sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

OPINIÃO DO DIA – Dora Kramer: o condomínio

Quem não tem reforma ministerial a fim de apresentar um governo para chamar de seu, caça com uma reunião ministerial para discutir metas, meios e modos.

Assessores, conselheiros, ministros e políticos próximos à presidente da República passaram o ano de 2011 dizendo que no início de 2012 haveria uma reforma ministerial que marcaria o começo do verdadeiro governo de Dilma Rousseff.

Pouco depois da posse presidencial e do anúncio do Ministério disseminou-se a versão de que a equipe então nomeada teria prazo de validade. Seria de um ano. Quem não sobrevivesse ao teste estaria fora. Os leitores, espectadores e ouvintes atentos lembram-se disso.

Completado o primeiro ano de governo, do parto da montanha nasceu um rato. O que era reforma agora é chamado de "ajuste" com quatro, no máximo cinco mudanças pontuais de nomes e nenhuma alteração no conceito da formação do condomínio

Dora Kramer, jornalista. “O parto da montanha”, O Estado de S. Paulo, 19/1/2012

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Entre a realidade e a fantasia - Da Disney, Obama manda facilitar visto a brasileiros
Enquanto isso, no Acre...
No G-20, Brasil é o segundo mais desigual
Cientistas elogiam e PT se queixa

FOLHA DE S. PAULO
EUA vão facilitar visto para turista brasileiro
Calmantes lideram venda de remédios controlados
Filho de ministro da Integração emprega lobista
Embaixador do Brasil faz defesa de Ahmadinejad

O ESTADO DE S. PAULO
EUA facilitam concessão de visto para brasileiros
Ex-deputado é condenado a 103 anos pela morte de Ceci
PF investiga suspeita de lavagem no TRT do Rio
Para cumprir lei, intervalo de aula vai virar 'extraclasse'
Telefonia 4G terá 60% de conteúdo nacional

VALOR ECONÔMICO
Governo para admissões até criação de fundo de servidor
Edital de aeroportos é contestado
Brasil Maior chega a elevar a tributação
Bancos criam concorrente para a TecBan
Polêmica na tributação de dividendos
Anatel aprova regras para leilão de 4G
Desigualdade cresce no G-20
Apoio ao etanol celulósico

CORREIO BRAZILIENSE
Secretário de ministério morre sem atendimento
Dilma corta R$ 35 bi de emendas do PPA
Educação
Mais 163 remédios com imposto reduzido

ESTADO DE MINAS
Quase 100 mil veículos a mais em BH
Secretário de ministério morre sem atendimento

ZERO HORA (RS)
As perdas da seca

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Vereadores recuam da farra da gasolina
Anatel exige internet de quarta geração
EUA vão flexibilizar visto para brasileiros

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Educação reprovada :: Roberto Freire

Haddad comanda o Ministério da Educação há 5 anos e meio, tempo suficiente para mostrar serviços e avanços em sua área. Ao contrário, no balanço de sua gestão, encontramos principalmente o descaso com nossos estudantes e com a educação das futuras gerações.

O maior desses descasos é o Enem. Transformado de uma prova para avaliação das escolas de ensino médio para um gigantesco vestibular, o Enem apresenta falhas que se repetem ano a ano. Da falta de capacidade de manter o adequado sigilo à absoluta falta de transparência com os critérios de avaliação, o Enem é o maior símbolo de uma administração fracassada, inepta e incompetente. Há relatos de estudante que tirou zero e reverteu sua nota no Judiciário, de estudantes que entregaram a prova em branco e tiraram nota maior que a mínima, e agora o Judiciário decidiu que o MEC deve dar transparência à correção das redações.

Sem critérios claros de avaliação, sem um currículo mínimo a ser percorrido no ensino médio para ser cobrado no Enem, o exame tem sido criticado por impor a ideologia oficial aos estudantes. Não se cobra conhecimentos adquiridos, mas o alinhamento do estudante ao pensamento oficial. O mérito, o único critério que deveria ser utilizado para ingresso nas universidades públicas, foi abolido nas águas turvas desse exame.

Mas a incompetência do ministro não se restringiu ao Enem. Livros didáticos foram distribuídos no país inteiro com erros de português. O ministério gastou tempo, energia e recursos para montar um kit contra a homofobia que foi reprovado até pela presidência e serviu unicamente para a direita levantar-se contra o esclarecimento necessário sobre o tema.

A expansão descontrolada das vagas nas universidades federais sem planejamento fez o sonho se transformar em pesadelo para aqueles que assistem aulas, quando são ministradas, em locais inadequados e sem equipamentos. E como não houve previsão da demanda por vagas, milhares sobram ociosas ano a ano, num desperdício completo de recursos escassos.

A alardeada supervisão dos cursos superiores serviu somente para demonstrar que o MEC deixa faculdades sem condições começarem a funcionar para depois fazer exigências de qualidade, após milhares de estudantes terem estudado nessas instituições ineptas, perdendo tempo e dinheiro e não alcançando a formação pretendida, como comprova a alta taxa de reprovação dos diplomados nas provas de admissão das respectivas carreiras.

Enquanto isso, ainda somos o 53º no ranking do Pisa/2009, o Programa Internacional de Avaliação de Alunos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE, muito atrás de nossos vizinhos latino-americanos.

Faltou à gestão Haddad foco no fundamental: conseguir unir o país para que nossas crianças aprendam português, matemática e ciências. Suprir a falta de recursos de estados e municípios para que o ensino fundamental seja priorizado numa cadeia de colaboração federativa. Isso não foi feito e continuamos a patinar na educação do nosso povo, comprometendo o nosso desenvolvimento futuro.

E ainda há quem defenda que esse senhor possa administrar uma cidade gigantesca e complexa como São Paulo.

Roberto Freire, deputado Federal (SP) e presidente do PPS

FONTE: BRASIL ECONÔMICO

O STF e a maconha :: Merval Pereira

Além de definir o alcance do papel do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e julgar o mensalão, o Supremo Tribunal Federal terá pelo menos mais um tema polêmico pela frente este ano. Uma decisão tomada no fim do ano passado, no dia 9 de dezembro, não teve a devida atenção da opinião pública: o STF decidiu deliberar, ainda neste ano de 2012, sobre a descriminalização do consumo de maconha, e tudo indica que a maioria do plenário tenda a favor.

Afinal, o Supremo tem se colocado na vanguarda da sociedade brasileira no campo dos costumes ao aprovar, nos últimos tempos, questões polêmicas como a união estável entre homossexuais e a permissão da defesa pública da legalização da maconha, retirando desse movimento o caráter de apologia de crime.

Antes dessas decisões, porém, houve um julgamento sobre a admissibilidade, exatamente como nesse caso do consumo individual da maconha, o que leva os interessados no caso a acreditarem que o resultado do julgamento no plenário será favorável à descriminalização.

Quem provocou o pronunciamento do STF foi a Defensoria Pública de São Paulo, a partir do caso de um jovem do ABC que ficou dois meses preso por conta de 1 grama da erva.

A ONG Viva Rio vai atuar como amicus curiae e já tem como advogados o ex-ministro da Justiça de Lula Marcio Thomaz Bastos e Pier Paolo Cruz Bottini.

O "amicus curiae" (amigo da corte), mesmo não fazendo parte do processo, atua como interessado pela causa reconhecido pela sociedade. A ONG Viva Rio está empenhada na descriminalização do consumo para uso próprio da maconha, apoiando o trabalho do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso pela regulamentação do uso da maconha.

A Comissão Latino-Americana, que, além do ex-presidente brasileiro, tem na sua coordenação os ex-presidentes César Gaviria, da Colômbia, e Ernesto Zedillo, do México, defende a descriminalização da maconha, por ser a droga de uso amplamente majoritário no mundo (90% do consumo mundial de drogas) e, ao mesmo tempo, cujos malefícios podem ser comparados aos do álcool e do tabaco.

Já a Comissão Global sobre Drogas, que Fernando Henrique também coordena, vai mais adiante e tem uma tendência de trabalhar pela legalização e regulamentação do uso da maconha como a melhor maneira de combater o tráfico de drogas e suas consequências.

Esse, porém, é um passo adiante que não está na cogitação nem do Viva Rio nem de Fernando Henrique.

