terça-feira, 14 de agosto de 2018

Hamilton Garcia: A que herança renunciamos? (ii) – Da Social-democracia ao Liberalismo-social

Se, como vimos no artigo anterior, os comunistas adulteraram o socialismo crítico de Marx &Engels em prol do socialismo mítico das mais variadas tendências – do stalinismo ao bolivarianismo, passando pelo petismo –, os social-democratas fizeram o mesmo em prol de um realismo político de resultados incertos: infecundo quando as crises do sistema capitalista polarizaram a sociedade, fecundo quando a normalidade política adversa (guerra fria) obrigou o capital a fazer concessões aos trabalhadores.

No primeiro caso, o alinhamento social-democrático à onda nacionalista do pré- I Guerra (1914-1918) – motivado, entre outras coisas, por conquistas econômico-sociais, no âmbito nacional, derivadas da institucionalização ocorrida nas décadas anteriores – levaria à divisão do movimento dos trabalhadores entre reformistas e revolucionários, no segundo, o pacto social-liberal (welfare state) possibilitaria o funcionamento de um sistema semirregulado que levou as sociedades ocidentais ao maior nível de igualdade desde o advento do capitalismo. O novo pacto funcionaria bem até os anos 1970, quando os sucessivos choques do petróleo, os avanços tecnológicos e a aceleração da globalização das cadeias produtivas – com intensa participação germânica, nipônica e italiana, entre outras –, criaram as condições para a poderosa fuga de capitais que agora ameaçam a estabilidade dos EUA e da Europa.

Eduard Bernstein (1850-1932), teórico da social-democracia alemã, foi o primeiro a perceber a tendência à sacralização do marxismo, iniciando a formulação de suas teses revisionistas, a partir do exílio londrino de 1888, sob as vistas de Engels, tentando manter os liames da política social-democrática com a teoria socialista não-utópica, propondo o debate público, a partir de 1899 , da nova realidade de um capitalismo não só capaz de superar suas crises, como de alcançar graus ainda mais elevados de desenvolvimento – ao contrário da previsão de Marx & Engels –, o que apontava novos desafios ao movimento operário, agora no sentido do reformismo.

A reação do PSD alemão e de Karl Kautsky (1854-1938) – principal teórico marxista vivo depois da morte de Engels – foi, antes, de garantir, respectivamente, uma prática sem teoria (empirismo) e de manter a “doutrina marxista” relativamente protegida da prática socialista – concepção que Lênin adotaria em direção oposta, assentando firmemente a ação na “doutrina" com ares de crença.

Se com Bernstein, malgrado as divergências possíveis, temos a tentativa de manter a teoria viva guiando a ação política – a grande inovação marxista fora, exatamente, como já se disse, a de situar a ação socialista no âmbito do desenvolvimento histórico objetivo revelado pelo materialismo-histórico –, com a resistência ortodoxa de Kautsky e a abstinência intelectual sindicalista, o mal, que amoleceria a racionalidade crítica da social-democracia desde então, seria o de pensar as conquistas populares no seio do capitalismo como mera ampliação do Estado, sem levar em conta que a manutenção de sua configuração capitalista tornaria as conquistas obtidas não apenas relativamente superficiais, como essencialmente provisórias à depender das injunções do capitalismo internacional e dos rearranjos geopolíticos.

Eliane Cantanhêde: Bolsonaro pelas bordas

- O Estado de S.Paulo

Enquanto PT e PSDB miram um o outro, Bolsonaro papa votos em todas as regiões

A Região Sudeste, com seus 43,4% dos votos, é uma incógnita, com São Paulo dividido, Rio uma bagunça e Minas, imprevisível. O Sul briga com sua tradição tucana, o Nordeste espera a ordem unida do ex-presidente Lula e Norte e Centro-Oeste podem dar soma zero: cada um tem em torno de 7,5% de votos e eles se compensam, ou se anulam.

Com 33 milhões de eleitores, São Paulo já começa com duas surpresas. Governado pelo PSDB há 25 anos e respirando sem aparelhos, enquanto Rio, Minas, Rio Grande do Sul e Rio Grande do Norte afundam, o Estado está dando uma canseira nos tucanos: empate técnico de Jair Bolsonaro (PSL) com Geraldo Alckmin para a Presidência e de Paulo Skaf (MDB) com João Doria para o Bandeirantes.

Eleição após eleição, a campanha sempre começa com o discurso da “fadiga de material” dos tucanos em São Paulo, mas eles acabam ganhando. Na última vez, para a Prefeitura da capital (9 milhões de eleitores), com um troféu: apadrinhado por Alckmin, Doria ganhou em primeiro turno.

E agora? A tal “fadiga de material” deixou de ser só lenga-lenga? E pode até estar sendo ampliada pelo surgimento de Bolsonaro? Ele não é “novo”, depois de 27 anos de Congresso e com a filharada toda na política, mas se contrapõe a nomes considerados óbvios, como o próprio Alckmin, Marina Silva e Ciro Gomes, além de se colocar como o maior adversário do PT.

No caso de Doria, contam os acertos e a perseverança de Skaf, que construiu na Fiesp boa plataforma para o governo, na capital e no interior. E contam os erros e a precipitação de Doria, que, mal assumiu a principal prefeitura do País, saiu em campo tentando disputar a candidatura presidencial com Alckmin e, no fim, trocou o mandato pela eleição ao governo. O “povo” não esquece essas coisas facilmente.

No Rio, tudo pode acontecer e o melhor exemplo foi Marcelo Crivella, da Igreja Universal do Reino de Deus, contra Marcelo Freixo, do PSOL – ¬ extrema-direita versus a extrema-esquerda para a prefeitura. Estado destruído, MDB desmontado, o ex-governador Sérgio Cabral na cadeia por bom tempo e, mesmo não sendo “chapa militar”, Bolsonaro deve colher votos de militares da reserva, fortes no Rio, enquanto o ex-prefeito Eduardo Paes (ex-DEM, ex-MDB, novamente DEM) tem fôlego para o governo.

Merval Pereira: Data-limite

- O Globo

Esforço de Lula é inútil, pois o TSE não parece disposto a permitir que a insegurança jurídica perturbe a eleição

À medida que vai se aproximando a data-limite para o registro das candidaturas à Presidência da República no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a discussão sobre a possibilidade de o ex-presidente Lula vir a ser oficializado pelo PT como candidato provoca polêmicas em várias áreas que serão afetadas pela decisão.

O ministro Admar Gonzaga, do TSE, que já defendeu a tese de que a candidatura de Lula deveria ser recusada de ofício, isto é, sem que o tribunal fosse provocado a se pronunciar por um cidadão, um partido político ou pelo Ministério Público Federal, rejeitou ação do servidor Charbel Maroun, candidato pelo Partido Novo em Pernambuco, para vetar desde já a candidatura de Lula à Presidência.

