito ruim.

O senhor teme uma nova onda repressiva?

ESPINOSA: É possível, porque o governo está numa situação muito difícil: o descontentamento está crescendo e ele perdeu capital político. E o único recurso que tem é a força. Mesmo dentro do Partido Comunista, há pessoas pedindo reformas. Na prática, está sendo criada uma frente contra o totalitarismo. E o instrumento do totalitarismo é a força.

'Isso erode o capital de prestígio político de Lula'

DEU EM O GLOBO

BRASÍLIA. As declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a uma agência de notícias internacional, comparando o dissidente cubano que morreu após 85 dias de greve de fome, Orlando Zapata Tamayo, a bandidos comuns foram desastrosas e minam o prestígio que o presidente e o país acumularam nos últimos anos. Esta é a avaliação do professor titular de Relações Internacionais da UnB Eduardo Viola.

Catarina Alencastro

O GLOBO: Como o senhor avalia o posicionamento do presidente Lula com relação ao dissidente morto em Cuba?

EDUARDO VIOLA: É terrivelmente negativa a declaração de Lula. Erode o capital de prestígio ganho pelo Brasil e por Lula nestes últimos anos. Não é apenas um descuido, mostra uma atitude muito preocupante em relação à insensibilidade ao desrespeito pelos direitos humanos.Cuba é uma ditadura clara há 50 anos, com características dinásticas de reter o poder na mesma família.

E a comparação que o presidente fez entre o dissidente cubano e bandidos comuns de São Paulo?

VIOLA: É vergonhoso comparar um bandido comum a um prisioneiro de consciência. Um bandido comum é alguém que se supõe ter feito muito mal à sociedade, que é o oposto do prisioneiro de consciência, que está justamente lutando para melhorar a sociedade em que vive.

Preocupa essa declaração do presidente?

VIOLA: Isso mostra que nos últimos tempos Lula tem retomado um discurso mais autoritário, que era típico do PT antes de assumir o poder, em 2003. O Plano Nacional dos Direitos Humanos, as críticas frequentes à mídia são outros exemplos. Há um componente autoritário em Lula. Ele está testando a reação da sociedade brasileira. O apoio que o Brasil dá à ditadura cubana, essa comparação foi um desastre.
O senhor acha que o presidente Lula pode estar querendo passar um recado?

VIOLA: Esse movimento procura captar os setores mais radicais para que votem em Dilma. Por um lado, setores extremistas que talvez cogitassem votar em branco podem gostar disso. Mas esses são setores minoritários. É um cálculo arriscado de Lula.
O senhor vê um componente eleitoral nesse posicionamento, então?

VIOLA: Lula tem em seu interior um componente autoritário em sua personalidade. Quando se tem alta popularidade isso é perigoso. O próprio uso da máquina pública para eleger Dilma é uma demonstração de autoritarismo. Ele está usando a máquina estatal maciçamente para eleger uma pessoa totalmente subordinada a ele, com o objetivo de voltar depois (ao poder). Isso é preocupante.

A posição do líder brasileiro pode reforçar a perseguição ao regime cubano naquele país?

VIOLA: Isso causa muita decepção, embora tenha muito pouco impacto sobre os dissidentes cubanos. A ditadura cubana funciona independentemente do resto do mundo. Eles são muito insensíveis ao que acontece fora da ilha.
Na entrevista à agência AP, Lula diz que é preciso respeitar a Justiça cubana. Como essa chancela é recebida internacionalmente?

VIOLA: O Brasil é a única grande democracia do mundo que legitima a ditadura cubana. O mesmo aconteceu quando Lula decidiu apoiar o Irã. Mina o prestígio conquistado pelo Brasil.

O zero positivo:: Míriam Leitão

DEU EM O GLOBO

O PIB de 2009 deve fechar o ano próximo de zero e isso não é uma má notícia. Hoje, o IBGE divulga o PIB do quarto trimestre e fecha oficialmente o ano. Os economistas estão divididos entre o zero e o levemente negativo, mas o último trimestre deve ser um número bem positivo, tipo 2% de crescimento. Com tudo o que houve, o Brasil não se saiu mal

O economista Regis Bonelli lembra que é difícil fazer a projeção exata porque vai depender das mudanças que o IBGE fizer nas variáveis sazonais.

O IBGE revê números dos trimestres anteriores e isso afeta as projeções. Ele prevê que a queda pode até chegar a 0,5%, mas acha que é um bom resultado perto do que foi o desastroso ano de 2009 para o mundo: No ano passado, a indústria caiu muito, a agropecuária teve queda, e só os serviços continuaram no positivo.

Este ano, o país está crescendo forte neste primeiro trimestre, a indústria está com números fortes, a safra será a segunda maior da história, o investimento está aumentando, a construção civil está com forte movimento.

Tudo isso levará 2010 a ter um crescimento de 5,5%.

O mundo discutiu no ano passado se a recessão seria em V, W, U ou L. Cada letra significa uma possibilidade para a curva da saída da crise. Ou uma recuperação rápida, em V; ou uma recuperação e nova queda, em W; uma queda e demora de recuperação, na forma de um U; ou uma recessão mais longa, como um L.