No próximo dia 7 de fevereiro a Viva Rio fará reunião com os advogados e o grupo de conselheiros que ajuda na campanha a favor da descriminalização do uso da maconha para acertar as estratégias. Ao mesmo tempo, o secretário de Meio Ambiente do governo do Rio, Carlos Minc, está em outra ponta mobilizando os defensores da descriminalização do uso da maconha para aproveitarem o momento favorável com manifestações por todo o país.

A representação ao Supremo Tribunal Federal se fundamenta no artigo 5 da Constituição Federal e nos seus incisos sobre os direitos individuais, as liberdades e inviolabilidades.

A base da decisão seria a de que ninguém pode ser preso por só fazer mal a si mesmo. Seis países - Espanha, Itália, Portugal, Argentina, República Tcheca e México - já não criminalizam a posse de drogas para consumo pessoal.

No Brasil, o porte de drogas, mesmo que para consumo próprio, é crime, mas o usuário é punido com penas restritivas de direitos, e não da liberdade.

Porém, a lei não define a quantidade de droga que diferencia usuário ou traficante, cabendo ao policial ou ao juiz a decisão, o que gera uma série de problemas, inclusive dá margem à extorsão policial, ou mesmo à condenação de pessoas que portem droga para uso próprio, como no caso que provocou a consulta ao Supremo.

Outra discussão, que causou a demissão do primeiro secretário nacional Antidrogas do governo Dilma, Pedro Abramovay - que está auxiliando o Viva Rio na cruzada pela descriminalização do consumo de maconha -, é o chamado "pequeno traficante", aquele que vende drogas para garantir seu consumo, que na opinião desses especialistas não deveria ser preso, mas ressocializado. Mas essa questão não estará em julgamento no Supremo.

Na Argentina, a questão da droga para consumo próprio foi definida pela Suprema Corte em 2009, com base na preservação da liberdade individual, desde que não cause danos a outras pessoas.

Os ministros entenderam, com base em tratados internacionais, que o direito à privacidade impede que as pessoas sejam "objetos de ingerência arbitrária ou abusiva".

O Supremo argentino decidiu que o artigo 19 da Constituição Nacional protege a liberdade pessoal de qualquer intervenção alheia, inclusive a estatal.

O presidente da Corte, ministro Ricardo Lorenzetti, chegou a dizer em seu voto que "não se trata apenas de respeito às ações realizadas na esfera privada, senão a de reconhecimento de um âmbito em que cada indivíduo adulto é soberano para tomar decisões livres sobre o estilo de vida que deseja".

Outro ponto salientado pelos juízes argentinos foi a chamada "revitimização", ou seja, que as primeiras vítimas em casos de viciados em drogas são os próprios consumidores e suas famílias, e não tem sentido uma resposta punitiva do Estado ao consumidor, que se traduziria em uma "revitimização".

Os ministros tiveram a preocupação, em seus votos, de deixar claro que a decisão não implicava a legalização da droga - assim como aqui no Brasil, ao descriminalizar a realização da Marcha da Maconha, o Supremo teve o cuidado de reafirmar que fumar maconha continuava sendo crime, e que as marchas não poderiam permitir o seu consumo.

FONTE: O GLOBO

Todos por um:: Dora Kramer

O cenário era a inauguração de uma creche em Angra dos Reis (RJ), mas poderia ser qualquer outro, já que o essencial estava presente: a mão forte e o braço firme do governo federal.

Fernando Haddad será candidato a prefeito de São Paulo, mas a campanha foi aberta pela presidente Dilma Rousseff, longe da arena da disputa. Não são apenas detalhes nem mera coincidência.

É um plano bem traçado. Com o objetivo tático de dar à eleição na capital paulista um caráter nacional em que a principal bandeira a ser apresentada pelo candidato seja a sua parceria com o Planalto e a finalidade estratégica de consolidar a hegemonia política do PT do Brasil.

Se porventura se juntarem PT e PSD - no primeiro ou mesmo no segundo turno, a união das máquinas municipal e federal vai se encarregar de neutralizar bastante o peso da estrutura estadual nas mãos do PSDB.

Quanto aos aliados, a inauguração da creche em Angra dos Reis forneceu um exemplo do engajamento de todos em prol da execução de um projeto prolongado de poder.

Estava lá o governador do Estado, Sérgio Cabral, fazendo eco ao entusiasmo da presidente Dilma na apresentação de Haddad.

Não como o ministro dos erros do Enem, mas como "um dos grandes ministros da Educação deste País, o melhor do período democrático", só comparável, nas palavras de Cabral, a "educadores como Anísio Teixeira e Gustavo Capanema".

Um exagero histórico, mas não um acaso retórico.

Ao PMDB interessa, e muito, não se desviar do caminho traçado pelo PT para não perder a vaga de vice na chapa de 2014.

Todos os movimentos até agora foram feitos na perspectiva de nacionalizar a eleição municipal paulistana.

A partir da premissa de que não há nomes tidos como imbatíveis, as lideranças mais antigas estão em processo de desgaste, todos são mais ou menos iguais na largada, Haddad acaba contando com condições competitivas mais vantajosas.

É o representante de um governo politicamente forte, que a maioria das forças não tem o menor interesse em contrariar.

Lula entra na campanha assim que terminar o tratamento do câncer na laringe e Dilma, com toda resistência pessoal a esse tipo de atuação, anteontem no Rio mostrou que, quando o assunto é eleição de São Paulo, sobe no palanque como profissional.

Pronta entrega. A segunda e amenizada versão do documento de balanço do primeiro ano de governo Dilma feita pelo PSDB foi escrita pelo cientista político Antônio Lavareda, a pedido do presidente do partido, Sérgio Guerra.

A primeira versão, muito mais contundente, havia sido encomendada por Guerra a Alberto Goldman, vice-presidente do PSDB.

Lavareda, consultor de marketing político do partido, teve toda liberdade para elaborar o texto final - que não foi lido por Sérgio Guerra nem passou pelo crivo da Executiva, embora tenha sido divulgado em nome do colegiado.

O conselheiro. Com o fim das férias do secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, no próximo dia 26, a presidente Dilma Rousseff retoma o assunto da composição da Comissão da Verdade, que cuidará por dois anos de reunir informações (conhecidas e ainda desconhecidas) sobre as violações aos direitos humanos cometidas durante o regime militar.

Entre os interlocutores da presidente para o tema, Gilberto Carvalho é o principal.

Nisso estão engajados petistas e aliados interessados em manter boas relações com vista à eleição presidencial de 2014.

Os petistas seguem no geral o roteiro imposto pelo ex-presidente Lula, que já em novembro do ano passado, data do enterro da proposta de realização de prévias, avisou aos seus navegantes: o exemplo de São Paulo deveria ser seguido e, até na medida do impossível, as disputas internas evitadas País afora.

Aos poucos caem as resistências iniciais a uma aproximação com o prefeito Gilberto Kassab, porque ele é considerado um interlocutor importante na cena nacional futura e uma peça fundamental na disputa local.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Enquanto Inês é viva:: Eliane Cantanhêde

A delicada questão da entrada dos haitianos acendeu uma luz amarela no governo, que identificou 37 pontos (mais) vulneráveis nos cerca de 17 mil km de fronteiras terrestres e que treme só de pensar que a ponte entre o Amapá e a Guiana Francesa pode virar uma nova "Ponte da Amizade", que une o Brasil ao Paraguai.

Em nome da "amizade", os sucessivos governos brasileiros assistiram perplexos e praticamente inertes a uma escalada da ilegalidade e de um fluxo estimado hoje em quase 18 mil veículos por dia. Sem contar os barcos clandestinos que deslizam sob o beneplácito da polícia paraguaia.

Acontece de tudo um pouco ali: a locomotiva do contrabando puxa o trânsito de criminosos e de trabalhadores ilegais e o tráfico de pes-

soas, de drogas e de armas.

"Como fiscalizar? Parar um por um? Impossível", admite o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.

A história tem tudo para se repetir agora ao Norte do país, principalmente com a crise na Europa, que tende a empurrar latino-americanos porta afora da Espanha e de Portugal, por exemplo. Infiltrado entre os que querem apenas sobreviver sempre cabe mais um: o bandido. Adivinha onde ele pode ir (ou vir) parar?

Como a Guiana é território da França, os voos entre os dois são domésticos, dispensando passaportes, vistos e os rigores de segurança das viagens internacionais. O trajeto se torna atraente como rota de migração e promissor como alternativa para o tráfico (de drogas, armas...).