Há uma diferença fundamental entre rejeitar liminarmente o registro e impugnar a candidatura antes do registro oficial. Os ministros do TSE consideram que uma candidatura não pode ser impugnada antes de ser registrada, o que provavelmente será feito pelo PT na quarta-feira dia 15, último dia do prazo oficial.

Escrevo “provavelmente” porque existe um grupo dentro do partido que defende a tese de que o ex-prefeito Fernando Haddad deveria ser oficializado logo como candidato do partido à Presidência, sem continuar com a manobra de registrar Lula para depois ter que tirá-lo, pois a impugnação pelo TSE parece certa.

O ex-presidente é inelegível pela Lei da Ficha Limpa, que foi sancionada por ele, por ter sido condenado em segunda instância. A lei eleitoral diz que uma das razões para tornar alguém inelegível é a condenação com trânsito em julgado, ou por um órgão colegiado em segunda instância. A insistência do PT com a candidatura Lula tem o objetivo de tentar que, nos primeiros dias de campanha eleitoral, que começa dia 31, ele possa participar dos programas de rádio e televisão. Tudo indica que é um esforço inútil, pois o TSE não parece disposto a permitir que a insegurança jurídica perturbe a eleição.

Raymundo Costa: Adivinha quem vem para o jantar

- Valor Econômico

O desafio de Haddad é substituir e não só representar Lula

O ex-senador Marco Maciel costumava dizer que na política brasileira tudo pode acontecer, inclusive nada. Esse será o caso de Lula, cujo registro da candidatura a presidente será pedido amanhã pelo PT à Justiça Eleitoral. O ex-presidente ainda acha que tem chance de disputar pela sexta vez o Palácio do Planalto, nas eleições marcadas para 7 de outubro. É mais que improvável, é praticamente impossível. Mais cedo ou mais tarde o Judiciário veta o nome de Lula com base na Lei da Ficha Limpa. O PT terá então que recorrer ao substituto.

Seria Jaques Wagner, mas o ex-governador da Bahia já não esconde de ninguém o temor de que está a um passo de ser preso: ele vem sendo investigado, não sabe qual será a conclusão do inquérito, e ser levado pela Polícia Federal a esta altura seria o pior para o PT e a campanha presidencial do partido. Uma comitiva de deputados petistas chegou a ir a Bahia para tentar demovê-lo. Em vão. O substituto será o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad. Substituto, não. Representante.

Se Lula estiver certo e o TSE permitir sua candidatura, o nome para a vice-presidente na chapa do PT será trocado. Sai Haddad e entra a deputada estadual Manuela d'Ávila, do PCdoB do Rio Grande do Sul. O ex-prefeito será ministro de um futuro governo do PT, se o partido evidentemente ganhar a eleição. Mas se tudo ficar como está, o candidato será Haddad. O que o PT agora espera de seu ex-prefeito é que ele esteja pronto para o que for o melhor para o partido e para Lula. Uma espécie de soldado do partido.

De acordo com um petista bem graduado, Haddad vai falar por Lula, será orientado por Lula e cumprirá, se eleito, um programa que é o programa do Lula, do PT e da esquerda democrática do país.

Em 2014 quem votou em Dilma Rousseff esperava levar um ministro da Fazenda como Nelson Barbosa, mas acabou levando Joaquim Levy, numa mudança de rumo que deixou desorientados os eleitores e a militância do partido.

Em 2018 o PT espera que Haddad seja o porta-voz de Lula e do partido. Pode mais uma vez se decepcionar, pois é líquido e certo que o eleito, mesmo se for Haddad, terá de fazer um acerto gigantesco nas contas públicas que exigirá cortes bem mais profundos do que o partido pretende admitir em campanha eleitoral.

Bruno Boghossian: Rosa e a Lei Ficha Limpa

- Folha de S. Paulo

Ministra já disse que condenação por colegiado é suficiente para barrar candidato

Rosa Weber tem uma visão rigorosa da Lei da Ficha Limpa. A ministra, que vai comandar o TSE no rumoroso processo de registro da candidatura de Lula, já deu pistas de que leva a sério as regras que tornam inelegíveis políticos condenados.

“A Lei da Ficha Limpa foi gestada no ventre moralizante da sociedade brasileira, que está a exigir dos poderes instituídos [...] um ‘basta’”, afirmou Rosa em 2012, durante seu primeiro julgamento de grande repercussão no Supremo.

Indicada meses antes por Dilma Rousseff para o tribunal, a ministra votou integralmente a favor da lei. Mais de uma vez, ela disse que a condenação por um colegiado de juízes é suficiente para barrar uma candidatura e que não há violação de direitos —mesmo que não estejam esgotados todos os recursos.

“O princípio da presunção de inocência, apesar de cardeal no processo penal, não pode ser compreendido como um véu que cobre a realidade e imobiliza a ação humana”, declarou a ministra.

A interpretação de Rosa se choca com os argumentos de Lula, que deve requerer nesta quarta (15) o registro de sua candidatura. Os advogados do ex-presidente afirmam que ele deve preservar seus direitos políticos porque a ação em que foi condenado não chegou à última instância.

Para a ministra, não há afronta em casos como esse, porque os recursos cabíveis após condenações em segundo grau “não comportam, como regra, efeito suspensivo”.

Hélio Schwartsman: Fugindo do anonimato

- Folha de S. Paulo

Tarefa de escolher deputados é bem mais complexa do que a de selecionar um presidente

Até acho que há uma chance razoável de o próximo presidente da República ser alguém suficientemente responsável, que não empurrará o Brasil para mais perto do abismo. Sou menos otimista em relação ao próximo Legislativo.

Se já é difícil para o eleitor selecionar um dentre os cinco ou seis candidatos presidenciais mais competitivos, que recebem ampla cobertura da mídia e têm algumas de suas propostas discutidas até em botequins, a tarefa de escolher deputados é bem mais complexa.

Para início de conversa, a oferta é assustadoramente maior. Cada partido ou coligação pode registrar um número de postulantes que chega a até 150% do total de vagas a preencher. No caso de São Paulo, cuja bancada federal tem 70 deputados, cada uma das 35 legendas poderia em princípio lançar 105 candidatos, perfazendo um total 3.675 concorrentes.

Até pelo grande número, é mínimo o espaço que os meios de comunicação dedicam à maioria deles. Mesmo no horário eleitoral gratuito, a massa de candidatos não dispõe de muito mais tempo do que alguns segundos por semana. Escapar ao anonimato não é trivial.

O resultado é que o eleitor, mesmo que estivesse empenhado em votar certo (e a literatura da ciência política assegura que a maioria não está), teria poucas ferramentas para fazê-lo. Na prática, agrava-se a tendência de o cidadão definir seu sufrágio baseado em linhas que consideraríamos pouco consistentes, como conhecimento prévio, vínculos emocionais, palpites de amigos, recomendações de pastores, frases de efeito que o candidato possa ter dito para fazer-se notar.

