“Dilma não é Lula, nem o seu quatriênio de governo será o mesmo daquele que passou. Aliás, se os registros biográficos servem para algo, não se pode desconsiderar que Lula construiu sua identidade no meio sindical, nas circunstâncias da ditadura militar, avessa a manifestações de uma ética de convicção por parte de um líder operário, e adotou o pragmatismo como lema de vida. Dilma, por sua vez, provém da política, e de uma política, como atesta sua história na resistência armada, orientada pelo culto da vontade, a que, de algum modo, preservou nos seus tempos de militante do PDT de Brizola, um político que também cultuava o primado da vontade em sua forma de agir. Se traços desse estilo pessoal persistem, eles não são favoráveis à difícil tarefa de manter contrários em equilíbrio.
Com Dilma o que se tem é principado novo, e se ingressa, de fato, em uma ordem burguesa racionalizada, que o messianismo implícito de Lula, ao encarnar a representação do povo, sabia temperar. Sem ele e o seu estilo de negociador nato, os interesses e os conflitos de interesses devem fluir mais soltos, evadindo-se da jurisdição estatal e retomando seus lugares na sociedade civil. Para o bem e para o mal, a política promete voltar. “
(Luiz Werneck Vianna, no artigo, ‘E la nave va’, Valor Econômico, 8/11/2010)
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
quarta-feira, 10 de novembro de 2010
Reflexão do dia – Luiz Werneck Vianna
Para além das eleições :: Bernardo Ricupero
Depois de passadas as eleições de 2010, talvez seja o momento de buscar perceber tendências mais profundas que emergiram nos dois turnos. Em primeiro lugar, a terceira vitória de um candidato a presidente do PT abre caminho para o partido se manter 12 anos ininterruptos no poder. Esse é um período suficiente para que o petismo deixe sua marca na política brasileira.
Aparentemente, o governo Dilma Rousseff pretende manter a mesma orientação dos anos Lula, combinando a estabilidade monetária, herdada da administração Fernando Henrique Cardoso, com a redução da pobreza. Dilma e seus auxiliares também dão sinais que pretendem acelerar o crescimento econômico, que tem ocorrido nos últimos anos.
Mas se, em termos gerais, se deve buscar não alterar as diretrizes do governo anterior, a principal incógnita é como fazer isso sem Lula. Ou melhor, um governo que reúne no seu interior o agronegócio e o MST é, em grande parte, uma obra do ex-líder sindical. Nessa referência, é bastante duvidoso que a técnica, escolhida pela primeira vez para um cargo eletivo, demonstre a mesma habilidade para conciliar interesses contraditórios. Além do mais, não se sabe bem como Lula se comportará fora do poder.
Em termos mais profundos, se Dilma tiver sucesso na meta anunciada no seu discurso de vitória, de fazer do Brasil um país de classe média, seu partido talvez tenha o que temer. A julgar pelo mapa eleitoral, o PT tem maiores dificuldades justamente nos estados com classe média mais consolidada.
Significativamente, a oposição voltou a vencer, como já havia ocorrido em 2006, na região Sul, e em São Paulo, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Em contrapartida, diferente do que sugerem alguns analistas, mesmo sem os votos do Nordeste, a candidata do PT ganharia as eleições. No entanto, haveria um quase empate, Dilma tendo recebido no resto do país 50,9% dos votos contra 49,1% de José Serra.
Mesmo assim, o futuro que se anuncia para a oposição parece longe de ser fácil. A questão inicial será saber se haverá ou não disputa pela liderança de seu principal partido, o PSDB. Em outras palavras, se a fila andará e o recém eleito senador Aécio Neves tomará o lugar do ex-candidato a presidente Serra ou se este insistirá em comandar a oposição.
A julgar pelo discurso de derrota do ex-governador de São Paulo, em que fez questão de dizer não “adeus” mas “até logo” ao eleitorado, haverá combate nas hostes oposicionistas. É possível, porém, que as intenções do discurso, feito ainda no clima da disputa eleitoral, não perdurem.
Em compensação, se Serra conseguir liderar a oposição, pode-se imaginar que ela assuma uma orientação mais à direita, como foi a da campanha do segundo turno da eleição presidencial. Tal linha de atuação facilitaria a aproximação e, mesmo, fusão entre PSDB e DEM. A solução tem sua lógica diante da pouco expressiva bancada que os dois partidos elegeram para o Congresso; não mais de 100 representantes na Câmara, divididos entre 53tucanos e 43 deputados do DEM; enquanto no Senado o PSDB passa a contar com uma bancada de 11 representantes e o DEM com não mais que 6 senadores.
Como resultado, Aécio seria afastado do ninho tucano. Um possível destino para o ex-governador de Minas seria o PSB, partido que sai fortalecidodas eleições, passando a ter seis governadores. Dessa maneira, a criação de uma terceira via entre PT e PSDB se tornaria uma possibilidade maior do que foi o Bloquinho, aliança ensaiada por PSB, PDT e PC do B e mesmo a candidatura Marina Silva.
É verdade que os 44% de votos de Serra no segundo turno indicam que há um certo espaço para a direita na política brasileira. É improvável, contudo, que a direita política tenha chances, ao menos no médio prazo, de ser majoritária num país com enormes desigualdades sociais como o Brasil. Outro fator a se levar em conta é que os tucanos manteriam uma cara excessivamente paulista, o que já criou dificuldades para o partido ao longo da campanha desse ano.
O mais provável é que Aécio se torne o novo líder da oposição. Terá, entretanto, o enorme desafio de formular um novo discurso para o PSDB. O ambiente para isso não é dos melhores, com a direção exercida pelo PT sobre a política brasileira sendo pouco questionada no momento.
Se quiser ser bem sucedido, terá provavelmente que agir como em outras situações que partidos, depois de longos períodos de oposição, retornaram ao governo ao assumirem muito do discurso de seus adversários. Foi dessa maneira que, em 1996, o Partido Democrata voltou ao poder nos EUA, depois de 12 anos, com Bill Clinton; o Partido Trabalhista retomou o poder no Reino Unido, em 1997, depois de 18 anos, com Tony Blair, e, em 2010, o Partido Conservador passou a ter o primeiro ministro, depois de 13 anos, com David Cameron.
Mas este artigo, como exercício de futurologia que é, procura apenas indicar uma série de possibilidades que podem ou não ocorrer nos próximos quatro anos. Na verdade, os contornos que a política brasileira assumirá serão principalmente o reflexo da fortuna e da virtù que governo e oposição demonstrarem.
Bernardo Ricupero é cientista político e professor do Departamento de Ciência Política da USP
Chegou a fatura:: Merval Pereira
O Congresso mais fragmentado de todos os que foram eleitos nos últimos anos começa a mostrar suas garras para a futura administração. São dez partidos de peso político na base governista que começam a disputar espaços na futura administração Dilma Rousseff — PT (88), PMDB (79), PP (41), PR (41), PSB (34), PDT (28), PTB (21), PSC (17), PCdoB (15), PRB (8).
Além do peso político dos aliados, a presidente eleita introduziu um novo critério para a formação do Ministério: idealmente 30% dos escolhidos deverão ser mulheres, o que pode significar um esforço de valorização do gênero em um ambiente machista, mas que definitivamente não é critério de meritocracia para nenhum governo, mesmo o chefiado por uma mulher.
Que, aliás, não foi eleita por ser mulher, embora Lula tenha posteriormente tentado justificar sua escolha, e desqualificar muitas críticas, pelo fato de Dilma ser mulher.
Mas há também outros critérios duvidosos que começam a ser exibidos nessa disputa pelo poder político.
O PTB é exemplar da falta de compromissos programáticos dos nossos par tidos. Apoiou a candidatura oposicionista de José Serra até que ficasse mais ou menos claro que ela não chegaria a lugar algum.
A partir daí, seu presidente, Roberto Jefferson — aquele mesmo do mensalão — passou a criticar a organização da campanha de Serra e o próprio candidato — e tinha razão em algumas dessas críticas, como a de que Serra nunca reuniu seus aliados para definir a campanha —, e liberou o PTB para aderir à candidatura governista.
Vencida a eleição, o PTB apresenta sua fatura através do senador Mozarildo Cavalcanti, de Roraima.
Quer ficar com o Ministério do Turismo, que ganhará importância nos próximos anos com a realização da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016.
O interessante é que o senador Mozarildo Cavalcanti foi dos mais combativos opositores ao governo Lula nos últimos quatro anos e era computado em todas as análises como integrante da ala oposicionista no Senado.
Já o PT começou a mostrar a que veio, depois de eleger a maior bancada da Câmara, desalojando o PMDB: quer não apenas a presidência da Casa, mas pretende retomar para os seus alguns ministérios que foram perdendo no segundo governo Lula para que a aliança governista acomodasse os representantes de outros partidos.
Além dos ministérios que já ocupa, o PT quer pelo menos um ou dois dos que cuidam da área de infraestrutura, na suposição de que haverá mais investimentos nos próximos anos. Cidades, hoje com o PR, Transportes, com o PRB, e Minas e Energia, com o PMDB, são alguns dos que estão na mira petista.
E também coloca no seu quinhão o Ministério da Saúde, que passou para o PMDB no segundo governo Lula.
