quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Entrevista: Luiz Werneck Vianna

"Dilma será constrangida à infidelidade"

Cristian Klein

RIO - Raros analistas, transcorrido apenas um ano de observação, afirmam de modo tão categórico que a presidente Dilma Rousseff conduz um governo essencialmente diferente ao de seu antecessor Luiz Inácio Lula da Silva. Para o sociólogo Luiz Werneck Vianna, de 73 anos, professor da PUC-Rio, Dilma realiza mudanças profundas que abrem novos caminhos na prometida marcha de continuidade à era Lula. Dilma separa-se do padrinho nos direitos humanos, na relação com os sindicatos - "a armação que Lula concebeu e fez funcionar está destruída" - e será cada vez mais impelida à infidelidade. Montará um governo com cara própria e o tocará sob a égide da racionalidade; e não para atender aos caprichos dos amigos e aliados. Dilma, afirma o pesquisador, já está introduzindo uma guinada no presidencialismo de coalizão brasileiro, com ministérios sem "porteira fechada". A tendência, prevê, é de uma coalizão mais programática.

A "estatolatria" de Lula, que significou uma volta ao varguismo e ao regime militar, dá espaço a uma presidente sintonizada com a agenda internacional de uma nova época em emergência, onde o Estado-nação perde força. Dilma é, e será, diferente de Lula, em primeiro lugar, por chegar ao poder em circunstâncias distintas - num mundo em mutação e em crise financeira - e, em segundo lugar, por estar dotada, com sua formação universitária em economia, da capacidade de calcular os riscos por ela mesma.

Ex-militante do Partidão, o PCB, quando foi aluno de curso de formação de quadros comunistas internacionais na então União Soviética, em 1974, Luiz Werneck Vianna mantém a posição em causas consideradas polêmicas. Defende as férias de 60 dias dos magistrados e critica o acerto de contas com o regime autoritário, nos moldes realizados pelos vizinhos sul-americanos: "Os direitos humanos dizem respeito aos vivos", afirma o sociólogo, que considera o empresário Eike Batista e a senadora Kátia Abreu (PSD-TO) símbolos do capitalismo brasileiro em expansão. A seguir, os principais trechos da entrevista concedida por Werneck Vianna ao Valor:

Valor: Qual é a sua avaliação do primeiro ano de Dilma Rousseff?

Luiz Werneck Vianna: Mudou em relação ao governo anterior, em que pese a própria Dilma.

Valor: Como assim?

Werneck Vianna: Independentemente de querer ser fiel ao patrono, ela vai ser constrangida à infidelidade. Já está montando um governo com cara própria. Caíram seis ministros, por denúncias de corrupção, sendo que o sétimo, o Nelson Jobim [ex-ministro da Defesa], era absolutamente chave. Foi uma perda imensa. Os outros significavam bem essa política do presidencialismo de coalizão do Lula. E essa é uma inflexão importante. A Dilma está introduzindo uma mudança de fundo na arquitetura do presidencialismo de coalizão no Brasil: [o ministério] não vai ser de porteira fechada. Tende a ser uma coalizão programática, o que nunca ocorreu no Lula. Era "Vem cá meu bem, que para você tem" e com isso você pode atender seu partido, seus amigos. A primeira implicação é uma mudança no sentido de partidos que parecem mais estruturados do que nossa filosofia admite. Para que o presidencialismo de coalizão programático funcione é preciso que os partidos estejam mais estruturados do que estão.

Valor: Quais são as evidências?

Werneck Vianna: Ela está conversando mais com os secretários-executivos sobre a realização de programas de governo. Na reforma ministerial, isso vai aparecer de forma mais definida.

Valor: A reforma vai ser importante para dar a cara dela.

Werneck Vianna: Vai definir qual será a natureza do presidencialismo de coalizão. Porque não há sociedade que tolere, com esse sistema de freios e contrapesos, e porque não há recursos para esses gastos perdulários. Tende a enxugar, tende a racionalizar. Essa é uma tendência do governo Dilma: racionalização.

Valor: O desafio é encontrar uma fórmula que não desagrade tanto a classe política, como a contenção de emendas parlamentares.

Werneck Vianna: E nem [desagrade] embaixo. Dependendo de como ela manobre, podemos ter turbulências. Politicamente, ela não tem ninguém relevante do lado dela. Perdeu o [Antonio] Palocci [ex-ministro da Casa Civil] e o Nelson Jobim. São quadros que ela não tem como recuperar.

Valor: O senhor critica uma certa "estatolatria" que haveria no Brasil. Dilma mudou em relação a Lula?

Werneck Vianna: Com ela, tende a diminuir. Se eu estiver certo, nós vamos ver nos próximos meses um progressivo distanciamento dos sindicatos e dos movimentos sociais em relação ao governo. O MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra] já começou.

Valor: Isso é bom?

Werneck Vianna: Dá mais autonomia para a sociedade.

Valor: Por que Dilma abriria mão do arranjo político que foi tão bem sucedido com Lula?

Werneck Vianna: Porque ela está vivendo um outro mundo, onde terá que fechar o cofre. E porque nós estamos vivendo uma mudança de época. O mundo mudou. Sabemos do que estamos nos afastando, mas ainda não pressentimos para onde vamos.

Valor: De que nos afastamos?

Werneck Vianna: Do que se poderia caracterizar, como no diagnóstico da [filósofa] Nancy Fraser, de um paradigma keynesiano-westfaliano. Estamos indo para um mundo onde temas centrais da vida moderna são tratados por organismos que exercem jurisdição internacional, por exemplo os que mexem com economia, meio ambiente e terrorismo. Exemplo forte é o da Justiça internacional, com o Tribunal Penal, acima dos Estados nacionais. É uma época de inovação, de criação.

Valor: O Brasil, com o recente fortalecimento do peso do Estado, não seria um contraponto à tendência?

Werneck Vianna: Esse deslizamento está acontecendo numa escala mundial. O Estado-nação perde força. E as ideologias, comportamentos e atitudes que vieram com ele vêm se esmaecendo. Mas no segundo mandato de Lula, houve uma mirada no retrovisor. Foi um momento de forte adesão ao paradigma keynesiano-westfaliano, no momento em que esse paradigma no mundo perde força.

Valor: Como isso se deu?

Werneck Vianna: Houve um retorno a um repertório dos anos 30, do Estado Novo, do regime militar, do "Brasil país grande potência". O tema [westfaliano] da grandeza nacional foi um retorno quanto à política do regime militar, especialmente a do governo Geisel. Esse eixo Getulio-JK-regime militar se projetou inteiro no segundo mandato de Lula. Isso envolvendo políticas e valores do nacional-desenvolvimentismo. [O economista] Celso Furtado [1920-2004] foi guindado a uma figura ícone do governo. Agora mesmo, um navio importante recebeu o nome dele. Na política externa, teve acompanhamento, especialmente, nas relações com o mundo árabe, América Latina... Para não falar da forte "estatalização" do movimento sindical.

Valor: A relação com os sindicatos mudou muito?

Werneck Vianna: A Dilma herda esse eixo, mas só que o mundo deslizou, vem deslizando. A armação que Lula concebeu e fez funcionar está destruída. Este sindicalismo não tem mais o velho lugar, quando sentava com o presidente da República e deliberava como ia ser o salário mínimo futuro - tanto de produtividade, tanto de inflação - e que virou lei agora. Isso foi feito com Lula e eles. Não tem mais Dilma e eles.

Valor: Ter os sindicatos por perto não seria uma medida mais racional para Dilma?

Werneck Vianna: Mas a conta também é alta. Passa pela Previdência, pelo salário mínimo, ajuste fiscal, custo Brasil, não dá mais. Essa crise está limpando a névoa, está obrigando a que o argumento econômico seja mais respeitado. Há exemplos de fora: Itália, Espanha. As medidas dela não terão como objeto os que estão em cima, as elites econômicas, mas quem está embaixo. Você continua a viver num condomínio entre governo e elites econômicas do país. Sempre disse isso.

Valor: O combate à pobreza e a ascensão de uma nova classe média não contradizem essa ideia?

Werneck Vianna: Está sendo importante. Mas são processos que requerem muita maturação.

Valor: Que outras diferenças marcam o estilo Dilma?

Werneck Vianna: Há uma diferença irremovível: ela tem formação universitária e numa área determinada, em economia. Alguma coisa de economia ela entende. O Lula, não. Delegava. A crise chega com a presidente no olho do furacão, sabendo ler, interpretar e calcular os riscos por ela mesma.

Valor: O país está em boas mãos?

Werneck Vianna: Não estou avaliando se é melhor ou pior. Só sei que quando os sindicatos chegam, com as suas pretensões, ela tem objeções a fazer, como fez na época da votação do salário mínimo. "Isso eu não posso dar". Ela sabe que não pode dar. E em outras coisas, como Previdência, saúde, ela é obrigada a se adaptar a uma agenda mais racional-legal do que Lula, por razões econômicas e por razões de fortalecimento de um sistema de freios e contrapesos que foi se tornando cada vez mais importante, além da mídia.

