sexta-feira, 30 de setembro de 2022

Fernando Gabeira - Ascensão e queda da extrema direita

O Estado de S. Paulo

O processo de redemocratização do Brasil ganha uma nova chance. Mas precisaremos de mudanças para aproveitá-la.

No momento em que a extrema direita está prestes a deixar o governo no Brasil, a italiana acaba de vencer as eleições. No caso deles, é a primeira vez desde a 2.ª Guerra Mundial.

Enquanto os italianos têm de discutir como lidar com essa forca política, aqui, no Brasil, o debate ainda incipiente é como evitar que retorne com sua política de armar a população, destruir os recursos naturais, esvaziar a produção científica e cultural e isolar o País no mundo.

Nos primeiros passos para abordar o fenômeno, tenho acentuado que o dínamo do crescimento da extrema direita europeia não está presente no Brasil: o medo diante dos movimentos migratórios.

Umberto Eco, no seu pequeno livro Migração e intolerância, fala das dificuldades dos animais e mesmo das crianças de conviverem com o diferente. Tive a oportunidade de assistir, nas praias italianas, à chegada maciça dos albaneses, quando ruiu o império soviético, no final do século 20. Eco menciona essa presença albanesa para registrar que alguns desses imigrantes se perderam para o crime e a prostituição. Mas esse fenômeno pontual acabou sendo visto por alguns como típico dos imigrantes. Ele mesmo exemplifica essa distorção com o exemplo de alguém que tem a mala roubada num outro país e acha que ali todos são ladrões.

Vera Magalhães - Bolsonaro encara a própria obra

O Globo

O presidente se fiou muito na expectativa de que medidas improvisadas amenizariam o trauma da pandemia

Jair Bolsonaro está nervoso. O que atormenta o presidente não é só chegar às urnas em desvantagem, sob risco considerável de ser derrotado em primeiro turno, duas circunstâncias inéditas para um presidente que disputa a reeleição no cargo.

Tampouco a irritação advém apenas de ele saber ser estreita, quiçá inexistente, a margem que terá para contestar, com sucesso, o resultado das urnas, caso se confirme adverso para ele.

Por fim, não é a condição de pai cioso ou marido devotado que tira o sono de Bolsonaro diante da divulgação de notícias como a quebra de sigilo de seu ajudante de ordens, o tenente-coronel Mauro Cid, ou da compra de 51 imóveis por ele e por familiares ao longo das últimas duas décadas em parte em dinheiro vivo.

O que atormenta Bolsonaro e o deixa à flor da pele na última semana, à beira da autocombustão, é a proximidade cada vez maior de ser confrontado com a obra de seu governo e de sua vida. Para esse acerto de contas, as pesquisas não são exatamente auspiciosas.

O Datafolha divulgado nesta quinta-feira não permite nem cravar se haverá segundo turno. Na verdade, depois de uma semana de sprint da campanha lulista em busca de virar votos e mostrar que Lula reúne em torno de si uma frente ampla de apoios, a estagnação nos índices foi um balde de água fria antes do debate da TV Globo.

A ideia do Q.G. petista era ir para o confronto decisivo contra Bolsonaro com um indicativo mais claro de que a fatura seria liquidada neste domingo.

Bernardo Mello Franco - Bolsonaro em modo 2018

O Globo

Depois de quatro anos no poder, presidente tenta se vender como candidato antissistema

O medo da derrota fez Jair Bolsonaro apelar a um velho figurino: o do candidato antissistema que venceu a eleição de 2018.

Depois de quatro anos no poder, o capitão foi aconselhado a apostar numa campanha mais convencional. Filiou-se ao maior partido do Centrão, planejou gastos milionários, profissionalizou a propaganda na TV e nas redes. Na nova versão, o candidato trocaria a fantasia de outsider pelo terno de presidente. Faltou conciliar o desejo dos marqueteiros com o espírito do Cavalão.

Pressionado, Bolsonaro apostou tudo na tentativa de voltar ao passado. Ontem ele resgatou até a estética das lives de 2018. Vestiu uma camisa da seleção e soltou o verbo em discurso para internet. O cenário foi decorado com uma bandeira torta na parede e uma mesa cuidadosamente desarrumada. Só faltaram os chinelos e o pão com leite condensado.