Ao mesmo tempo , o PTB, o PP e o PR formaram um bloco na Câmara para a próxima legislatura que terá 103 deputados. Querem disputar de igual para igual com PT e PMDB as presidências de comissões e cargos na Mesa Diretora. E, quem sabe, formar um futuro par tido de centro mais adiante.
Já o PSB, o partido da base que mais cresceu proporcionalmente, também já mandou seus recados.
Usou seus seis governadores eleitos para respaldar a proposta de recriação da CPMF, uma tentativa tosca da futura administração de aumentar a carga tributária fingindo que nada tem a ver com isso.
Como a ideia está tendo uma rejeição muito grande, pelo que representa de aumento de custos para a sociedade e, ao mesmo tempo, de enganação por parte do governo, que passou a campanha inteira defendendo a redução da carga tributária, a futura administração já começa a ter que lidar com as questões concretas de ter que cortar gastos para equilibrar as contas públicas e ter dinheiro para os investimentos que serão necessários.
É por isso que volta a ganhar corpo a proposta “rudimentar” apresentada pelo então ministro da Fazenda Antonio Palocci de manter as despesas do governo crescendo menos do que o Produto Interno Bruto (PIB).
O ministro Paulo Bernardo, que deve permanecer no Ministério de Dilma, embora não necessariamente no Planejamento, está do mesmo lado que há cinco anos, defendendo a mesma tese: com a medida, em quatro anos o governo conseguiria dobrar o volume de investimentos.
Mas o PSB, ao mesmo tempo em que socorre o governo, também mostra que tem condições de fazer política para além da hegemonia do PMDB e do PT.
Lançar a candidatura de Aécio Neves, do PSDB, à presidência do Senado é só uma maneira de chamar a atenção para outras possibilidades dentro de alianças políticas numa base tão fragmentada, onde cada um cuida de seu interesse partidário.
O PMDB, pragmático, está propondo simplesmente que cada um mantenha o que já tem.
Os conflitos ideológicos, que serão inevitáveis dentro de uma aliança tão diversa quanto a que está sendo montada, também aparecem na oposição.
O PPS já declarou, através de seu presidente, o deputado federal eleito por São Paulo Roberto Freire, que se sentiu incomodado com a discussão sobre o aborto ocorrida na campanha presidencial e que pretende fazer uma oposição ao governo Dilma “pela esquerda”, dissociando-se assim de uma ligação com o Democratas, que forma no bloco de oposição, mas pretende explorar cada vez mais o que identificou como uma tendência conservadora do eleitorado brasileiro.
Fogo nos marimbondos:: Dora Kramer
O ministro Franklin Martins, da Comunicação Social, nem parece que está saindo do governo tal a assertividade de suas palavras ontem no seminário internacional Comunicações Eletrônicas e Convergência de Mídias, organizado para discutir a proposta de regulamentação da área de telecomunicações que será concluído antes do fim do mandato do presidente Luiz Inácio da Silva.
"Nenhum grupo tem o poder de interditar a discussão, que está na mesa e terá de ser feita. Em clima de entendimento ou de enfrentamento", disse ele, com a convicção dos que têm a força.
Franklin Martins já disse particular e publicamente que não vai continuar no governo Dilma.
Considerando que o referido anteprojeto só poderá ser analisado pelo Parlamento no ano que vem, é de se imaginar que tenha recebido carta branca da nova presidente para "bancar" o interesse do governo de mobilizar sua maioria para assegurar a tramitação da polêmica proposta por bem - na base na busca do consenso - ou, se não for possível, por mal mesmo.
Por "enfrentamento" é de se supor que o ministro esteja se referindo a um confronto com os que na sociedade e no Congresso forem contrários à proposta do governo.
Por ora não se sabe bem qual é o teor do anteprojeto, cuja discussão "pega" no ponto de sempre: a ideia de controle de conteúdo. Franklin assegura que tais temores são infundados, embora toda documentação produzida pela conferência de comunicação que o governo patrocinou no ano passado e pelo último Congresso do PT digam o contrário.
Interessante, porém, é um item específico que o ministro adiantou ontem e que precisa de urgente regulação: a propriedade de veículos de comunicação por políticos. É proibido, mas ninguém respeita. "Porque a discussão é evitada e agora é a oportunidade para que se discuta tudo isso", diz Franklin.
Está coberto de razão. Agora, é de se conferir se a nova presidente, Dilma Rousseff, vai querer mesmo enfrentar a discussão e com ela boa parte do Congresso, que controla emissoras de rádio e TV.
A começar por seus poderosos aliados, sendo os mais notórios o presidente do Senado, José Sarney, e o presidente da Comissão de Infraestrutura, Fernando Collor de Mello, para citar apenas os mais notórios de uma lista enorme que estariam, nesse caso, muito mais dispostos ao enfrentamento que ao entendimento.
De onde se conclui que dificilmente o exemplo citado pelo ministro seja de fato um dos alvos da regulamentação.
Ao vento. Foi mais uma das inúmeras tentativas de maquiar a realidade, mas, à parte a inadequação de sempre, qual a importância da avaliação do presidente Lula de que "o Enem foi um sucesso total", diante dos acontecimentos e da proximidade de sua despedida da Presidência?
Nenhuma, a não ser a oportunidade perdida de abordar o assunto com maturidade, tratando dos erros como tais, mas aproveitando para reforçar a importância do exame, oferecer alento aos estudantes prejudicados e dar o primeiro passo no rumo da recuperação da credibilidade do Enem.
Como não há novidade na atitude do quase ex-presidente, nesta altura só seria de se lamentar se a presidente eleita Dilma Rousseff também manifestasse essa posição politicamente competitiva frente aos problemas nacionais.
Estelionato. Se os salários dos parlamentares estão defasados, se o aumento proposto agora é indispensável e se, como diz o senador José Sarney, cabe ao atual definir a remuneração do futuro Congresso, por que o assunto não foi ventilado antes das eleições?
Porque, assim como ocorre com a proposta de recriação da CPMF, entre a honestidade e o risco de perder votos, a primeira é causa perdida.
Cenografia. Nada mais distante da realidade do poder de fato que a foto nos jornais de ontem com Michel Temer "presidindo" a reunião da equipe de transição repleta de petistas estreladíssimos.
Um enredo que embaraça o DEM:: Rosângela Bittar
Chave do nó está em um tempestivo "anarriê"
O Democratas, análises de evidências e fatos provam, saiu maior do que entrou nas eleições de 2010. Na antevéspera da disputa, sim, encontrava-se realmente alquebrado. Tinha um candidato a vice-presidente na chapa de oposição escolhido à última hora e à revelia da direção partidária. Tinha expulsado, por corrupção, seu único governador, cristão novo no partido, no comando, à época, de um quadradinho - o do Distrito Federal - sem peso político.
Sem liderança, transformado em inimigo número 1 do mito, elegeu dois governadores, cravando uma estaca no coração do presidente Lula que havia implorado, pública e insistentemente, pela derrota do DEM exatamente nos Estados onde venceu, Santa Catarina e Rio Grande do Norte.
Continuou, pelas urnas de 2010, sendo a quarta bancada na Câmara Federal depois de 10 anos lutando na oposição, uma proeza para o partido que nasceu, viveu e se aculturou no governo. Está na oposição há mais tempo que o PSDB. Reduziu de 56 para 43 seu efetivo, mas ainda é maior que o PP, PSB, PDT, PR, PTB, PPS, PCdoB, PV, PSC, que estão aí no jogo político sem ninguém decretar sua irremediável e iminente morte. No Senado também caiu muito numericamente, de 13 para 7 senadores, perdeu líderes importantes, e não conseguiu ficar na terceira posição que tinha antes, mas ficou na quarta, perdendo para os mesmos PMDB, PT e PSDB que estão à sua frente na Câmara. Porém, maior que todos os demais. Um parceiro não desprezível, por exemplo, para as composições e disputas de poder entre os grandes.
Apesar de tudo isso, vive uma crise fortíssima, um impasse tal que, a impressão primeira, é que só um mágico conseguiria levá-lo à superação. O partido está dividido, ferido, com as posições radicalizadas, sem soluções óbvias à vista.
Seu maior líder, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, não aceita mais o comando do presidente da legenda, Rodrigo Maia. Convidado por Orestes Quércia para transferir-se ao PMDB, pensa na proposta, deve até aceitá-la. Não se vislumbra, porém, como seria essa vida política do Kassab, de repente, no lulismo, no dilmismo, ou no governismo, pois o PMDB é governo, e governo federal, em São Paulo, onde Kassab tem sua base e ampliou liderança, é Michel Temer, no PMDB, e Marta Suplicy e Aloysio Mercadante, no PT. Todos distantes de Quércia.
O prefeito procura um prumo, e não parece ver opções a não ser ingressando na dissidência quercista, desmotivada a lutar internamente depois do agravamento da doença de seu líder. Ou mesmo prestando continência a Temer, no governo, a Mercadante e Marta, por tabela. Uma migração que carece de sentido, pelo menos para os leigos.
A senadora Kátia Abreu é a outra maior líder do partido, tem visibilidade, comando, foi vitoriosa nas urnas, é quem mais agrega grupos, tem conexões com as cúpulas partidárias antigas e novas. Como presidente da Confederação Nacional da Agricultura, porém, não poderia presidir um partido de oposição, nem liderá-lo de uma forma mais efetiva. Seria uma impropriedade que mais levaria problemas ao DEM, e à entidade, do que soluções.