Nada disso faz prognosticar uma Câmara muito diferente da atual, apesar do propalado desejo de mudança radical deflagrado pela Lava Jato. Ao contrário até, as regras de distribuição de verbas do fundo público para as campanhas deixaram tudo na mão das burocracias partidárias, que tendem a favorecer o statu quo.

Ricardo Noblat: Lula candidato é fake News

- Blog do Noblat | Veja

A maior notícia falsa da história recente do país

Sem perder a pose, como se expusesse a mais cristalina das verdades, a senadora Gleisi Hoffman, presidente do PT, em entrevista concedida, ontem, a jornalistas estrangeiros, disse sem franzir o cenho que seu partido não trabalha com a hipótese de o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad substituir Lula como candidato à presidência da República.

Haddad, segundo ela, será registrado apenas como vice quando o PT pedir amanhã à Justiça Eleitoral o registro da candidatura de Lula. Diante da incredulidade dos jornalistas, o máximo que Gleisi se permitiu foi dizer que o partido irá “às últimas consequências” para impedir que a candidatura seja barrada, e que Lula estará em campanha “de um jeito ou de outro”.

De duas, uma. Ou Gleisi quis dar a entender que Haddad será trocado por outro candidato no caso de a Justiça considerar Lula impedido de disputar com base na Lei da Ficha Limpa, ou então mentiu outra vez. É certo que mentiu. O candidato é Haddad, com Manuela d’ Ávilla (PC do B) de vice. O PT “não trabalha com essa hipótese” simplesmente porque deixou de ser hipótese.

No momento em que tanto se discute nos meios de comunicação, nas universidades e por toda parte o fenômeno das notícias falsas, um país do tamanho de um continente vive há meses sob o impacto da maior “fake news” da sua história política recente – a candidatura de um condenado e preso. Outras, no passado, produziram enormes estragos. Com essa não será diferente.

“Você não terá eleições livres e democráticas se proibir o principal candidato de disputar”, disse Gleisi aos jornalistas. Não disse por que mesmo assim o PT participará das eleições de qualquer maneira. Não seria mais coerente denunciá-las por sujas e pregar a abstenção ou o voto nulo? É o que promete fazer o minúsculo Partido da Causa Operária (PCO), por ora aliado do PT.

Gleisi comparou o que chama de “atuação política do Judiciário” no Brasil e em outros países da América Latina com as ditaduras militares que governaram tais países nas décadas de 1960 a 1980 – outra informação falsa. Sob uma ditadura, o Judiciário não atua. Pode atuar uma contrafação dele. Nada se compara a uma ditadura. E ditadura de direita ou de esquerda é a mesma coisa.

Não passou pela cabeça de nenhum ditador sugerir que seus partidários acrescentassem ao seu nome o nome dele. Tampouco passou pela cabeça dos partidários fazerem isso espontaneamente. A primeira coisa que fez a família Lula foi adotar “Lula” como sobrenome. Os petistas mais sabujos seguem seu exemplo. Dá-se como provável que Haddad fará o mesmo para atrair mais votos.

José Casado: O que querem as mulheres

- O Globo

São 77,3 milhões e têm poder decisivo nas urnas, com maioria (52,5%) dos votos. É essencial prestar atenção ao que pensam e dizem sobre eleições, candidatos à Presidência e o futuro governo. Pistas surgiram na semana passada, em atualização semestral da série Retratos da Sociedade Brasileira, pesquisa realizada pelo Ibope e Confederação Nacional da Indústria.

As mulheres (71%) se dizem céticas, mais pessimistas, mais indecisas e mais propensas a anular ou votar em branco do que os homens. Entre eles, essa proporção é bem inferior (64%), embora significativa.

Pode-se atribuir essa repulsão generalizada, com forte tom feminino, às circunstâncias de uma eleição sob o estigma das revelações da Operação Lava-Jato (corrupção transparece como principal motivo para ausência, voto nulo ou branco.)

Com os descontos, sobram percepções básicas sobre o país que as mulheres querem. Elas repisaram tudo aquilo que haviam indicado seis meses atrás na mesma pesquisa.

As preocupações se distinguem, por exemplo, naquilo que o próximo presidente deveria estabelecer como prioridade de governo: 

> Metade das mulheres aponta mudanças sociais para redução das desigualdades sociais, como a melhoria dos serviços estatais de saúde, educação e segurança.

> Homens acham que deveria ser prioritária a moralização da administração, com ênfase no combate à corrupção e na punição dos corruptos. 

> Seis em cada dez mulheres veem no desemprego o principal problema. Já entre homens a maior inquietação (59%) é com a corrupção.

 > Instigadas a relacionar três prioridades de governo, a maioria (51%) foi incisiva: saúde. Atribuem às deficiências nos serviços de saúde uma precedência isolada (41%). 

>No mundo masculino as preferências se dividem entre redução de impostos (33%), controle da inflação (32%) e melhorias na saúde (32%).

Quem sai de casa para caçar votos não deveria esquecer: urna é substantivo feminino.

Luiz Carlos Azedo: Jogo de profissionais

- Correio Braziliense

Teremos a menor renovação política das últimas sete eleições, em razão da redução do tempo de campanha de 90 para 45 dias; do horário eleitoral gratuito de 45 para 35 dias; e do financiamento público

Havia grande expectativa em relação ao papel dos chamados movimentos cívicos nas eleições de 2018, na onda dos protestos e grandes manifestações organizados pelas redes sociais desde março de 2013. Esses protestos resultaram, mais tarde, no impeachment de Dilma Rousseff e no apoio maciço à Operação Lava-Jato. Entretanto, já se pode dizer, com toda certeza, que não conseguirão renovar a representação política no Congresso; e talvez, não tenham também grande peso nas eleições para presidente da República. A política dos cidadãos, digamos assim, nunca foi tão vigorosa, mas eleitoralmente não resulta na formação de coalizões políticas robustas o suficiente para romper a blindagem das velhas estruturas partidárias e oligarquias políticas.

A razão desse fenômeno é uma mix de decisões intempestivas do Supremo Tribunal Federal (STF), como a portabilidade dos recursos e tempo de televisão, que estimularam a formação de partidos franquia, e a nova política de financiamento público, que fortaleceu ainda mais os donos de partidos e os candidatos endinheirados, sem nenhuma garantia de que não haverá caixa dois. Essas decisões provocaram a reação dos grandes partidos no sentido de bloquear a renovação e salvar a pele dos seus caciques na reforma eleitoral e partidária.

O instinto de sobrevivência do establishment político é notável. Embora, mais cedo ou mais tarde, muito de seus integrantes venham a ter que acertar contas com a operação Lava-Jato, o esquema montado para neutralizar seus efeitos eleitorais tem um lado muito positivo: a sobrevivência da nossa democracia, que estava em vias de ser garroteada por um movimento em pinça de projetos autoritários à direita e à esquerda. Isso explica a ampla coalizão de forças formada em torno do candidato de PSDB, Geraldo Alckmin, que foi um bom governador de São Paulo e tem a simpatia das elites econômicas do país.