O falatório também pareceu ressurgir de uma máquina do tempo. O capitão repetiu mentiras sobre a urna eletrônica e tentou amedrontar eleitores religiosos com temas como comunismo e ideologia de gênero.

Eliane Cantanhêde – Estabilidade, mas com dúvidas

O Estado de S. Paulo

Vitória em primeiro turno é tão incerta quanto o terceiro lugar

As eleições chegam ao seu dia D com os dois principais candidatos, Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro, procurando ganhar no grito, ou na narrativa, ou no imaginário popular, produzindo demonstrações de força, sejam elas reais ou apenas para inglês, ops!, eleitor ver. É a derradeira busca pelo voto, especialmente pelos 13% de eleitores indecisos ou pelos que podem mudar de candidato na última hora. No caso de Ciro Gomes, 46%. No de Simone Tebet, 38%.

Lula ostenta troféus, com listas diárias de adesões em setores-chave, que influenciam eleitores e podem puxar votos, como artistas, atletas, intelectuais, economistas, ex-candidatos à Presidência, ex-ministros principalmente do tucano Fernando Henrique Cardoso e ex-presidentes do Supremo.

São eles Joaquim Barbosa, Celso de Mello, Ayres Britto, Nelson Jobim (que foi ministro de Lula) e, sem necessidade de notas ou declarações, Sepúlveda Pertence. Só Ellen Gracie, consultada pela campanha petista, preferiu não manifestar voto. E, mais uma vez, já fora do STF, Marco Aurélio Mello, é voto vencido: é o único pró-Bolsonaro.

Luiz Carlos Azedo - Há duas hipóteses (e não quatro) para Lula e Bolsonaro no primeiro turno

Correio Braziliense

Na simulação de segundo turno, Lula derrotaria Bolsonaro por 54% a 39% dos votos, sendo que o presidente da República cresceu um ponto e o ex-presidente parece que bateu no teto

A pesquisa DataFolha divulgada ontem pôs fogo no debate entre presidenciáveis da TV Globo, como vocês verão nas páginas do Correio Braziliense e do Estado de Minas de hoje. Com 50% dos votos válidos, como no levantamento anterior, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está com a bola na marca do pênalti para voltar ao poder, porém, pode chutá-la na trave e ter que encarar um segundo turno. O presidente Jair Bolsonaro (PL), com 36% de intenções de votos, subiu um ponto nas pesquisas. Com 6%, Ciro Gomes (PDT) caiu um ponto por causa da campanha do voto útil, e Simone Tebet (MDB), com 5%, manteve-se na mesma posição que estava. Soraya Thronicke (União Brasil) também manteve-se no 1%.

Esses resultados expurgam votos nulos, brancos e abstenções, como determina a lei eleitoral na hora de proclamar o vencedor. A pesquisa estimulada aponta Lula com 48%, um ponto a mais do que na semana passada; Bolsonaro com 34%, um a mais também. Ciro Gomes com 6%, um a menos; Simone, com os 5% da pesquisa anterior; e Soraya Thronicke (União Brasil), com 1%. Felipe d’Avila (Novo), Sofia Manzano (PCB), Vera Lúcia (PSTU), Léo Péricles, Constituinte Eymael (DC) e Padre Kelmon (PTB) não pontuaram. Votos branco/nulo/nenhum somam 3%, um a menos em relação à pesquisa anterior. Não sabe manteve 2%. Na simulação de segundo turno, Lula derrotaria Bolsonaro por 54% a 39% dos votos, sendo que o presidente da República cresceu um ponto e o ex-presidente parece que bateu no teto. A aprovação do governo caiu 1%, estando em 31%; esse ponto se deslocou para os que consideram o governo regular, que são 24%. A reprovação do governo manteve-se em 44%.

José de Souza Martins* - Referendos ocultos nas eleições

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Para alguns, serão a confirmação da ilusão autoritária do voto de 2018; para outros, estas são as escolhas de representantes do povo cidadão

As várias anomalias da situação com que se defrontam o eleitorado e os candidatos nestas eleições sugerem que para muitos não serão elas apenas eleições. Para alguns, serão a confirmação da ilusão autoritária do voto de 2018, quando a população votou enganada pelas “fake news”. Bolsonaro elegeu-se no ingênuo pressuposto de que o eleitorado que o elegeu abdicara de seu direito cidadão de ser representado.

