quinta-feira, 18 de abril de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

PEC das Drogas trata questão séria com demagogia

O Globo

Parlamento deve ao país resposta condizente com a necessidade de distinguir traficantes de usuários

A Proposta de Emenda à Constituição conhecida como PEC das Drogas, aprovada na terça-feira no Senado, é forte em demagogia e, na hipótese mais otimista, inócua como solução para os problemas causados pelos entorpecentes. O texto que segue para a Câmara não faz a distinção necessária entre usuário e traficante e atrapalha, em vez de ajudar, a discussão a respeito em andamento no Supremo Tribunal Federal (STF). A questão exige mais conhecimento técnico e responsabilidade do Congresso.

Se aprovada pelos deputados como está, a PEC aumentará o encarceramento de usuários pegos pela polícia com quantidades pequenas de droga. Com isso, fornecerá mais mão de obra às facções criminosas que atuam nos presídios e terá o efeito contrário ao desejado por quem votou a favor no Senado. Por isso é urgente fazer correções. A situação preocupante da segurança pública não permite leviandade dos legisladores em tema tão sensível.

Merval Pereira - Vingança é o nome do jogo

O Globo

Vivemos um momento delicado, em que os três Poderes brigam entre si e, às vezes, também internamente, alimentando incertezas

Vingança é a palavra de ordem vigorando. Vivemos um momento delicado, em que os três Poderes brigam entre si e, às vezes, também internamente, alimentando incertezas. O Supremo Tribunal Federal (STF) está em choque com o Legislativo, e os próprios ministros se batem, ainda em decorrência da Operação Lava-Jato.

Há claramente uma ação articulada no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para tentar punir juízes e desembargadores que trabalharam na Lava-Jato, com claro cheiro de vingança no ar. No Congresso, os parlamentares se organizam, na Câmara e no Senado, para se vingar do STF, que prendeu o deputado federal Chiquinho Brazão.

Mas não apenas por isso. Também contra o que consideram a “fúria legiferante” da mais alta Corte do país. O Executivo, por sua vez, briga com o Legislativo, onde não tem maioria, e se escuda no Supremo, que já esteve mais forte do que hoje e também precisa de apoio político. As CPIs são a arma parlamentar com que o Congresso ameaça o governo.

Malu Gaspar - Os drones de Lira contra Lula

O Globo

A notícia dos ataques que Arthur Lira (PP-AL) fez a Alexandre Padilha (Relações Institucionais) começou a circular nos celulares dos deputados na quinta-feira passada, no momento em que líderes do governo no Congresso se reuniam para discutir a votação das emendas orçamentárias prevista para esta semana.

Lira chamou Padilha de “desafeto pessoal” e incompetente, depois de vários veículos de imprensa publicarem que ele atuou nos bastidores para que os deputados votassem pela soltura de Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), preso por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF) sob a acusação de ser um dos mandantes do assassinato de Marielle Franco (PSOL).

A reação dos lulistas foi de ironia. “O café dele já esfriou mesmo, hein?”, disse um deles, já emendando: “Quem fez fama atropelando o governo vai se assustar ao ser atropelado”. O presidente da Câmara dos Deputados provavelmente não soube da piada governista, mas certamente percebeu que muita gente em Brasília interpretou um ataque tão frontal como sinal de desespero e fraqueza política.

Míriam Leitão - A volatilidade e o ruído que fica

O Globo

Houve uma piora na percepção da economia após a mudança da meta, como se o governo tivesse “jogada a toalha“ na área fiscal

Ontem foi o reverso de terça-feira. O real foi a moeda que mais subiu, e os juros futuros de longo prazo caíram tudo o que haviam subido. Mas isso não muda os sinais de que houve uma piora da percepção da economia. Os novos números de resultado primário anunciados pelo ministro Fernando Haddad eram até melhores do que os que o mercado projetava. O problema é ter ficado a impressão de que o governo e o Congresso vão desistir das metas fiscais. Como houve exagero na terça, o dia amanheceu ontem com o mercado sabendo que haveria uma reversão. Mas continua havendo uma onda de fortalecimento mundial do dólar, o que pode bater na inflação e nos indicadores internos. Nada é alarmante, não é crise, mas é um cenário que exige mais cuidados. É o que dizem os economistas que consultei dentro e fora do governo.

Luiz Carlos Azedo - Lula deve pôr as barbas de molho com o cenário mundial

Correio Braziliense

Da mesma forma como o isolamento internacional se tornou um ponto fraco de Bolsonaro, a deriva diplomática de Lula abre espaços para a oposição

Num Palácio em que a cozinha governa, porque a área meio controla as atividades fins, o florentino Nicolau Maquiavel seria uma espécie de espírito de porco, a desafiar o coro dos contentes que cercam o príncipe, num momento em que o seu governo precisasse corrigir seu curso.