De certa forma, os mecanismos de financiamento eleitoral e distribuição de tempo de televisão são o grande obstáculo à candidatura do capitão da reserva do Exército Jair Bolsonaro (PSL), cujo vice, general Mourão, chama de “ditabranda” o regime militar que vigorou no país entre 1964 e 1985. A outra face da moeda é o fato de Marina Silva, em que pese a enorme representatividade alcançada nos dois últimos pleitos, ir às urnas sem dispor da paridade de meios que deveria ter, se levássemos em conta a votação que obteve para a Presidência e não, apenas, o número de deputados da Rede e do PV, como estabelece a legislação eleitoral.

Como outra contradição do mesmo processo, temos a resiliência do PT, cujo líder principal, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, está preso e inelegível. A reforma eleitoral foi feita sob encomenda para evitar que o desastre eleitoral petista de 2016 se repita nas eleições desse ano. Em aliança com o PMDB e outros grandes partidos, a legenda somente não conseguiu tudo o que queria na reforma eleitoral, porque não foi aprovado o voto em lista, assim como o MDB não conseguiu aprovar o “distritão” proposto pelo presidente Michel Temer. Na distribuição de recursos do fundo partidário e tempo de televisão, o PT tem cacife para sonhar com um candidato no segundo turno, seja o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, seja o ex-governador da Bahia Jaques Wagner.

Joel Pinheiro da Fonseca: Para que serve um debate?

- Folha de S. Paulo

Se o debate tem relevância, é porque ele nos mostra pessoas

Há um consenso de que o debate da quinta-feira passada, na Bandeirantes, foi morno. Saímos decepcionados. Há pelo menos mais seis no horizonte. Para não ficarmos reclamando depois deles, cabe perguntar: o que exatamente ficou aquém do desejado?

Uma crítica comum a debates ou entrevistas com candidato é que faltou discussão de “propostas”. Faltou esmiuçar em detalhes os planos do candidato para a segurança pública, para o SUS, para a habitação, para o orçamento.

Eu não acho que o problema esteja aí, e por dois motivos: o primeiro é que nenhum candidato sabe, em detalhes, o que fará em cada área —conhecimento altamente técnico e cuja engenharia não caberá a ele— e, mesmo que soubesse, não diria.

Qualquer plano tem pontos fracos; tornar público um projeto detalhado que, no momento, ele não tem a autoridade para implementar, abre o candidato a críticas fáceis de todos os lados que só diminuiriam sua força.

O segundo motivo pelo qual um debate não é um palco adequado para a discussão pormenorizada de políticas públicas é que nenhum de nós assistiria a cinco minutos disso.

Ninguém —exceto quem é da área— tem interesse e conhecimento para acompanhar os números, fatos e detalhes sobre um tema qualquer, por mais importante que ele seja.

O candidato que cita números em sua fala o faz somente para dar a impressão de que domina o tema, e mesmo aí tem que cuidar para ser breve porque a atenção do ouvinte é fugaz. No mais, quem realmente quer discutir ou entender medidas não assiste um debate oral; vai ler um livro ou artigo.

Gil Castello Branco: O Brasil pode mudar

- Globo

É curiosa a frase do americano Roger von Oech, especialista em inovação: “Só quem gosta de mudança é bebê molhado.” Os brasileiros, enojados com a maioria dos políticos, estão divididos entre a indiferença e o desejo de transformação. No Tocantins, há dois meses, no segundo turno da eleição tampão para governador do estado, venceu a indiferença, o “não voto”. As abstenções, votos brancos e nulos atingiram 51,83%, superando a soma dos votos dos dois candidatos.

“É tudo farinha do mesmo saco. Nada vai mudar”, é o que dizem. De fato, as regras eleitorais favorecem de forma escancarada os que já detêm mandatos e frustram o desejo de renovação dos brasileiros. Os fundos Partidário e Eleitoral, que somados custam aos cidadãos R$ 2,6 bilhões, são distribuídos em parcelas maiores para os grandes partidos, e os dirigentes rateiam a bolada entre eles. Uma centena de parlamentares fará de tudo para ser reeleita com medo da Lava-Jato. Os já conhecidos também serão favorecidos pela redução dos tempos de campanha e de propaganda eleitoral. No horário eleitoral gratuito, o espaço para a divulgação das campanhas também é muito maior para os tradicionais partidos. Nos debates na televisão, os candidatos com percentuais pequenos de votos nas pesquisas eleitorais não têm chance de crescer porque sequer são convidados.

As vantagens não param aí. Um deputado federal tem até 25 assessores, e um senador chega a ter cem subordinados, agora transformados em “cabos eleitorais”, pagos pelo Erário. Outra vantagem é os parlamentares continuarem com o mandato até o dia das eleições. Como estão em campanha eleitoral, pouco aparecem no Congresso, mas continuam usufruindo da verba indenizatória para bancar escritórios, automóveis, gasolina, refeições, telefones, impressos etc. Enfim, é um jogo desigual. A estimativa é que de cada cem deputados federais que tentarão a reeleição, 80 consigam permanecer na Casa.

Ana Carla Abrão: Ironia

- O Estado de S.Paulo

Aumento do STF desrespeita dispositivo constitucional chamado teto de gastos

Os ministros do Supremo Tribunal Federal – agora, naturalmente, acompanhados também pelo Ministério Público – se autodeclararam merecedores de um aumento de 16,38% nos seus salários. Em valores absolutos, são R$ 5,6 mil a mais para cada um dos 11 ministros, número que constará na proposta orçamentária de 2019, a ser apreciada pelo Congresso Nacional.

O problema não está necessariamente no valor, até porque não é fácil julgar se ganham bem ou mal nossos magistrados, tendo em vista a pouca transparência sobre seus vencimentos. Afinal, boa parte da sua remuneração está à margem da Lei de Responsabilidade Fiscal e até mesmo da Receita Federal, com adicionais de renda disfarçados de verbas indenizatórias. O problema maior está nos efeitos moral e fiscal desse aumento em momento tão crítico da economia nacional.

Do ponto de vista moral, a conta é fácil. São 13 milhões de brasileiros desempregados, consequência de uma crise que gerou uma contração de mais de 10% na renda per capital nacional. Além disso, somos o 3.º país mais desigual do mundo e, pasmem, a desigualdade de renda no setor público brasileiro é o dobro da desigualdade de renda do Brasil, segundo cálculos de Ricardo Paes de Barros, economista que entende desse problema como ninguém.

Mas talvez os argumentos morais sejam excessivamente abstratos, apesar de números tão concretos. Lancemos mão então de argumentos fiscais. Afinal, estamos falando de orçamento e, como bem citou o ministro Ricardo Lewandowski ao defender o aumento, é importante perseguir a boa prática orçamentária – em particular num país em que União, Estados e municípios enfrentam uma crise fiscal sem precedentes, com despesas crescendo de forma descontrolada.

