Não queremos negociar nada, diz Bolsonaro em ato pró-intervenção militar diante do QG do Exército
Presidente discursou para apoiadores aglomerados e com bandeiras contra o Congresso e gritos de ataques ao Supremo
Ricardo Della Coletta / Renato Onofre – Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - Em cima da caçamba de uma caminhonete, diante do quartel-general do Exército e se dirigindo a uma aglomeração de apoiadores pró-intervenção militar no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou neste domingo (19) que "acabou a época da patifaria" e gritou palavras de ordem como "agora é o povo no poder" e "não queremos negociar nada".
"Nós não queremos negociar nada. Nós queremos ação pelo Brasil", declarou o presidente, que participou pelo segundo dia seguido de manifestação em Brasília, provocando aglomerações em meio à pandemia do coronavírus. "Chega da velha política. Agora é Brasil acima de tudo e Deus acima de todos."
"Todos têm que ser patriotas, acreditar e fazer sua parte para colocar o Brasil no lugar de destaque que ele merece. Acabou a época da patifaria. É agora o povo no poder. Mais que direito, vocês têm a obrigação de lutar pelo país de vocês", afirmou Bolsonaro, que tossiu e levou a mão à boca ao final do discurso.
"O que tinha de velho ficou para trás. Nós temos um novo Brasil pela frente. Todos no Brasil têm que entender que estão submissos à vontade do povo brasileiro", disse. "Contem com o seu presidente para fazer tudo aquilo que for necessário para manter a democracia e garantir o que há de mais sagrado, a nossa liberdade", completou o presidente.
A aglomeração diante do quartel-general do Exército foi o ato final de uma carreata em Brasília, feita pelos apoiadores do presidente e com pedidos de intervenção militar, gritos contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal, e pressão pelo fim do isolamento social recomendado pela OMS contra a pandemia.
A fala de Bolsonaro e sua participação nesse ato em Brasília, no Dia do Exército, provocaram fortes reações no mundo jurídico e político.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse ser uma “crueldade imperdoável com as famílias das vítimas” pregar uma ruptura democrática em meio às mortes da pandemia da covid-19.
“O mundo inteiro está unido contra o coronavírus. No Brasil, temos de lutar contra o corona e o vírus do autoritarismo. É mais trabalhoso, mas venceremos”, escreveu Maia. “Em nome da Câmara dos Deputados, repudio todo e qualquer ato que defenda a ditadura, atentando contra a Constituição.”
“Não temos tempo a perder com retóricas golpistas. É urgente continuar ajudando os mais pobres, os que estão doentes esperando tratamento em UTIs e trabalhar para manter os empregos. Não há caminho fora da democracia”, afirmou.
O governador João Doria (PSDB) disse ser "lamentável" que o presidente "apoie um ato antidemocrático, que afronta a democracia e exalta o AI-5". O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) também chamou de "lamentável" a participação de Bolsonaro. "É hora de união ao redor da Constituição contra toda ameaça à democracia."