O senador Demóstenes Torres (GO), com uma atuação reconhecida e uma campanha vitoriosa este ano, está nos planos do governador eleito de Goiás, Marcone Perillo, para ser peça importante nas eleições municipais de 2012, além de ser a alternativa de representação do partido no Senado em cargos de liderança e direção nas comissões temáticas.
O senador Agripino Maia (RN) foi espetacularmente reeleito, superando a campanha pessoal movida contra ele pelo presidente Lula, mas se partir para sua enésima disputa da liderança no Senado deve aumentar o cordão dos descontentes e se enfraquece internamente. O Democratas do Rio, embora fornecendo o vice na chapa presidencial da oposição e tendo hoje a Presidência do partido, a primeira da renovação promovida pela velha guarda, entrou e saiu da eleição sem ânimo.
O candidato ao Senado, Cesar Maia, maior liderança do partido no Estado e uma das maiores do país, ficou em quarto lugar na disputa que elegeu dois. O presidente do DEM, Rodrigo Maia, seu filho, viu sua votação a deputado federal reduzida dos 235.111 votos de 2006, 2,9% do total do Rio, a 86.162 votos, em 17º lugar, menos votos que Arolde de Oliveira, que exerce influência sobre outro grupo político do DEM. Terá Maia ficado mais dócil ao aconselhamento dos mais velhos depois disso?
A presidência ficou com o filho de César, mas a liderança do partido na Câmara já passou por outros herdeiros. O fato é que a sucessão no partido e a transição às novas gerações ainda não provou resultados: os filhos de Cesar, de Jorge, de Efraim, de Agripino, de Paulo Souto, e o neto de ACM, todos sem apetite de articulação política, sem vontade de aprender e demonstrando um precoce enfado, não foram até agora a solução esperada.
Se o senador do PSDB, Aécio Neves, for mesmo liderar a oposição no Congresso, sua tendência seria manter os laços com o grupo jovem, notadamente com Rodrigo Maia, seu aliado na disputa com o PSDB de São Paulo pela candidatura à Presidência da República. Porém, não se sabe, pelo menos o DEM ainda não sabe, até onde vai essa disposição do ex-governador mineiro que, de qualquer forma, não conduziria a totalidade do DEM, exatamente por ter preferência por um grupo.
Contraditoriamente, o partido, que saiu mais forte, está internamente destroçado, como se vê. O DEM é uma crise ampla. Talvez fosse o caso de voltar atrás, de fazer um tempestivo anarriê, ir ao ponto de partida da mudança de nome e dessa transição para as novas gerações, para experimentar pressioná-las a assumir para valer as rédeas da agremiação ou reconhecer, finalmente, que a ideia sucumbiu e refazer os planos. O ex-governador, ex-senador, ex-embaixador e ex-presidente do partido Jorge Bornhausen pode ser a chave para o desenlace do dramático nó de tantas pontas.
Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras
O embuste da CPMF:: Fernando Rodrigues
BRASÍLIA - Uma mentira repetida mil vezes vira verdade. Uma bobagem também. Por exemplo, o suposto benefício colateral da volta do imposto do cheque: permitir ao governo combater a sonegação por saber exatamente qual é a movimentação financeira oficial de cada brasileiro com conta bancária.
Técnicos, políticos de oposição e governistas, quase todos, apontam esse aspecto em defesa do retorno da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira.
Como os bancos ficam obrigados a recolher um percentual fixo sobre todas as operações de seus clientes, a Receita Federal passa a ter uma ferramenta útil para perseguir quem não paga impostos.
O raciocínio é indigente ou de má-fé. Ou as duas coisas.
Já existem e estão em vigor uma lei e uma instrução normativa da Receita Federal a respeito de movimentações financeiras. Depois que o Senado impediu a renovação do imposto do cheque, no final de 2007, criou-se um novo instrumento: a Declaração de Informações sobre Movimentação Financeira.
Trata-se de uma declaração que bancos estão obrigados a fazer. Nesse documento devem estar os dados de todos os correntistas cuja movimentação supere R$ 5 mil por semestre. No caso de empresas, o valor é de R$ 10 mil.
Ou seja, hoje o governo já sabe muito bem o que uma parcela significativa de contribuintes faz. Fica de fora só quem movimenta, entre saques e depósitos, menos de R$ 5 mil a cada seis meses.
Qual a razão então de criar algo tão regressivo como a CPMF? Dezenas de reportagens, inclusive uma recente de Gustavo Patu, já provaram a ineficácia desse tributo como fonte financiadora da saúde pública. Para combater a sonegação, só duplicaria uma norma existente. Tudo considerado, é fascinante como a frágil defesa do imposto do cheque continue sendo repetida pelos detentores do poder -inclusive por Dilma Rousseff.
CPMF, ENEM e “controle social da mídia” : em três tempos, o jeito petista de governar:: Bolivar Lamounier
O governo federal e os governos estaduais interessados parecem dispostos a promover a ressurreição da CPMF dentro do mais fajuto jeitinho brasileiro que se possa conceber. Um diz que o outro quer, o outro diz que o um é que quer, e uma hora dessas ela ressuscita.
Não tendo sequer a unanimidade da categoria, os governadores interessados obviamente preferem que a presidente eleita assuma a parte principal do ônus.
Ela, embora tenha reiteradamente prometido não criar novos impostos, não vai se fazer de rogada . Cortar gastos ela só vai quando estiver com o pescoço na forca. E afinal, se a idéia é tributar mais, onde é que se vai encontrar pretexto melhor que o financiamento da saúde ?
Sobre o ENEM, é difícil acrescentar algo ao que a imprensa vem publicando desde sábado.
Reconhecendo (e como poderia não reconhecer ?) a trapalhada, o ministro da Educação propôs reaplicar o exame só aos estudantes diretamente prejudicados. A Justiça Federal entendeu que o estrago é maior e que a única solução aceitável é fazer tudo de novo. O ministro disse que vai recorrer.
Qualquer que seja o caminho finalmente adotado, fato é que nem burocratas subrepticiamente empenhados em desmoralizar o exame fariam melhor. O que estamos assistindo – pela segunda vez - é uma cena explícita de incompetência. E não me digam que vale a pena ver de novo.
Por último, o famigerado “controle social da mídia”. Com a sutileza que o caracteriza, o ministro Franklin Martins declarou que o controle vai sair por bem ou por mal . As empresas jornalísticas que se cuidem. Vão dar com os burros n’água se tentarem se opor ao projeto que o governo atual deverá legar a Dilma Rousseff.
Isso aí é o que o czar da comunicação declarou no início de um seminário que inventou para dar ares cosmopolitas a um conjunto de sugestões elaborado em 2009 por partidos de esquerda, Ongs e “movimentos sociais”, todos eles muito devotados às liberdades de imprensa e de expressão, como se pode imaginar.
Assumindo a presidência em janeiro e contando com a maioria na Câmara e no Senado a partir de fevereiro, Dilma Rousseff estará em tese capacitada a arrancar virtualmente o que quiser do Congresso.
Portanto, se logo de saída a presidente quiser mandar um sinal negativo à imprensa, no Brasil e no exterior, poderá fazê-lo com um gesto dos mais singelos. Bastará manter no cargo o ministro sob cuja mesa a serpente vem chocando o mencionado ovo.
Os educatecas do Enem levaram bomba :: Elio Gaspari
Haddad acreditou no que disse, foi de Waterloo para Stalingrado, e a conta do fracasso foi para a garotada
O presidente do Inep, Joaquim José Soares Neto, titular da lambança ocorrida com a prova do Enem, deveria ter pedido demissão no sábado, desculpando-se aos 3 milhões de jovens cuja vida atrapalhou. Não tendo-o feito, o ministro da Educação, Fernando Haddad, deveria tê-lo demitido na segunda-feira. Não tendo-o feito, Haddad deveria ter pedido demissão ontem.
Os educatecas do Inep e Haddad mostraram que um raio cai duas vezes no mesmo lugar. No ano passado, uma sucessão de prepotências e inépcias transformaram o projeto do Enem como substituto do vestibular num dos maiores fracassos do governo Lula. O ministro culpou a lei das licitações. Livrou-se dela e foi de Waterloo para Stalingrado.
O educateca pernóstico é o sujeito que inventa um teste de "linguagem, códigos e suas tecnologias" para designar aquilo que se chamava prova de português. É um chato, mas não faz mal a ninguém. Maligno é o educateca com alma de bedel. O doutor Soares Neto, por exemplo.
O Inep proibiu que os estudantes levassem lápis para a prova. Com isso tirou o direito da garotada de rabiscar cálculos e anotações à margem da prova. Na hora de aporrinhar, o educateca pode tudo. Na hora de fazer o seu serviço, pode nada.
O dia do Enem é uma jornada de tensão na vida de milhões de jovens e de suas famílias. A nota do teste habilita os estudantes para as bolsas do ProUni e em muitos casos determina-lhes o futuro. Nessa hora, em vez de o poder público aparecer com uma face benevolente, vem com os dentes de fora.