Teria delegado sua cidadania ao eleito, à sua dinastia e aos seus cúmplices para fragilizar e até suprimir direitos sociais, facilitar as vantagens privadas do arbítrio e usurpar a competência participativa dos cidadãos em ações e protestos. Até Rasputin teve abrigo nos recintos do poder.

O governante agiu, nestes quase quatro anos, como se tivesse sido eleito para um mandato de feição totalitária oculto numa democracia falsa e teatral. Esperneou o tempo todo porque entendeu que, no enquadramento da lei, as instituições lhe usurpavam o poder imaginário de comandante de quartel.

Para outros, estas são eleições de representantes do povo cidadão na esfera federal e na estadual, nos Executivos e nos Legislativos.

Maria Cristina Fernandes - A eleição que desafiou 37 anos de democracia

Valor Econômico

Polarizada pelo alto grau de definição dos eleitores, campanha tem a 3ª via menos expressiva desde 1989

O Brasil chega à sua décima eleição presidencial desde a redemocratização depois de enfrentar a maior ameaça às instituições que a garantiram. Polarizada desde o início, com alto grau de definição do voto, esta é também a eleição em que a terceira via deverá ter o menor percentual de votos.

Nenhuma outra campanha da história brasileira antagonizou, como esta, o presidente-candidato e o Tribunal Superior Eleitoral. Desde a redemocratização, o Ministério da Defesa e o comandante do Exército jamais haviam respaldado a desconfiança nas urnas eletrônicas como os atuais o fizeram.

O ataque às instituições eleitorais desencadeou manifestações de apoio e confiança de seis emissários do governo americano, em visita ao Brasil, inclusive o secretário de Defesa, Lloyd Austin. Em carta, 50 eurodeputados pressionaram a Comissão Europeia por um repúdio inequívoco à subversão das regras democráticas no Brasil.

O apoio doméstico ao TSE foi demonstrado na posse do ministro Alexandre de Moraes à qual compareceram todos os ex-presidentes, à exceção de Fernando Henrique Cardoso, por enfermo, todos os ministros do Supremo Tribunal Federal, além dos principais candidatos à Presidência e aos governos, governadores e presidentes das casas legislativas.

O tom belicoso adotado ao longo do governo e da campanha colaborou para que Jair Bolsonaro, quarto presidente a disputar a reeleição, seja rejeitado por mais da metade do eleitorado. Foi com este patamar de repúdio que Fernando Haddad perdeu a disputa pela Presidência em 2018.

Vinicius Torres Freire - Desumanidade derrota Bolsonaro

Folha de S. Paulo

Descaso atroz do presidente pelo sofrimento de doentes e famintos juntou ofensa à desgraça social

Não, não saberemos de uma possível derrota precoce de Jair Bolsonaro (PL) até domingo. É difícil que as pesquisas de véspera, de sábado, indiquem maioria mais folgada de Lula da Silva (PT) no primeiro turno, pois o eleitorado indeciso é residual. Marolinhas de abstenção podem mudar o jogo.

O resultado mais importante do Datafolha é que a votação de Lula e de Bolsonaro não mudou durante a campanha eleitoral oficial, desde meados de agosto. A votação dos dois, tanto no primeiro quanto em um possível segundo turno, também é a mesma.

Os estelionatos eleitorais, benefícios sociais extras, a querela da gasolina, a propaganda, nada disso teve efeito. A taxa de indecisos foi histórica e precocemente baixa, em uma eleição plebiscitária, em uma campanha ainda mais vazia de ideias do que de costume. O truque da candidatura contra o "sistema" deixou de colar, assim como a demagogia farisaica com a corrupção.

Hélio Schwartsman - Prazer cívico

Folha de S. Paulo

E já há cheiro de debandada nas fileiras bolsonaristas

"Rei morto, rei posto", ou "Le roi est mort, vive le roi", no original francês. Diante do que parece ser uma derrota inevitável de Jair Bolsonaro, empresários e até mesmo políticos que despontavam como firmes apoiadores do presidente já começam a cortejar Lula ou, pelo menos, enviar sinais de que estão dispostos a conversar. Vejo esse movimento com bons olhos.

Objetivamente, a debandada reduz ainda mais as exíguas chances de apoio político a alguma aventura extrainstitucional de Bolsonaro. Numa nota mais pessoal, confesso que sinto uma espécie de prazer cívico ao ver o pior presidente da história do país ser derrotado —e quanto mais humilhante for a derrota, mais me regozijarei.