Valor: Nestes termos weberianos, Dilma busca legitimar seu poder no mundo da técnica enquanto a fonte de Lula era o carisma?

Werneck Vianna: Pode-se dizer. Mas, independentemente desse cálculo, há constrangimentos que fazem com que ela seja orientada para esta direção, e não outra. Não tem como não aderir a este movimento. A cognição política pode ser a mesma, o que muda é a circunstância, é a "fortuna", para ficar na imagem cediça do Maquiavel. E, aí, a "virtù" tem que mudar também. O tema dos direitos humanos ganhou uma projeção no governo Dilma, que não teve no governo Lula. O movimento sindical sofreu - a meu ver foi uma ferida funda - um abalo, com a saída desse ministro [Carlos Lupi, do PDT], que vinha do atraso sindical.

Valor: Qual é a consequência?

Werneck Vianna: O movimento sindical vai conhecer a divisão real entre as centrais, por exemplo, entre CUT, Força...

Valor: Mais competitividade?

Werneck Vianna: Sim, e também mais independência em relação ao governo. Com o Lupi, houve a ampliação da vida sindical em torno dos projetos governamentais. O sindicalismo foi se expandindo, com todos os sindicatos se arregimentando ao governo.

Valor: Fora o acesso aos recursos do imposto sindical.

Werneck Vianna: E Lupi dando carta sindical para todo mundo e tudo isso aparelhado com ONGs. Mas, independentemente disso, o Lupi não caiu por causa da Dilma.

Valor: Por que ele caiu?

Werneck Vianna: Porque as instituições democráticas se reforçaram no país.

Valor: A Comissão de Ética da Presidência da República ganhou um peso que não tinha.

Werneck Vianna: A Comissão de Ética era para ter um outro papel, mais dócil. E não teve.

Valor: A recomendação de saída do ministro deixou a presidente numa saia-justa.

Werneck Vianna: Para ela, destituir a Comissão seria um desastre, nem poderia fazer. A Comissão teve uma importância inesperada. E mais: deixou uma raiz, um sedimento, deixou, digamos, uma jurisprudência.

Valor: Foi o nascimento de uma nova instituição de controle?

Werneck Vianna: Isso ao lado da Controladoria Geral da União e desses mecanismos todos que foram criados pela Constituinte ou depois dela, para que a sociedade pudesse fiscalizar o Executivo. Era tudo nominal, no papel. A esquerda em 1988 - consideradas as forças que mais tarde fundaram o PSDB e o PT, que já existia - não tinha a menor ideia do papel que essa institucionalidade iria ter. A presença dessas instituições e do Judiciário na vida política brasileira não foi algo que surgisse daquela intelligentsia e daquela esquerda. Isso não estava na cabeça do Fernando Henrique [Cardoso, ex-presidente], não estava na do Lula, do Ulysses [Guimarães, ex-presidente da Câmara dos Deputados e da Assembleia Nacional Constituinte].

Valor: Estava em quem?

Werneck Vianna: Parece que foi uma associação entre juristas e [o ex-governador de São Paulo] Mário Covas, especialmente o José Afonso da Silva [constitucionalista, ex-secretário de Segurança Pública de 1995 a 1999 e principal assessor jurídico de Covas quando ele era senador, na Constituinte].

Valor: Como deve ser a sucessão no Ministério do Trabalho?

Werneck Vianna: É difícil. Porque também não dá para entregar para um petista, que vem com a agenda prontinha lá daquele fórum de 2004 [o Fórum Nacional do Trabalho], com uma carga doutrinária sobre o assunto e a defesa da pluralidade sindical. Não pode entregar a um [Ricardo] Berzoini [ex-ministro do Trabalho, do PT, entre 2004 e 2005].

Valor: O PT no Ministério do Trabalho é um complicador?

Werneck Vianna: Acho impossível [a nomeação de um petista]. Ele é obrigado a fazer reforma. O Berzoini tentou. Fez uma emenda constitucional.

Valor: O senhor costuma mencionar em suas análises o processo de expansão do capitalismo no país. Quem o lidera e para onde ele vai?

Werneck Vianna: Vai sem projeto, politicamente desarmado. Mas tem sua energia, é voraz. Esse Eike Batista [presidente do grupo EBX e oitavo homem mais rico do mundo] pode ser considerado uma figura emblemática. Tem essa ética, com uma vida de monge, não é um homem de consumo conspícuo. Vive para servir à riqueza, à acumulação, como se fosse um herói calvinista. Ele é bem representativo. E os homens do agronegócio também. A [senadora] Kátia Abreu [do PSD de Tocantins e presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA)] é outra. São os novos personagens do capitalismo brasileiro. Vigorosos, sem fraquezas, sem ostentação. Os Matarazzo [de São Paulo] tinham uma vida mais aristocrática.

Valor: Seu trabalhos sobre judicialização da política são referência. Como o senhor avalia as críticas às tentativas de se podar o Conselho Nacional de Justiça (CNJ)?

Werneck Vianna: Isso vai na esteira do mesmo processo de intensificação do mecanismo de controle [das instituições brasileiras].

Valor: O CNJ é importante?

Werneck Vianna: Freios e contrapesos fazem parte de uma dinâmica que tem funcionado cada vez mais.

Valor: Prerrogativas dos magistrados, como férias de 60 dias, são justificáveis?

Werneck Vianna: É uma atividade terrível. Há determinadas profissões que também têm férias mais extensas, escafandristas, esse tipo de coisa. A sociedade é que tem que estabelecer isso.

Valor: A Comissão da Verdade não chega tardiamente?

Werneck Vianna: A minha posição não acompanha as posições majoritárias aí na intelligentsia. Acho que a gente deve recuperar a história, mas o passado passou. Página virada. Cada país fez, em circunstâncias diferentes. Você, à esta altura, rasgar a Lei da Anistia, seria jogar o país numa crise, não sei para quê.

Valor: E para conhecer as circunstâncias das mortes, sem punição, como aprovado?

Werneck Vianna: Isso deve existir, com estes limites.

Valor: Os militares recorrem sempre à acusação de revanchismo.

Werneck Vianna: Mas, vem cá, as grandes lideranças que nos trouxeram à democracia tiveram muito clara essa questão: anistia real, geral e irrestrita. As forças derrotadas, ou seja, a luta armada, querem reabrir esta questão? Não foram elas que nos trouxeram à democracia. Nos momentos capitais, ela não estava à frente, na luta eleitoral, na luta política, na Constituinte. Era um outro projeto.

Valor: Por isso ela é menos legítima para reivindicar investigações sobre o período?

Werneck Vianna: É politicamente anacrônica. O país foi para frente. Tem uma ex-prisioneira política na Presidência da República. Altos dignitários da administração têm a mesma origem que ela.

Valor: Os direitos humanos não deveriam estar além do conflito entre projetos à esquerda ou à direita?

Werneck Vianna: Os direitos humanos dizem respeito aos vivos. Aos mortos, o velho direito de serem enterrados como Antígona [protagonista da tragédia grega de Sófocles] quis enterrar o irmão em solo pátrio. É o que esta Comissão da Verdade está fazendo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO, 10/1/2012

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Brasil fecha fronteiras para conter "invasão" de haitianos
Temporal já matou treze em Sapucaia
Rio +20, uma nova oportunidade
Anvisa tira registro de silicone holandês
Obra com FGTS tem juro abaixo do mercado

FOLHA DE S. PAULO
Governo vai restringir a entrada de haitianos
Estado veta uso de bala de borracha na cracolândia
Empresa de aliado e amigo do ministro ganha obra
FGTS terá linha para financiar reforma da casa
Anvisa rastreia próteses mamárias usadas no país

O ESTADO DE S. PAULO
Congresso ignora escândalo e dá mais R$ 1 bi para ONGs
Irmão de Bezerra perde cargo
No Rio, mais 5 mortes
Dilma adia reforma do ministério para fevereiro
"Não vão me desmoralizar", avisa Eliana Calmon

VALOR ECONÔMICO
Empreiteiras emergentes entram no clube do bilhão
Elite da bolsa tem R$ 134 bi sob risco
Lei muda juízo sobre trabalho a distância
Chuva reduz produção de minério
Mínimo se valoriza e chega a um terço do salário médio

CORREIO BRAZILIENSE
Doações para filho complicam Bezerra
Rio chora seus mortos e busca desaparecidos
Silicone da Holanda está proibido
Brasil limita vistos e barra a entrada de haitianos

ESTADO DE MINAS
Nas contas do Ministério da Integração Nacional...Um pernambucano vale 110 mineiros
Dinheiro de emergência prometido não chegou
Ação pede acesso à correção das redações do Enem
Arrasada, Além Paraíba sofre com nova ameaça

ZERO HORA (RS)
Seca já aumenta preço de frango, ovos e leite
Fortunati acusa MP de ter critérios diferenciados

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Barbárie na Funase
Líder do DEM entra com ação contra ministro
Localizados mais cinco corpos no Rio

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Gabinete de crise

A assessoria do governador Eduardo Campos (PE), padrinho político do ministro Fernando Bezerra (Integração Nacional), está divulgando o áudio do discurso feito pela presidente Dilma, no dia 30 de agosto do ano passado, na cidade de Cupira. Na ocasião, ela assinou autorização para a construção de três das cinco barragens previstas para a região e anunciou convênio para a reconstrução de casas atingidas pela enchente de 2010. "Estamos aqui para impedir que a região seja assolada de novo por essa catástrofe", afirmou Dilma.