Em 2009 furtaram-se as provas; em 2010, inverteram-se os gabaritos e distribuíram-se exames com questões repetidas ou inexistentes. Segundo o MEC, a responsabilidade é da gráfica. Segundo a gráfica, a lambança atingiu apenas 0,33% dos 10 milhões de cadernos. Conclusão: 100% da culpa é das vítimas.
Descobertos os erros, não ocorreu aos doutores tirar dos portais do Inep e do MEC uma autoglorificação do doutor Soares José Neto Joaquim: "O primeiro dia de provas do Enem transcorreu em normalidade". Segundo ele, a lambança "de forma alguma prejudica a credibilidade do Enem". Empulhação.
No dia seguinte, ameaçaram chamar a Polícia Federal para xeretar tuiteiros. (A propósito, inversões são um estorvo. O nome do educateca é Joaquim José Soares Neto.)
O ministro Fernando Haddad foi de Waterloo para Stalingrado porque acreditou nas próprias promessas. Quis fazer uma coisa, fez outra, deu errado em 2009 e voltou a dar errado em 2010. Quando o Enem/ Vestibular foi lançado, a garotada poderia fazer a prova duas vezes por ano, talvez três. Desistiram, preservando a máquina de moer carne, obrigando o jovem a jogar seu futuro num só fim de semana.
Haddad e o Inep sabem que um similar americano do Enem, o SAT, é oferecido à garotada em sete ocasiões ao longo do ano. O teste é feito on-line e as questões são praticamente individuais, complicando-se conforme o desempenho do estudante. Os educatecas não gostam desse exame, porque os obrigaria a trabalhar muito mais, expandindo seu acervo de questões e obrigando-os a conviver com uma cultura de provas eletrônicas, abandonando o método medieval do papel e caneta (lápis é proibido).
Burocrata gosta é de assinar contrato, de preferência sem licitação. Deu no que deu.
E a barganha original venceu a ilusão virtual :: José Nêumanne
João Santana, o Patinhas, letrista de Gereba e Capenga, do Grupo Bendegó, banda cujo nome celebra o meteorito caído no sertão da Bahia em 1784, virou "o" marqueteiro dos presidentes desde que comandou a propaganda dos triunfos eleitorais de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006, de Maurício Furnes em El Salvador, em 2009, e agora de Dilma Rousseff. Pelo que revelou em entrevista exclusiva a Fernando Rodrigues, da Folha de S.Paulo, saiu da campanha de 2010 grato aos adversários em geral, e aos tucanos em particular, a cuja alienação atribuiu, em parte, o triunfo da candidata oficial. Terá ele razão?
Um pouco, sim. Mas talvez a tivesse mais ainda se se referisse especificamente à reeleição do presidente há quatro anos, e não ao pleito deste ano. Em 2006, o escândalo do "mensalão" levou o PSDB e o PFL à ilusão de que, fosse quem fosse, seu candidato venceria Lula, politicamente debilitado pela denúncia de Roberto Jefferson de ter comprado apoio parlamentar. O ex-prefeito de São Paulo José Serra e seu correligionário Geraldo Alckmin, à época no governo do Estado, se enfrentaram num cabo de guerra feroz para ver quem seria escolhido pelo partido para derrotar Lula. Consta que, quando foi sugerido ao chefão do então PFL, Antônio Carlos Magalhães. que propusesse o impedimento do presidente, ele desdenhou: "Que nada! Vamos deixar o porco sangrar até a eleição e torrá-lo nas urnas." Os tucanos omitiram-se ao não punir seu presidente nacional de então, Eduardo Azeredo, acusado de ser o "pai" do "mensalão" em Minas Gerais. E tiveram de se contentar, como ocorreu nos últimos pleitos, com o Palácio dos Bandeirantes, deixando o Planalto em comodato para o Lula de sempre e a "companheirada" de fé.
Em 2010, a história foi outra e, se Patinhas a conhece, não quis contá-la inteira. Desde que assumiu o segundo mandato, o presidente dedicou-se à tarefa de eleger o sucessor, já que preferiu esta hipótese ao desgaste a que poderia ficar exposto se tentasse emendar a Constituição para disputar ele próprio mais uma reeleição. O ex-dirigente metalúrgico teve paciência de relojoeiro e tino de mercador fenício na tessitura de seu projeto de permanência no poder.
Começou a construção pelo alicerce - do jeito que lhe ensinaram os mais velhos, entre eles um sábio adversário, Tancredo Neves. O dr. Tancredo dizia que ninguém chega à Presidência da República sem unir seu Estado. Lula radicalizou o ensinamento e resolveu unificar todos os grotões, conquistando a adesão das lideranças locais. Sim, é verdade que ele tornou o Bolsa-Família um formidável cabo eleitoral e também contou com o vento a favor de uma popularidade que atingiu os píncaros de 83% na época da eleição. Mas não ficou esperando que apenas isso alavancasse o soerguimento de seu "poste", que sempre foi pesado - e ele sabia. Dilma não é petista histórica, tem carisma zero e um talento de comunicadora inversamente proporcional ao do padrinho. Por isso ele costurou alianças indissolúveis com as lideranças municipais, deputados estaduais e federais, senadores e governadores. Mal a campanha começou, sua candidata já tinha a vitória assegurada.
Pode-se dizer que para tanto ele vendeu a alma (dela) ao diabo. Compôs com o que há de pior em nossa rasteira politicagem regional, aliou-se a inimigos figadais do PT ideológico de antanho e não descuidou de nenhum detalhe. A avalanche de milhões de votos registrados nas urnas eletrônicas do sertão nordestino resultou de um trabalho que incluiu a cassação pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), de dois governadores oposicionistas - Cássio Cunha Lima (PSDB), da Paraíba, e Jackson Lago (PDT), do Maranhão. Quem festejou com isso a restauração da moralidade no pleito se esqueceu de que Marcelo Déda (PT), de Sergipe, escapou de processo similar e se reelegeu no primeiro turno. Restou Teotônio Vilela (PSDB), em Alagoas, mas, como é notório, este Estado é feudo do governista Renan Calheiros (PMDB). E foi assim que não houve palanques no Nordeste para a oposição e a candidata governista nem teve de se expor às intempéries da soleira sertaneja, porque os aliados a representaram à altura. Na Paraíba, por exemplo, os dois candidatos com chances, Ricardo Coutinho (PSB), o vencedor, e José Maranhão (PMDB), o governador, fizeram a campanha por ela.
Assim como em 2006 Alckmin imaginou que anularia a máquina pública com o decrépito discurso moralista da UDN, Serra, em 2010, enredou-se nas próprias fantasias vãs. O Patinhas baiano descreveu, na entrevista citada acima, como a oposição imaginou que a candidata governista, inexperiente e tatibitate, afundaria nos debates. Na campanha real, os debates tornaram-se inúteis pelo esvaziamento do interesse neles, provocado pelos próprios marqueteiros dos candidatos, que os cercam de proibições esterilizantes. Mas, ainda que valessem, qual teria sido mesmo o debate em que Serra esmagou Dilma sob sua "poderosa" argumentação?
Lula nunca teve escrúpulos muito em conta e na campanha recente os enfiou numa gaveta fora do alcance de quem quer que fosse. Desrespeitou a mesma Justiça Eleitoral que asfaltou as veredas de sua candidata nos grotões, fazendo pouco da lei e zombando de eventuais e esquálidas punições. Desprezou os princípios do Estado Democrático de Direito relativos ao bom proveito do rodízio no poder ou ainda à igualdade de oportunidades na disputa. Só que também o adversário-mor lhe deu uma boa mãozinha. Serra pretendia chegar à Presidência sem dever favores a ninguém, mostrando que não aprendeu com seu fiasco anterior, as derrotas de Lula e o impedimento de Collor que é quase impossível vencer sozinho. E quem ganha não governa.
A revelação dos podres da grande família de Erenice Guerra no palácio só adiou, não evitou a vitória de Lula-Dilma, conforme Patinhas, leitor de pesquisas. Prevaleceu a barganha original sobre o escândalo ocasional.
Jornalista e escritor, é editorialista do "Jornal da Tarde"
O duopólio e o partido único :: Roberto DaMatta
Com o fim do monopólio aéreo, ninguém mais sofre, exceto os passageiros
Estou de novo num aeroporto.
Outro dia fui impedido de resgatar milhas, hoje estou numa espera sem justificativa. Impotente, faço como todo brocha: reflito ansioso sobre a situação. Não posso deixar de pensar na Varig e no duopólio.
Pois até no monoteísmo, quando só há um Deus, ele é uma Santíssima Trindade e tem uma Virgem Mãe. Tudo a ver com o momento político, já que todo monismo acaba em pluralismo. Finda a eleição que juntou, recomeça o sofrimento do cidadão frente aos velhos problemas que fragmentam. Mas há coerência. Pois, se a promessa é governar para os esfaimados, quem anda de avião é um faminto pagante, o que, convenhamos, não deixa de ser uma versão brilhante do socialismo à brasileira. Seguindo o axioma de Marta Suplicy: relaxo e gozo quando, em pleno vôo, e, tangido pela fome dos pobres de Deus, devoro barrinhas de cereal e nanosanduíches de fudele de peru com creme de barbear.