Mariliz Pereira Jorge - As sequelas do bolsonarismo

Folha de S. Paulo

Marcas da incivilidade continuarão tendo efeito na saúde mental coletiva

Precisaremos de tempo para conhecer as nuances do rastro da destruição causada por Jair Bolsonaro. Não me refiro aos indicadores econômicos e sociais que já sinalizam retrocesso, estagnação, incompetência. Esses dados são desde já acessíveis e revelam uma parte da devastação civilizatória no país. Falo sobre as profundas sequelas emocionais deixadas pelo bolsonarismo na sociedade.

O atual governo alimentou nos últimos quatro anos um clima de arruaça constante. Não houve um dia de tranquilidade desde que Bolsonaro assumiu o poder. Nos tornamos um povo triste, ansioso e cansado, refém de uma gestão caótica e antidemocrática. Num futuro próximo, imagino que os estudiosos diagnosticarão o brasileiro com estresse pós-traumático, o tipo de choque causado em quem enfrenta guerras, assaltos, violência sexual.

Reinaldo Azevedo - Democracia é o plano, diz Datafolha

Folha de S. Paulo

E se Bolsonaro vencer? Será preciso refazer o país desde o fim

Os números da pesquisa Datafolha indicam que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem chance de se sagrar vitorioso no primeiro turno. Fossem os 50% a metade exata, poderia faltar o seu voto, leitor. O embate se dá só no domingo, e a experiência indica que a gente só acerta as previsões que antecedem as 48 horas depois do fato consumado. Neste espaço, quando ainda se discutia a quimera da "terceira via", antevi um embate bem mais acirrado entre os dois primeiros colocados do que apontam as pesquisas. A ver. Certamente subestimei a disposição fanática de Jair Bolsonaro para a truculência contraproducente.

Caso as coisas se resolvam em favor de Lula no dia 2 ou no dia 30, muitas linhas se produzirão para saber o que mais pesou na definição do resultado. Foi o petista a conduzir uma campanha quase sem erros —como avalio—, ou foi sua nêmesis a cometer toda sorte de desatinos para manter unidos seus celerados? O que lhe terá garantido o conforto do segundo lugar também terá impedido a sua vitória. "E se Bolsonaro vencer, Reinaldo?" Bem, caras e caros, aí será preciso, um dia, refazer o país desde o fim.

Há pelo menos três semanas se intensificaram as cobranças —oriundas mais das viúvas e dos viúvos da Lava Jato do que do mercado— para que o petista apresente o tal plano detalhado de governo, ou, então, afirma-se, o eleitorado estaria lhe dando "um cheque em branco", metáfora que, convenham, precisa, quando menos, ser atualizada. Vai ser o quê? Chave do Pix? Quem sabe o "aggiornamento" das figuras de linguagem induzam senão à modernização do pensamento, ao menos a uma perspectiva realista.

Bruno Boghossian - Bolsonaro amplia artilharia contra Lula e deixa guarda aberta

Folha de S. Paulo

Presidente aposta alto no aumento da rejeição ao petista, mas governo também é vidraça em debate na Globo

Jair Bolsonaro (PL) chegou ao debate da TV Globo determinado a provocar, em três dias, algo que sua campanha não conseguiu em três meses de disputa: turbinar a rejeição a Lula (PT).

O presidente ativou o modo "gabinete do ódio" ainda no primeiro bloco. Bolsonaro abriu sua participação com a já tradicional dobradinha com o candidato Padre Kelmon (PTB) ao enaltecer o Auxílio Brasil, mas a discussão sobre realizações do governo durou pouco.

Em boa parte de suas perguntas e respostas, Bolsonaro fez esforços para vincular o adversário a conhecidos itens da agenda antipetista, como escândalos de corrupção, a liberação das drogas e o assassinato de Celso Daniel, ex-prefeito de Santo André (SP). Chamou ainda o petista de mentiroso e ex-presidiário.

Concentrado num único debate, esse repertório representou uma intensificação da artilharia de Bolsonaro contra Lula. O conteúdo, no entanto, foi semelhante aos ataques que sua campanha já vinha fazendo ao petista, colhendo efeitos limitados.

Desde o fim de junho, a rejeição ao ex-presidente passou de 35% para 39% –ainda insuficiente para rivalizar com os 52% do próprio Bolsonaro.