FONTE: O GLOBO/ PANORAMA POLÍTICO :: ILIMAR FRANCO

Por Aécio, PSDB evita ataques a Bezerra

Senador não quer se indispor com PSB de olho em aliança em 2014

Tradicional parceira do PT, legenda está em ascensão e é dirigida pelo governador de PE, amigo do tucano

Leandro Colon, Natuza Nery

BRASÍLIA - O PSDB avisou o DEM que não será "protagonista" no cerco ao ministro Fernando Bezerra Coelho (Integração Nacional) e, em nome do senador Aécio Neves (MG), orientou o aliado a seguir sozinho contra o auxiliar da presidente Dilma Rousseff.

De olho nas eleições de 2014, a ala tucana ligada ao mineiro não quer melindrar o PSB do governador Eduardo Campos (PE), presidente do partido e fiador da indicação de Bezerra à Esplanada.

A legenda, tradicional parceira do PT, já é uma das principais forças políticas do Nordeste e sigla ascendente no Congresso Nacional.

Não por acaso, Aécio não quer se indispor com Campos, de quem é amigo e a quem tentará atrair para uma eventual dobradinha na próxima campanha presidencial.

O recado do PSDB ao DEM foi dado no fim de semana em conversas sobre qual estratégia adotar diante da crise envolvendo o ministro.

Enquanto o primeiro deixou claro que uma ofensiva para desestabilizar Bezerra não interessa a Aécio, o segundo manteve posição mais beligerante. Conforme o cálculo de dirigentes do DEM, seria um trunfo contra o Executivo a queda do oitavo ministro de Dilma.

Há, ainda, outra razão para a timidez tucana na crise: o presidente do PSDB, deputado Sérgio Guerra (PE), não só representa o mesmo Estado que o ministro e Eduardo Campos como possui afinidades políticas com ambos.

Por enquanto, o PSDB vem adotando atitude mais protocolar nas cobranças ao ministro. Ontem, não assinou a representação que o DEM protocolou na Procuradoria-Geral da República pedindo abertura de investigação contra Bezerra.

Até agora, tucanos têm agido muito mais para alimentar as divergências entre PSB e PT na base aliada do que para desgastar o ministro.

Eis a missão definida para 2012: dividir e, se possível, dinamitar a relação de Dilma com os partidos que lhe dão sustentação. O objetivo é, ao mesmo tempo, criar problemas para a presidente no Congresso e, depois, atrair os insatisfeitos para a esfera de influência de Aécio.

Desde a semana passada, Bezerra é alvo de acusações de favorecimento no repasse dos recursos de sua pasta, nepotismo e privilégio ao filho.

Em conversas reservadas com Eduardo Campos, a base aliada e congressistas da oposição acertaram um rito que passará, até segunda ordem, só pela visita do ministro ao Congresso amanhã.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Dilma adia reforma do ministério para fevereiro

Com dificuldades para fazer a reforma ministerial até a fim do mês, a presidente Dilma Rousseff deverá deixar as mudanças para fevereiro. A ideia é trocar de cinco a oito ministros, mas sem provocar atritos entre os partidos da base aliada. Com isso, o ministro da Educação, Fernando Haddad, terá agora de esperar mais um pouco para começar sua campanha à Prefeitura de São Paulo pelo PT

Com xadrez difícil, Dilma adia reforma e segura Haddad

Presidente quer trocar de 5 a 8 ministros sem melindrar os aliados; ministro da Educação, que sairia dia 16 para eleição, terá de esperar

Lisandra Paraguassu

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff está encontrando dificuldades para fazer a reforma ministerial até o fim deste mês e as mudanças, agora, devem ocorrer apenas em fevereiro. A intenção de Dilma é trocar de cinco a oito ministros, sem provocar atritos entre os partidos da base aliada. Como a presidente está disposta a promover a mudança na equipe de uma só vez, o ministro da Educação, Fernando Haddad - que já estava de malas prontas -, terá agora de esperar mais um pouco para começar sua campanha à Prefeitura de São Paulo.

Dilma pediu a Haddad, na segunda-feira, que ele aguardasse até o final do mês antes de passar o bastão para Aloizio Mercadante (PT). Titular de Ciência e Tecnologia, Mercadante foi o escolhido para substituir Haddad, mas, embora já tenha comunicado a equipe sobre a troca, precisará aguardar alguns dias.

"A presidente me pediu para esperar mais um pouquinho", disse ontem o ministro Haddad. A cúpula do PT queria que a presidente Dilma liberasse seu candidato até o dia 16 para que ele pudesse iniciar a caça aos votos - já que não é conhecido e nunca disputou a eleição -, mas terá de se conformar com o tempo exigido pelo Palácio do Planalto.

Haddad já tinha pedido para deixar a Esplanada dos Ministérios em novembro, mas Dilma não deixou. Agora, havia programado sua saída para a próxima semana, mas a presidente pediu novamente que ele aguardasse. Disse ao ministro que não quer fazer uma reforma a conta-gotas, mas, sim, anunciar todas as mudanças de uma vez só. Não há, no entanto, nomes para todos os cargos.

Mudanças. Depois de demitir sete ministros em um ano - seis dos quais suspeitos de corrupção -, a presidente Dilma quer agora mexer na gestão do governo, e não só em nomes. De qualquer forma, a saída de Haddad da Educação é a única já anunciada há meses, desde que o ministro foi indicado pelo PT para concorrer à sucessão do prefeito Gilberto Kassab (PSD).

A mudança de Mercadante de Ciência e Tecnologia para Educação abre outra vaga, disputada pelo PSB e pelo PT. Devem sair, ainda, os ministros das Cidades, Mário Negromonte (PP); da Cultura, Ana de Hollanda (sem partido); e de Políticas para Mulheres, Iriny Lopes (PT).

Acusado de ter fraudado um parecer e permitir a alteração de uma obra de transportes para a Copa de 2014 em Cuiabá, o ministro Negromonte perdeu apoio do seu partido no Congresso. Além disso, Dilma também não gosta do trabalho do ministro. Acha que ele não correspondeu às expectativas de uma pasta que não só tem um orçamento alto como cuida de algumas obras da segunda fase do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), especialmente em saneamento.

Troca. A presidente também está à procura de um novo nome para o Ministério do Trabalho, interinamente comandado por Paulo Roberto Pinto desde a saída de Carlos Lupi (PDT), envolvido em denúncias de fraudes com ONGs.

O ministério da Pesca, hoje ocupado por Luiz Sérgio (PT), deve ser incorporado à pasta de Agricultura, e o de Portos - controlado por Leônidas Cristino (PSB) - pode ser acoplado a Transportes. Se isso ocorrer, o PSB de Eduardo Campos, governador de Pernambuco, deverá ter uma compensação.

Apesar das denúncias que pesam contra o ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra Coelho, Dilma tentará mantê-lo no cargo. No Palácio do Planalto, o comentário é o de que ele só sairá se for concorrer à Prefeitura de Recife pelo PSB.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Congresso ignora escândalo e dá mais R$ 1 bi para ONGs

Personagens na queda de três ministros no primeiro ano de mandato da presidente Dilma Rousseff, as entidades privadas sem fins lucrativos foram autorizadas a receber quase R$ 1 bilhão a mais no Orçamento de 2012. Com as emendas parlamentares aprovadas pelo Congresso, os gastos com as organizações não governamentais poderão alcançar R$ 3,4 bilhões - 42% mais em relação à proposta original de R$ 2,4 bilhões. O aumento das verbas ocorre no momento em que o governo tenta conter irregularidades no repasse de recursos para ONGs. Segundo o Tribunal de Contas da União, o atraso médio na apresentação das prestações de contas por parte das entidades cresceu em 2010 e alcançou 2,9 anos

Congresso ignora série de escândalos e infla verba de ONGs em R$ 1 bilhão

Em pleno ano eleitoral, Orçamento de 2012, que previa inicialmente repasses de R$ 2,4 bi para entidades, foi alterado

Marta Salomon

BRASÍLIA - Personagens coadjuvantes na queda de três ministros no primeiro ano de mandato da presidente Dilma Rousseff, as entidades privadas sem fins lucrativos foram autorizadas a receber quase R$ 1 bilhão extra no Orçamento de 2012, ano eleitoral. A proposta orçamentária original chegou ao Congresso prevendo repasses de R$ 2,4 bilhões às organizações não governamentais (ONGs), mas, inflados pelas emendas parlamentares, os gastos poderão alcançar R$ 3,4 bilhões.