Míriam Leitão: O que pesa sobre a lira turca

- O Globo

Brasil tem vulnerabilidades nas contas públicas, e risco da lira turca é virar uma crise em dominó que afete outros emergentes

Agora é o momento em que as autoridades econômicas vão lembrar que o Brasil não é a Turquia. E não é mesmo, há várias diferenças entre os dois países. A Turquia enfrenta os déficits gêmeos — fiscal e externo — e está sendo hostilizada pelo governo Trump. O Brasil tem uma boa situação externa e uma grande fragilidade fiscal. A questão é que quando há uma crise em país emergente todos os outros recebem olhares de desconfiança. O ideal era não sermos vulneráveis, mas somos.

Desde abril, quando começou este período de aversão a risco que pegou Argentina, Brasil e outros, a Turquia já estava com problemas. O real se desvalorizou, o Banco Central teve que vender dólares e fazer operações de oferta de garantia contra risco cambial. Logo depois a volatilidade foi controlada. Mas com a lira turca a situação continuou piorando. A Turquia tem problemas parecidos com os da Argentina: inflação alta, em torno de 16%, déficit nas contas públicas e uma grande exposição cambial.

O endividamento bruto do governo turco é baixo, de apenas 28% do PIB, segundo o FMI. Mas o problema é a dívida privada extremamente elevada que chega a 170% do PIB. Para se ter uma ideia, segundo a economista Monica de Bolle, diretora de estudos de mercados emergentes da SAIS/Johns Hopkins, nos EUA, as empresas privadas turcas têm US$ 66 bilhões em papéis para rolar nos próximos 12 meses, e os bancos, US$ 76 bilhões. As reservas cambiais turcas, que chegam a US$ 100 bilhões, ficam pequenas diante de um serviço de dívida tão alto e com prazos tão curtos.

— A Turquia precisa desesperadamente de entrada de dólares, e o que está acontecendo é justamente o contrário. A briga com Trump dificulta ainda mais as coisas, porque os EUA têm poder de veto no FMI. O país não tem a quem pedir ajuda, nem ao Fundo. Além disso, nos anos 2000 a Turquia recorreu ao FMI, mas não cumpriu nada do que estava no acordo. Portanto, o histórico não é bom — explica Monica de Bolle, que trabalhava no FMI nesse período.

Alckmin traça estratégia para recuperar votos no interior de São Paulo

Tucano equaciona palanque duplo e prepara ação 'porta a porta' para frear avanço de Bolsonaro

Thais Bilenky / Daniel Carvalho | Folha de S. Paulo

TAUBATÉ E BRASÍLIA - Governador de São Paulo por quatro mandatos, o presidenciável Geraldo Alckmin (PSDB) deu início a uma “operação porta a porta” para recuperar o eleitorado cativo de seu estado, hoje dividido entre o tucano e Jair Bolsonaro (PSL).

Em evento ao lado do candidato a governador João Doria (PSDB) na sexta-feira (10) Alckmin fez sua primeira ação de campanha no interior paulista, depois de meses ausente publicamente do estado.

O tucano tentava evitar complicar ainda mais a divisão em sua base com as candidaturas adversárias de Doria e a do governador Márcio França (PSB), vice que o sucedeu e disputa a reeleição.

Em Taubaté, a 20 quilômetros de Pindamonhangaba, sua cidade natal, Alckmin foi recebido como prata da casa. Passou quase uma hora tirando selfies, abraçando simpatizantes e ouvindo incentivos à sua candidatura.

Lá deixou claro que a divisão do palanque duplo foi equacionada. “Vamos ter partidos que que apoiam o João Doria e vão fazer campanha para mim, e partidos que apoiam o Márcio França, mas também nos apoiam, estão na nossa coligação”, afirmou.

Segundo aliados, o PSB liberou os estados. Assim, França e partidos coligados como o PTB farão campanha para o presidenciável tucano.

Resolvida essa questão, o foco da campanha agora é recuperar o terreno perdido —crucial para alavancar o desempenho de Alckmin no país.

Alckmin quer usar inserções na TV para atacar Bolsonaro

Estrategistas tucanos vão utilizar comerciais de 30 segundos no horário eleitoral para ‘desconstruir’ adversário nas eleições 2018

Pedro Venceslau | O Estado de S.Paulo

Os estrategistas da campanha do ex-governador Geraldo Alckmin, presidenciável do PSDB nas eleições 2018, decidiram poupar o tucano e usar os seus comerciais de 30 segundos no horário eleitoral no rádio e na TV para tentar “desconstruir” a candidatura de Jair Bolsonaro (PSL).

A ideia é utilizar locutores em off, entrevistas antigas e efeitos gráficos nessa tarefa. Com isso, consideram, a imagem de Alckmin seria preservada.

A avaliação no PSDB é de que o candidato do PT estará no segundo turno. Nesse cenário, o candidato do PSL é apontado como o principal adversário na disputa pela segunda vaga.
A campanha de Alckmin pretende usar boa parte das 12 inserções diárias a que ele tem direito no rádio e na TV para apontar contradições de Bolsonaro em sua trajetória.

Durante a preparação para o debate da TV Bandeirantes com os presidenciáveis na quinta-feira, 9, auxiliares e aliados de Alckmin estavam divididos sobre a melhor estratégia no primeiro confronto direto da campanha. A maior parte do entorno do ex-governador defendia um embate direto com Bolsonaro logo na largada, mas o tucano resistia à ideia.

Fiel ao seu estilo, Alckmin testou todas as opções, mas deixou no ar qual seria sua escolha. Quando teve a palavra ao vivo, surpreendeu ao optar por acionar a ex-ministra Marina Silva, presidenciável da Rede. A escolha se repetiu em outras duas ocasiões. Esse episódio ilustra um dilema tático sobre a melhor forma de enfrentar o deputado do PSL, que tem direito a apenas um comercial a cada três dias.

Alckmin se compromete a ampliar atendimento às mulheres vítimas de violência doméstica

O candidato do PSDB à Presidência da República, Geraldo Alckmin, garantiu a ampliação de delegacias femininas para atendimento de vítimas de violência doméstica. Alckmin participou na tarde de hoje (13) de sabatina na redação de ISTOÉ. O assunto tem sido bastante debatido nos últimos dias. Os números assustam. De acordo com dados divulgados na última semana pela ONG Fórum Brasileiro de Segurança Público, o número de feminicídio subiu de 812, em 2016, para 1.133 casos, em 2017.

“Todo o empenho para reduzir. O que nós fizemos em São Paulo? Delegacias especializadas, com equipes formadas por delegadas, investigadoras, escrivãs. Pretendemos, então, ampliar as delegacias femininas, com ação rápida – no sentido de atendimento à mulher -, investigação. A impunidade estimula as atividades delituosas, então pegar quem cometeu o crime e punir.”, defendeu o tucano.