Igor Gielow - Lula bate boca com nanico, mas vence Bolsonaro por pontos no debate

Folha de S. Paulo

Ninguém foi à lona no encontro da Globo, principal motivo para a realização destes eventos

De tédio ninguém morreu, apesar da duração excessiva do espetáculo. O último debate presidencial antes do primeiro turno no próximo domingo (2), na Rede Globo, foi marcado por um grau de agressividade que há muito não se via num encontro de candidatos ao Planalto na TV.

Claro, o tempo passa: saiu Leonel Brizola gritando com Paulo Maluf e entraram Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), apoiados por um séquito de candidatos no fim da fila das pesquisas.

Lula recuperou-se da atuação apagada no debate Folha/UOL/Cultura/Band e conseguiu escapar da maldição de 1989, quando foi abatido pela afobação no embate final na Globo com Fernando Collor —noves fora a polêmica da edição posterior na TV. Escorregou, contudo, ao bater boca com um nanico.

Assertivo no limite da agressividade, o ex-presidente quase saiu da linha na inusitada e interminável sucessão de direitos de resposta trocados com Bolsonaro no primeiro bloco do evento. Mas alinhou-se e conseguiu encaixar uma linha de golpes no ocupante do Planalto, a quem pespegou um "cara de pau" com tom de indignação crível.

Rafael Cortez* - Debate mantém janela aberta para vitória em primeiro turno

O Estado de S. Paulo

Debate na Globo pouco contribuiu para o presidente reverter a imagem negativa que a maioria do eleitorado faz do seu governo

A campanha presidencial começou com o debate sobre as possíveis chances de crescimento da terceira via e se encerra com incerteza sobre seu final: se primeiro ou segundo turno. O agregador de pesquisas do Estadão mostra 52% de votos válidos para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o que diante da margem de erro das pesquisas, fundamentalmente, expressa um cenário em aberto. Grosso modo e, assumindo alguma simplificação, o debate da Globo só terá importância se contribuir para gerar esse movimento relevante às vésperas da eleição.

O petista tem basicamente duas tarefas para conseguir a vitória de oposição em primeiro turno: convencer indecisos e cansados da polarização e, especialmente, convencer ao comparecimento eleitoral. O presidente Jair Bolsonaro (PL), por sua vez, tem duas opções: convencer o eleitorado do seu desempenho no governo ou aumentar a rejeição do petista, contribuindo para evitar voto útil em direção a ele. Os demais nomes lutam para justificar a relevância dos projetos em uma eleição que deve figurar na História como a votação recorde de polarização.

Fabio Murakawa - Preso em sua bolha, Bolsonaro luta para ir ao segundo turno

Valor Econômico

Eleito com voto antipetista, presidente pregou para convertidos e assustou moderados na campanha

Jair Bolsonaro (PL) conseguiu angariar votos muito além do seu eleitorado mais fiel para se eleger presidente da República em 2018. Neste ano, ironicamente, a incapacidade de romper essa bolha pode tirá-lo do Palácio do Planalto.

Há quatro anos, em meio à onda antipetista que varria o Brasil pós-Lava-Jato e à comoção com a facada que quase tirou-lhe a vida, Bolsonaro obteve 46,03% dos votos válidos em primeiro turno. Ao longo de toda a atual campanha, porém, não conseguiu se aproximar desse índice. Teria hoje apenas 36% dos votos válidos, segundo a pesquisa Datafolha de ontem.

O dilema entre falar só para a própria bolha ou abrir-se ao eleitorado médio dividiu o entorno de Bolsonaro nos últimos meses.

Ministros da ala política, como Ciro Nogueira (Casa Civil) e Fábio Faria (Comunicações), aconselhavam o presidente a fazer uma campanha propositiva, mostrando realizações e surfando na onda do Auxílio Brasil de R$ 600 e da redução dos preços dos combustíveis.

Eles defendiam que o presidente precisava falar mais ao eleitor moderado, que havia votado em Bolsonaro em 2018 mesmo sem ser bolsonarista ou defender sua pesada pauta de costumes e pró-armas. Amparados por pesquisas qualitativas, os ministros tentavam mostrar a Bolsonaro que cada fala radical afastava esse eleitor.

Contratado pelo presidente do PL, Valdemar Costa Neto, o publicitário Duda Lima apostou nessa “linha light”, dos primeiros vídeos gravados no laboratório da pré-campanha às primeiras inserções no horário eleitoral.