A lei orçamentária será sancionada pela presidente nos próximos dias. O aumento do dinheiro destinado a essas entidades acontece no momento em que o governo tenta conter as irregularidades no repasse de verbas para as ONGs, estimuladas por uma dificuldade crônica de fiscalizar as prestações de contas desses contratos.

O aumento dos repasses surpreende sobretudo pelo valor. No Orçamento de 2011, o aumento de verbas aprovado pelo Congresso para as ONGs foi de R$ 25 milhões. No de 2012, o volume é 38 vezes maior: R$ 967,3 milhões. Os gastos extras estão concentrados nos ministérios da Saúde, do Trabalho e da Cultura,

De acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU), o atraso médio na apresentação das prestações de contas cresceu em 2010 e alcançou 2,9 anos. Já a demora na análise das contas diminuiu, mas ainda é de inacreditáveis 6,8 anos, em média.

Os problemas não se resumem à falta de fiscalização. A Controladoria-Geral da União (CGU) já apontou o desvio de verbas em entidades contratadas em pelo menos cinco ministérios diferentes.

Pente-fino. No final de outubro, em meio a denúncias de desvios na aplicação de verbas dos ministérios do Trabalho, do Turismo e do Esporte, a presidente Dilma Rousseff determinou uma devassa nos contratos, que só poderiam ter pagamentos retomados com o aval do ministro e sob sua responsabilidade direta.

Quase três meses depois, o governo não informou ainda o número de entidades que poderão ser obrigadas a devolver o dinheiro que receberam e não poderão celebrar novos contratos. Não se sabe quantas entidades tiveram os recursos liberados, depois do bloqueio inicial. O prazo para resolver as pendências termina no final do mês. Esse trabalho tem como objetivo separar entidades eficientes daquelas que desviam dinheiro.

O aumento dos repasses a ONGs aprovado pelo Congresso vai na contramão das restrições impostas pelo governo, ao exigir que as entidades beneficiadas tenham de passar por seleção prévia e mostrar experiência na área para as quais foram contratadas.

Nos últimos anos multiplicaram-se as entidades de fachada e sem qualificação, pois, a pretexto de evitar a burocracia, bastava a apresentação de três declarações atestando a existência da ONG para que ela fosse contratada para prestar serviços à União.

"O governo estabeleceu travas importantes para que os problemas não se repitam", avalia a ministra do Planejamento, Miriam Belchior.

Corrupção. Investigações de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Congresso, da CGU e do TCU identificaram reiteradas irregularidades em entidades. Desde 2002, pelo menos, o relatório final da CPI das ONGs já alertava para a proliferação de entidades "sem que haja qualquer mecanismo institucional de controle sobre as atividades que desenvolvem".

Depois disso, em 2006, a CPI dos Sanguessugas revelou esquema de 53 entidades que haviam desviado dinheiro de convênios para a compra de ambulâncias.

Campeão. Em 2012, é o Fundo Nacional de Saúde (FNS) o destino da maior parcela de gastos extras autorizados pelo Congresso: foram R$ 726 milhões extras, que elevam as autorizações de gastos para R$ 1,2 bilhão.

O Ministério do Trabalho vem logo em seguida no ranking dos principais destinos do dinheiro extra. O Orçamento das ONGs aumentou R$ 49 milhões, para R$ 187 milhões. No final do ano passado, o TCU mandou suspender convênios do Ministério do Trabalho com entidades privadas sem fins lucrativos ao detectar 500 prestações de contas com análises pendentes. Suspeitas de corrupção envolvendo ONGs derrubaram o então ministro Carlos Lupi.

No ano passado, ONGs receberam R$ 2,8 bilhões dos cofres públicos – considerando os pagamentos efetivamente feitos. O Ministério da Ciência e Tecnologia concentrou a maior parcela dos pagamentos, com R$ 873 milhões de gastos. Os ministérios da Educação e da Saúde aparecem na sequência.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Ainda incompleta, 'faxina' mirou Transportes e Dnit

Ministério foi o mais afetado por limpeza promovida por Dilma, com 27 servidores afastados dos cargos

João Domingos

BRASÍLIA - Mesmo tendo assinado decreto que obriga os titulares dos ministérios a vigiar mais os contratos e os convênios assinados com Estados, municípios e ONGs, e afastado mais de 40 servidores suspeitos de corrupção, irregularidades diversas e mau uso do dinheiro público, a faxina iniciada pela presidente Dilma Rousseff nos ministérios há seis meses ainda está incompleta.

A rigor, a limpeza promovida pela presidente atingiu mesmo só o Ministério dos Transportes e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), de onde saíram 27 servidores, entre eles o ministro Alfredo Nascimento e o diretor-geral da autarquia, Luiz Antonio Pagot.

Auditoria da Controladoria-Geral da União concluída em novembro levantou desvios de R$ 229 milhões no setor da agricultura, principalmente nas operações da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Entre as irregularidades houve até um leilão fantasma de milho pertencente a um produtor que morrera seis meses antes.

Mesmo assim, na Conab até hoje os diretores não foram afastados. Houve substituição apenas no setor jurídico, entregue ao advogado da União Rui Piscitelli. Ele entrou no lugar de Rômulo Gonsalves, que teria facilitado as irregularidades com pareceres jurídicos.

O presidente da estatal, Evangevaldo Moreira, é apadrinhado do líder do PTB na Câmara, Jovair Arantes (GO). A Procuradoria da República em Goiás abriu processo no dia 19 de dezembro contra Evangevaldo e quase uma centena de outras pessoas suspeitas de fraudes num concurso da Ordem dos Advogados do Brasil. Mas nada aconteceu com ele.

Além de Evangevaldo, ficaram na estatal outros diretores que, pelas promessas da presidente, deveriam ter saído, como Marcelo Melo, diretor de Operações, indicado pelo PMDB, Rogério Abdala, diretor de Administração, e Sílvio Porto, diretor de Política Agrícola, nome do PT na Conab.

Também permaneceram por lá Rodrigo Calheiros, filho do senador Renan Calheiros, líder do PMDB, Adriano Quércia, assessor de programas, neto do ex-governador Orestes Quércia, Matheus Benevides, coordenador de acompanhamento de ações orçamentárias, neto do deputado Mauro Benevides, e Mônica Infante Azambuja, assessora da diretoria, ex-mulher de Henrique Eduardo Alves, líder do PMDB na Câmara.

No Ministério do Esporte, onde as suspeitas de desvio de dinheiro levaram à demissão de Orlando Silva, o atual ministro Aldo Rebelo trocou alguns dos principais cargos das diretorias, mas manteve nomes da estrutura dos tempos de seu antecessor. Um deles é Waldemar Lima da Silva, ex-secretário executivo, que assinou convênio com entidades de fachada. Ele foi nomeado assessor especial do ministro. O próprio Rebelo justificou sua manutenção. Disse que ele só assinou os convênios porque esse era seu papel.

No Turismo, Gastão Vieira não teve muito o que mudar. É que boa parte dos diretores teve de sair depois da Operação Voucher, da Polícia Federal, que prendeu 38 servidores e pessoas ligadas à pasta, entre eles o secretário executivo Frederico Costa e Silva, e o secretário de Desenvolvimento, Colbert Martins.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Empresa de aliado e amigo do ministro ganha obra

A estatal Codevasf, subordinada ao Ministério da Integração, escolheu a empresa de um aliado e amigo do ministro Fernando Bezerra para contrato de R$ 4,2 milhões em Pernambuco.

A empresa apresentou o maior preço, mas venceu pela "qualidade do projeto técnico".

Integração contrata empresa de aliado político do ministro

Correligionário é filiado ao PSB, mesmo partido de Fernando Bezerra (Integração)

Empresa, que saiu vitoriosa em licitação para obra de R$ 4,2 mi, diz não ter havido viés político na escolha

Catia Seabra, Leandro Colon

BRASÍLIA - A empresa de um amigo e correligionário do ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra, foi escolhida para firmar contrato de R$ 4,2 milhões com a Codevasf, companhia ligada à pasta.

Trata-se da Projetec Projetos Técnicos, dirigida por João Recena, que obteve contrato em Pernambuco, no ano passado, apesar de ter apresentado preço mais alto do que as cinco concorrentes.

Recena é filiado ao mesmo partido do ministro, o PSB. Além disso, é seu amigo e também do governador Eduardo Campos (PE), presidente nacional do PSB.

À época do contrato, a Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) ainda era presidida por Clementino Coelho, irmão do ministro. Na licitação, a Projetec apresentou preço R$ 1,4 milhão acima da menor oferta.

No dia 13 de dezembro, a Codevasf optou, no entanto, por sua contratação, atribuindo a decisão à qualidade da proposta técnica, julgada pela comissão de licitação. A companhia decidiu dar 70% de peso ao critério técnico, contra 30% à parte financeira.

O contrato destina-se à elaboração de projeto executivo para pavimentação e restauração de vias secundárias em Petrolina, cidade natal do ministro. O nome do projeto é "Senador Nilo Coelho", uma homenagem ao tio dele.