Num país onde somente agora, em pleno século 21, se tenta excluir bandidos dos cargos eleitorais e que começa a ficar incomodado com o fato de os poderosos não terem que seguir a lei e a desconfiar que reclamar é um direito, e não falta de educação, admito que há progresso. Comportome, pois, como o anticidadão que sempre fui. Escrevo e, no silêncio que mata, entendo qual é o meu lugar! No Brasil, o antiliberalismo inventou “partidos democráticos” cujo objetivo era o de destruir as outras agremiações que, por sobrevivência ou malandragem, deveriam integrar o grande rio ideológico capaz de não só promover o progresso, mas de resolver (eis a nossa concepção hierárquica de democracia liberal!) — e de resolver de uma vez por todas! — os grandes problemas com magníficas reformas de base. Na reinvenção do liberalismo, toldamos a liberdade dos outros.
Um desses partidos está no poder. E, se o poder destrói os inimigos, ele cria a arrogância que desmascara os amigos.
Com isso, aquele partido ideológico exemplar, que não roubava nem deixava roubar, tornou-se um vasto pântano e pariu um líder nacional personalista e tragicômico. Um grande guia que, com um excepcional populismo popular, subverteu a obsessão monista de sua agremiação, cujo alvo era defender os interesses dos pobres e famintos.
No poder, a ilha vira continente. Tal como o Plano Real acabou com a inflação das múltiplas moedas, na esfera política o partido dominante transformou seu líder no principio exclusivo do poder.
Não se diz tudo numa crônica. Mas pode-se apontar as transformações não previstas pelo monismo petista. De cara, o enorme papel do cara. Depois o fracasso da ejaculação precoce do ex-capitão do time, o notório Zé Dirceu, ato que liquidou a liderança ideológica e simultaneamente promoveu, com o sucesso do Plano Real e das medidas macroeconômicas que eram a herança maldita do governo tucano, um dinamismo inusitado do consumo com suas contradições e polifonias. Surge então uma dualidade curiosa: os aliados de modernização, como o PSDB, passam a ser inimigos mortais; e os velhos reacionários — os coronéis dos grotões — tornam-se amigos do coração.
Essas reviravoltas permitiram ao guia escolher e eleger um sucessor feminino virgem do PT e de disputa eleitoral. Algo inusitado numa terra onde, como dizia um dos aliados de Lula, expulso da presidência por corrupção, seria preciso ter “aquilo roxo” para governar.
No campo do transporte aéreo sucedeu algo semelhante. Uma companhia que dominava e era um símbolo nacional foi liquidada. O que era um, virou dois e agora há o orgulho de se viver num momento mágico no qual tudo cabe, inclusive a destruição de uma empresa que recebeu como um estertor o fundo de pensão dos seus trabalhadores logo usurpado pelo governo.
Com o fim do monopólio aéreo, ninguém mais sofre, exceto os passageiros sujeitos a duas empresas que podem escusar o respeito que o ardiloso capitalismo liberal exige de quem paga. Se sou contra isso? Se escrevo por mágoa porque uma das maiores vilezas do governo Lula foi, além do mensalão, liquidar a Varig que com ela levou meu filho para o cemitério, a resposta direta é um claro, doloroso e sincero SIM! No plano geral, vale chamar atenção de como um projeto de poder à stalinista, acabou por promover mais capitalismo e mais liberalismo. Muito mais do que nos oito anos de FHC. Pela mesma lógica, o partido da justiça social liquidou uma enorme empresa sem pensar nos seus trabalhadores. Mas o sucesso da eleição de Dilma abala inesperadamente a tese do “salvador carismático da pátria”, pois a imagem da mãe está muito mais próxima do liberalismo que se abre a si mesmo, recriando-se diariamente, do que dos velhos autoritarismos que não suportam diferenças.
No plano pessoal, o da tal crônica clássica, porém leve e um tanto carnavalesca, que, dizem os entendidos, é um achado brasileiro, eu confesso que o duopólio aéreo simboliza a morte do meu filho mais velho. Para ficar no que pode ser dito, ele traz de volta o sofrimento e o desejo humano de restituição, que só vai terminar quando eu morrer. Não posso ter meu filho de volta, mas posso sublimar a experiência dolorosa de sua perda chamando atenção para a enorme traição feita com a Varig. Falo com viés, tomo partido. E por que não se isso foi a única coisa que aprendi com o PT e com o Lula? Mas com uma diferença fundamental: a morte do meu filho não tem dois pesos e duas medidas, como tudo neste governo, que, felizmente, está também indo embora.
ROBERTO DaMATTA é antropólogo.
DEM pode deixar de existir
Em busca da sobrevivência política, partido cogita a possibilidade de fundir-se ao PSDB ou ao PMDB, hipótese que converteria em aliado um opositor ferrenho ao governo Lula
Ivan Iunes
Partidos que sofreram as maiores derrotas durante as eleições, DEM e PPS enfrentam um truncado jogo de alianças e acordos até o fim do ano para definir uma mudança de curso que recoloque as legendas em uma rota de sobrevivência política. Enquanto os sucessores do antigo PFL estudam a fusão com o PSDB e até um desembarque no PMDB — o que jogaria a legenda na bancada governista —, os socialistas tentam se afastar da imagem conservadora dos atuais aliados para marchar rumo a uma oposição mais branda ao governo federal.
Depois de perder 22 cadeiras na Câmara e seis no Senado com o resultado do pleito de outubro, o DEM estuda se unir a outras siglas para manter parte do cacife político. Na oposição desde a primeira eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, o partido viu a bancada se reduzir dramaticamente. Da quase uma centena de deputados federais eleitos em 1998, sobrarão apenas 43 a partir de 1º de fevereiro, data da posse dos novos parlamentares.
Diante dos números, os maiores expoentes da legenda estudam a fusão com PSDB ou PMDB. Na prática, isso significa dizer que a sigla poderia tomar um caminho insólito e apoiar o governo petista depois de fazer oposição ferrenha a Lula nos últimos oito anos.
O maior temor do DEM é que uma janela para a troca de partidos seja aprovada pelo Congresso e a bancada se reduza ainda mais com a migração de parlamentares para a base governista. “Estamos extremamente fragilizados. O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, tem conversado com vários partidos, sempre com um cenário de fusão”, revela o deputado federal Guilherme Campos (DEM-SP). De acordo com o parlamentar, o presidente do partido, deputado Rodrigo Maia (RJ), também tem participado dos encontros.
Ao negociar um desembarque na bancada governista, o DEM praticamente implodiria a oposição ao Palácio do Planalto durante o governo de Dilma Rousseff, já que o grupo ficaria reduzido a PSDB, PSol e PPS, que, juntos, detêm apenas 68 dos 513 assentos na Câmara dos Deputados. Por isso, os atuais partidos da bancada governista desconfiam das reais intenções da legenda. Entendem que a negociação aberta seria mais uma forma de pressionar o PSDB a garantir maior espaço nas composições estaduais e municipais. O maior interessado é justamente Kassab, que termina o mandato na Prefeitura de São Paulo em 2012 e almeja chegar ao Palácio dos Bandeirantes, que será ocupado por Geraldo Alckmin (PSDB) nos próximos quatro anos.
Musculatura
Se o destino do DEM passa por São Paulo, o PPS tenta formar uma frente com partidos menores para tentar ganhar um mínimo de musculatura no Congresso. A legenda viu reduzir de 22 para 12 o número de deputados na Câmara e tem apenas Itamar Franco (PPS-MG) no Senado. O presidente do partido, Roberto Freire, analisa que o caráter conservador abraçado pelos aliados PSDB e DEM durante as eleições prejudicou em especial o partido, que pretende se inserir em um discurso de centro-esquerda. “Tivemos erros crassos na campanha que se encerrou, como fazer uma oposição que aplaudia o governo, sem citar a correção necessária de rumos, sem espírito crítico”, critica Freire.
O partido se aproxima de grupos mais alinhados ao Planalto, como PV e PSol. O próprio Freire admite voltar à bancada governista, de onde saiu depois do escândalo do mensalão em 2005, desde que o Palácio do Planalto altere a atual política econômica.
Na África, Lula defende Estado forte
Chico de Gois, enviado especial
MAPUTO. Em jantar diante do presidente de Moçambique, Armando Guebuza, e outras autoridades, o presidente Lula disse ontem que os oito anos de seu mandato passaram rápido porque ele tem uma boa avaliação. Pela manhã, durante palestra na aula inaugural da instalação do polo da universidade aberta do Brasil em Moçambique, Lula afirmara que os altos índices de aprovação ocorrem porque ele não fica no gabinete conversando com jornalistas, mas, sim, viajando.
Lula defendeu um Estado forte, dizendo que a instituição é pai, tutor e filho da sociedade. O presidente disse ainda que sentirá falta dos microfones: — Terminado o meu ritual institucional, eu queria — já que estão faltando menos de dois meses para eu deixar a Presidência e, portanto, eu vou sentir saudade dos microfones — poder falar diretamente com o povo de Moçambique, através dos alunos da escola em Maputo, Lichinga e Beira.
Enem: sem recurso nem gabarito, fica a confusão
Classificado pelo presidente Lula como "sucesso extraordinário", o Enem transformou-se numa total confusão. Após suspender o exame, a Justiça Federal do Ceará proibiu a divulgação do gabarito e desautorizou o MEC a receber recursos de candidatos. A correção dos cartões está embargada. Em Pernambuco, o tema da redação vazou.