Justiça e Defesa planejam aumentar a vigilância, o policiamento ostensivo e as operações de inteligência na área enquanto é tempo.

No caso da ponte com o Paraguai, ninguém preveniu, ninguém remediou e agora nem há mais como remediar. Milhares de famílias vivem disso e a diplomacia do "não-me-toques" entre vizinhos impede qualquer ação real. É fechar os olhos e deixar pra lá. Inês é morta.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Os limites do adesismo :: Cláudio Gonçalves Couto

Se há algo que notabiliza como político o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, é a sua habilidade como articulador. Antes mesmo de ser guindado por José Serra à condição de alcaide da maior metrópole brasileira, Kassab já havia se destacado como o principal construtor do PFL paulista, organizando o partido pelo interior. Foi essa capacidade como negociador político, mais do que eventuais sucessos administrativos, que lhe renderam o posto de vice-prefeito na chapa demo-tucana e, depois, a reeleição, cindindo o PSDB. Seguiu nessa senda ao deflagrar uma defecção em massa do DEM, que teve como subproduto substancial a oportunidade de migração sem custos ou riscos para insatisfeitos de todos os matizes, tanto os desconfortáveis no barco da oposição como os incomodados em agremiações do campo governista. Nada mais fácil, já que o PSD não seria "de direita, de esquerda, nem de centro", apenas oportunista.

A última cartada desta raposa foi a oferta ao PT de uma aliança nas eleições municipais paulistanas. O fato de seu partido ser um invertebrado ideológico, disposto a negociar com quem quer que seja, em princípio facilita as coisas. Mas isto não seria exatamente algo indispensável, já que a lógica coalicional do multipartidarismo brasileiro facilita todas as aproximações, a despeito de quaisquer origens programáticas que as agremiações possam ter tido. Isto fica evidente tanto pelo apoio do PP (partido do capitão Bolsonaro e sucessor da Arena da ditadura militar) ao governo da ex-guerrilheira Dilma Rousseff, quanto pela presença do PCdoB na administração kassabista em São Paulo. Nessa festa partidária brasileira, ninguém é de ninguém e todos são de todos; ou quase. Um dos limites mais claros para isto está nas alianças eleitorais entre os dois partidos polares do sistema nacional, PT e PSDB. Para esses dois, são interditadas as alianças nacionais, estaduais ou em municípios de primeira grandeza, embora sejam liberadas as coligações pelo interiorzão afora, onde a lógica da política nacional não faz sentido e a ideologia é uma língua estranha.

Aliança entre PSD e PT só interessa ao primeiro

Ao acenar publicamente com seu possível apoio ao PT no pleito paulistano, Kassab aumenta seu cacife numa negociação com os tucanos, seus parceiros de primeira hora. De quebra, facilita sua amizade com o governo federal. Contudo, para que tal proposta matreira seja politicamente levada a sério, é preciso considerar se tal aliança é proveitosa para o PT, já que o casamento não sai sem a anuência das partes. Fazendo-se as contas, faz muito pouco sentido, pois o prefeito paulistano não tem muito a oferecer, mas pode causar prejuízos. Vejamos.

Em primeiro lugar, o PSD não carreia tempo de TV para seus aliados (não mais do que 30 segundos), pois tendo sido criado após as últimas eleições congressuais, não obteve votos para deputado federal e, consequentemente, não pontua no critério de distribuição do tempo no horário eleitoral gratuito. Em segundo lugar, a administração de Kassab é mal avaliada pela população, como demonstram todas as pesquisas. Assim, contar com seu apoio mais tira do que atrai votos - como também foi demonstrado em recente pesquisa do Datafolha. Em terceiro lugar, o PT faz uma forte oposição à administração Kassab na Câmara Municipal e em outras instâncias, de modo que uma aliança obrigaria o partido a moderar seu discurso e, no limite, defender o aliado. Como explicar ao eleitor tal mudança de posição? E, se como afirmou Fernando Haddad ao Valor de ontem, candidatos não devem esconder seus aliados, seria muito difícil jogar Kassab para baixo do tapete.

Em quarto lugar, poder-se-ia alegar que Kassab barganharia a aliança eleitoral em troca do eventual apoio dos vereadores de sua base ao futuro prefeito petista, se eleito. Ora, mas há quem duvide que os vereadores que hoje apoiam o prefeito na Câmara, sejam ou não de seu partido, apoiarão qualquer um que for eleito, desde que recebam algo em troca? Portanto, uma oferta como essa apenas enganaria a ingênuos, que se dispõem a pagar por algo que já têm. Em quinto lugar, Kassab poderia barganhar o apoio do PSD à presidenta Dilma em troca da aliança em São Paulo. Mas vale aqui a mesma lógica dos vereadores: o PSD e seus deputados se dispõem a apoiar qualquer governo que atenda a seus pleitos no Legislativo.

O único ganho a ser auferido pelos petistas no caso de uma aliança com o PSD seria o isolamento de José Serra em relação a um de seus maiores aliados. Contudo, tal ganho é largamente sopesado pelos prejuízos que traz (como nas segunda e terceira razões aduzidas acima). Ademais, Serra já passa por um processo de isolamento dentro de seu próprio partido, tanto na frente nacional (com Aécio à frente), como na estadual (com Alckmin à frente). Para quê, então, gastar cartuchos importantes na aceleração de um processo que já está em curso por questões internas à disputa tucana? Faz mais sentido buscar uma aliança com o principal parceiro nacional, o PMDB, eliminando um adversário que também é ligado à educação, jovem e com forte potencial de crescimento (Gabriel Chalita). Ou então, repetir a tradicional aliança com o PCdoB, que possui um candidato bem situado nas pesquisas (Netinho de Paula) e que reforçaria a candidatura petista na periferia da cidade, oferecendo um contraponto à imagem de moço de classe média escolarizada de Haddad (apesar de sofrer forte rejeição).

Em suma, embora o assédio de Kassab ao PT seja um ato de esperteza política, ela faz muito mais sentido para o prefeito de São Paulo do que para o partido de Lula. Entretanto, como ele, apesar de engenheiro e muito matreiro, não é o único que sabe fazer contas, é pouco provável que tal aliança prospere.

Cláudio Gonçalves Couto é cientista político, professor da FGV-SP

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Em torno do verbo blindar :: Fernando Gabeira

Blindagem é uma palavra nova no vocabulário político do Brasil. Blindar significa revestir com estruturas metálicas para proteger um corpo. Ou evitar que o eventual vazamento de seu conteúdo contamine o ambiente. Nenhuma palavra surge na política dissociada do seu momento histórico.

O verbo blindar ganhou força num período de crescimento econômico, distribuição de renda e licenciosidade dos detentores do poder. A blindagem mais comum ocorre quando surgem evidências contra ministros e o governo e sua base aliada decidem, de certa forma, interromper o questionamento. Como em outras vezes, o governo nos orienta, claramente, a não acreditar nas evidências que estão na mesa, e sim nele e em sua versão oficial. Ao realizar esse movimento, o governo nos joga no terreno da religião e da magia.

Em A Cidade de Deus, de Santo Agostinho, não era a visão física que nos descortinava a realidade, só alcançável pelos olhos da fé. Richard Sennet, em A Consciência do Olho, lembra que os únicos espaços de imunidade no cotidiano medieval eram os terrenos da igreja. Não eram delimitados, como nos palácios, por muros de pedras ou pontes levadiças, e sim pela magia divina. Para esses espaços de imunidade corriam os pobres, os doentes e os desamparados, que, geograficamente, se colocavam dentro do círculo mágico traçado pela bondade divina. A blindagem moderna no Brasil não é um espaço de refúgio dos mais fracos ante da perseguição da urbs. É de uso pessoal, como um abadá metálico, e se destina a proteger alguém no núcleo do poder.

De um ponto de vista religioso, o verbo blindar aproxima-se mais dos versos de Jorge Benjor, no sentido de fechar o corpo: Para que meus inimigos tenham mãos, não me peguem, não me toquem/ Para que meus inimigos tenham olhos e não me vejam/ E nem mesmo um pensamento eles possam ter para me fazerem mal. Na canção Jorge da Capadócia, "vestido com as roupas e as armas de Jorge", o combate é muito mais seguro: Facas, lanças se quebrem, sem o meu corpo tocar/ Cordas corrente se arrebentem sem o meu corpo amarrar. Tudo se passa num universo mágico, onde feitiço, mandingas são combatidos com o fechamento do corpo. É um campo pré-moderno, anterior ao predomínio da ciência e da razão.