Foi em V. No final, a economia ficou estagnada, mas não foi um ano parado, mas de grandes emoções diz Armando Castelar, da Gávea Investimentos.

Para 2010, ele prevê crescimento de 6%. Mas acha difícil manter esse ritmo por causa da elevação do déficit em transações correntes, que este ano vai a 3% do PIB. O economista Gustavo Loyola, que acredita em -0,3% em 2009 e 5,5% em 2010, também teme que o crescimento não seja sustentável.

O país precisa aumentar nossa capacidade de investimento e poupança explica o diretor-sócio da Tendências consultoria.

A história do ano foi mais impressionante. Existem zeros e zeros, esse é positivo, dado o que se temia no começo de 2009.

No último trimestre de 2008, a indústria tinha caído numa magnitude de 20%. No começo de 2009, houve um medo enorme da indústria e ela parou de produzir, entrou no ano apenas queimando estoques. As exportações despencaram. Mas o mercado interno voltou rapidamente a consumir. Além disso, como reflexos da luta contra a inflação, o Brasil estava com um setor bancário mais protegido lembra Bonelli.

José Márcio Camargo, da Ópus Gestão de Recursos, acha que houve três fatores para explicar a recuperação em V, ou seja, o melhor cenário.

A atuação rápida do Banco Central na liberação do compulsório e redução dos juros, a atuação dos bancos públicos que conseguiram suprir o crédito privado que ficou escasso, e o desempenho da China que beneficiou o Brasil disse.

Regis Bonelli concorda que o Banco Central atuou rápido na liberação do compulsório, mas lembra que o BC elevou os juros em setembro, no início do pior da crise. Ele acha que houve excesso de conservadorismo: De qualquer maneira, o Brasil se saiu melhor do que vários outros países.

É bem verdade que a queda foi forte. Sair de um ritmo de 6% para zero fez o país deixar de agregar R$ 180 bilhões ao seu PIB: Para um país como o nosso, é uma perda pesada diz Regis.

Em 2010, Bonelli acha que o país só não cresce neste ritmo de 5,5% se houver alguma crise séria de financiamento externo provocada pelos países endividados da Europa. Mesmo assim, no máximo isso provocaria uma redução do crescimento.

O Itaú Unibanco prevê queda de 0,2% no resultado de 2009; o Bradesco acha que ficará em zero. A MB Associados estima -0,1%, e que em 2010 o país crescerá 6%.

O padrão do crescimento daqui para frente vai seguir o dos períodos passados.

Cresce forte mas como não temos taxa de investimento e poupança suficientes, a inflação volta e os juros têm que subir diz Sérgio Vale, da MB.

Em resumo: a queda foi forte, mas a recuperação, rápida.

Não foram os 2% da aposta do ministro Mantega nem o desastre que se temia.

O país perdeu em não crescer.

Este ano terá crescimento.

Mas o que o país precisa é crescer por vários anos

Câmara aprova pré-sal que prejudica economia do Rio

DEU EM O GLOBO

Por 369 votos a favor, 72 contrários e duas abstenções, o Estado do Rio foi derrotado ontem, na Câmara dos Deputados, na votação da emenda que revê a distribuição da receita com exploração do petróleo no país - nas áreas já em produção, como a Bacia de Campos, e nas futuras, incluindo o pré-sal. Se for promulgada, a economia do Rio deverá perder R$ 7,2 bilhões por ano, incluindo os recursos destinados ao governo e aos municípios. O governador Sérgio Cabral alertou que os R$ 4,9 bilhões arrecadados pelo estado Ibsen, com royalties e participações especiais em 2009 serão reduzidos a R$ 100milhões, o que quebrará a economia estadual. Cabral e os parlamentares do Rio apostam no - prometido veto de Lula à emenda para evitar o que chamou de deboche. O texto segue ao - Senado.

Câmara faz Rio perder R$ 7 bi

Por 369 votos a 72, estado deixaria de receber recursos do petróleo. Cabral cobra veto de Lula

Gustavo Paul e Cristiane Jungblut BRASÍLIA

O Rio de Janeiro foi derrotado ontem na votação da chamada emenda Ibsen,que revê a atual distribuição da receita com exploração do petróleo nas áreas já em produção, como a Bacia de Campos, e nas áreas futuras,incluindo o pré-sal. Se for promulgada, deverá representar uma perda deR$ 7,2 bilhões na economia estadual, incluindo aí os recursos destinados ao governo e aos municípios.

O governador Sérgio Cabral advertiu que os R$ 4,9 bilhões que o estado arrecadou de royalties e participações especiais em 2009 serão reduzidos a R$ 100milhões, o que quebrará a economia estadual. Cabral e os parlamentares do Rio apostavam no prometido veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à emenda para evitar o que chamou de deboche. O texto segue ao Senado.

Atenção deputados federais: o governo do Rio recebeu em 2009 em torno de R$ 5 bilhões com participações governamentais.

Se os senhores aprovarem a emenda do deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) ele quebra.