Gabarito também suspenso
Por causa dos erros, Justiça proíbe que MEC divulgue tabela de respostas do Enem
EXAME NA BERLINDA
Isabela Martin, Demétrio Weber e Catarina Alencastro
FORTALEZA e BRASÍLIA - Após determinar anteontem a suspensão do Enem 2010, a juíza Karla de Almeida Miranda Maia, da 7aVara Federal do Ceará, proibiu também a divulgação do gabarito das provas realizadas no último fim de semana. No mesmo despacho, a juíza avisou que também está suspenso o recebimento, pelo MEC, de requerimentos administrativos de qualquer aluno, prejudicado ou não pelos erros no exame.
Com isso, os pedidos de correção, que teriam início via internet a partir de hoje para alunos prejudicados pelo cabeçalho invertido do cartão de respostas da prova de sábado, não poderão sequer ser recebidos.
A correção e as análises dos cartões de respostas de candidatos de todo o país também estão sob embargo. Pela decisão da juíza, estão suspensas todas as etapas que antecederem a publicação do resultado final do Enem.
A Advocacia-Geral da União informou que vai recorrer contra a suspensão do Enem até a próxima segundafeira.
No entendimento da juíza, a liminar que suspendeu o Enem também tem efeito sobre a divulgação do gabarito.
Karla Almeida considerou que a “eventual divulgação do gabarito poderá acarretar acirrados ânimos entre os candidatos eventualmente aprovados e aqueles que não obtiveram resultado exitoso”.
Para a juíza, falhas constatadas na aplicação do Enem afetaram todos os candidatos, indistintamente.
Segundo ela, a “conduta insipiente dos fiscais de cada sala onde foram aplicadas as provas ensejou todo tipo de transgressão” às normas do edital. Ela citou o exemplo do uso de celulares. Para a juíza, essas falhas comprometeram a segurança indispensável à avaliação dos candidatos.
A decisão judicial pela suspensão do Enem partiu da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal no Ceará.
AGU vai recorrer ao TRF até segunda
Em Brasília, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), órgão do MEC responsável pelo Enem, estava com tudo pronto para divulgar ontem, às 18h, o gabarito das quatro provas realizadas no sábado e domingo. Com o esclarecimento da juíza sobre o alcance da liminar concedida na véspera, o Inep abortou a divulgação. A decisão fez o Inep suspender também a página que seria disponibilizada hoje na internet para que participantes do Enem prejudicados pelo erro no cabeçalho das folhas de resposta solicitassem a correção das provas na ordem invertida. A decisão foi noticiada pelo Inep em texto divulgado na página onde seria anunciado o gabarito e apresentado o formulário para solicitação de correção invertida.
A AGU informou que o recurso deverá ser apresentado até a próxima segunda-feira ao Tribunal Regional Federal (TRF) da 5ª Região. O órgão quer que o Enem seja validado e que somente os cerca de 2 mil alunos que receberam o caderno de provas de cor amarela (que apresentava erros de impressão) tenham o direito de fazer uma nova prova.
— Nós queremos garantir ao universo de 3,2 milhões de alunos que fizeram uma prova válida o direito a receber a avaliação, e garantir àqueles que foram prejudicados uma nova avaliação, em condições similares, que apure a mesma condição que eles avaliaram nas provas anteriores do Enem — disse o advogadogeral da União, Luís Inácio Adams.
Ele disse que o problema no cartão de respostas poderá ser resolvido com a correção invertida das provas.
— Não é válido submeter um universo de estudantes a todo um novo processo com todo o custo disso, por conta dessa fragilidade, que foi séria. Em nenhum momento podemos deixar de reconhecer que houve um prejuízo, mas esse prejuízo não pode se transformar em um prejuízo maior ainda — disse Adams.
A suposta quebra do princípio de isonomia levou a Defensoria Pública da União a recomendar que o MEC anule a prova. A AGU ainda não respondeu à Defensoria, que até ontem à tarde havia recebido 2.600 emails de alunos relatando os problemas durante a aplicação do Enem. Os depoimentos darão embasamento a uma ação civil coletiva que a Defensoria quer ingressar, caso o MEC não siga sua recomendação.
A decisão da juíza do Ceará surpreendeu o ministro Fernando Haddad.
À tarde, após visita à OAB, em Brasília, ele disse que não trabalhava com a hipótese de ser proibido de divulgar o gabarito. Haddad voltou a defender que as provas do Enem são formuladas de modo que diferentes edições tenham cientificamente o mesmo grau de dificuldade.
Assim, a reaplicação do exame de sábado apenas para um grupo restrito de participantes não afetaria a igualdade de condições.
— Eu sei que esse debate é novo para o mundo jurídico, mas, no meio educacional, essa questão já está pacificada — disse Haddad.
Após ouvir as explicações de Haddad, o presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcante, disse que só vai se posicionar sobre o tema após ouvir a Comissão de Ensino Jurídico da OAB. Falando em tese, porém, ele adiantou o entendimento de que todos os estudantes prejudicados deveriam ter direito a refazer o exame.
Isso inclui quem se atrapalhou no momento de preencher o cartão de respostas, cujo cabeçalho inverteu a ordem das questões. A proposta do MEC é que só possam refazer o teste os candidatos que receberam provas amarelas com questões faltando ou duplicadas — número inferior a 2 mil dos 3,4 milhões que fizeram as provas no sábado.
— Se o princípio da igualdade não for resguardado, a Ordem terá um posicionamento pela anulação — disse Cavalcante. — Cada caso é um caso, mas a prova terá que ser repetida por todos os que tiveram prejuízos.
A Comissão de Educação do Senado convidou Haddad para prestar esclarecimentos sobre o Enem. Na Câmara, a bancada do PSDB pediu ao Ministério Público Federal que investigue o caso e ao Tribunal de Contas da União (TCU) que realize auditoria especial sobre os contratos do Enem — ao todo, considerando despesas com os Correios e as Forças Armadas, o MEC gastou R$ 182 milhões com o exame. O líder da minoria no Congresso, deputado Otávio Leite (PSDB-RJ), criticou a postura de Haddad: — Ele sequer pediu desculpas.
Achei de uma soberba preocupante.
Ex-assessor de Erenice pede demissão
Antes de ir para Casa Civil, Gabriel Laender foi advogado da Unicel
BRASÍLIA. Gabriel Laender, exassessor da ex-ministra Erenice Guerra citado nas denúncias sobre suposto tráfico de influência da Casa Civil, pediu demissão e deixou o governo. O pedido de demissão de Laender foi publicado no Diário Oficial de ontem.
Há duas semanas, Laender teve de prestar depoimento na Polícia Federal, no inquérito que apura denúncias sobre negócios de Israel Guerra, filho de Erenice, com empresas do governo.
Antes de ser chamado por Erenice para a Casa Civil, Laender foi advogado da Unicel, operadora de telefonia celular em São Paulo. A empresa teria sido beneficiada por decisão da Agência Nacional de Telecomunicações em processo que teve parecer técnico contrário ao projeto da operadora. A PF apura se Erenice, Laender ou outro servidor do alto escalão federal tentou favorecer a Unicel. A empresa já teve no quadro de prestadores de serviços o marido de Erenice, José Roberto Camargo.
Laender não foi localizado.
TCU aponta graves irregularidades em 18 obras incluídas no PAC
Alguns dos empreendimentos foram destacados como exemplos na campanha da presidente eleita, Dilma Rousseff, como a ampliação do sistema de esgoto de São Luís, no Maranhão, o Berço de Atracação do Porto de Vitória e a Ferrovia norte-sul
Rosa Costa
BRASÍLIA - O Tribunal de Contas da União (TCU) relacionou 18 obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) entre as 32 que apresentam irregularidades graves e que, portanto, devem ser paralisadas. Algumas dessas obras foram destacadas como exemplos na campanha da candidata eleita do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff.
Entre essas obras estão a ampliação do sistema de esgoto de São Luís, no Maranhão; a construção das obras do Berço de Atracação do Porto de Vitória, no Espírito Santo, e as obras da Ferrovia Norte-Sul, em Tocantins. As obras do PAC estão distribuídas por 15 das 27 Unidades Federativas do País.
Foram fiscalizadas 231 obras, cujos valores chegam a R$ 35,6 bilhões. Segundo o TCU, se todas as recomendações de correção dos contratos forem aceitas, a economia para os cofres públicos pode alcançar R$ 2,6 bilhões.
No ano passado, a ação do TCU motivou críticas do governo ao tribunal, inclusive por parte do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sob a alegação de que o órgão estaria aparelhado pela oposição.
O TCU manteve o veto às obras de duas refinarias da Petrobrás: a Abreu e Lima, em Pernambuco, e a Presidente Getúlio Vargas (Repar), no Paraná. Os dois investimentos tinham sido brecados pelo TCU no passado, mas Lula ignorou a recomendação, autorizando a liberação de recursos para ambas. Caberá agora aos parlamentares da Comissão Mista de Orçamento (CMO) decidirem se apoiam o órgão ou se endossam a iniciativa de Lula.
Irregularidades
A relação das 231 obras auditadas pelo tribunal e as 32 que apresentam indícios graves de irregularidades - como sobrepreço, superfaturamento, licitação irregular, problemas ambientais e falhas nos projetos - foram entregues ontem aos presidentes da Câmara e do Senado, o deputado e vice-presidente eleito Michel Temer (PMDB-SP) e o senador José Sarney (PMDB-AP).