A empresa diz que tem 45 anos de existência e nega favorecimento, assim como a Codevasf.

Ao todo, o Ministério da Integração Nacional repassou cerca de R$ 34,5 milhões para a Projetec nos últimos três anos, sendo R$ 10,3 milhões em 2011. Pelo menos 90% saíram da Codevasf.

A Projetec também foi beneficiada, em maio do ano passado, com prorrogação de um contrato, no valor de R$ 6 milhões, por mais 12 meses. A empresa de Recena também tem contratos com o governo de Pernambuco.

Recena e Eduardo Campos foram secretários da gestão de Miguel Arraes (1995/1998), avô do hoje governador.

Recena ocupava o Planejamento. Campos, a secretaria da Fazenda. Em 2010, Recena doou R$ 100 mil para a campanha do governador.

A Projetec teve um aditamento de R$ 7,2 milhões em um contrato com o governo de Pernambuco. Um outro contrato é objeto de investigação no TCU (Tribunal de Contas da União).

Envolvido numa crise política desde a semana passada, Bezerra promete ir amanhã ao Congresso prestar esclarecimento sobre os critérios de liberação de verbas antienchente de seu ministério, entre outros pontos.

Conforme a Folha mostrou no sábado, o deputado Fernando Coelho (PSB-PE), seu filho, foi o beneficiário do maior volume de emendas parlamentares da pasta em 2011. Bezerra ainda teve de se explicar sobre a manutenção de parentes no ministério. Além do irmão, familiares de sua nora.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Inadimplência tem a maior alta desde 2002

O Indicador de Inadimplência do Consumidor cresceu 21,5% em 2011, segundo a Serasa Experian; juros e inflação colaboraram para a alta

Wladimir Dandrade

A inadimplência do consumidor brasileiro cresceu 21,5% em 2011 na comparação com o ano anterior, informou ontem a Serasa Experian. Esse é o maior nível de aumento desde 2002, quando o Indicador de Inadimplência do Consumidor cresceu 24,7% em relação a 2001. Na comparação de dezembro com o mesmo mês de 2010, a alta da inadimplência foi de 13,1%. Ante novembro do ano passado, o indicador apresentou queda de 2,5%.

Em nota divulgada para a imprensa, a Serasa Experian atribui a ampliação da inadimplência em 2011 ao aumento da inflação, que reduziu o rendimento do trabalhador, e aos juros elevados mantidos durante a maior parte do ano passado e que reduziram a capacidade de pagamento das dívidas pelo consumidor. "Cabe destacar que o acúmulo de dívidas, de médio e longo prazos, vem desde 2010, ano em que as condições de crédito e do orçamento do consumidor foram mais favoráveis do que em 2011", afirmou a entidade.

No resultado de dezembro ante novembro, a maior contribuição para a queda de 2,5% veio das dívidas com bancos, que caíram 2% - esse tipo de dívida corresponde a 49,3% do peso do indicador. O valor médio das dívidas com bancos nos 12 meses de 2011 foi de R$ 1.302,12, redução de 0,7% ante o mesmo período de 2010.

A maior queda em dezembro ante novembro foi verificada nos protestos, que encolheram 11,5%. O valor médio dos títulos protestados, no entanto, cresceu 16% em 2011 na comparação com 2010 e atingiu o valor de R$ 1.372,86.

O valor médio das dívidas não bancárias (cartões de crédito, financeiras, lojas em geral e prestadoras de serviços) no ano passado ficou em R$ 320,63, uma queda de 17,3% na comparação com 2010.

Os cheques sem fundo, por sua vez, apresentaram aumento de 8,4% sobre 2010, atingindo o valor médio de R$ 1.359,19. Na comparação de dezembro ante novembro, dívidas não bancárias e cheques sem fundo tiveram queda de, respectivamente, 1,2% e 8,3%.

Trajetória. O assessor econômico da Serasa Experian Carlos Henrique de Almeida diz que "há grandes chances" de a inadimplência do consumidor brasileiro manter a trajetória de crescimento nos três primeiros meses deste ano.

De acordo com Almeida, existe um movimento natural de aumento da inadimplência no primeiro trimestre de cada ano, embora essa sazonalidade não tenha se manifestado em 2010. "O ano de 2010 foi muito bom, mas agora há grandes chances de 2012, assim como 2011, cumprir essa sazonalidade", afirmou Almeida.

O economista também lembra que neste ano o mês de fevereiro terá um dia a mais, o que deve contribuir para o avanço do índice no primeiro trimestre.

"É um dia a mais de registro de inadimplência, o que dá uma certa contribuição", afirmou Almeida.

De acordo com o economista, assim como ocorreu em 2010, a busca do consumidor por crédito continuou aquecida no ano passado, mas a inflação alta e a manutenção dos juros em níveis elevados criaram dificuldades para o brasileiro arcar com suas dívidas.

"O crédito continuou em alta em 2011, mas no balanço do ano o consumidor acabou tendo dificuldades", afirmou o assessor da Serasa Experian.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Cautela na reforma

A presidente Dilma Rousseff está cautelosa no anúncio dos nomes da reforma ministerial porque ela será cirúrgica. Depois de um ano em que sete ministros caíram — seis por denúncias de corrupção e um por falar demais — e um começo de 2012 com mais um nome na berlinda (Fernando Bezerra Coelho, da Integração Nacional), a presidente quer definir todas as mexidas para não melindrar ainda mais os partidos aliados.

Todas as pastas já nomearam seus interlocutores para o momento em que a presidente chamá-los para conversar. Existem aqueles, como o PMDB, que conformaram-se com o espaço menor do que o sonhado, mas que, se tiverem brecha, vão tentar emplacar um ministério mais vultuoso. Outros, como o PR, viraram o ano negociando com a Secretaria de Relações Institucionais para substituir o atual ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, por um nome político. E o PP, que pretende evitar que um técnico — Márcio Fortes — assuma no lugar de Mário Negromonte em Cidades.

Por fim, existe o PSB, que poderá herdar o ministério da Ciência e Tecnologia do PT. Um dos nomes cogitados é de Ciro Gomes, mas ele enfrenta resistências internas no partido e no PMDB, legenda que foi chamada pelo ex-governador do Ceará de "um ajuntamento de assaltantes". (PTL)

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Problemas de repertório, o Barcelona e nós :: Luiz Werneck Vianna

Os repertórios constituem um conjunto articulado de conhecimentos e de práticas, selecionados pela experiência, que se tornam dominantes quando amplamente compartilhados, tornando-se, assim, um instrumento de uso generalizado para os diferentes modos do agir social. Tanto podem assumir uma forma simples como, no caso das regras de etiqueta, se revestir da alta complexidade, do tipo das que se manifestam, por exemplo, na ciência, na música erudita e na política. Repertórios mudam, sempre contingenciados pelas alterações do gosto, pela emergência de novas necessidades ou de novos desafios, mas há sociedades e culturas que os protegem dos riscos da obsolescência, envolvendo-os numa aura mística, e até levantam muralhas, como na antiga China, a fim de garantir a permanência de princípios que sustentem dever existir harmonia entre o cosmo e a vida dos homens.

No Ocidente, sob a influência do Século das Luzes, temia-se a síndrome da imobilidade chinesa como um fim do mundo em que as rodas da História parariam de girar, como em Tocqueville, Marx, Nietzsche e Weber. A opção ocidental, decerto num processo que conheceu lutas sociais prolongadas e revoluções, foi a da permanente busca pela inovação do seu repertório cognitivo em todos os ramos da atividade humana, com o que se abriu passagem para o moderno, e desde então, nas conhecidas palavras de um grande autor, tudo o que antes parecia sólido estava condenado a se dissolver no ar, inclusive na China.

Somos filhos, neste extremo Ocidente ibérico em que nos encontramos, dessa mesma cultura, e uma boa testemunha disso está no vitorioso processo de modernização que, há décadas, subverte nossa paisagem econômica e social, implicando a emergência ao mundo dos direitos de massas de milhões que antes nem sequer os divisavam. Contudo, por processos inerentes à nossa formação, em que o Estado cumpriu, e segue cumprindo, papel determinante em todas as dimensões da vida social, continuamos prisioneiros de repertórios que nasceram à sombra da sua incontrastável presença em nossa História, em que pese a afirmação de uma já robusta sociedade civil. Assim é que o peronismo e o varguismo - dois casos clássicos de repertórios que nasceram na órbita do Estado, a seu modo e a seu tempo bem-sucedidos - seguem como presenças renitentes na Argentina e no Brasil, no primeiro caso, abertamente e no segundo, de modo dissimulado, sem ceder lugar mesmo diante das novas circunstâncias com que, atualmente, se defrontam.