Muitos podem dizer que a modernidade também é uma forma de magia que se considera, indevidamente, superior às outras. Mas se há discussão na antropologia, na políticas as dúvidas são menores. Fechar o corpo é pré-moderno no contexto do ritual democrático. Em termos políticos, o verbo blindar é uma invenção infantil que só prospera enterrando as possibilidades de um debate racional. É como se a base aliada fosse um grupo de meninos acossado pelas críticas e decidisse, subitamente, gritar: Shazam! A partir daí, envolvidos no aço, os protegidos seguem seu rumo, fora do alcance humano. Ainda em termos democráticos, o processo de blindagem determinado por um grupo majoritário é o mesmo que encontramos nas partidas infantis em que o dono da bola, vendo seu time ameaçado, acaba com o jogo e a leva para casa.

Sexta economia do mundo, no início do século 21 o Brasil ainda não se desprendeu do realismo mágico celebrizado por romancistas latino-americanos. Ministros blindados entram e saem do Palácio do Planalto. Seus movimentos são reduzidos por causa do peso. Não podem estar juntos em certos lugares porque o assoalho se rompe. Blindando aos poucos seus aliados, Dilma Rousseff poderia exibir uma ala de ministros blindados na parada de 7 de Setembro. Depois de passarem os Urutus, veríamos os ministros blindados, cada qual com sua estrutura e com um tipo de aço, forjado na amizade pessoal, na força do clã ou mesmo na conveniência das alianças regionais.

Ao recusar as evidências, Dilma pede apenas que acreditemos nela, que vejamos com os olhos da fé o luminoso caminho que o Brasil vai trilhar, rumo ao que chama de um país de classe média. Neste começo de ano já se soube que o programa de segurança, chamado Pronasci, fracassou e precisa cortar metade dos investimentos, que seriam de R$ 2 bilhões. Da mesma forma, dados de 2011 indicam que não houve avanços no campo do saneamento básico, mas um pequeno retrocesso: continuamos com 45% das casas sem essa estrutura elementar. Dilma apresentou-se na eleição como a mãe do PAC. Diante dessa nova situação, o melhor é ser apenas Mãe Dilma, dessas que tiram mau-olhado e trazem de volta em 48 horas a pessoa amada. Ao optar pela blindagem, o governo não só fechou o corpo de seus ministros, mas recuou o processo democrático para o universo da magia.

O que podem as pessoas, na chuva, a casa caindo, diante de ministros blindados, que passam em carros blindados? Toneladas de aço e de símbolos tecidos com as linhas de um poder metálico os separam do comum dos mortais. E nós, que pensávamos que a política nos reaproximaria, que era uma de suas qualidades... Já não se trocam tiros, é verdade. Mas a espessa blindagem das forças majoritárias que querem que os adversários tenham olhos, mas não vejam, tenham mãos e não lhes toquem, essa armadura revela que a democracia no Brasil ainda é uma relação vivida com um preservativo de aço.

O verbo blindar sentou praça na política. É um dado novo na trajetória da redemocratização. Representa a quebra da promessa de transparência, entendida não só como revelação das ações, mas também reconhecimento da responsabilidade. Com o verbo blindar rompeu-se o vínculo implícito na promessa. Legalmente, tudo pode ser revelado. No entanto, nada pode ser feito. A possibilidade de esse mecanismo ser rompido: casos com provas arrasadoras, o que os americanos chamam de revólver fumegante e os latinos, batom na cueca. As exceções são uma válvula de escape.

No passado, o corpo fechado dos governantes, como Papa Doc, no Haiti, era atribuído à proteção dos orixás. Que deuses protegem os blindados brasileiros? Os deuses do aumento salarial, das compras em Miami? O processo brasileiro rebaixa, ao mesmo tempo, a democracia e a religião.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Sombras do passado :: Nelson Motta

Por mais que os ficcionistas quebrem a cabeça para inventar crimes, mistérios e conspirações complexos, surpreendentes e emocionantes, os livros, filmes e seriados acabam sempre superados pela vida real. O assassinato do prefeito Celso Daniel completa dez anos sem culpados nem condenados, e pior, desde o início das investigações sete testemunhas e investigados já foram assassinados ou morreram em circunstâncias misteriosas. O principal acusado é digno de um pulp fiction: o Sombra.

O roteiro: prefeito de uma próspera cidade industrial faz um acordo com empresários correligionários para desviar dinheiro público para as campanhas do seu partido. Ninguém ganharia nada, não eram corruptos, eram patriotas a serviço da causa e do partido, afinal, estava em jogo transformar o Brasil, os nobres fins justificavam os meios sujos. Foi assim no início, mas o ser humano?

Com a dinheirama crescendo e rolando sem controle, o Sombra, chefe da operação e amigo do prefeito, começa a desviar para sua própria causa. Outros empresários do esquema, e alguns políticos que intermediavam as contribuições, também começam a meter a mão. Até que o prefeito, que não sabia de nada, descobre tudo e ameaça detonar o esquema. Seria o fim para o Sombra e a quadrilha.

O prefeito é atraído pelo Sombra para uma cilada, o carro dos dois é interceptado por bandidos e o prefeito sequestrado, o Sombra escapa ileso. Nenhum resgate é pedido, dias depois o prefeito é encontrado morto a tiros e com marcas de tortura. Contra as evidências, a polícia trata o caso como um sequestro comum, mas o Ministério Publico vai fundo nas conexões políticas. O garçom que havia testemunhado a última conversa entre o prefeito e o Sombra é executado. Em seguida, uma testemunha da morte do garçom. O bandido que fazia a ligação entre os sequestradores e o Sombra é assassinado na cadeia. O médico legista, que atestou as marcas de tortura, morre envenenado. Ameaçado, o irmão do prefeito se exila na França. O Sombra continua nas sombras, o processo não anda, logo o crime estará prescrito. E o pior de tudo: não é ficção.

FONTE: O GLOBO

Maysa - Ne me quitte pas

No G-20, Brasil é o segundo mais desigual

Atrás só da África do Sul, o Brasil é o segundo país com maior desigualdade do G-20, diz a ONG Oxfam. Mas é um dos quatro do mesmo grupo (ao lado de México, Argentina e Coreia do Sul) que reduziram a desigualdade nos últimos 20 anos. Para a Oxfam, "mesmo que o Brasil tenha avançado no combate à pobreza, é um dos países mais desiguais do mundo, com agenda forte pendente na área".

Brasil é a segunda nação mais desigual do G-20

Estudo da ONG Oxfam mostra, no entanto, que país está entre os quatro que melhoraram a distribuição de renda

RIO e MADRI. Atrás apenas da África do Sul, o Brasil é o segundo país com maior desigualdade do G-20, segundo estudo da ONG Oxfam, voltada para o combate à pobreza e à injustiça social. Por outro lado, o país é um dos quatro do mesmo grupo - ao lado de México, Argentina e Coreia do Sul - que reduziram a desigualdade nas últimas duas décadas.

"Mesmo que o Brasil tenha avanços no combate da pobreza, ele é ainda um dos países mais desiguais do mundo, com uma agenda bem forte pendente nesta área", disse o chefe do escritório da Oxfam no Brasil, Simon Ticehurst, em entrevista à BBC Brasil.

Segundo o estudo, 12 milhões de brasileiros saíram da pobreza absoluta entre 1999 e 2009. Também houve queda da desigualdade medida pelo coeficiente de Gini - que vai de zero, o mínimo de desigualdade, a um, o máximo -, baixando de 0,52 para 0,47 no mesmo período, segundo a BBC Brasil.

Ticehurst também disse à BBC Brasil que é importante que o governo mantenha as políticas de transferência de renda, como o Bolsa Família, e que o Estado intervenha para melhorar o sistema de distribuição de renda.

"Os mercados podem criar empregos, mas não vão fazer uma redistribuição (de renda)", afirmou à versão brasileira da rede britânica.

A pesquisa prevê, ainda de acordo com a BBC Brasil, que, se o país crescer conforme as previsões anunciadas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) - 3% em 2012 e acima de 4% nos anos seguintes - e mantiver a tendência de redução da desigualdade e de crescimento populacional, o número de pessoas pobres cairá quase dois terços até 2020, com menos cinco milhões de brasileiros na linha da pobreza.

