Presidente do grupo Companhia das Letras fala sobre sua carta e crise no setor
Francesca Angiolillo | Folha de S. Paulo
SÃO PAULO - Com dívidas exorbitantes, as maiores redes de livrarias do país, Cultura e Saraiva, entraram com pedidos de recuperação judicialno lapso de um mês, ameaçando o setor editorial como um todo.
Uma carta, divulgada na última terça (27), foi a maneira que Luiz Schwarcz, 62, presidente do grupo Companhia das Letras, encontrou para convocar ao enfrentamento do que chamou de “os dias mais difíceis” do livro no país.
O editor recebeu a Folha na sede da Companhia das Letras para analisar a crise e comentar sua opção pelo apelo direto ao leitor. “Não é assim que a política está funcionando?”
Na opinião de Schwarcz, deve haver uma reversão na tendência de alta de vendas que vinha desde 2017. Para ele, editores contribuíram para a crise ao segurarem o preço dos livros, apesar da inflação.
Nos últimos dias, ele diz ter visto otimismo com a mobilização gerada após sua carta.
“O que vai acontecer agora no Natal, eu não sei dizer.” Mas, conta, “publicitários mandaram slogans para lojas fazerem cards digitais, lojas do interior pedem chamadas para campanhas próprias, novas campanhas entrarão no ar por sites de mobilização. Não sei o tamanho da ajuda, mas alguma haverá.”
• A crise deve afetar editoras de diferentes portes ao mesmo tempo?
Acho que editoras de portes diferentes sentem a crise diferentemente. Muitas editoras pequenas não forneciam para essas redes. As grandes foram as que tiveram maiores danos pelo volume de crédito que tinham, ou pelo volume de livros consignados em poder das livrarias. No entanto têm mais poder de recuperação. O grave talvez seja para as médias; elas podem representar parte significativa do montante que não será pago.
O Brasil esteve na maré contrária um tempo atrás, as livrarias muito mal lá fora e muito bem aqui. Isso se inverteu.
O que acho que aconteceu em parte nos EUA e que é diferente daqui, é que houve uma concentração muito grande na venda online e um crescimento da venda digital, que depois diminuiu. Agora você tem as livrarias independentes se fortalecendo de novo.
Nos EUA a venda online representa 50% do mercado. No Brasil não existe isso. Houve outros fatores na minha opinião, erros de gestão sobre os quais pretendo falar pouco, porque não cabe a mim julgar.
• Quais?
Em linhas gerais, o que eu posso dizer é que essas redes não voltaram com o Brasil. Continuaram com um número grande de pontos, talvez até por motivos nobres, ou não queriam olhar para a recessão que estava pegando também o leitor. Demoraram para se adequar, até agora.
No momento que o Brasil começa a crescer, que uma classe C ou D começa a entrar no mercado, cria-se a ilusão de que os volumes vão crescer, o que de fato começa a acontecer, e para uma classe que estava crescendo na pirâmide educacional, mas não proporcionalmente na de renda. Então os editores, para entrar nas listas de mais vendidos, começam a quantificar o livro; R$ 29,90 era quase padrão para poder ser best-seller, depois R$ 34,90, R$ 39,90. Então você imagina as redes de livrarias na ilusão de crescimento, os editores na ilusão do best-seller e esses livreiros tendo que pagar salários e aluguéis indexados pela inflação.