Durante a sabatina, Alckmin afirmou que uma marca de seu governo será “a fortíssima participação das mulheres” e citou a escolha de sua vice, a senadora Ana Amélia (PP-RS), como prova disso. O presidente do PSDB ressaltou que as mulheres não podem ser vistas apenas como voto, elas têm de “se empoderar”. Geraldo Alckmin ainda destacou que irá fazer justiça quanto à diferença salarial entre homens e mulheres existente hoje no país.

“Justiça com as mulheres na questão do emprego. A mulher tem o desemprego mais alto e ela ganha de 15 a 62% menos que o homem (dados do IBGE). É inacreditável! Nós precisamos ser justos com as mulheres através da educação, informação e fiscalização.”

Alckmin não contará com ajuda financeira de partidos aliados

Aliados não querem financiar Alckmin

Por Vandson Lima e Andrea Jubé | Valor Econômico

BRASÍLIA - Candidato a presidente da maior coligação desta eleição, com nove partidos e 44,4% do tempo disponível para rádio e TV, Geraldo Alckmin não contará com qualquer ajuda financeira das legendas a ele aliadas.

Segundo dirigentes das siglas envolvidas, não há expectativa de que DEM, PP, PRB, PR, SD, PPS, PTB e PSD aportem dinheiro na campanha de seu candidato ao Palácio do Planalto. E nem poderiam, alegam. Com bancadas hoje muito maiores do que as que elegeram em 2014, esses partidos concentrarão seus recursos em custear as campanhas de seus congressistas para, ao menos, manter o tamanho - e influência - que têm hoje no Congresso Nacional. A bancada eleita em 2014 é um dos critérios usados para a distribuição do fundo partidário de R$ 1,72 bilhão.

"Não temos condições para isso [dar dinheiro para a campanha de Alckmin]. O DEM está apertadíssimo, pois temos uma receita que espelha o tamanho do partido no passado", diz o presidente do DEM, Antonio Carlos Magalhães Neto. Em 2014, o DEM elegeu apenas a décima bancada da Câmara, com 21 membros. O partido mais que dobrou no período: tem hoje 43 integrantes, quinta maior bancada. "Hoje o nosso tamanho é incompatível com a nossa receita", continua Neto. O DEM terá a oitava maior fatia do fundo, com R$ 87,5 milhões.

O PP indicou a candidata a vice na chapa de Geraldo Alckmin, a senadora pelo Rio Grande do Sul, Ana Amélia. Mas essa indicação não implica necessariamente em repasse de recursos da cota feminina do fundo eleitoral do PP para a campanha majoritária tucana. Seguindo a lei eleitoral, do total de R$ 39,3 milhões destinado à campanha das candidatas mulheres da sigla, nenhum centavo do PP será repassado ao cabeça da chapa presidencial por conta da vice.

‘A democracia precisa dos partidos políticos’, diz brasilianista

O cientista político americano David Samuels diz que siglas vivem ‘situação de descrédito’, o que ‘abre a porta’ para candidaturas como a de Jair Bolsonaro nas eleições 2018

Ricardo Brandt | O Estado de S.Paulo

O cientista político americano David Samuels estuda o sistema partidário brasileiro há duas décadas. Professor da Universidade de Minnesota (EUA), o brasilianista afirma que a polarização hoje no Brasil se dá não entre direita e esquerda, mas entre petistas e antipetistas – dois grupos de perfis semelhantes que, somados, representam quase a metade do eleitorado. Ele também diz que os partidos ficaram em descrédito com os escândalos de corrupção, mas enfatiza que “a democracia precisa de partidos”. Samuels está no País para apresentar o livro que lançou nos EUA em parceria com o cientista político brasileiro Cesar Zucco Júnior, da FGV do Rio, sobre o comportamento do eleitorado e o sistema partidário brasileiro (Partisan, Antipartisans, and Nonpartisans – Voting Behavior in Brazil, ainda sem tradução).

• O eleitor brasileiro é indiferente aos partidos ao votar?

Existe uma coerência do sistema partidário no eleitorado. Mais ou menos a metade pensa politicamente em termos de ‘eu gosto ou não gosto do PT’. E a outra metade é, na maioria, não politizado, não partidário. Um grupo que não têm afinidade nem é contra partido algum. As qualidades pessoais dos candidatos e a performance do governo são importantes – por isso, dizemos que o candidato governista terá poucas chances nessa eleição. Mas nossa conclusão é que, para os eleitores partidários, a atitude partidária, seja ela positiva ou negativa, molda ou filtra as percepções políticas, como as de performances pessoais e de governo.

• Os partidos vivem seu pior momento no Brasil, depois dos escândalos de corrupção?

Todos partidos ficaram em situação de descrédito. A democracia precisa de partidos políticos. Esse é o problema da democracia. O eleitor não gosta de partidos, os partidos são de elites. E o eleitor não gosta de elites. Mas qualquer sistema político precisa de elites. Tem um amigo que diz ‘olha, uma democracia precisa de partidos da esquerda e da direita’. Não é somente o partido de esquerda que vai consolidar e aprofundar a democracia. O Brasil carece de partidos conservadores com raízes na sociedade, só existem candidatos conservadores. Isso abre a porta para candidatos como Jair Bolsonaro (PSL).

• O Brasil vive um cenário de polarização excepcional?

Não é somente no Brasil que tem polarização, é no mundo inteiro. Nos últimos 30 anos, a economia brasileira tem mudado muito e isso deu vantagens para muita gente, mas também trouxe desvantagens para uma porção enorme da população. A precariedade de empregos cresceu, afetou a classe média, as pessoas que têm emprego no setor formal. E isso tem a ver com a política, com os padrões de atitudes políticas.

• É uma polarização estilo democratas versus republicanos?

Mais ou menos dois terços ou três quartos dos partidários são petistas. Mas tem uma proporção grande do eleitorado brasileiro que é somente antipartidário, não tem partido que goste. Aqui, tem mais antipartidário puro do que na maioria dos países. Nos EUA, todo antipartidário também tem uma afinidade partidária. No livro, mostramos vários países com antipartidarismo, mas o Brasil tem muitos. E a maioria desses antipartidários são antipetistas, 75% a 80%.

• Qual o perfil do petista e do antipetista?

Eles não vêm de classes sociais diferentes. Não é que o antipetista seja da elite e o petista é pobre, da classe média e baixa. Uma pessoa politizada tem de ter um certo grau de educação, um desejo de se engajar na política. E, geralmente, essas pessoas são de classes socioeconômicas mais altas. São 20 milhões de antipetistas. Não podem ser só pessoas das elites. E também tem pobre e gente com PhD que estão entre os petistas.

• A aliança do PSDB com o Centrão indica um alinhamento dos tucanos com a direita?