Não tardou a sofrer ataques de parte dos ideológicos, sobretudo do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente. Em junho, Carlos ironizou no Twitter um filme de 30 segundos produzido por Lima para ser usado nas redes sociais.

“Vou continuar fazendo aqui o meu trabalho e dane-se esse papo de profissionais do marketing. Meu Deus!”, escreveu.

Maria Cristina Fernandes - Debate vai virar ‘fábrica de memes’ na reta final

Valor Econômico

Lula perdeu a paciência com Padre Kelmon que foi ao debate justamente para arrancar dele esta reação

Ao evitar fazer perguntas a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no debate da Globo, último grande evento da disputa eleitoral, o presidente Jair Bolsonaro (PL) acabou por reconhecer a condição que a campanha o colocou como principal cabo eleitoral do ex-presidente. Até um “L” involuntário fez ao erguer a mão nas considerações finais que, minutos depois do debate, já se transformou em “meme” da campanha lulista.

O recurso será abundantemente usado pelos candidatos que tentarão explorar os deslizes dos adversários em seu benefício junto a eleitores que, pelo horário em que transcorreu o encontro (das 22h45 às 1h45), não puderam assisti-lo.

Se evitou o embate direto com Lula, Bolsonaro escalou o Padre Kelmon para fazê-lo. O candidato do PTB, em grande parte, foi bem-sucedido ao tirar do sério o candidato petista que, até ali, vinha conseguindo reverter a impressão deixada no debate da Band de não ser capaz de reagir às acusações de corrupção.

Depois de manter a fleuma ante adversários mais difíceis, como Bolsonaro ou Ciro Gomes (PDT), que ficou apagado no debate, Lula perdeu a paciência com Padre Kelmon que foi ao debate justamente para arrancar dele esta reação.

“Candidato laranja não tem respeito por regras”, disse Lula que, ao fim do embate, tentou retomar o controle: “Vou voltar a ser presidente porque o povo brasileiro está cansado de gente de sua espécie. Não sei de onde você veio, mas seu comportamento é de um fariseu. Feche a boca quando outro estiver falando. Não estou vendo um representante da igreja. Estou vendo um impostor”.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Editoriais / Opiniões

Uma eleição com poucas ideias e ameaças à democracia

Valor Econômico

A alta temperatura da disputa não se traduziu em um confronto de várias, boas e novas ideias

Mais de 156 milhões de brasileiros vão depositar seus votos nas urnas no domingo, nas eleições mais caras e mais polarizadas desde a redemocratização - segundo as pesquisas, escolherão sobretudo entre duas opções conhecidas: o atual presidente, Jair Bolsonaro, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O pêndulo da história se deslocou de volta para o candidato do Partido dos Trabalhadores, legenda derrotada amplamente em 2018, com sua rejeição capitaneada por um longevo e medíocre deputado de extrema-direita e defensor da ditadura militar. As pesquisas indicam que Lula poderá ser eleito no primeiro turno.

A apuração dos votos, tranquila em outros pleitos, é agora motivo de grande preocupação. Desde que assumiu o cargo, Bolsonaro deu muitas mostras de aversão à democracia, disse que as urnas eletrônicas não são confiáveis e que não aceitaria pacificamente uma derrota. Em campanha para permanecer no poder, Bolsonaro convocou para sua cruzada contra as urnas o ministro da Defesa, Paulo Sérgio de Oliveira, que ensaia promover apuração paralela dos votos feita por militares.

Dirigido por Valdemar Costa Neto, condenado no mensalão, o PL, ao qual Bolsonaro se filiou, contratou a auditoria do Instituto Voto Legal, sem expertise no assunto, para se pronunciar sobre a segurança das urnas. O veredito veio à luz em duas páginas apócrifas, apontando supostas falhas na atuação do TSE, “vulnerabilidades relevantes nas urnas” e brechas para manipulação dos resultados porque “somente um grupo restrito de servidores e colaboradores do TSE controla todo o código fonte dos programas da urna eletrônica e dos sistemas eleitorais”. O presidente cria um ambiente propício ao tumulto no dia das eleições.

Poesia | Murilo Mendes - Os dois lados

 

Música | Joyce Cândido - Corra e olhe o céu (Cartola e Dalmo Castello)