“De quanto pode a fortuna nas coisas humanas e de que modo se lhe deva servir” (Quantum fortuna in rebus humanis possit, et quomodo illis it occurrem dum), o 15º capítulo d’O Príncipe, foi escrito para separar a religião da política, numa época em que o Estado recebia forte influência da Igreja, mas trata é desse assunto.

À época, dizia-se que as coisas eram governadas pela fortuna e por Deus e que os homens não poderiam modificar o seu destino. É mais ou menos o que acontece com o governo Lula, cujo futuro parece predeterminado por velhas convicções ideológicas, o que é sempre uma forma distorcida de apreensão da realidade, tanto quanto a religião.

Maria Hermínia Tavares - Reservatório do populismo

Folha de S. Paulo

Defesa da democracia já não basta para conter a força desse espectro antigo e profundo

Jair Bolsonaro perdeu as eleições —e seu golpe de Estado deu chabu. Ele não poderá disputar cargos públicos até 2030, além de ter contas pendentes com a Justiça que poderão deixá-lo fora do jogo, sabe-se lá por quanto tempo.

O que o mantém vivo na política, além de parcela da opinião pública, são a sua conspícua família e o espaço que lhe concedem, não sem ambiguidades, aqueles que à sua sombra se elegeram governadores, senadores e deputados.

Mas é possível que seu prestígio e sua liderança no campo da direita declinem. Nesse caso, terá destino semelhante ao de líderes populistas derrotados nas urnas mundo afora, em proporção maior dos que permanecem no poder e corroem a democracia por dentro.

Bruno Boghossian – Uma forcinha ao arbítrio

Folha de S. Paulo

Parlamentares terceirizam interpretação da Constituição e patrocinam o arbítrio nas esquinas

Emoldurar a PEC das Drogas como uma vingança contra o Supremo é um favor e tanto para o Senado. A proposta que enquadra como crime a posse e o porte de entorpecentes em qualquer quantidade é uma daquelas inovações que desfilam com o surrado disfarce da defesa institucional, apenas para despejar seus resíduos no mundo real.

A ideia nasceu pelo motivo errado. O Senado armou a reação quando o STF caminhava para determinar que o porte de maconha não deve ser considerado crime. O tribunal ensaiou um passo largo demais com a descriminalização. Acertou onde pisava, porém, ao restringir a discussão à maconha e propor uma quantidade de droga para diferenciar usuário de traficante.

Fernanda Torres - Ziraldo e a alegria da resistência

Folha de S. Paulo

Foi um dos que insistiram num Brasil humano, criativo e justo

No início da década de 1970, no arrocho da ditadura militar, o bairro do Jardim Botânico no Rio de Janeiro era o refúgio de artistas e intelectuais cariocas. No afã de que seus filhos usufruíssem de uma liberdade inexistente para além do portão de suas casas, essa geração de pais aderiu em peso ao ensino construtivista.

Eu e meu irmão, Claudio, fomos matriculados no Centro Educacional da Lagoa, uma escola pequeníssima, que prometia milagres com Piaget. Fabrízia Pinto era da mesma sala do meu irmão. No primeiro dia de aula, a molecada se apresentou com seus caderninhos encapados e os da guria causaram furor. Decorados com caricaturas dela ao lado de letras vivas, ou fugindo dos números 2 e 3, eles exibiam o traço inconfundível de Ziraldo, pai de Fabrízia e autor de uma febre chamada Flicts.

A casa Ziraldo e Wilma sempre esteve aberta, palco das festinhas de adolescência, de viradas, ensaios e contestações. O casal era próximo dos meus pais e os filhos regulavam de idade. Daniela, primogênita dos Pinto, era diferente. Metida até a orelha com o movimento estudantil, os pais acharam por bem mandá-la para Londres, onde se formou em letras e se descobriu cenógrafa.

Ruy Castro - Eles são os homens de bem

Folha de S. Paulo

Seguidores sinceros de Bolsonaro se confundem com os Brazão, Queiroz, Lessa e outros elementos

Quem conhece o teatro, romances e contos de Nelson Rodrigues sabe que seus personagens são uma galeria de adúlteros, incestuosos, assediadores, assassinos, suicidas e outros graves transgressores das normas de convívio. Por causa disso, Nelson foi censurado, teve peças e livros proibidos, sofreu ameaças físicas e foi chamado de tarado e pornográfico. Quem são esses personagens? Marginais, presidiários, prostitutas, pobres, destituídos, aqueles de quem a sociedade espera esses "desvios"?

Maria Cristina Fernandes - A receita da liturgia de Lewandowski para a crise

Valor Econômico

Ministro da Justiça doma bancada de bala, cavalo de batalha do bolsonarismo e massa de manobra de Lira

A harmonia entre os Poderes está na Constituição. Na ausência dela, o país vive sob inconstitucionalidade. Foi assim, citando o ex-presidente da República e daquela Casa, Michel Temer, que o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, abriu a sessão na Comissão de Segurança Pública da Câmara.