A moderação do PT fez o PSDB migrar mais para a direita. O PT era a esquerda, se moderou, mudou para o centro e ocupou o espaço do PSDB. O PSDB queria ser um partido de centro-esquerda, mesmo no momento de fundação. O PSDB tem dois problemas principais. Um é tentar tirar os eleitores do Bolsonaro e mostrar que é realmente conservador. O outro é como vai fazer campanha sem dizer que é governo hoje.

• O PT vai sobreviver sem Lula?

Acho que sim, é uma questão aberta ainda. Bolsonaro tem fãs, mas não tem uma organização que dá apoio. É a fraqueza principal da campanha dele. A prova foi a incapacidade de conseguir se coligar com grandes partidos e achar um candidato a vice que adicione alguma coisa. Mas, para o PT, o partido não é só uma pessoa, é uma organização grande que tem recursos, tem milhões de simpatizantes e diversos políticos pelo Brasil inteiro.

• Nos EUA seria possível um candidato condenado e preso?

Acho que é coisa inédita no mundo. Acho que não aconteceria.

Cármen defende Ficha Limpa; Wagner lança alerta ao PT

Ministra fala às vésperas do registro de Lula; Wagner pede definição do partido

Na antevéspera do registro da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Palácio do Planalto, a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, defendeu ontem a Lei da Ficha Limpa, que torna inelegíveis condenados por órgão colegiado da Justiça. “Leis eleitorais, nacionais, da maior importância, são de iniciativa popular”, disse a ministra. “A chamada Lei da Ficha Limpa foi um conjunto de cidadãos que levou ao Congresso Nacional aquilo que lhe parecia próprio.” Cármen afirmou que essa lei foi “considerada pela ONU uma das melhores que existem”. Condenado por corrupção e lavagem de dinheiro e preso desde abril, Lula já teve sua condenação confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região. Também ontem, o ex-governador da Bahia Jaques Wagner lançou um alerta ao PT: “Se temos uma estratégia de substituição, nós não vamos ter a vida inteira para expor o (Fernando) Haddad”, disse. Haddad e o próprio Wagner são apontados como possíveis substitutos de Lula.

Para Cármen, Ficha Limpa é conquista da sociedade

Rafael Moraes Moura /Amanda Pupo | O Estado de S. Paulo.

BRASÍLIA - Às vésperas do registro, pelo PT, da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Palácio do Planalto, a presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, fez ontem uma defesa da Lei da Ficha Limpa, que torna inelegíveis condenados na Justiça por órgão colegiado. Sentenciado por corrupção e lavagem de dinheiro na Lava Jato e preso desde abril, Lula está potencialmente enquadrado na Ficha Limpa. O petista, que lidera as pesquisas de intenção de voto, teve a condenação confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4).

“Leis eleitorais, nacionais, da maior importância, são de iniciativa popular. A chamada Lei da Ficha Limpa foi um conjunto de cidadãos que levou ao Congresso Nacional aquilo que lhe parecia próprio. Uma lei considerada pela ONU como uma das melhores que existem”, disse Cármen Lúcia durante palestra em Brasília. A ministra vai deixar a presidência do Supremo em setembro.

Ao registrar Lula no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mesmo com ele cumprindo pena em Curitiba, o PT procura ganhar tempo e expor ao máximo o ex-presidente na campanha. Por isso, o registro da candidatura será feito amanhã, último dia do prazo. O ex-governador Jaques Wagner, no entanto, disse ontem que o PT tem uma “estratégia de substituição” e que o partido não pode esperar “a vida inteira” para expor o ex-prefeito Fernando Haddad, provável substituto de Lula na chapa se a candidatura do ex-presidente for impugnada.

A discussão jurídica sobre a possibilidade de Lula ser candidato também ocorre em meio à troca de comando no TSE – a gaúcha Rosa Weber, de 69 anos, assume hoje o comando da Corte. Considerada por colegas, auxiliares e advogados a ministra mais rigorosa do TSE, Rosa votou pela cassação da chapa de Dilma Rousseff-Michel Temer por abuso de poder político e econômico, defendeu a perda de mandato dos governadores do Amazonas, do Tocantins, da Paraíba e de deputados de Sergipe acusados de irregularidades na destinação de verbas da Assembleia Legislativa do Estado (mais informações nesta página).

Nos temas eleitorais decididos pelo Supremo – Corte que também integra – Rosa acompanhou a corrente majoritária que decidiu que o prazo de oito anos de inelegibilidade fixado pela Ficha Limpa pode ser aplicado até para candidatos que tenham sido condenados antes da publicação da lei, em 2010.

Rosa Weber assume TSE com desafio de combater fake news

No Tribunal Superior Eleitoral, nova presidente terá tarefas como a fiscalização do financiamento das campanhas políticas e a aplicação da Lei da Ficha Limpa

André de Souza | O Globo

BRASÍLIA - A tarefa não será das mais simples. Ao tomar posse hoje à noite como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a ministra Rosa Weber terá, logo de cara, que comandar o processo eleitoral de uma das disputas mais acirradas e imprevisíveis dos últimos tempos, marcada para daqui a menos de dois meses. De imediato, terá que lidar com o julgamento da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio da Silva, enquadrado na Lei da Ficha Limpa.

Considerada a mais discreta entre os 11 integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF) —a presidência do TSE sempre é exercida por um ministro do STF—, Rosa terá outras tarefas espinhosas. Entre elas, estarão as chamadas “fake news”, que ganharam maior repercussão com o crescimento das redes sociais e aplicativos de mensagens. O TSE precisará se equilibrar entre o combate ágil e efetivo aos boatos que se espalham pela internet e o exercício dos direitos de defesa e de liberdade de expressão.

Outro tema que desafia a corte é a fiscalização do financiamento das campanhas. Esta será a primeira eleição geral desde que as doações de empresas foram proibidas. Para compensar, o Congresso aumentou o volume de verbas públicas destinadas às campanhas. Mas novas preocupações, como o financiamento pelo crime organizado, passaram a ter um peso maior.

Apesar dos desafios, o TSE não é uma novidade para Rosa. O primeiro mandato de dois anos dela como ministra efetiva da Corte começou em 24 de maio de 2016. Em 2018, o mandato foi renovado para mais um biênio. Antes de 2016, ela já tinha ficado quatro anos como ministra substituta.

Em junho do ano passado, Rosa votou pela cassação da chapa vencedora na eleição presidencial de 2014. Na prática, isso significaria tirar o presidente Michel Temer do cargo. Mas, por quatro votos a três, o TSE preservou seu mandato. No STF, Rosa já votou contra prisão após condenação em segunda instância, mas, ao analisar um pedido da defesa de Lula, condenado na Lava-Jato, se rendeu à maioria e votou contra a liberdade do ex-presidente.

Rosa assume TSE e irá administrar rito sobre registro de chapa de Lula

Por Luísa Martins e Isadora Peron | Valor Econômico

BRASÍLIA- A ministra Rosa Weber assume a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) hoje tendo como principal desafio os trâmites jurídicos em torno da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O PT pretende registrá-lo como postulante ao cargo de presidente da República amanhã, último dia do prazo.