Fecha o estado disparou Cabral, no início da tarde, depois de reunir-se com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. No movimento surrealista, nem Salvador Dalí conseguiria fazer algo tão surrealista como essa emenda. É de uma leviandade constitucional, um desrespeito.

Quatro ausências na bancada fluminense
A emenda foi aprovada por 369 votos a favor, 72 contrários e duas abstenções. Enquanto os 10 deputados da bancada do Espírito Santo compareceram em peso, na do Rio foram registradas quatro ausências,entre as quais a de Rodrigo Maia (DEM). Ainda houve um voto a favor da emenda entre os parlamentares fluminenses: o do deputado Adílson Soares(PR). Antes da votação, o líder do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP),subiu na tribuna e tentou alterar o resultado. Ele advertiu que o texto é inconstitucional e os deputados e prefeitos que estiverem contando com mais recursos ficarão sem nada.

Não se pode comprar terreno na Lua. A emenda é inconstitucional, e o presidente Lula será obrigado a vetá-la. Não tomem como ameaça, mas como informação. É incorreto fazer uma disputa contra o Rio de Janeiro disse Vaccarezza, em meio a vaias de deputados.

Os 90 municípios que recebem esses recursos,entre eles Campos, Macaé e Cabo Frio, que levam R$ 2,6 bilhões,passarão a reter apenas R$ 145 milhões. Além disso, Cabral argumentou que o governo federal não teria mais como contar com os recursos do petróleo como garantia ao pagamento da antecipação de receita acordada com a União na gestão da ex-governadora Rosinha Garotinho.

Cabral abandonou a discrição assumida nas últimas semanas. O governador havia sido advertido por aliados políticos a não elevar o tom, sob risco de atrair mais resistência aos interesses do Rio. Para o governo, em novembro passado, ao dizer que os deputados queriam roubar o Rio, o governador deu combustível à emenda Ibsen. Ontem, Cabral disse que a emenda era uma barbaridade e um equívoco, que ainda poderia ser recuperado.

É uma emenda sem pé nem cabeça, que desrespeita e viola um acordo político e a Constituição. Ela é um deboche! Na defesa de sua emenda, o deputado Ibsen Pinheiro admite que o Rio terá perdas,mas disse que ele estava fazendo justiça federativa: Dois estados perdem e um deles significativamente.

Infelizmente, porque é uma receita injusta que não tem fundamento jurídico, nem político, nem constitucional.

Ontem, a base governista procurou costurar uma emenda alternativa, que iria preservar a receita atual de petróleo do Rio, mas colocava em risco a renda com o pré-sal. Sem consenso entre os parlamentares fluminenses e dos demais estados, o texto acabou abandonado, irritando o líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), relator do projeto da partilha.

Isso virou uma esculhambação geral. Os radicais se uniram. O Rio disseque vai votar na emenda Ibsen (porque o Lula vai vetar) disse Henrique,brincando. Até eu vou votar...

Prefiro a emenda Ibsen e confiar no veto do presidente Lula disse o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Briga agora será no Senado e no Judiciário

O veto presidencial é uma das três alternativas sobre as quais se agarram o governo estadual, os prefeitos e os deputados. Segundo o coordenador da bancada fluminense, deputado Hugo Leal (PSC), a próxima etapa do esforço para manter a receita do Rio será feita no Senado. Se não for bem sucedido, o front será o Judiciário.

Preparando esse caminho jurídico, o governo do Rio e a prefeita de Campos, Rosinha Garotinho,presidente da Organização dos Municípios Produtores de Petróleo(Ompetro), estiveram ontem no Supremo, ao lado de outros prefeitos de cidades produtoras. Foi feito um apelo a Gilmar para que seja votada no plenário do Supremo o mérito de uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin), apresentada pelo deputado Geraldo Pudim(PR-RJ), que pede o fim da tramitação da emenda Ibsen. A liminar dessa Adin foi negada em dezembro pela ministra Ellen Gracie, mas o mérito será apreciado pelos demais ministros.

Viemos fazer um apelo ao ministro. Não se pode distribuir (para outros estados) o que não é da União. Esses recursos já fazem parte da receita corrente do estado e dos municípios disse Rosinha.

A emenda Ibsen propõe que sejam somadas as rendas com royalties e participação especial e descontada aparte da União. Isso inclui recursos já auferidos nas áreas em produção como a Bacia de Campos, a maior do país e nas áreas futuras, incluindo o pré-sal. O que sobrar é dividido meio a meio: 50% ficam com os 26estados e o Distrito Federal, e 50% destinam-se aos mais de 5.500municípios.

A votação da emenda encerra a tramitação na Câmara dos quatro projetos do marco regulatório do pré-sal. Ela foi incluída na proposta que estabelece o modelo de partilha de produção no pré-sal.Três projetos já foram aprovados pelos deputados enviados ao Senado: o que cria o Fundo Social com recursos do pré-sal, o que permite a capitalização da Petrobras e o que cria a estatal Petro-Sal. O governo quer aprovar os quatro até o fim deste semestre.