A frase não foi pinçada a esmo. Na véspera, o ministro havia acompanhado o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em jantar com quatro ministros do Supremo, além do titular da AGU, Jorge Messias. O encontro foi pautado pela preocupação com a relação entre os Poderes, notadamente com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

Presidente da Câmara recua após críticas de aliados

Marcelo Ribeiro e Raphael Di Cunto / Valor Econômico

Nos bastidores, mudança de postura de Lira foi comemorada

Após ensaiar uma escalada da crise com o Palácio do Planalto, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidiu recuar e segurou, pelo menos temporariamente, o andamento de medidas que tinham o potencial de desagradar ao governo. Críticas de aliados aos seus recentes movimentos, recomendações para que mudasse o tom e uma visita do ministro da Casa Civil, Rui Costa, teriam contribuído para o reposicionamento.

Nessa quarta-feira (17), o plenário aprovou apenas requerimentos de urgência a projetos sem polêmica e encerrou rapidamente as votações. Parlamentares não se debruçaram sobre requerimentos que enfrentavam resistência do governo. O alagoano nem sequer participou da sessão.

William Waack - A fórmula da vitória

O Estado de S. Paulo

A política econômica do governo Lula 3 está tornando mais difícil uma próxima vitória eleitoral

Lula assumiu o terceiro mandato já pensando em 2026, o que é normal. A questão é saber se vai funcionar a fórmula que está tentando aplicar para ganhar as próximas eleições.

Ela é muito simples e se baseia numa leitura do passado: a de que o gasto público traz voto, além de impulsionar o crescimento do PIB. Há uma série imensa de fatores que influenciam eleições, mas a ortodoxia petista (não só, porém) insiste em que benefícios sociais, acesso ao crédito e consumo das famílias é que consagram o presidente nas urnas.

Eugênio Bucci - Um vilão de James Bond estreia na política

O Estado de S. Paulo

Elon Musk parece um personagem fugido daqueles filmes de antigamente, mas extrapola. Suas ações reais sobrepujam a imaginação de Ian Fleming

O magnetismo dos filmes de James Bond desapareceu na fuligem das estrelas. As pernadas do 007 descansam no passado. O tipo criado por Ian Fleming, que pedia seu dry martini a bordo de um smoking da cor da noite ou de um summer de alta alvura, perdeu o elã.

Não que não tenha sido bom. Era divertido o modo como ele se apresentava para a dama fatal: “Bond, James Bond”. Em dois minutos, os dois se beijariam e em seguida se perderiam entre um salto de paraquedas e um tiro de pistola com silenciador. Só depois de incontáveis piruetas por terra, mar e ar é que o casal teria direito a um happy-end. Caliente. Estávamos no período da guerra fria e o espião que tinha licença para matar nos presenteava com amores escaldantes. O espectador médio daquela época torcia pela manutenção do establishment e vibrava quando James e a namorada se atracavam entre lençóis depois de salvar a humanidade, o planeta, o capitalismo e a dinastia Windsor da destruição completa.

Roberto Macedo – Economia: um alento fraco e só no curto prazo

O Estado de S. Paulo

Olhando as quatro décadas passadas e à frente o médio prazo, o desalento é grande com o crescimento econômico do Brasil

O noticiário econômico é focado no curto prazo porque vem muito de analistas e instituições financeiras atuantes neste horizonte em que procuram ganhar dinheiro. Não busca lições do passado nem discute as previsões mais longas. Usualmente, estas últimas repetem o presente quase sem alterações.

O relatório Focus, do Banco Central, que aponta previsões de analistas, vem mostrando taxas do PIB para o ano corrente que se alteraram. As desta semana, por exemplo, são de um crescimento de 1,95%, taxa que veio subindo devagar, mas persistentemente, há nove semanas. Mas a previsão para 2025, 2026 e 2027 é de 2%, há 18, 36 e 38 semanas, respectivamente.

Fernando de la Cuadra – Las tareas pendientes con la educación comprometen el futuro de Brasil

La crisis de la educación en Brasil, no es una crisis, es un proyecto.(Darcy Ribeiro)

La educación en Brasil está pasando por una etapa de estagnación, sin que las nuevas autoridades asuman responsablemente dar un giro con respecto a la situación heredada de los dos gobiernos anteriores, de Michel Temer y Jair Bolsonaro. Como nos advierte Darcy Ribeiro, parece que históricamente la función de la educación en Brasil ha sido la de profundizar las diferencias entre una elite culta, letrada y hasta erudita y una gran masa de analfabetos destinados a cumplir el papel de fuerza de trabajo barata y dócil. Los avances realizados en el campo pedagógico –como los realizados por Paulo Freire a comienzos de los años sesenta– siempre tuvieron que enfrentarse con la férrea oposición de quienes rechazaban los avances civilizatorios que la educación podría representar para el país, alfabetizando y dando carta de ciudadanía a los grupos más pobres y excluidos de la población.

Poesia | O amor bate na aorta, Carlos Drummond de Andrade

 

Música | Xande Canta Caetano - Gente