Metade dos pobres do mundo está no G-20

No mundo há 1,3 bilhão de pessoas na pobreza (que vivem com menos de US$1,25 por dia). E mais da metade está nos países do G-20, segundo a Oxfam. O estudo da ONG mostra que há uma tendência "preocupante" de aumento da desigualdade nos países do G-20.

Os três países com maiores reservas internacionais - Rússia, China e Japão - foram os que mais registraram aumento da desigualdade. Já a França, o país mais equitativo do G-20 na distribuição de renda, é onde houve menos avanço na desigualdade. Alemanha, Canadá, Itália e Austrália, apresentam condições também mais iguais. Os Estados Unidos, por outro lado, é o país mais desigual entre as nações ricas.

"A experiência do Brasil, da Coreia do Sul e de vários países de renda baixa e média-baixa mostra que reduzir a desigualdade está ao alcance dos dirigentes do G-20", diz o estudo da Oxfam.

"Não existe escassez de potenciais alavancas para políticas (de redução da desigualdade). Em vez disso, talvez exista uma escassez de vontade política", acrescenta o documento.

(Com El País)

FONTE: O GLOBO

Ministra argentina diz que Brasil é protecionista

Débora Giorgi reage à afirmação feita pelo ministro Pimentel de que a Argentina é um "problema permanente"

Marina Guimarães

BUENOS AIRES - O governo da presidente Cristina Kirchner criticou fortemente a declaração do ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior do Brasil, Fernando Pimentel, de que "a Argentina é um problema permanente". O ministro fez o comentário em entrevista à agência Dow Jones, na terça-feira.

Em nota distribuída à imprensa, a ministra de Indústria da Argentina, Débora Giorgi, afirmou que "a realidade do comércio bilateral entre Argentina e Brasil não condiz com os comentários feitos por Pimentel".

A ministra ressaltou que a Argentina foi responsável por 19,5% do superávit comercial de quase US$ 30 bilhões obtido pelo Brasil em 2011. Além disso, continuou Débora, no último ano, o déficit da balança comercial argentina com o sócio foi de US$ 5,8 bilhões. As compras de produtos brasileiros pelo mercado argentino cresceram 23% em relação a 2010, com US$ 22,71 bilhões, detalhou.

A ministra argentina alegou que as medidas que restringem as importações em seu país "seguem as normas dos tratados regionais e da Organização Mundial do Comércio (OMC)". Porém, a ministra não justificou a demora de mais de 60 dias - período máximo determinado pela OMC - para autorizar a importação de milhares de produtos brasileiros, entre eles os eletrodomésticos de linha branca, máquinas e equipamentos agrícolas, têxteis e outros.

Com um forte tom de reclamação, Débora acusou o Brasil de protecionismo. "A Argentina busca reequilibrar o comércio e a industrialização regional, requerendo o acesso ao mercado brasileiro e pedindo a eliminação das múltiplas barreiras não tarifárias existentes para a entrada de nossos produtos no mercado vizinho, ao mesmo tempo em que defendemos nossos produtos da concorrência desleal implícita nos incentivos à produção, à exportação e ao investimento."

Engessamento. Os analistas argentinos preveem um período de fortes conflitos comerciais no Mercosul, especialmente entre o Brasil e a Argentina, em consequência da exigência de uma declaração prévia à ordem de compra. A medida entrará em vigor no primeiro dia de fevereiro. "Se a Argentina não excluir o Brasil e o Uruguai do novo mecanismo que burocratiza as importações, haverá importantes atritos entre os parceiros, que poderiam provocar retaliações", avaliou Raúl Ochoa, especialista em integração e ex-secretário de Comércio Exterior. Ele disse ao Estado que a medida vai engessar o comércio.

Na avaliação do economista-chefe da Fundação de Investigações Econômicas Latino-americanas (Fiel), Juan Luis Bour, o governo argentino não deverá abrir exceções porque as restrições são uma solução de curto prazo para manter o superávit comercial do país a qualquer preço. "As disputas comerciais serão mantidas, e vamos ver muitas queixas por parte dos sócios, especialmente porque há outras restrições que não são tão visíveis, como a proibição para que as empresas não enviem os lucros ao exterior", disse Bour.

A escalada da tensão comercial com o Brasil já começa a preocupar os empresários argentinos. Com a memória ainda fresca do bloqueio sofrido pela indústria automobilística local no ano passado, com centenas de veículos argentinos acumulados na fronteira, o presidente da Fiat Argentina, Cristiano Rattazzi, apelou para o espírito do Mercosul. Em entrevista ao Estado, Rattazzi opinou que os dois países "precisam limar qualquer tipo de aspereza e resgatar o espírito inicial do Mercosul, que é o de integração total da região para conquistar outros mercados e fazer acordos de comércio com outros países".

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Economist" cita Brasil entre países "capitalistas de Estado"

SÃO PAULO - A revista britânica "The Economist" citou o Brasil entre os países emergentes adeptos de uma nova forma de "capitalismo de Estado".

Capa da edição nas bancas, o texto sustenta que os Brics (Brasil, Rússia, India, China e África do Sul) engendraram um novo tipo de empresa híbrida, apoiada pelo Estado, mas que se comporta como empresa do setor privado.

A revista assinala que, na década de 1990, acreditava-se que as estatais, pouco competitivas, seriam fechadas ou privatizadas. Porém, elas foram responsáveis ​​por 1/3 dos investimentos estrangeiros diretos nos países emergentes entre 2003 e 2010.

A "Economist" diz que o governo brasileiro, que abraçou a privatização nos anos 1990, agora interfere em decisões de Petrobras e Vale, e transforma empresas menores em campeãs nacionais.

O artigo aponta fraquezas no modelo, como o fato de empresas com apoio do Estado ocasionarem perda de competitividade nas rivais

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Previsão para alta do PIB do Brasil cai de 3,6% para 3%

O Fundo Monetário Internacional (FMI) avalia que as economias de países emergentes também sofrerão deterioração em 2012 e 2013. Para este ano, a média é de uma expansão de 5,4%, ante projeção de 6,1% em setembro. Para 2013, o crescimento previsto é de 5,9%.

Para o Brasil, o FMI espera alta de 3% em 2012, ante estimativa de 3,6% há quatro meses. A previsão é mais negativa que a do Banco Mundial e a do governo, que fala em 4% a 4,5%. Para 2013, a expectativa é de 4%.

Segundo o FMI, o impacto em 2012 no Brasil será sentido na perda de vitalidade do mercado doméstico. "O crescimento nos mercados emergentes sofrerá desaceleração por causa do ambiente externo deteriorado e por uma queda na demanda doméstica", alertou o Fundo.

Entre os países do Brics, a China é o que mais crescerá, com 8,2% em 2012 e 8,8% em 2013. O FMI estimava que a China poderia manter expansão de 9%, mas reviu a avaliação. Para a Índia, o Fundo espera expansão de 7% e, para a Rússia, 3,3%. / J.C.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

BNDES financiará até 80% de investimentos em aeroportos

TCU quer que governo reduza significativamente participação da Infraero na sociedade que administrará terminais

Henrique Gomes Batista, Geralda Doca e Ronaldo D"Ercole

RIO, BRASÍLIA e SÃO PAULO. O BNDES financiará até 80% dos investimentos que serão realizados nos aeroportos que devem ser privatizados em fevereiro - Guarulhos, Brasília e Viracopos (Campinas). O banco divulgou ontem as condições especiais para o empréstimo aos vencedores, que terão seis meses de carência e prazo total de pagamento de até 240 meses. O banco, contudo, não financiará o valor da outorga - o prêmio que a ser pago ao governo federal por quem assumir os terminais.

Embora o limite total do financiamento seja de 80%, poderá chegar a 90% dos itens financiáveis. Até 70% do financiamento do banco serão indexados pela Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), hoje em 6% ao ano e uma das mais baixas do país. O restante terá outros indexadores. A remuneração básica do BNDES será de 0,9% ao ano, acrescida da taxa de risco, que pode variar de 0,46% a 3,57% ao ano.

Além dos investimentos, o BNDES pode conceder um "empréstimo-ponte", que terá como custo a remuneração básica do BNDES, de 0,9% ao ano, acrescido de TJLP mais 1% ao ano, e de uma taxa de risco de crédito.

O financiamento dos investimentos terá prazo de utilização de até 84 meses, com seis meses de carência. O financiamento será estruturado em parcelas com base nas características dos investimentos. Os juros serão pagos trimestralmente durante a carência. O prazo total do financiamento, incluindo o empréstimo-ponte, será de 180 meses para os aeroportos de Guarulhos e Brasília, e de 240 meses para o terminal de Campinas.