O TCU também recomendou aos parlamentares a retenção do pagamento de seis construções que apresentam indícios de superfaturamento. Duas delas estão na Bahia, vinculadas à Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (Codevasf) e à Companhia de Trens Urbanos. As demais estão no Ceará, Goiás, Rio e Roraima.
A entrega da lista de obras embargadas este ano ocorre após a polêmica provocada pela aprovação de itens na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), em agosto, que facilitam os gastos do governo e abrem brechas para fugir da fiscalização do TCU. Um desses dispositivos autorizou a Petrobrás e Eletrobrás a ficarem fora da aplicação de tabelas oficiais de preços.
Para o presidente do tribunal, ministro Ubiratan Aguiar, a medida imporá "maiores responsabilidades ao Congresso". "Nosso trabalho é técnico, subsidiamos as duas Casas. A decisão de alocar ou não recursos é do Congresso, e não do tribunal", afirmou, sem comentar a iniciativa do presidente de ignorar as recomendações do tribunal.
Relator do processo de fiscalização das obras, o vice-presidente do TCU, ministro Benjamin Zymler, defendeu uma lei própria disciplinando as auditorias de obras públicas, sem a vinculação à LDO existente hoje. Para os ministros, os 14 anos de atividade comprovaram a eficácia do sistema utilizado pelo TCU.
Regulação da mídia terá de ocorrer, diz Franklin
O ministro Franklin Martins (Secretaria de Comunicação Social) afirmou ontem em seminário internacional que a regulação do setor de mídias no País vai ocorrer, nem que para isso seja preciso “enfrentamento”: “Nenhum grupo tem o poder de interditar a discussão. A discussão está na mesa. Terá de ser feita. Pode ser num clima de enfrentamento ou de entendimento”.
Regulação da mídia terá de ocorrer, diz Franklin
Para ministro, ‘história de que a liberdade de imprensa está ameaçada é bobagem, fantasma, é um truque’
Leandro Colon
BRASÍLIA - Em tom beligerante, o ministro da Secretaria de Comunicação Social do governo federal, Franklin Martins, afirmou ontem que a regulação do setor de mídias no Brasil vai ocorrer nem que para isso seja preciso enfrentar os adversários. "Nenhum grupo tem o poder de interditar a discussão. A discussão está na mesa. Terá de ser feita. Pode ser num clima de enfrentamento ou de entendimento."
A declaração do ministro foi feita na presença de autoridades estrangeiras da área, na abertura do seminário internacional Comunicações Eletrônicas e Convergência de Mídias, organizado por ele. O ministro convidou autoridades de outros países para debater o tema entre ontem e hoje.
Ele quer entregar até o fim do ano um anteprojeto de regulação do setor à presidente eleita, Dilma Rousseff. A atuação do ministro tem sido vista por entidades da área, entre elas a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), como um movimento do atual governo para regular o conteúdo produzido pelos meios de comunicação, embora ele negue isso enfaticamente.
Em seu discurso, Franklin classificou de "fantasmas" as críticas que tem recebido. O maior "fantasma", segundo ele, é a tese de que o governo quer ameaçar a liberdade de imprensa ao levantar o debate sobre o tema. "Essa história de que a liberdade de imprensa está ameaçada é bobagem, fantasma, é um truque. Isso não está em jogo", disse.
O ministro subiu o tom e afirmou que as reclamações são fruto de "fúrias mesquinhas". "Os fantasmas passeiam por aí arrastando correntes", ressaltou. "Os fantasmas, quando dominam nossas vidas, nos impedem de olhar de frente a realidade. Os fantasmas não podem comandar esse processo. Se comandarem, perderemos uma grande oportunidade."
Segundo ele, a intenção do governo é dar uma atenção especial ao setor de radiodifusão em detrimento da telecomunicação. "O governo federal tem consciência de que nesse processo de convergência de mídia é necessário dar proteção especial à radiodifusão", afirmou.
Ressalvas
O discurso de Franklin foi recebido com ressalvas pela Abert."Enxergamos de modo diferente. Não estamos vendo fantasmas. São coisas que estão acontecendo", disse Luis Roberto Antonik, diretor-geral da entidade, sobre os movimentos do governo de controle de conteúdo.
Segundo ele, é preciso discutir, entre outras coisas, a atividade jornalística na internet. Franklin aproveitou o evento para alfinetar a imprensa. "Não haverá qualquer tipo de restrição. Mas vamos com calma. Isso não significa que não pode ter regulação. Liberdade de imprensa não quer dizer que a imprensa não pode ser criticada, observada", afirmou o ministro. "Liberdade de imprensa quer dizer que a imprensa é livre, não necessariamente boa. A imprensa erra."
Políticos
Em entrevista coletiva após o discurso, Franklin defendeu um controle de conteúdo sobre temas ligados, segundo palavras dele, ao respeito à privacidade, a campanhas discriminatórias, cultura regional, entre outras coisas. "No mundo inteiro isso é feito", justificou. O ministro criticou ainda a propriedade de canais de televisão por políticos.
"Todos nós sabemos que deputados e senadores não podem ter televisão", observou, baseado no dispositivo da Constituição que proíbe que parlamentares mantenham concessões de comunicação. De acordo com Franklin, o setor virou "terra de ninguém" e os parlamentares usam "subterfúgios" para comandar emissoras. "A discussão foi sendo evitada e agora é oportunidade para que se discuta tudo isso", defendeu o ministro.
BC ajuda banco de Sílvio Santos a cobrir rombo de R$ 2,5 bilhões
Após um socorro de R$ 2,5 bilhões para cobrir um rombo nas contas do Banco PanAmericano, do Grupo Silvio Santos, o Banco Central e a Caixa Econômica Federal decretaram uma espécie de intervenção na instituição. O aporte acontece quatro meses após o sinal verde do Banco Central para que a Caixa comprasse 49% do capital com direito a voto do banco. Ontem, começaram a circular rumores de fraudes no PanAmericano, que é um dos mais fortes do país em crédito consignado e não tem conta corrente. Os problemas teriam sido constatados pelo BC há um mês. Para tapar o rombo, o dinheiro foi liberado por meio do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), e o Grupo Sílvio Santos deu garantia em bens. Logo a seguir, a instituição ganhou novos diretores. Em comunicado divulgado após o fechamento dos mercados, o PanAmericano anunciou que pode ter sido vítima de uma fraude bilionária. O texto fala de "inconsistências contábeis" que não permitiam perceber "a real situação patrimonial" do banco. O mercado chegou a especular que o BC faria um comunicado no fim da tarde, mas ele não aconteceu e o PanAmerlcano soltou a nota. As ações do banco caíram 6,74% na Bolsa de São Paulo. O valor do socorro é bem maior do que o R$ 1,37 bilhão de patrimônio do banco.
Fraude no PanAmericano
Banco do Grupo Silvio Santos recebe injeção de R$ 2,5 bi após BC descobrir rombo no balanço
Bruno Villas Bôas, Aguinaldo Novo e Patrícia Duarte
RIO, SÃO PAULO e BRASÍLIA - Em meio a rumores de que estaria prestes a quebrar, o Banco PanAmericano informou ontem à noite que vai receber um socorro de R$ 2,5 bilhões. O dinheiro sairá de empréstimo que o Grupo Silvio Santos, seu principal acionista controlador, tomou do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), criado para proteger correntistas e poupadores de bancos em dificuldades, reembolsando até R$ 60 mil por CPF, e formado com contribuições compulsórias dos próprios bancos. Segundo fontes, o Banco Central (BC) teria considerado intervir no banco, o que foi descartado após pedidos do grupo controlador. Sócia do PanAmericano, com 49% do capital votante, a Caixa Econômica Federal começou ontem mesmo uma espécie de intervenção na instituição, ao indicar nova diretoria executiva para o banco. Também foi convocada reunião para decidir os novos integrantes do Conselho de Administração em 26 de novembro, ainda segundo comunicado divulgado pelo PanAmericano.
O banco atua apenas no segmento de financiamentos, sobretudo de automóveis, e não tem contas correntes, o que afasta a possibilidade de risco sistêmico. O PanAmericano é atualmente o 21° do ranking nacional, com ativos de R$ 12,5 bilhões ao fim de junho. O BC não quis se manifestar oficialmente sobre o assunto.
Nos bastidores, acompanhou o processo, avalia que as normas foram todas cumpridas e que o PanAmericano já foi capitalizado e não vai quebrar. O empréstimo do FGC ao grupo prevê o pagamento em dez anos, com carência de três.
No comunicado, o PanAmericano já indica que foi alvo de fraude. Assinada pelo presidente do Conselho de Administração, Luiz Sebastião Sandoval, a nota informa que o aporte ocorre porque foram constatadas “inconsistências contábeis” que não permitiam aos controladores perceber “a real situação patrimonial” do banco.
Os primeiros indícios de fraude teriam sido encontrados há um mês pelo BC, que, depois da crise de 2008, apertou a fiscalização principalmente junto a bancos de pequeno e médio porte — os mais atingidos na época pela falta de crédito. Segundo fontes do BC, o valor do rombo pode ser um pouco menor que o aporte de R$ 2,5 bilhões. O objetivo da injeção maior é ter uma margem de segurança para eventuais novos problemas. Há suspeitas de participação de executivos. A dúvida dos técnicos é se a fraude aconteceu antes ou depois da compra pela Caixa, em dezembro de 2009, por R$ 739,2 milhões. Uma parcela foi paga na ocasião e outra em julho último, quando o BC aprovou a operação.