Lula já foi alertado por seus advogados para a possibilidade de seu pedido de candidatura seguir um "rito abreviado" na Corte. Pelas contas de um integrante da equipe jurídica do PT, a inelegibilidade do petista deve ser declarada ainda em agosto.A estratégia do partido é alongar ao máximo essa batalha jurídica. O TSE tem até 17 de setembro, a três semanas do primeiro turno, para julgar em plenário todos os pedidos de impugnação de candidatura.

Esse também é o prazo final para que o PT decida se vai insistir em Lula - por meio de um recurso extraordinário no Supremo Tribunal Federal (STF) - ou se trocará seu nome pelo de Fernando Haddad. Isso porque, a partir de 17 de setembro, não se pode mais alterar a chapa que disputará a eleição.

Para o PT, o risco de o rosto de Lula chegar às urnas é o de não ter chance de chegar ao poder. Os votos serão considerados nulos caso seja confirmada a sua inelegibilidade. "A validade dos votos fica sujeita à análise dos recursos a que o ex-presidente terá direito", disse ao Valor fonte do TSE.

Um voto irracional: Editorial | O Estado de S. Paulo

Uma parte da elite empresarial do País começa a declarar publicamente sua intenção de voto em Jair Bolsonaro (PSL) para a Presidência da República. O que antes era um apoio silencioso e um tanto envergonhado vai ganhando porta-vozes desinibidos. A unir esses empresários está não o liberalismo postiço de Bolsonaro, inventado somente para tornar menos difícil declarar voto em quem é tão identificado com o estatismo, o nacionalismo e a repressão que marcaram a ditadura militar, mas a presunção de que o ex-capitão, por ser quem é, será capaz de implodir o atual sistema político.

Para os empresários que se dizem bolsonaristas, é preciso acabar com o presidencialismo de coalizão, em que o presidente precisa fazer acordos muitas vezes fisiológicos com diversos partidos para conseguir votos. Fosse o candidato do PSL capaz desta proeza, mereceria o apoio dos brasileiros de boa-fé.

Que o deplorável presidencialismo de coalizão é o sintoma mais evidente da submissão da política a interesses paroquiais não se discute. A distribuição de verbas e cargos para angariar apoio no Congresso torna praticamente impossível que o Executivo forme um Ministério com os melhores nomes possíveis, devido ao loteamento entre os apaniguados de partidos aliados. Ademais, a governabilidade fica sempre na dependência da habilidade do presidente de manter a capacidade de barganha.

Congresso trava projetos de ajuste, mas turbina os gastos: Editorial | Valor Econômico

O fim do recesso parlamentar não resultou na retomada da votação de propostas importantes para o país. O Senado resolveu adiar a apreciação dos projetos de lei da cessão onerosa dos campos do pré-sal e da venda das distribuidoras da Eletrobras para depois das eleições. Oficialmente, governo ainda manifesta esperança de que os dois temas de sua lista de prioridades não serão postergados. Mas o vice-presidente do Senado, Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), disse com todas as letras que os dois assuntos deveriam ser apreciados apenas após a escolha do futuro presidente.

Cunha Lima justificou que "recomenda o bom senso" que os dois assuntos somente sejam apreciados quando se souber quem será o novo presidente. Em defesa pouco crível dos interesses da nação, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) disse não ver sentido em o governo "correr contra o tempo na reta final para se desfazer do patrimônio público a preço de banana".

Na verdade, são temas importantes e deveriam ser debatidos levando em conta o interesse da nação e não do governo do momento. Somente o leilão dos seis blocos da cessão onerosa pode render mais de R$ 100 bilhões e garantir importantes investimentos e ajustes em outras áreas; e a venda das distribuidoras pode livrar o governo e a população de pesados encargos em um ano em que a meta fiscal prevê um déficit de R$ 159 bilhões. Além disso, não foi bem pensando nos interesses do governo que o Congresso aprovou uma série de projetos em comissão e até mesmo em plenário, que vão acarretar pesada conta, especialmente para o próximo presidente.

Retrocesso na saúde: Editorial | Folha de S. Paulo

Piora recente em indicadores indica agravamento no quadro de atenção básica

Uma crendice disseminada reza que notícia ruim nunca chega desacompanhada. Na saúde pública brasileira, a repetição de más novas —como as recentes pioras em mortalidade materna e infantil e nos índices de vacinação— parece corroborar a máxima.

Novos dados vieram à tona nesta segunda (13), na Folha: em 2016, voltou a aumentar a taxa de mulheres que morrem durante a gestação, o parto ou 42 dias depois dele por fatores associados à condição.

Em 2015, a cifra era de 62 por 100 mil nascidos vivos, patamar já muito alto. Um ano depois, o último com estatísticas disponíveis, subiu para 64,4/100 mil. Quase o triplo do observado no Chile (22/100 mil).

Não é só por comparação, contudo, que o dado preocupa. O Brasil havia assumido, e descumprido, a meta de reduzir a mortalidade materna em 75% até 2015.

Deveria ter recuado para 35/100 mil, mas ficou distante disso. Agora retrocede, tanto no indicador quanto no compromisso, reformado para uma diminuição de 50% até 2030, ou 30 mortes/100 mil.

Estados precisam da reforma da Previdência: Editorial | O Globo

Governadores conscientes da crise têm de trabalhar para que as mudanças sejam aprovadas logo

A proposta de reforma da Previdência encaminhada ao Congresso por Michel Temer dava relativa tranquilidade aos governos estaduais, porque ela estabelece — está paralisada na Câmara, mas não morta — que a Federação terá seis meses para adotar as mudanças.

Assunto impopular onde seja feita, esta reforma é de difícil execução nos entes federativos menores, em geral mais expostos às pressões de fortes corporações do funcionalismo. A torcida era para o Congresso aprovar as mudanças —idade mínima para obtenção do benefício, regras de transição, revisão de benevolentes e irreais pensões e assim por diante —, e a Federação como um todo ter de se adequar, por não haver outra alternativa. Promulgada a emenda, a reforma torna-se determinação constitucional.

Mas o próprio governo federal, com a desidratação política do presidente da República, flagrado numa conversa aética com o empresário Joesley Batista, nos porões do Jaburu, perdeu as condições de viabilizar a reforma no Congresso.

Aliança - Tribalistas

Garcia Lorca: Volta de passeio

Assassinado pelo céu,
entre as formas que vão para a serpente
e as formas que buscam o cristal,
deixarei crescer meus cabelos.

Com a árvore de tocos que não canta
e o menino com o branco rosto de ovo.

Com os animaizinhos de cabeça rota
e a água esfarrapada dos pés secos.

Com tudo o que tem cansaço surdo-mudo
e mariposa afogada no tinteiro.

Tropeçando com meu rosto diferente de cada dia.
Asassinado pelo céu!


(Tradução de William Agel de Melo)