No Brasil, essa patologia particular que se manifesta na dificuldade de abandonar surrados repertórios conta com antecedentes históricos vetustos. Angela Alonso, em seu importante estudo sobre a chamada geração de 1870 (Ideias em Movimento, Paz e Terra, 2002), argumenta persuasivamente que uma das razões para a queda do Império esteve na incapacidade de suas elites políticas, em meio a mudanças políticas e sociais - em boa parte desencadeadas por elas -, de abrir seu repertório a práticas e aos discursos que vinham à tona a partir da emergência de novos tipos sociais. Mais intrigante ainda, sinal aziago de que pode estar instalada uma caveira de burro em algum lugar da nossa História, é o processo que transcorre diante de nós quando testemunhamos, dia a dia, um repertório novo e promissor, conquistado em dura e longa luta, ter seu sentido contaminado precisamente pelo que visava a substituir.

Esse repertório novo não nos chegou de cima nem por meio de construções intelectuais arbitrárias sem amparo nas correntes de opinião que germinavam na sociedade civil. Ao contrário, é filho do movimento da resistência democrática à ditadura militar, encorpou-se a partir de meados dos anos 1970 e tomou forma no diagnóstico de que na raiz dos nossos males estava um processo de modernização conservadora que, a partir da chamada Revolução de 1930, recorrendo a fórmulas ora puramente repressivas, ora mais brandas - como no período JK -, sujeitava a sociedade a uma modelagem exercida pelo Estado.

Tal diagnóstico, no curso das lutas da resistência, adensou-se e se converteu no programa que serviu de plataforma para a convocação da Assembleia Constituinte de 1986, que, em suas linhas gerais, o adotou. Sua tópica gravitou em torno dos temas da autonomia da sociedade e da vida associativa quanto ao Estado, da descentralização e valorização do poder local e da abertura da esfera pública a uma ampla participação da cidadania. Além disso, aquele programa estava animado pela disposição de conter a discrição da administração pública, pleito que o constituinte reconheceu ao criar um complexo sistema de controle da sua operação, inclusive pelos novos papéis que concedeu ao Ministério Público. Estava aí, disponível para uma sociedade que experimenta notáveis mudanças em sua economia e em sua estrutura social, um novo repertório.

Mas há algo em nossa História, as marcas profundas do seu pathos conservador, que conspira para que velhos repertórios, como as marchinhas de carnaval, nunca saiam de moda, pois não se pode mais ignorar a ressurgência da síndrome típica dos nossos ciclos de modernização autoritária, já visível no retorno às práticas de centralização administrativa, ao modelo de capitalismo politicamente orientado, ao decisionismo que campeia na ação do Executivo e às esdrúxulas manias de grandeza nacional.

Provavelmente, foi esse pathos que atuou em nossa reação à acachapante derrota do Santos pelo Barcelona, que encontrou explicação, na maior parte da crítica especializada, por uma pretensa fidelidade do time catalão ao velho e vitorioso repertório do futebol brasileiro, que teria sido, em má hora, abandonado por nós. Decididamente, não foi assim, eles criaram um repertório novo, e isso, em geral, nos desconcerta.

Luiz Werneck Vianna, professor-pesquisador da PUC-Rio.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Maiores em conflito com a lei :: Eduardo Graeff

A lei exige transparência no trato da coisa pública, mas o costume ampara quem leva vantagem. A tensão entre esses dois princípios é o pano de fundo da novela da corrupção que se arrasta, há anos, diante dos nossos olhos.

Do fim da censura à imprensa, em 1978, passando pela Constituição de 1988, até a criação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2004, e a Lei de Acesso à Informação recém-sancionada, o Brasil muniu-se de praticamente todos os instrumentos legais necessários para a gestão democrática, transparente e responsável do Estado.

Por que, então, prevalece a sensação de que a corrupção aumentou, em vez de diminuir?

De um lado, porque as instituições funcionam. A imprensa toca o alarme, a polícia, as comissões parlamentares e os tribunais de contas investigam, o Ministério Público denuncia, a Justiça instaura processos. Tudo isso gera notícia e aumenta a percepção pública de irregularidades, que antes da democratização ficariam escondidas. De outro, porque as instituições não funcionam como deveriam: expõem a corrupção, mas raramente chegam à punição dos culpados.

Oito anos depois de aparecer num vídeo achacando um, por assim dizer, bicheiro, Waldomiro Diniz, então subchefe da Casa Civil, ainda não foi formalmente acusado - responde a processos, mas por outros fatos. O número de servidores federais demitidos por improbidade aumentou bastante depois da criação da Corregedoria-Geral da União, em 2001. Mas o risco de um servidor demitido sofrer alguma sanção penal é de apenas 3%, constatou Carlos Higino Ribeiro de Alencar num estudo sobre a eficácia da Justiça no combate à corrupção.

Para o mau funcionamento das instituições há remédios legais. Alguns já aplicados, como a súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal. Outros em discussão, como a "PEC dos Recursos", defendida pelo ministro Cezar Peluso. Se eles tiverem o efeito esperado, de desemperrar as engrenagens da Justiça, a impunidade pode diminuir e com ela, em alguma medida, a corrupção.

A corrupção e a impunidade têm outras causas, porém, mais culturais do que institucionais. A nossa herança patrimonialista, morta e enterrada na letra da lei, ainda vive na prática. Agentes públicos comportam-se como se fossem donos de pedaços do Estado. Os apadrinhados, movidos pela lealdade ao chefe político, acima de tudo. Os concursados, blindados por seus direitos adquiridos, começando por uma estabilidade no emprego equivalente à vitaliciedade que outros países reservam aos membros do Judiciário. Uma consequência direta disso é a manutenção de privilégios legais, mas injustificáveis. A obtenção de vantagens ilegais é um efeito secundário inevitável. Quem não vê nada de errado em lesar o público por uma coisa não se deve escandalizar tanto com a outra.

O aprendizado democrático da sociedade pode apertar o cerco aos privilégios encastelados no Estado. A aplicação contínua e mais rigorosa da lei pode diminuir a tolerância com a corrupção. Em que prazo? Não sei. Mas se já investimos tantos anos nessa possibilidade, mais vale insistir do que desistir antes de ver resultados.

A função pedagógica da lei, contudo, não depende somente de bons textos. Requer bons professores: lideranças, autoridades que deem lições de integridade pelo exemplo de seus atos, mais do que palavras.

Acontece que a maioria dos exemplos vindos de cima nos últimos anos transmite a lição oposta: a de que levar vantagem à custa do erário pode ser não apenas tolerável, mas defensável, se for pelo partido, pela classe ou pela causa certos. Se figuras de proa da República dão um jeito de driblar ou torcer a lei em proveito próprio, o que esperar dos seus subordinados?

O conflito entre a magistratura e o Conselho Nacional de Justiça escancarou essa tensão ali, onde as suas implicações são mais dramáticas. Acredito que a maioria dos juízes cumpra a lei com o mesmo rigor com que a aplica. Mas a força com que seus representantes esperneiam contra a fiscalização dos atos administrativos dos tribunais indica que eles ainda não incorporaram realmente, profundamente, o princípio da transparência democrática.

Manter ou limitar as funções de fiscalização do Conselho Nacional de Justiça tem tudo para vir a ser um desses atos exemplares, capaz de acelerar ou atrasar a mudança de mentalidades, além de fixar jurisprudência. Prestação de contas é uma obrigação que vale para todos os agentes públicos? Ou ela admite ressalvas quando os guardiães da lei estão em causa? Queira ou não a nossa Corte Suprema, é assim que sua decisão será entendida pelo público e pelos próprios magistrados.

Ironia ou armadilha da História: o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva faz jus ao título de pai do CNJ, dentro da reforma do Poder Judiciário que ele estimulou. Ao mesmo tempo, Lula carrega o estigma - do qual gostaria de se livrar - de padrinho do mensalão, o maior escândalo de corrupção destes anos, que o Supremo Tribunal Federal também está em via de julgar. O legado institucional da sua Presidência estará em causa no julgamento dessas duas, digamos, realizações tão contraditórias. A própria composição do Supremo Tribunal Federal leva a sua marca, aliás - na medida em que Lula nomeou a maioria dos seus integrantes.

Transparência ou opacidade da Justiça? Punição exemplar ou prescrição penal para os mensaleiros? Não sei para que lado Lula usará a influência que inegavelmente tem nesses dois julgamentos. Prefiro nem pensar.

Os próximo capítulos da nossa novela política serão emocionantes, em todo caso.

Cientista político, foi secretário-geral da Presidência da República (Governo Fernando Henrique Cardoso)

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Paulinho da Viola - Coisas do mundo minha nêga

As aparências enganam?:: Merval Pereira

Um dos graves problemas brasileiros é o nepotismo, a ponto de o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ter sido obrigado a formalizar "a proibição de nomeação ou designação, para cargos em comissão e funções gratificadas em tribunais ou juízos, de cônjuge, companheiro ou parente até o terceiro grau dos membros ou juízes vinculados".

A noção do brasileiro como "homem cordial", difundida pelo historiador Sérgio Buarque de Hollanda, define aquele que age segundo o "coração" - não no sentido de ser bondoso, mas no de pautar suas ações pelo afeto e pela intimidade, e ser incapaz de separar vida pública de vida privada.