Depois de descoberto o rombo, foi feita ainda uma tentativa junto a outros bancos (inclusive a própria Caixa) para adquirir o controle da instituição, mas não houve interessados. Sem alternativas, o BC cogitou intervir na instituição, mas o grupo conseguiu costurar o empréstimo junto ao FGC.
O montante de R$ 2,5 bilhões corresponde a 10% do atual patrimônio do fundo, de R$ 25,9 bilhões.
Ação teve 8° maior queda da Bolsa
Já o tamanho do rombo supera o atual patrimônio líquido do PanAmericano, de R$ 1,37 bilhão (segundo o balanço de junho, o último disponível). Fontes disseram que o Grupo Silvio Santos teria dado todos os seus bens — incluindo o canal de TV — como garantia para o empréstimo, que recebeu aval do BC.
Conforme a nota divulgada ontem, o PanAmericano informa que a nova diretoria executiva passa a ser comandada por Celso Antunes da Costa, que foi diretor de Gestão da Integração da Nossa Caixa. Ele substitui Rafael Palladino no cargo de diretor-superintendente da instituição financeira.
Os rumores sobre a quebra do PanAmericano derrubaram ontem as ações do setor bancário na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Os papéis preferenciais (PNs, sem direito a voto) do banco despencaram 6,74%, oitava maior queda da Bolsa (os papéis não fazem parte do Ibovespa, o principal índice do mercado brasileiro).
Desde 1° de outubro, a queda acumulada é de 20,73%. Ontem, os boatos arrastaram as ações dos bancos Santander (6,65%), Itaú Unibanco (2,69%, as preferenciais) e Bradesco (2,96%).
Os papéis ordinários (ONs, com voto) do Banco do Brasil recuaram 2,39%.
Segundo Eduardo Velho, economistachefe da Prosper Corretora, o aporte foi uma surpresa e afastou a possibilidade de uma falência do banco.
Ele afirma que a informação vazou e que por isso o banco antecipou a divulgação do empréstimo, para evitar uma forte queda da Bolsa hoje.
— A notícia caiu como uma bomba no mercado — afirma Velho.
No ano passado, a instituição informou ter registrado um lucro líquido de R$ 171,5 milhões em 2009, queda de 27,3% em relação ao ano anterior.
O PanAmericano adotou recentemente uma estratégia agressiva para atrair clientes. Aposentados e pensionistas do INSS que fechassem um contrato de empréstimo de qualquer valor ganhavam um vale-compras de R$ 50.
O banco do Grupo Silvio Santos comercializa ainda os títulos da Tele Sena.
Foram 54 milhões deles vendidos apenas no ano passado, quando desativou as vendas do Carnê do Baú e expandiu sua presença em redes de varejo.
Ontem, o Ibovespa encerrou em queda de 1,35%, aos 71.679 pontos, puxado pelo recuo das ações da Petrobras. Os papéis preferenciais da estatal caíram 1,48%, e os ordinários, 1,28%. Para o analista-chefe da SLW Corretora, Pedro Galdi, o recuo pode ser explicado por um movimento de venda de ações para embolsar lucros, aproveitando a alta recente. Já o dólar fechou estável, a R$ 1,699, após dois leilões do BC.
Jungmann destaca papel de Joaquim Nabuco na abolição da escravatura
Parlamentares destacam militância de Joaquim Nabuco em sessão solene
A Câmara realizou hoje sessão solene em homenagem ao jornalista, escritor, diplomata e deputado Joaquim Nabuco (1849-1910), como parte da programação relativa ao centenário da sua morte. Em seus discursos, a maioria dos parlamentares destacou que Nabuco, mais do que um político, foi um militante que lutou não só pelo fim da escravidão, mas também pelo acesso dos escravos recém-libertados a direitos básicos, como educação e emprego.
Para Maurício Rands (PT-PE), Joaquim Nabuco foi um reformador. "Ele percebeu que o Brasil seria incompleto enquanto os ex-escravos não fossem incluídos na vida nacional. Em todos os seus pronunciamentos na Câmara, na memorável jornada abolicionista, e no seu livro O Abolicionismo, de 1873, ele enfatizava esta questão: o que fazer depois da abolição da escravatura? Falava da importância de se desenvolver o trabalho livre no Brasil, da formação universal que a nação precisaria dar aos ex-escravos, aos artistas, como ele chamava, talvez querendo se referir aos que chamaríamos de artífices, aos trabalhadores manuais", disse Rands.
Reforma agrária
Joaquim Nabuco defendeu ainda a reforma agrária, pois era contrário ao sistema latifundiário predominante no Brasil. E era favorável à monarquia e ao Estado laico. "Na hora em que o País se dividiu entre monarquia e república, ele ficou do lado da monarquia, porque sabia que isso era irrelevante. O importante era a abolição da escravatura, era a reforma agrária, era escola igual para todos. Ele queria o substancial e não apenas o superficial que aparece nos jornais. Ele foi monarquista, como podia ser republicano, desde que houvesse a abolição da escravatura, desde que houvesse a alfabetização de todos", afirmou o senador Cristovam Buarque (PDT-DF).
Na opinião de Cristovam, Joaquim Nabuco é atual porque o Brasil ainda não completou a abolição nem alfabetizou todos os brasileiros. Para Rands, a atualidade de Nabuco decorre da "emancipação incompleta" do povo brasileiro. O deputado Raul Jungmann (PPS-PE) concordou, afirmando que Nabuco é uma fonte atual na política brasileira. "Nabuco identifica na escravidão a distância não percorrida da independência à constituição plena da nação", afirmou Jungmann.
Segundo o líder do PT, deputado Fernando Ferro (PE), Joaquim Nabuco deve ser inspiração para as mudanças necessárias - por exemplo, para a reforma agrária.
Participaram da sessão solene o neto de Joaquim Nabuco, José Thomaz Nabuco Filho, e a presidente da Fundação Gilberto Freyre, Sonia Freyre, representando a família do sociólogo que, em 1949, formulou requerimento para a criação do Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais.
Ano Joaquim Nabuco
A programação integra o conjunto de iniciativas públicas e privadas que homenageiam o diplomata ao longo de 2010, instituído como Ano Nacional Joaquim Nabuco por lei de iniciativa do senador Marco Maciel (DEM-PE).
As atividades, organizadas pela Academia Brasileira de Letras, pela Fundação Joaquim Nabuco e pela Fundação Armando Álvares Penteado, começaram no mês passado, com uma exposição sobre a trajetória parlamentar do estadista. A mostra ficará aberta para visitação até domingo (14) no Salão Negro do Congresso.
Também foi lançado o livro Discursos parlamentares - Joaquim Nabuco. Ainda nesta terça-feira, às 16 horas, a TV Câmara vai lançar o documentário Diálogo com Joaquim Nabuco, dirigido por Marcya Reis. O vídeo faz um paralelo entre a história do intelectual e a do jovem negro Thiago, universitário nascido na comunidade da Rocinha, no Rio de Janeiro.
Eu, etiqueta:: Carlos Drummond de Andrade
Que não é meu de batismo ou de cartório
Um nome... estranho
Meu blusão traz lembrete de bebida
Que jamais pus na boca, nessa vida,
Em minha camiseta, a marca de cigarro
Que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produtos
Que nunca experimentei
Mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
De alguma coisa não provada
Por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
Minha gravata e cinto e escova e pente,
Meu copo, minha xícara,
Minha toalha de banho e sabonete,
Meu isso, meu aquilo.
Desde a cabeça ao bico dos sapatos,
São mensagens,
Letras falantes,
Gritos visuais,
Ordens de uso, abuso, reincidências.
Costume, hábito, premência,
Indispensabilidade,
E fazem de mim homem-anúncio itinerante,
Escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É duro andar na moda, ainda que a moda
Seja negar minha identidade,
Trocá-lo por mil, açambarcando
Todas as marcas registradas,
Todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
Eu que antes era e me sabia
Tão diverso de outros, tão mim mesmo,
Ser pensante sentinte e solitário
Com outros seres diversos e conscientes
De sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio
Ora vulgar ora bizarro.
Em língua nacional ou em qualquer língua
(Qualquer, principalmente.)
E nisto me comprazo, tiro glória
De minha anulação.
Não sou - vê lá - anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
Para anunciar, para vender
Em bares festas praias pérgulas piscinas,
E bem à vista exibo esta etiqueta
Global no corpo que desiste
De ser veste e sandália de uma essência
Tão viva, independente,
Que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
meu gosto e capacidade de escolher,
Minhas idiossincrasias tão pessoais,
Tão minhas que no rosto se espelhavam
E cada gesto, cada olhar,
Cada vinco da roupa
Sou gravado de forma universal,
Saio da estamparia, não de casa,
Da vitrine me tiram, recolocam,
Objeto pulsante mas objeto
Que se oferece como signo de outros
Objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
De ser não eu, mar artigo industrial,
Peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome novo é Coisa.
Eu sou a Coisa, coisamente.