Leilão pode ser adiado para depois do dia 6

Já o Tribunal de Contas da União (TCU) quer que o governo reduza significativamente a participação da Infraero na sociedade que vai administrar os aeroportos, fixada em 49% no edital. Este, além de outros problemas, é um dos motivos que podem levar ao adiamento do leilão dos três terminais, marcado para o próximo dia 6.

Oficialmente, os órgãos do governo envolvidos mantêm a data, mas, nos bastidores, fala-se da necessidade de reabertura do prazo, diante dos problemas detectados pelo TCU no edital. No relatório aprovado pelo TCU em dezembro, o ministro Aroldo Cedraz já havia feito recomendação para que o governo reavaliasse a participação da Infraero, sob pena de prejudicar a eficiência na nova empresa na gestão dos aeroportos.

Embora o ministro da Secretaria de Aviação Civil, Wagner Bittencourt, tenha adiantado que o governo não seguiria a sugestão, como confirmado no edital, uma fonte afirma que a Casa Civil pode ser obrigada a ceder. Há várias negociações com o TCU para contornar os impasses, evitando, assim, atrasar o leilão.

Segundo o relatório do TCU, o modelo proposto pelo governo, de administração pública e privada, pode atrapalhar o processo decisório da nova empresa e a eficiência buscada.

Os rumores de adiamento do leilão causaram estranheza entre os representantes de alguns dos consórcios que se preparam para a disputa. Marlon Shigueru Ieiri, do escritório FHCunha Advogados, se surpreendeu porque todos os estudos prévios foram aprovados pelo TCU antes da publicação do edital. A Fidens, construtora mineira que se associou à americana ADC&HAS informou que "não tem conhecimento deste assunto", e reiterou que está preparada.

Também causou inquietação o adiamento da divulgação das respostas aos questionamentos ao edital encaminhados à Anac. Elas deveriam ter sido publicadas na quarta-feira, mas foram adiadas para segunda-feira.

FONTE: O GLOBO

Reforço no caixa do BNDES pode chegar a R$55 bi

Valor é igual ao liberado para a instituição em 2011

Martha Beck

BRASÍLIA.O reforço que o Tesouro fará no capital do BNDES este ano pode chegar a R$55 bilhões. O valor é igual ao liberado para a instituição em 2011. Embora o ministro da Fazenda, Guido Mantega, já tenha declarado que a intenção do governo é reduzir os aportes no banco e dar espaço ao setor privado para financiar o investimento de longo prazo no país, a avaliação dos técnicos é de que isso ainda não é possível. A prioridade no ano de 2012 é turbinar os investimentos para promover o crescimento da economia. Além disso, as ações do governo para estimular o setor privado a aplicar recursos em áreas importantes, como infraestrutura, ainda não foram suficientes para alavancar esse segmento significativamente.

As Letras Financeiras (LFs), por exemplo, títulos de crédito de longo prazo criados em 2009 para dar fôlego ao investimento privado, fecharam 2011 com um estoque de R$148,5 bilhões, segundo a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Esse montante responde por menos de 10% do mercado de títulos privados no país. Já os CBDs respondem por mais de 50% e as debêntures, mais de 30%.

Já os CRIs, papéis lastreados em créditos imobiliários garantidos por imóveis e vistos como uma alternativa importante de financiamento no lugar da caderneta de poupança, também têm pouca representatividade no mercado brasileiro. Segundo a Anbima, eles fecharam 2011 com estoque de R$27,8 bilhões.

Cálculo da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib) mostra que o país precisa de, ao menos, R$188,6 bilhão em investimentos por ano até 2015. Técnicos do governo admitem que, para essa demanda, o BNDES continuará tendo papel essencial:

- O ideal é que o BNDES receba menos aportes ao longo dos próximos anos, mas isso continuará a ser feito enquanto o mercado privado amadurece - disse um membro da equipe econômica.

Outro fator que contribui para um aporte elevado no BNDES este ano é o fato de o governo contar com a instituição para financiar projetos nos quais a União precisa entrar como parceira do setor privado, como na concessão dos aeroportos de Brasília, Guarulhos e Viracopos.

FONTE: O GLOBO

País vai desembolsar R$ 655 bilhões para pagar dívidas em 2012

Dilma sanciona lei com orçamento da União para 2012

Da receita total, de R$ 2,2 tri, R$ 655 bi vão para o financiamento da dívida pública

BRASÍLIA - O Diário Oficial da União publica na edição dessa sexta-feira, 20, o Orçamento para 2012. A lei aprovada pelo Congresso Nacional no final de dezembro do ano passado foi sancionada na quinta-feira, 19, sem vetos, pela presidente Dilma Rousseff.

A lei estima em R$ 2,257 trilhões a receita da União para o exercício financeiro deste ano. Excluindo-se os gastos com o refinanciamento da dívida - no valor de R$ 655 bilhões - o total cai para aproximadamente R$ 1,6 trilhão.

O orçamento para pagamento de pessoal em 2012 chega a R$ 203,24 bilhões. O valor não contempla nem os reajustes salariais dos servidores nem o aumento real dos benefícios pretendidos pelos aposentados que ganham acima do salário mínimo.

A concessão dos reajustes foi um dos pontos controversos da proposta orçamentária. Manifestantes que pediam recursos para os aumentos chegaram a provocar a interrupção de uma reunião da Comissão de Orçamento.

A Lei do Orçamento abrange o orçamento fiscal referente aos poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta - inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, no valor de R$ 959,1 bilhões.

Engloba também o orçamento da seguridade social (R$ 535,7 bilhões), com todas as entidades e órgãos a ela vinculados, além de fundos e fundações, instituídos e mantidos pelo Poder Público.

(Com Agência Brasil e Agência Estado)

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O crescimento necessário: Rogério L.F. Werneck

Na discussão sobre a possível desaceleração do crescimento chinês, voltou a ser lembrado na mídia que a liderança do Partido Comunista da China estaria convencida de que a expansão da economia não pode cair abaixo de 7% a 8% ao ano. Crescimento mais lento poria em risco a coesão social do país e o regime unipartidário. Guardadas as devidas proporções, pode-se fazer indagação similar sobre o Brasil: a que taxa tem de crescer a economia brasileira? Embora não seja uma pergunta fácil, o governo tem a resposta pronta.

Na entrevista publicada na revista The New Yorker em dezembro, a presidente Dilma Rousseff explicou que "precisamos manter a economia crescendo, sem inflação, para gerar receita que permita continuar nossa política de distribuição de renda". A equipe da Fazenda tem sido bem mais específica. Está convencida de que o crescimento tem de ser de pelo menos 4,5% ao ano, para que a receita tributária permita ao governo continuar a expandir o dispêndio e levar adiante seus programas, sem deterioração das contas públicas.

É uma visão um tanto peculiar dos limites da desaceleração do crescimento. Na China, menos de 7% deixariam o país à beira da explosão social. No Brasil, menos de 4,5% deixariam o governo impossibilitado de dar continuidade à rápida expansão do gasto público que embasa seu projeto político. Há muitas razões para defender um crescimento econômico de 4,5% ao ano. O que há de peculiar é que, entre todas, a que mais mobiliza o governo seja a folga fiscal gerada por tal ritmo de expansão do PIB.

É importante ter essa firme convicção do governo em mente, ao analisar suas supostas dúvidas sobre como conduzir a política macroeconômica nos próximos meses. O Planalto assustou-se com a desaceleração da economia. E quer que o crescimento seja retomado tão logo quanto possível. Há boas razões para crer que, a menos de cenários muito adversos para a economia mundial, a retomada já esteja a caminho, na esteira do afrouxamento monetário observado nos últimos meses. Mas o governo não quer dar tempo ao tempo e deixar que os efeitos da queda da taxa de juros se façam sentir em toda sua extensão. Um aumento do nível de atividade concentrado no segundo semestre lhe parece tardio e insuficiente. Significaria mais um ano de crescimento do PIB a cerca de 3%. E de pouca fartura fiscal para fazer face ao reajuste do salário mínimo e a outros aumentos de dispêndio já encomendados.