A história do ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra, tem todos os recortes dessa relação de cumpadrio que se tornou característica da nossa política, mesmo quando aparenta obedecer às regras estabelecidas.

O fato de ter autorizado a maior parte das verbas de sua pasta para seu estado, Pernambuco, tem explicações técnicas razoáveis pelas sucessivas enchentes que afetaram o estado e a necessidade de construção de barragens para prevenir futuros danos.

Além do mais, a presidente Dilma Rousseff estava a par das necessidades e autorizou pessoalmente os gastos, o que retira do ministro a responsabilidade por um eventual "favorecimento".

Seria ideal que o próprio ministro, e a presidente, tivessem cuidados para evitar mal-entendidos e resolvessem a questão da verba através de outras pastas, e não apenas aquela que faz parte do acordo político com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, presidente do PSB. Mas vá lá que não tenham tido esse zelo.

Mas as nomeações de parentes do ministro para cargos de seu ministério mostra justamente essa maneira antiguada de fazer política.

O sociólogo Roberto Da Matta cita como típicos da cultura brasileira o "jeitinho" e a "malandragem", que são utilizados para driblar a lei através do uso da posição social ou das relações sociais.

Aqui há a prevalência de apadrinhamentos em função das relações sociais, mesmo quando a nomeação em si aparentemente não traz benefícios diretos a quem nomeou nem ao nomeado, como é o caso do seu tio, Osvaldo Coelho, nomeado para o Comitê Técnico-Consultivo para o Desenvolvimento da Agricultura Irrigada.

Bezerra argumentou em nota oficial que os membros convidados a participar do comitê "foram escolhidos diante de critérios que envolveram conhecimentos das questões relacionadas ao desenvolvimento da agricultura irrigada e também a disposição para contribuir com as ações da Política Nacional de Irrigação".

Não estaria caracterizado o nepotismo porque a função de conselheiro "não é cargo em comissão ou função de confiança, não tem direito à remuneração e nem subordinação hierárquica ou funcional ao Ministro".

Muito bem. Então, por que não evitar constrangimentos para o governo, para si e para o próprio tio, que se queixa de trabalhar pouco, e convidar outro empresário que esteja disposto a colaborar com a política nacional de irrigação?

É o mesmo caso do irmão do ministro, Clementino Coelho, que por ser o diretor mais antigo da Codevasf, ficou à frente do órgão, sem ser nomeado, durante praticamente um ano inteiro.

Também não se caracteriza nepotismo, pois, embora o órgão seja subordinado ao ministro, Clementino não foi formalmente nomeado para sua presidência, apenas exerceu as funções de presidência, inclusive porque, conforme suas próprias explicações, não poderia se furtar a tomar as decisões que o órgão exigia.

Pois essa sua longa "interinidade" acabou tão logo foi descoberta pela imprensa, e um novo presidente, aparentemente sem laços de família com o ministro, já foi nomeado.

Acontece que o nepotismo está presente na política brasileira, mas através do voto. Como diversos outros políticos, o ministro Fernando Bezerra tem um filho que é deputado federal e provável candidato a prefeito de Petrolina, reduto eleitoral da família.

Pois o deputado Fernando Coelho Filho, também do PSB, teve o maior volume de liberação de emendas parlamentares da pasta do pai em 2011, verba que vai para ações tocadas pela Codevasf, aquela estatal que até outro dia era presidida por um irmão do ministro, e tio do deputado.

Petrolina foi escolhida pelo Ministério para ser o município pioneiro nas ações do programa Mais Irrigação do PAC-2, um deles denominado "projeto Nilo Coelho", em homenagem ao tio de Bezerra, que foi senador e governador de Pernambuco.

Cada coisa dessas tem sua explicação particular, mas se juntamos todas elas fica uma sensação desagradável de que se repete em Pernambuco uma política regressiva que favorece os feudos políticos.

Além das relações de dependência, outro ponto destacado nos estudos do sociólogo Roberto Da Matta é a questão do profissionalismo em contraponto com o nepotismo, que impediria o desenvolvimento das instituições brasileiras, sobretudo as governamentais.

O governador Eduardo Campos faz parte de uma nova geração política brasileira que, pelo menos na teoria, coloca a gestão eficiente e o profissionalismo à frente de seus projetos de governo.

No caso das enchentes, ele inclusive alega, com razão, que não pode ser "acusado" por ter sido mais eficiente e apresentado projetos técnicos que foram aprovados, liberando as verbas necessárias.

Mas tanto ele quanto o ministro Fernando Bezerra, que é um potencial candidato ao governo de Pernambuco na sucessão de Campos, poderiam se preocupar mais com as aparências.

A imagem regional dos dois deve estar em alta nos seus redutos eleitorais, mas a imagem nacional do PSB pode se contaminar. Se isso ainda importar nessa política do vale-tudo que está disseminada entre nós, seria pelo menos uma boa notícia.

FONTE: O GLOBO

Defeito de fabricação:: Dora Kramer

Os dois partidos com maior representação no Congresso, PT e PMDB, são aliados no âmbito nacional, mas disputam como adversários o poder local.

Foi assim em alguns estados em 2010 e será assim em muitas capitais – por enquanto, 14 das 26 – em outubro próximo.

Há duas distorções aí. Cada qual à sua maneira, ambas representativas de um ambiente político onde prosperam as conveniências e definham as ideias e os ideais.

Um ex-parlamentar de longa e larga experiência no ramo chama atenção para a seguinte discrepância: em sistema eleitoral/partidário que se prezasse, natural seria que os dois maiores partidos de um país defendessem linhas de pensamento diversas.

E, portanto, deveriam ser concorrentes em todos os níveis, por representarem ideologicamente parcelas diferentes da sociedade.

Como entre nós não funciona assim, não há ideias e sim interesses a defender, toma-se como perfeitamente aceitável a parceria entre supostamente desiguais com vista apenas a colher vitórias eleitorais e depois compartilhar o exercício do poder.

Exatamente por causa do artificialismo programático em que se baseiam as alianças é que se torna possível duas legendas aliadas serem adversárias circunstanciais.

Sem que isso fira de morte a parceria. Ninguém duvida de que PT e PMDB se engalfinhem para valer nas eleições municipais e depois voltem, ainda que aos trancos e barrancos, à convivência no comando do país podendo até concorrer juntos de novo à Presidência da República.

Mas tudo que é torto tem preço e prazo de validade. Aquele mesmo político experiente que aponta desvio no que nos parece ser um curso natural, alerta para a impossibilidade de as coisas transcorrerem assim para sempre.

Com o decorrer do tempo há duas hipóteses para o futuro dessa aliança: ou o PT canibaliza o PMDB e o partido se destrói – ele cita o processo entre PSDB e DEM como exemplo – ou as lutas locais acabam se sobrepondo e a parceria se desfaz.

E por que não é possível se uniformizar as alianças nos planos federal, estadual e municipal, como tentou a Justiça ao impor a regra da verticalização, logo derrubada pelo Congresso?

Porque parceria "de cima" é sustentada na troca de vantagens, no jogo puramente fisiológico. "Embaixo", nas cidades, é que se dá a disputa de fato, pois ali está a fonte de poder real que determina a sobrevivência ou a falência de um partido.

Não por outro motivo as seções estaduais e municipais são as que reagem com veemência a coligações tão esdrúxulas – como a proposta do prefeito de São Paulo ao PT – que pareçam inaceitáveis aos olhos do eleitorado.

A história recente está cheia de exemplos de partidos cujas regionais perderam força e competitividade eleitoral, se acabaram por causa de equívocos na decisão de firmar alianças.

Carimbo. Há um debate no governo sobre a marca do governo de Dilma Rousseff: há quem defenda o investimento na simbologia do social e há quem considere melhor apostar na imagem de eficácia gerencial.

Ambas as propostas encontram obstáculos. O social seria um filão esgotado e definitivamente identificado com Lula.

O gerencial tem a realidade como adversária. Além de não ter visto, quando era chefe da Casa Civil, todas as irregularidades que resultaram na saída de ministros em seu primeiro ano de governo, Dilma não viu o uso político das verbas do Ministério da Integração Nacional, bem como nomeou Fernando Bezerra para o cargo e deixou que o irmão dele fosse por um ano presidente de estatal (Codevasf) subordinada à pasta.

Não são exatamente atitudes de gestora eficaz.

Alto lá. Queira o bom senso que PT, PSDB e prefeito de São Paulo não estejam pensando em transformar o drama da chamada cracolândia em matéria-prima de disputa eleitoral.

Se estiverem, conviria não avançarem nesse perigoso terreno da pusilanimidade a fim de não confirmarem a impressão de que perderam a noção do limite.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Dilma falhou no que se dizia melhor:: Rosângela Bittar

Apagões pequenos, médios e grandes, do Oiapoque ao Chuí; epidemia grave de dengue; mortes novamente por catástrofes da natureza esperadas mas não prevenidas por governos municipais, estaduais e sobretudo federal, a quem compete muito; caos aéreo persistente, resultado de incipientes medidas; erros repetidos na administração da Educação; baixa execução de PACs I ou II; reforma agrária sem resultados; invisível avanço em desempenho na área de segurança. Problemas, esses e muitos outros, do primeiro ano do governo Dilma, todos, de gestão.