Pronto a abandonar seu novo discurso sobre política fiscal, adotado há menos de cinco meses, o Planalto não esconde que gostaria que o estímulo monetário fosse complementado com mais um vigoroso impulso fiscal. O governo anda especialmente preocupado com o investimento público, que caiu no ano passado. Não por contenção de gastos, mas pelo desmantelamento das cadeias de comando que acionavam decisões de investimento em ministérios infestados por esquemas de corrupção.

O Planalto agora tem pressa. Foi-se o primeiro ano do mandato. Há eleições municipais pela frente. A cada dia, as deficiências da infraestrutura parecem mais desgastantes. E os cronogramas da preparação do País para a Copa do Mundo e a Olimpíada, mais alarmantes. Mas como recuperar o investimento público e assegurar o impulso fiscal capaz de antecipar a retomada, sem que as contas públicas se deteriorem e o combate à inflação seja comprometido?

Não é difícil vislumbrar a "solução". Mais uma vez, o governo parece propenso a apelar para o orçamento paralelo que montou no BNDES, alimentado por transferências diretas do Tesouro, não contabilizadas nas estatísticas de resultado primário e de dívida líquida do setor público. Caso a situação externa se agrave, poderá ser feita nova e vultosa transferência de recursos do Tesouro ao BNDES, com roupagem salvacionista. Mas mesmo que não se agrave, o governo parece disposto a fazer tal transferência a seco. Dissimulando-a, talvez, com a cortina de fumaça de um programa espalhafatoso - e inócuo - de contingenciamento de gastos.

FONTE: O GLOBO

Os direitos humanos do dinheiro:: Vinicius Torres Freire

"Hedge funds" ameaçam ir a tribunal europeu de direitos humanos contra possível calote do governo grego

Uns fundos de investimento chamados "hedge funds" ameaçam levar o governo grego à Corte Europeia de Direitos Humanos caso o país dê um calote, diz uma história publicada no "New York Times".

A Grécia negocia uma redução de mais de 50% de sua dívida com credores privados (R$ 510 bilhões de um total de R$ 800 bilhões de débitos). Banco Central Europeu e FMI, com cerca de um terço da dívida grega, não serão tungados -mais um argumento dos "hedge funds" para querer o dinheiro deles de volta.

Muito credor privado deve aceitar o "calote suave", até porque não tem alternativa e, caso a Grécia venha a dar calote puro e simples, o tumulto será tal que bancos perderão mais dinheiro em outras praças.

Mas alguns "hedge funds" querem "diversão garantida ou seu dinheiro de volta". Consideram o calote uma violação de seu direito de propriedade, um direito humano na Europa. Essas firmas são a ponta de lança dos investimentos financeiros mais complexos do planeta.

Especula-se (não há como ter certeza) que muito "hedge fund" comprou títulos da dívida grega na liquidação (baratinho) e, ao mesmo tempo, fez contratos de seguro contra a perda com tais papéis (na verdade, compraram CDS, "credit default swaps", um título financeiro que funciona como um seguro contra calotes, grosso modo). Ontem, a dívida grega que vence em março valia apenas 44% do valor de face.

Caso a "reestruturação" de parte da dívida grega seja considerada calote pela International Swaps and Derivatives Association (Isda), os CDSs terão de ser pagos (pela contraparte dos "hedge funds").

Haverá "calote" se a "reestruturação" não for "voluntária". Aliás, a tunga é oficialmente chamada de "envolvimento do setor privado", mais eufemismo para sujeiras.

Se o calote for "oficializado" pela Isda, os "hedge funds" pegariam seu dinheiro de volta, também detonando curtos-circuitos na finança europeia (pagamentos de coberturas de prejuízos em série).
A Isda é uma associação de firmas financeiras e outras que procura colocar alguma ordem nas negociações de derivativos negociados fora de Bolsas e assemelhados.

Um CDS é um derivativo, um título financeiro cujo valor depende de um outro papel (no caso, os papéis da dívida do governo grego).

O mais divertido, porém, é o sentido último da possível iniciativa dos "hedge funds". Se esse pessoal tivesse razão e, pior, ganhasse a ação, estaria extinto o risco (e, portanto, deveriam também ser extintos os prêmios de risco, o extra de juros cobrado devido ao medo de calote).

Como se disciplina um mercado de dinheiro se não há mais o risco de não receber o empréstimo de volta? Pela taxa de retorno, pode ser. Ainda restaria esse sinal de preço para regular os negócios.

Mas, sem risco de calote, haveria empréstimos ineficientes aos montes, certo? O direito pétreo à propriedade do dinheiro tenderia a resultar pois em desperdício de dinheiro, em mercados ineficientes.

Sim, o argumento foi esticado ao absurdo, mas quem detonou a especulação (de ideias) maluca foram os "hedge funds" reclamando direitos humanos. Aliás, podemos imaginar também representantes das crianças gregas que ora dependem de ajuda para comer indo às Cortes pelo direito a vida & comida. Certo?

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Carros de sobra:: Míriam Leitão

Há carros sobrando no mundo. A indústria automobilística mundial está ociosa em 20 milhões de veículos. Esse é o número de carros que podem ser produzidos mas não há compradores. O número é cinco vezes o mercado brasileiro, que consumiu, em 2011, 3,7 milhões de automóveis leves. A produção no país subiu 0,7%; as exportações cresceram 7,5%; e as importações dispararam 29,8% no ano passado.

A projeção da PricewaterhouseCoopers (PWC) para este ano é que a ociosidade vai aumentar de 20 milhões para 24 milhões. Todas as montadores do mundo chegarão ao final do ano com capacidade de produção de 103 milhões de veículos. Mas o consumo projetado é de apenas 79 milhões.

Por isso a venda de importados vem subindo tanto. Um em cada quatro carros vendidos no Brasil em 2011 foi fabricado fora do país. O importante a se lembrar sempre é que 85% das importações foram feitas pelas próprias montadoras: 650 mil veículos. Outros 200 mil entraram via importadoras, que trouxeram carros da China, Japão e Coreia do Sul, principalmente.

- O pano de fundo para se analisar a indústria brasileira é a ociosidade de produção mundial, provocada pela crise econômica americana e europeia. O mercado está se deslocando para os países emergentes, tanto em termos de produção quanto de consumo - disse o sócio-diretor da PWC, Paulo Petroni, que fez um estudo sobre o setor.

A alta de um ano para o outro via importadoras chegou a 87%. A venda de carros chineses cresceu 346%, e a de japoneses, 108%, mas a base de comparação era baixa. A maior parte veio da Argentina e do México, países com os quais o Brasil possui acordos comerciais. Metade dos importados veio da Argentina.

- A importação feita pelas montadoras é reflexo da crise que houve na Argentina. Anos atrás, o país ficou com uma ociosidade de produção muito grande e foi mais fácil para as montadores transferir para lá parte da produção do que investir em novas plantas no Brasil - explicou Flávio Meneghetti, presidente da Fenabrave.

A participação dos veículos importados no mercado interno brasileiro saltou de 5,1%, em 2005, para 24% em 2011, segundo a PWC. No mesmo período, as exportações caíram de 30,7% para 15,9% do total da produção.

A produção nacional cresceu 0,7% no ano passado e as vendas subiram 3,3%. Para este ano, a Anfavea prevê que a produção vai crescer 2%, mas as exportações devem cair 5,5% por causa da retração do consumo mundial.

- O excedente de produção em nosso setor provoca uma crescente dificuldade de competição. E há falta de competitividade não só da indústria automotiva mas da própria economia brasileira - diz Ademar Cantero, diretor de Relações Institucionais da Anfavea.

Mais do que a valorização do real, Ademar culpa os problemas de sempre para justificar a crescente dificuldade de exportar e competir com os importados: impostos elevados; mão de obra mais cara que a de outros países; infraestrutura ineficiente; energia cara; burocracia. Acha que as medidas do governo para o setor foram importantes, mas que não resolvem problemas que são estruturais.

- Foi uma medida pontual e inicial enquanto se desenha o novo regime automotivo. Até 2020, as vendas de automóveis devem saltar de 3,7 milhões para 6,5 milhões. Se nada for feito, esse aumento de demanda será ocupado pelos importados - disse.

Pelas contas de Paulo Petroni, o custo de produção de um veículo médio no Brasil é 60% maior do que na China; 52% maior do que na Índia; e 33% maior do que no México:

- O custo da mão de obra no Brasil supera o da mexicana, apesar de o trabalhador brasileiro receber salário menor. Temos encargos, taxas e contribuições que incidem sobre as folhas de pagamento. O trabalhador brasileiro leva para casa por volta de 55% do custo total da mão de obra; o mexicano, por volta de 75%.

O kWh de energia elétrica no Brasil custa 0,81; contra 0,09 na Argentina; 0,05 no México; e 0,58 na Europa. O aço brasileiro, segundo a PWC, tem preço historicamente 35% a 40% acima dos níveis internacionais.

Ainda assim, não se pode dizer que o setor automobilístico brasileiro apresenta maus resultados. O setor de veículos e peças fechou o ano com queda de apenas 0,4% na bolsa brasileira. Resultado muito melhor do que o do Ibovespa, que fechou em queda de 18,4%. A indústria automobilística terminou o ano com 144.710 empregados nas montadoras, 6,3% a mais que o total de dezembro de 2010. As vendas de motos cresceram 7,58% no ano passado. A de ônibus disparou 21,73%, enquanto a de caminhões subiu 9,69%.

A Fenabrave projeta uma alta de 5,76% nas vendas para 2012, incluindo automóveis, comerciais leves, caminhões, ônibus e motos. Somente para carros, a expectativa é de emplacar 3.579.699 unidades, com aumento de 4,5% sobre 2011. Para caminhões, é prevista alta de 9,6%. Para ônibus, 14,3%. E, para motos, 7,5%.

O lobby da indústria brasileira sempre foi forte e alguns governos são mais sensíveis a essa pressão. O atual é tão sensível que há quem diga que o MDIC, Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, deveria se chamar MIA, Ministério da Indústria Automobilística. Mas com o excesso de produção mundial, que de fato existe, e com o aumento de importação, que em parte elas mesmas fizeram, o setor se enche de argumento para pedir medidas excepcionais de proteção. Só que a maioria dos problemas dos quais reclama todos os outros setores enfrentam. O mais adequado seria melhorar as condições de competitividade para toda a indústria brasileira.

FONTE: O GLOBO

E a reforma do Estado? (1):: Sérgio C. Buarque

Parece haver um consenso nos meios políticos brasileiros de que a reforma política é, como dizem, “a reforma das reformas”, embora o entendimento termine quando se discute o conteúdo das mudanças que corrigiria os vícios e as distorções do atual sistema político brasileiro. No entanto, por mais que seja importante, a reforma política é apenas um componente de uma transformação mais ampla e profunda do Estado brasileiro, quase ausente da agenda política, embora seja a base primária do desperdício dos recursos, da ineficiência e da corrupção que dominam no Brasil.

Entre vários aspectos que pedem uma reforma do Estado, merece atenção especial a combinação esdrúxula do sistema federativo: alta concentração da União e grande fragmentação municipal. A excessiva e irracional centralização da estrutura federativa se manifesta com a apropriação pela União de cerca de 60% da receita final disponível dos governos, tornando Estados e municípios dependentes e reféns do governo federal (os 27 Estados ficam com algo em torno de 25% e os 5.565 municípios dividem o restante). O resultado é a patética revoada de governantes para busca de recursos em Brasília para médios e pequenos projetos locais, provocando uma grande ineficiência, a dependência e as adesões políticas espúrias, e as malfadadas emendas parlamentares. A esmagadora maioria dos investimentos públicos no Brasil passa e é decidida pela União, da construção de uma grande rodovia às ações emergenciais nas enchentes ou a implantação de uma quadra esportiva em um pequeno município do interior.

A reforma do Estado deve, portanto, promover uma forte redistribuição dos recursos públicos entre os entes federativos e, como consequência, a redefinição dos papéis com o aumento dos recursos e das responsabilidades dos Estados e dos municípios. A União deve se concentrar nas questões nacionais e nos grandes projetos estratégicos e de larga abrangência territorial. As ações localizadas e os projetos de médio e pequeno porte devem ser de responsabilidade dos Estados e municípios. Esta descentralização contribui para uma redução significativa dos custos, aumenta a eficiência e favorece os resultados pela proximidade dos problemas e da sociedade, e elimina a dependência política e a troca de favores com as instâncias superiores de governo. A reforma deve rever também a excessiva fragmentação municipal em unidades territoriais inviáveis e insustentáveis (este aspecto será analisado no próximo artigo).

Outro aspecto crítico da gestão pública do Estado brasileiro reside no loteamento político das funções gratificadas nos diversos níveis e instâncias governamentais, fonte de favores e transações políticas, instabilidade gerencial e politização das atividades técnico-gerenciais, esta farra de nomeações compromete sua qualidade e eficácia da gestão, gera instabilidade e permite a formação de rede de operadores de desvio de recursos públicos. A resposta a esta distorção do sistema público de gestão é uma ampla profissionalização dos cargos públicos de direção, limitando a nomeação dos governantes ao primeiro escalão do governo e seus assessores imediatos, todos os cargos comissionados a partir do segundo escalão devem ser ocupados por servidores de carreira com mérito e competência comprovada na área e, como tal, com compromisso com a função pública e independência dos poderosos de plantão.

Sérgio C. Buarque é economista e consultor

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

'É importante ter uma aliança'

Com relação ao PSD, o pré-candidato tucano à Prefeitura diz que quem cuida do assunto é o governador Alckmin

Apontado como preferido no grupo do ex-governador José Serra para disputar a Prefeitura pelo PSDB, caso não saia o acordo com o PSD, do prefeito Gilberto Kassab, o secretário estadual de Cultura, Andrea Matarazzo, disse "respeitar as decisões de Serra". "Até porque sempre entendi que a história dele é a história de um vencedor na política", afirmou em entrevista ao Estado.

Com a decisão de Serra de não concorrer, as prévias são um caminho sem volta no partido?

Acredito que sim, porque avançaram muito. O partido está muito motivado, todo mundo animado, e isso está fazendo muito bem ao partido. Acho importante uma aliança ampla. Uma aliança que tenha nossos parceiros de sempre, como DEM, PP, PTB e, obviamente, o PSD, um partido importante, até porque hoje o prefeito Kassab lidera o PSD. É uma discussão que está em curso e que pode ser bem sucedida.

Como foi a conversa do sr. com Kassab para ter o apoio do PSD?

Quem está cuidando da questão de aliança é o partido e o governador Alckmin. Tenho conversas com o prefeito por ser amigo dele há mais de 20 anos. Então a gente conversa de política normalmente. Mas não no assunto alianças. Quem tem que cuidar das alianças é o governador, que é o chefe político do partido no Estado.

Acha que Alckmin deve declarar seu voto como militante, como disse que faria quando houve ameaça de prévias em 2004?

Olha, o governador tem que ter a posição que ele achar importante. Ele tem a agenda dele. A decisão que tomar será sempre aceita por mim. Mas acho que ele fará o que tem dito e feito sempre, que é manter uma certa distância do processo e equidade entre os candidatos.

O ex-governador Alberto Goldman e o senador Aloysio Nunes Ferreira já disseram que o apoiariam numa prévia. O sr. espera o apoio declarado de Serra?

Para mim, o fundamental é ter apoio da militância. Obviamente entre todos os militantes, e eles se incluem na militância do partido. E é fundamental o apoio da sociedade. Cada voto é um voto. Quero o apoio deles, como de todos os militantes.

Como pretende rebater as acusações de que teria implementado uma política higienista na capital quando secretário de Serra?

É mais uma vez o PT repetindo incansavelmente uma mentira, com finalidade eleitoral. As pessoas que conhecem a cidade sabem bem do meu trabalho.

O pré-candidato do PMDB, Gabriel Chalita, tenta fechar o apoio do DEM, retirando o tradicional aliado da aliança com o PSDB?

O DEM ficará conosco.

O que achou das críticas de Chalita sobre a operação da Polícia Militar na cracolândia?

Gabriel conhece São Paulo até Higienópolis, nunca chegou até a Duque de Caxias. É opinião de quem não conhece, até porque é especialista em autoajuda e não em ajudar os outros. 

O que acha da decisão de Serra de não disputar? O PSDB deve pedir a ele que reveja a posição?

Acho que o governador Serra tem uma história não só no partido, mas no País. E, portanto, está credenciado para disputar o cargo que ele decidir ser mais importante no momento. Sempre respeitei as decisões do Serra até porque sempre entendi que a história dele é a história de um vencedor na política.


FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A flor e a náusea :: Carlos Drummond de Andrede

Preso à minha classe e a algumas roupas,
Vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas, revoltar-me'?

Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.

Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.

Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.

Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.

Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.