A presidente da República gastou seis meses iniciais na montagem do governo e os seis meses finais na desmontagem. Perdeu, na tessitura, dois pilares, Antonio Palocci, chefe da Casa Civil, e Nelson Jobim, ministro da Defesa, dois mais importantes colaboradores. Titubeou, demorou, negaceou, até trocar ministros política e administrativamente inviabilizados nos cargos, levando o governo à paralisia. Quando tomou providências o fez de forma acanhada - pois ainda há áreas no vácuo -, e já era o fim da primeira etapa.

Isso não influiu na popularidade, na capacidade de reeleição, no apoio popular, como citam governistas profissionais, a provar que a aceitação é prova de que o governo foi bom. Não se pode dizer, porém, para o bem do realismo, que se o mau governo não atingiu o voto, não existiu. Com altos índices de aprovação no último Ibope do ano, maior até que seus antecessores no mesmo período, Dilma seria reeleita gloriosamente se o pleito fosse hoje. Mas não poderá dizer que recebeu, para isso, contribuição decisiva de sua performance de gestora, fama que adquiriu já na equipe de transição do governo Lula, antes até de ser ministra.

O governo começa o segundo ano no mesmo ponto que começou o primeiro: tendo que ser remontado, exigindo nomeação de ministros que possam ter competência para executar programas que a presidente venha a apontar como seu projeto de Brasil. Em janeiro de 2012 estão todos no ponto do janeiro de 2011: à espera de que ela diga a que veio e para onde vai.

Dilma terminou em empate, inclusive, no quesito de preservação da democracia e das instituições, ainda necessitadas de cuidados especiais no Brasil. Para cada avanço, houve um retrocesso. Iniciativas como a criação da Comissão da Verdade, ou mudanças dos princípios de política externa para preservar o respeito aos direitos humanos, por exemplo, tiveram seu contraponto na censura a programas de TV e peças de propaganda ensaiadas sem pudores pela ministra da Mulher, Iriny Lopes, e na pressão do partido presidencial, o PT, para que promova o controle da imprensa. Houve outras ameaças que não chegaram a configurar risco real, mas promessas de autoritarismo, como o abuso do governo por medidas provisórias, o que anula o contraditório do Congresso, e renovadas tentativas de eliminar controles do Tribunal de Contas da União.

A timidez administrativa da presidente inibiu até mesmo o grupo criado para ajudá-la a romper o imobilismo da gestão do Estado, a Comissão de Gestão Pública. Jorge Gerdau, empresário coordenador do grupo que levaria para o governo os instrumentos modernos de administração na iniciativa privada, não logrou resultados. O grupo não deu respostas sobre como melhorar a gestão de áreas de administração difícil e, às vezes, dramática, como a da saúde e, principalmente, dos hospitais públicos. Nem da educação, uma gestão perdida entre erros administrativos repetidos, por exemplo, na aplicação de exames nacionais, e equívocos da política universitária expansionista que criou instituições fantasmas pelo interior afora.

O problema é que esses setores de gestão em colapso têm se tornado numerosos, a eles se somando a segurança, o combate ao uso de drogas, a prevenção de desastres ambientais, o abastecimento de energia.

A oposição, se disse neste espaço ao fim de 2011, foi um fracasso retumbante no ano em que deveria se renovar e reafirmar um projeto alternativo para o eleitorado. O governo não ficou à frente, embora, ao contrário da oposição, que nem número teve, contasse com os instrumentos para fazer e acontecer.

O ministério foi formado para atender ao projeto do ex-presidente Lula de preparar candidatos de cara nova para o PT disputar eleições municipais e estaduais. Deu errado no federal, e pode continuar nessa má trilha a julgar-se pelas especulações que cercam a substituição dos ministros candidatos. A troca de Fernando Haddad por Aloizio Mercadante - e não vai aqui nenhum lobby das corporações que lotearam o MEC a favor do secretário-executivo (Henrique Paim) e candidato preferencial de Haddad - continua dentro do projeto de formação de candidatos do PT a eleições traçado por Lula.

As corporações, que governam por intermédio de conferências, ONGs e greves, por sinal, tomaram mais de uma das áreas fundamentais para o sucesso do projeto deste governo. Na saúde tentou-se estabelecer base de alguns programas novos, voltados para a classe média, segundo orientação expressa da presidente, mas foi incipiente. Exemplo de fim de linha nesse setor acontece na porta do governo federal. Brasília, governada pelo PT, que tem na saúde o problema mais grave entre tantos, continua mergulhada na incompetência e falta de perspectiva de soluções. A última do governador Agnelo Queiroz foi criar o ciclo-socorro, as "bikelâncias" que, como o nome indica, são isso mesmo, ambulâncias em bicicleta. Não se tem notícia de reações de perplexidade, terror ou providências no Ministério da Saúde.

O governo parece amarrado, impedido. Com esse fraco e pouco criativo desempenho, Dilma está no topo das pesquisas de popularidade, apoio e aceitação do eleitorado, repetem como um mantra seus acólitos. O ex-presidente Lula já disse, nos idos do pós-mensalão, que um governo começa mesmo no terceiro ano, portanto, esse início não conta. O pior dos mundos será a marquetagem convencer Dilma da desnecessidade de reações firmes neste segundo ano.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília.

FONTE VALOR ECONÔMICO

A privataria quer bicar o Fundão:: Elio Gaspari

O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, concedeu à General Electric, por 50 anos, um terreno de 47 mil metros quadrados para que ela construa um centro de pesquisas na Ilha do Fundão. O doutor comprou a gleba ao Exército, pagando R$13 milhões. Aquilo que pode parecer um episódio de modernização da cidade, é um capítulo da dilapidação do patrimônio da Viúva e dos impostos pagos pelos cariocas.

Faz tempo, existiu na Baía de Guanabara uma Ilha do Bom Jesus, e lá, no reinado de D. Pedro II, instalou-se o Asilo dos Inválidos da Pátria para receber veteranos da Guerra do Paraguai. A iniciativa foi amparada por uma subscrição pública de moradores da cidade e de seus comerciantes. Em 1868 havia lá 32 oficiais e 1.163 praças.

Passados 106 anos, o presidente Ernesto Geisel soube que o Asilo continuava funcionando. Pelas suas contas, se houvesse Inválido da Pátria vivo, teria algo como 124 anos. Pediu ao ministro do Exército, general Silvio Frota, que lhe explicasse o que era aquilo.

O ministro mostrou que nas 58 casas do Asilo trabalhavam 57 militares e 69 civis. Os asilados eram quatro, de outras guerras. Em dinheiro de hoje, a instituição consumia R$455 mil anuais (noves fora os salários). Portanto, havia 32 servidores para cada "inválido da pátria" que, por sua vez, custava R$9,5 mil mensais. Geisel mandou acabar com a maluquice. Como o ministro demorava, em 1976 o presidente ameaçou entrar em greve. Não assinaria coisa alguma levada por Frota enquanto o Asilo não fosse extinto. Ganhou a parada. Essa era uma época em que esbanjava o dinheiro da Viúva. (Um sargento do Asilo tivera dupla militância, dividindo-se entre o plantel dos torturadores da Polícia do Exército e o contrabando.)

As terras da Ilha do Bom Jesus continuaram como propriedade da União e, como agora esbanja-se o patrimônio da Boa Senhora, Eduardo Paes quer atrair para o Rio o "Brazil Technology Center" da General Electric. Para isso, presenteia a empresa com o terreno. Como a propriedade não é dele, comprou-a ao Exército. A GE é uma empresa privada e tem bala para comprar terrenos. O Exército, uma instituição pública sustentada pelo Tesouro, não faz qualquer uso daquilo que foi a Ilha de Bom Jesus.

A vereadora Sonia Rabello, que já ajudou a impedir a construção de um monstrengo disfarçado de marina no Aterro do Flamengo, sustenta que esse tipo de munificência faz mal à cidade. Até bem pouco tempo o Exército teve um projeto para a construção de três edifícios, com 140 apartamentos, no Forte do Leme. A ideia, aceita pelo prefeito, felizmente foi abatida em voo na Câmara do Rio.

A choldra que paga impostos verá R$14 milhões de sua carga tributária municipal passar para o Exército, em benefício dos acionistas da General Electric, cujas ações fecharam a US$18,86 no pregão de segunda-feira da Bolsa de Nova York.

Há inúmeros interessados em bicar as terras do Fundão. São negócios em que todo mundo ganha, menos a Viúva e os inválidos do fisco.

Serviço: Está na rede o trabalho "A Espuma das Províncias - Um estudo sobre os Inválidos da Pátria e o Asilo dos Inválidos da Pátria, na Corte (1864-1930) do professor Marcelo Augusto Moraes Gomes.

FONTE: O GLOBO